Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 36/2016, que autoriza distinções entre partidos políticos, para fins de funcionamento parlamentar, com base no seu desempenho eleitoral, e comentário sobre a importância da realização das reformas política e eleitoral.

Autor
Rose de Freitas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS:
  • Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 36/2016, que autoriza distinções entre partidos políticos, para fins de funcionamento parlamentar, com base no seu desempenho eleitoral, e comentário sobre a importância da realização das reformas política e eleitoral.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2016 - Página 67
Assunto
Outros > ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETO, AUTORIZAÇÃO, SEPARAÇÃO, PARTIDO POLITICO, REFERENCIA, PARTICIPAÇÃO, FUNDO PARTIDARIO, UTILIZAÇÃO, TEMPO, TELEVISÃO, RADIO, CRITERIO SELETIVO, RESULTADO, ELEIÇÕES.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as palavras que vou proferir neste plenário dizem respeito a uma das iniciativas que V. Exª tomou nesta Casa, que é, exatamente, tratar da reforma política e, consequentemente da reforma eleitoral.

    Este é um momento de uma necessária evolução, Sr. Presidente, do sistema político. Estamos em uma época em que as informações são transmitidas com extrema velocidade. Há maior interesse pelas atividades legislativas e também, felizmente, cobrança dos eleitores por todas as ações, cobranças de resultados verdadeiros sobre todas as propostas em que acreditaram e ajudaram a fundamentar.

    As pessoas, Sr. Presidente, estão mais vigilantes sobre os seus representantes, haja vista o resultado das eleições, não só no meu Estado, mas o resultado das eleições no Brasil inteiro. Cobram por leis mais eficazes e querem ver no dia a dia desta Casa, da outra Casa e de todas as outras Casas do Brasil o resultado do trabalho parlamentar.

    O Legislativo Federal é o Poder mais transparente da República. É possível, por exemplo, você acompanhar pela televisão – TV Senado, TV Câmara – os pronunciamentos realizados no plenário e nas comissões e compartilhar, sobretudo nas redes sociais, a pesquisa dos projetos que tramitam no Congresso. Há um tempo real para tudo o que nós estamos tratando na política em nosso País.

    Todos esses instrumentos fortalecem a participação democrática e dele ninguém tem que ter receio. Sabemos que a democracia não se faz somente pelo voto, mas também pela expressão popular nos mais variados canais de comunicação, canais que ganharam complexidade. O eleitor não é um mero receptador de notícias, Senadora Lídice da Mata. Ele está apto a interagir com o meio, a se portar como interlocutor. Ficou mais fácil mobilizar as pessoas e alertar para falhas do funcionamento do sistema vigente.

    Uma lei mal formulada pode ser questionada em redes sociais e mobilizar abaixo-assinados para que ela seja modificada. Estamos em uma época diferente daquela em que criamos a base do nosso sistema eleitoral. Passaram-se 30 anos da Assembleia Constituinte, Assembleia da qual eu fiz parte de 1987 a 1988, mas, na verdade, parece ter passado mais do que essas três décadas. É que o tempo anterior à Constituição se media pela velocidade da comunicação analógica. As informações demoravam a circular pelo País. Agora, as leis e os agentes públicos são todos vigiados.

    As notícias circulam pelas redes sociais, Sr. Presidente, e são divulgadas de modo quase instantâneo. É possível considerar que as mudanças culturais implicam a necessidade de reformas no campo eleitoral. A sociedade, informada sobre o papel de seus representantes, tende a cobrar deles o cumprimento de suas funções políticas em grau mais alto cada dia e cada hora. Tem sido assim desde a promulgação do Texto Constitucional, da qual nós fizemos parte, Sr. Presidente, no final da década de 1980.

    Depois passamos por pequenas mudanças ao longo dos anos, mas uma reforma profunda e que reflita, com fidelidade, as intenções de voto do eleitor parece, nos dias atuais, compor uma pauta em condição de ser aprovada necessariamente, atualmente, pelo Congresso Nacional.

    A Constituição e as mudanças das leis eleitorais, cada uma à sua época, tenderam ao alinhamento com as expressões da vontade popular. Foram criados mecanismos inovadores e que impactaram a relação entre eleitores e representantes. Contudo, Sr. Presidente, passaram-se os anos e os mecanismos perderam a sua atualidade.

    Em nosso entendimento, as pressões por mudanças na engrenagem da democracia representativa parecem significar que existe defasagem no modo de conduzir a política. Isso é sentido a todo momento. As manifestações populares revelaram a existência de lacunas no sistema eleitoral em vigor. É como se estivessem no limbo. Há um distanciamento entre políticos e eleitores que precisa ser resolvido. A meu ver, Sr. Presidente, a Proposta de Emenda à Constituição n° 36, de 2016, pode mitigar a distância entre representante e representado. Essa proposição tem importância simbólica e também no campo real.

    No dia 13 de setembro, a PEC nº 36, de 2016, foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, e as medidas nela inseridas para reduzir o número de partidos do Congresso Nacional estão aptas a serem votadas e tornarem-se regras constitucionais. A proposta dispõe que só terão direito ao chamado "funcionamento parlamentar" as siglas políticas que, a partir de 2018, obtiverem um mínimo de 2% dos votos válidos em, pelo menos, 14 unidades da Federação; a partir das eleições de 2022, o percentual será de 3% dos votos válidos. Não quer dizer que esteja o autor dessa proposta a destruir um dos grandes instrumentos da democracia, que é a organização partidária; ao contrário. O povo se confunde no emaranhado de siglas espalhadas pelo Brasil, muitas das quais servem apenas para contornar os artifícios que se montam em períodos eleitorais.

    O chamado "funcionamento parlamentar" compreende a participação nos recursos do fundo partidário, o acesso gratuito à rádio e televisão e o uso da estrutura funcional oferecida pelas Casas Legislativas. Portanto, os partidos, Sr. Presidente, que não alcançarem os níveis mínimos de votação não terão direito a fundo partidário nem a tempo de TV e rádio.

    O impacto dessa cláusula de desempenho não seria pequeno: estima-se que 10 dos 28 partidos da Câmara dos Deputados poderiam perder o direito ao chamado "funcionamento parlamentar". O lado positivo da medida é que a cláusula enfrenta a questão das "legendas de aluguel", tantas vezes denunciadas, tantas vezes repudiadas, e, em nenhuma das vezes, enfrentada. Essas legendas de aluguel também impedem que siglas pequenas se orientem, exclusivamente, por oportunidades eleitorais, sem apresentar um programa político viável.

    Os cientistas políticos, dentre os quais ouso citar Jairo Nicolau, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, consideram que a proporcionalidade extrema pode produzir um Legislativo muito fragmentado, e isso afetaria o ambiente de governabilidade, causando – como causa até hoje – uma paralisação da atividade legislativa pela impossibilidade de acordos em torno dos temas importantes que vão à votação.

    A Constituição de 1988, Sr. Presidente, consagrou o pluripartidarismo como um dos elementos da diversidade democrática, mas o contexto de quatro, três décadas atrás é diferente do que temos hoje. Naquela época, na qual a sociedade pressionava, sobretudo, por representatividade a seus diversos setores, não se previa o atual excesso de siglas partidárias. Estamos falando da atualidade, sem ainda tentar contabilizar as outras demais siglas que estão na fila para conseguir o registro das suas agremiações partidárias.

    A PEC nº 36, de 2016, limita a atuação de siglas que não tenham alcançado um desempenho mínimo nas eleições, mas também garante aos eleitos de partidos menores o direito de participar de todos os atos inerentes ao exercício do mandato, mesmo que seu partido não possa usufruir do "funcionamento parlamentar".

    Há um equilíbrio entre a representação partidária e a nominal. Se o candidato é eleito em partido de baixo desempenho nas eleições, a ele deverá ser assegurado o cumprimento de seu mandato. O funcionamento parlamentar, por seu turno, é direito do partido, não do indivíduo, razão pela qual não será garantido ao eleito por um partido de baixo desempenho nas urnas nem o tempo de TV, nem o fundo partidário.

    Srªs e Srs. Senadores, Sr. Presidente, em nosso entendimento, entre os projetos mais relevantes a serem votados no Congresso Nacional, está a reforma política, com todas as suas implicações, com todas as suas consequências. No âmbito dessa reforma, costumo reivindicar especial atenção ao sistema de eleição proporcional. Passamos por ajustes nas últimas corridas eleitorais, mas estamos distantes do modelo ideal.

    A PEC nº 36, de 2016, não encerra o esforço para que um dia nós possamos efetivamente alcançar uma reestruturação do sistema político, em direção a votações mais justas e mais representativas. Na verdade, a PEC é só o começo de um conjunto de medidas que pretendem extinguir as distorções anacrônicas do sistema.

    Presenciamos vários episódios de candidatos que beneficiaram seus colegas de legenda porque tiveram uma votação expressiva e levaram à eleição candidatos com pouquíssimos votos. Essa distorção não faz sentido em um ambiente de 35 partidos, em que boa parte das siglas partidárias, Sr. Presidente, parece totalmente desconectada de qualquer ideologia. Trata-se de duas faces de uma mesma moeda: quanto mais força se atribui aos candidatos, menor expressão tem o partido. E o contrário também pode ocorrer: se a legislação eleitoral confere maior importância aos partidos, o voto nominal passa a ficar totalmente desidratado.

    A meu ver, o trajeto a ser percorrido é o do equilíbrio entre o voto no partido e o voto no candidato. Por isso, vejo com otimismo a cláusula de desempenho da PEC nº 36. Ela limita o número de partidos, mas não prejudica o candidato eleito a cumprir seu mandato.

    Chegamos a um patamar em que dificilmente o eleitor sabe nomear os partidos políticos em atividade no País. É muito comum se perguntar em que partido estava o candidato em que votou e ele não saber. A maioria absoluta não sabe. Ainda mais improvável, Sr. Presidente, é que o eleitor saiba a ideologia difundida por cada uma das legendas, da legenda na qual depositou o seu voto. A fragmentação partidária reduz a governabilidade, dificulta os acordos políticos e se torna um obstáculo à democracia. No outro extremo, a votação exclusivamente no candidato esvazia a ideologia dos partidos e a representação dos diversos setores da sociedade.

    Ao finalizar a minha fala e minha reflexão, Sr. Presidente, quero solicitar aos Senadores e às Senadoras desta Casa que façamos as reformas de que o Brasil precisa, dessa vez, definitivamente, comprometidamente, com seriedade. Independentemente do partido a que pertençamos, nós precisamos dessa reforma política.

    Atravessamos um período, Sr. Presidente, em que o País precisa sair da UTI. Um esforço conjunto será determinante para realizarmos essa tarefa com sucesso. Não temos o direito de errar, de procrastinar, nem podemos ficar falando em reformas ao longo de décadas e não operarmos essas reformas ou fazermos minirreformas, dentro desta Casa, de acordo com a conveniência política do momento. Não podemos demorar, porque o brasileiro tem pressa para conhecer a solução de nossos problemas econômicos, sociais e políticos.

    A saída para todos esses aspectos aqui abordados depende de uma boa estrutura política. Mencionei, há pouco, que o cenário político nacional é recheado por 35 siglas partidárias, mas não há uma só delas que carregue, em seu programa político, a negação do progresso do País. Não há uma ideologia partidária cuja essência seja prejudicar o País, o que não corresponde, inclusive, aos votos que são aqui proferidos.

    Os eleitores estão atentos ao que fazemos no Congresso e exigem de nós o avanço das reformas estruturantes. Eles não se sentem representados pela classe política. Mas podemos mudar a percepção que se generalizou de que Parlamentares não desempenham suas funções com eficiência, porque é isso que perpassa a sociedade. Nós podemos fazer as reformas para nos estruturarmos política e adequadamente, e para que isso possa acontecer de fato e de direito. A classe política precisa aprender a cortar na carne, nos seus interesses imediatos, nas suas conveniências de aliança, nas suas conveniências eleitorais, para oferecer algo maior ao País.

    Sr. Presidente, a partir da diminuição do número de partidos e do enfrentamento das questões eleitorais, poderemos restabelecer mecanismos coerentes com o presidencialismo de coalização, que até agora tem sido apregoado pelo Governo atual, o nosso Governo, e por governos anteriores.

    Presidencialismo de coalizão: como podemos definir isso? É a soma das forças para que nós possamos oferecer ao País uma administração executiva coerente com seus programas, com suas metas e com as prioridades do povo brasileiro. Nós vamos fortalecer, de fato, restringindo os partidos, fazendo uma reforma política, fortalecendo o vínculo entre políticos e eleitores.

    Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, com a esperança renovada de que nós possamos enfim, de fato, ainda este ano, votar uma reforma eleitoral.

    Lembro-me da última vez em que falamos desse assunto no plenário; abria-se uma janela porque era, naquele momento, a conveniência da base, da maioria que aqui estava, de uma base política que falava sobre a reforma. Quero dizer que agora o Brasil não quer mais esperar por nada, não quer esperar que haja um milagre nesta Casa para que sejam feitas transformações econômicas – temos de votá-las. Não quer esperar mais que a gente possa pensar como será o futuro da educação – temos de fazer as mudanças agora. Não quer esperar mais que nenhum ministro venha dizer como é que se resolve o problema da saúde – temos de resolvê-lo agora. Também temos de fazê-las para oferecer uma política digna; isso não é restringindo o direito de ninguém, a capacidade de organização, o direito do voto. Nós queremos que exista coalização de votos entre eleitores, coalizão política entre os eleitores e os políticos, que hoje passam por alguns vexames diante da população brasileira.

    Era o que tinha a dizer.

    Agradeço a V. Exª, mais uma vez, pela sua solidariedade e pelo tempo que me destinou.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2016 - Página 67