Discurso durante a 158ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação contrária à decisão do STF de proibir a vaquejada, defendendo a regulamentação da mesma.

Autor
José Agripino (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CULTURA:
  • Manifestação contrária à decisão do STF de proibir a vaquejada, defendendo a regulamentação da mesma.
Aparteantes
Eunício Oliveira.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2016 - Página 38
Assunto
Outros > CULTURA
Indexação
  • DESAPROVAÇÃO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PROIBIÇÃO, ATIVIDADE CULTURAL, REGIÃO NORDESTE, VAQUEIRO, GADO, DEFESA, REGULAMENTAÇÃO, ATIVIDADE.

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há pouco tempo, menos de uma hora atrás, eu tive oportunidade de me manifestar com relação aos fatos que ocorreram no final da semana e que se desdobram até agora.

    Eu vou falar sobre um assunto que diz respeito à minha Região, à nossa Região, e ao Brasil, mas eu queria reiterar a posição que já deixei clara há pouco tempo com relação ao que se exige do presente momento. O momento é de busca de sensatez. O Senado é composto por 81 Senadores; eu, talvez, seja o que mais número de mandatos tem, e a minha obrigação é de praticar a sensatez, até em função da experiência que eu tenho desta Casa, pelos muitos anos que aqui vivi.

    Esta Casa é uma Casa de 81 Senadores, de muitos partidos, não é a Casa de um, dois, ou três, nem cinco Senadores, e a obrigação dos Senadores é defender com sensatez a dignidade do Senado, a dignidade do Congresso e a harmonia entre os Poderes. A obrigação que nós temos é de contribuir para que se refaça, e se refaça rapidamente, o diálogo estremecido entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. É isso que interessa à sociedade brasileira, que nós representamos na Câmara e no Senado – no Senado, os Estados; na Câmara, os diversos Estados e cada cidadão –, e que deseja, no momento, que o País se reencontre, que o Governo governe, que a Justiça opere e que o Congresso vote – a começar, por exemplo, pelos dez pontos da corrupção. Esse é o link direto com a sociedade, sem exageros, para fazer com que aquilo que vem sendo feito, as investigações da Lava Jato, que estão passando a limpo o País, tenham consequência, e nunca interrupção. Tenham consequência, concluam seu trabalho, e nunca sofram qualquer tipo de interrupção, porque isso seria contrariar a vontade do povo brasileiro.

    Votar outras leis que, neste momento, pudessem significar não digo contraposição, mas embaraço às investigações, como a Lei do Abuso de Autoridade – que tem de ser votada, sim, mas, o momento não é agora, porque a Casa do povo, o Congresso Nacional poderia ser mal interpretado –, poderia ser entendido como um ato de retaliação pelo fato lamentável do conflito recém-ocorrido nas dependências do Congresso Nacional, fato que tem de ser explicado para que Congresso readquira a sua credibilidade e a sua dignidade.

    Dito isso, Sr. Presidente, eu queria fazer o registro, Senadora Ana Amélia, de um fato completamente diferente, mas que é a realidade do Brasil. Está aqui na frente. Enquanto estamos angustiados, tensos com a situação que vive o País, brasileiros de norte a sul, leste a oeste, estão aqui na porta – são caminhões, são cavalos, são toneladas de ração animal, são vaqueiros e donos de empresas rurais, de A a Z. Vieram todos para cá, motivados por quê? Por uma decisão – por seis a cinco – do Supremo Tribunal Federal que, analisando uma questão localizada do Estado do Ceará, decidiu pela ilegalidade ou inconstitucionalidade, motivada por maus-tratos a animais, da prática da vaquejada.

    A vaquejada, Presidente Elmano, tem cem anos – no seu Piauí e no meu Rio Grande do Norte. Senador Elmano Ferrer, desde que eu me entendo por gente as vaquejadas de Currais Novos, de Caicó, de São José de Mipibu, de Mossoró, de toda parte, fazem parte do calendário de eventos. O senhor já imaginou suspender o Carnaval do Rio de Janeiro, ou o Carnaval da Bahia, que é uma festa popular? Tão festa quanto são as vaquejadas. As vaquejadas são um evento esportivo, e, no entorno da vaquejada, você tem a festividade, você tem a sanfona, você tem o folguedo, você tem o emprego sendo gerado e a diversão sendo exercitada a partir de uma tradição cultural da nossa Região. Os empregos gerados pela tradição da vaquejada – que tem mais de cem anos – são milhares e milhares. Não é só no seu Piauí e no meu Rio Grande do Norte, é no Brasil inteiro.

    O que se coloca neste momento? É o dilema, o confronto entre a proteção, ou a defesa contra os maus-tratos de animais, e uma tradição, um esporte e a geração de emprego; é o confronto entre essas duas coisas. De um lado está uma coisa que tem de ser objeto de preocupação: a proteção aos animais, aos bois que são, em muitos dos casos, preparados para a vaquejada. Nem sempre o boi que entra na corrida da vaquejada é um boi qualquer; às vezes é, mas nas melhores vaquejadas são bois preparados para aquela atividade, que é uma atividade esportiva.

    Será que se tem que entregar o boi à própria sorte? Aos maus-tratos? Em nome do folguedo, da diversão, da geração de empregos? Não! Não estou defendendo isso. Só que, ao longo do tempo, se maus-tratos foram praticados no passado, cada vez que o tempo passa e cada vez que a pressão sobre o fato dos maus-tratos é exercida, mais providências são tomadas.

    Hoje, no meu Estado, o colchão de areia dos parques de vaquejada mede 50 cm de espessura – areia de rio, areia que é capaz de amortecer o choque da queda do animal. Antigamente, talvez não fosse assim; hoje é. É uma exigência o colchão de areia 50 cm. Antes, cheguei a assistir a espetáculos lamentáveis do rabo quebrado de um animal durante a vaquejada. Hoje não existe mais isso, porque há uma cauda artificial, com um tipo de engate especial, que é usado uma vez e substituído para evitar a quebra do rabo e o maltrato do animal. Já é uma prática normal que, ao longo do tempo, foi desenvolvida pelas denúncias de maus-tratos – que têm de ser feitas, para que o animal não seja maltratado em benefício de uma atividade que gera empregos, que é tradição, que é diversão, mas que não deve significar maus-tratos ao animal.

    Não sei se V. Exª sabe, eu são sabia, confesso-lhe. Eu não sabia... Senador Eunício Oliveira, V. Exª, que é do Ceará, sabia que nas vaquejadas de hoje... O Senador Lindbergh é carioca paraibano, é carioca paraibano, paraibano de sotaque como o meu. V. Exªs sabem, ou sabiam, que não é mais permitido o contato do metal com o animal, com o cavalo da vaquejada? Você tem de ter uma proteção, de esparadrapo ou de um isolante qualquer. É uma exigência! Produto de quê? De denúncias e de providências tomadas ao longo do tempo. Em nome de quê? Do não maltrato do animal. Você não pode tocar o boi. Se você tocar o boi numa carreira, o tocador, com a esteira, está desclassificado, em nome da proteção ao animal. Não se pode usar chicote – nem pensar! – nem no cavalo, nem no boi. É proibido, desclassifica o corredor. O veterinário de plantão é uma exigência. Você tem lotes de reses, de bois, que só podem correr duas corridas. Entre uma corrida e outra – é a informação que eu tenho –, o animal é bem alimentado, lavado e submetido à inspeção de veterinário. Em assim sendo, você está garantindo ao animal as condições mínimas de proteção contra os maus-tratos.

    Será que, feito isso, a Região, os 600, 700 mil empregos, não têm direito à sobrevivência da atividade da vaquejada? Em nome de uma tradição? Em nome da geração de empregos na Região mais desprivilegiada do Brasil, que é a Região Nordeste, onde a geração de um emprego se faz com imensa dificuldade, e em nome de uma tradição de cem anos? Será que não vale a pena trabalharmos uma lei que faça, por consenso, a coexistência da proteção ao animal e a geração de empregos?

    O que nós temos, Senador Eunício, é de compatibilizar o conflito: de um lado, a proteção do animal; do outro lado, uma atividade que é tradição, que é prática de esporte e geração de emprego. Precisamos compatibilizar as duas coisas. Será que isso é possível? É claro que é possível. E é isso o que nós temos de buscar fazer, inclusive levando esses argumentos aos Ministros do Supremo Tribunal Federal para obter a colaboração do bom senso de S. Exªs, que são todos homens e mulheres de enorme bom senso.

    Ouço com muito prazer o Senador Eunício Oliveira.

    O Sr. Eunício Oliveira (PMDB - CE) – Senador Agripino, eu estava fora, lá no gabinete, e ouvi atentamente quando V. Exª abriu a discussão nessa questão da vaquejada. Meu pai, em 1963, em uma corrida de vaquejada, fazia aboios, versos, para animar o chamado "jiqui", onde ficava o animal. Não há que se falar aqui, honestamente, em maus-tratos de animais. O que há que se falar aqui é em desconhecimento de causa. Nós, que somos do Nordeste, sabemos que esta é uma tradição centenária da nossa cultura. Não é apenas a questão dos 700 mil empregos tão sonhados, tão desejados no Brasil de hoje, um país onde há 13 milhões de desempregados. No Nordeste, onde já temos mais de cinco anos seguidos de seca, nós vamos aumentar as dificuldades do Nordeste brasileiro em nome de quê? Em nome da preservação ou dos maus-tratos a animais, o que não existe, apenas por desconhecimento de causa. Hoje, obrigatoriamente, nas vaquejadas o tamanho da corrida não chega a 150 metros. Há necessidade de um colchão de areia entre 40 e 60cm de profundidade. Não há maus-tratos aos animais. Ali, ao contrário, há assistência aos animais. Os animais que participam – e eu tenho até um filme, uma espécie de brincadeira, em que o vaqueiro se atrapalha na saída do jiqui, e o boi corre. Quando ele chega naquela faixa branca onde ele tem que deitar ele se deita, de tão acostumado que está com aquilo. Já é uma coisa natural. Então, não há maus-tratos a animais. Senador José Agripino, há algo mais bruto do que a luta de boxe entre dois seres humanos? Há algo mais bruto do que a farra do boi? Não estamos tratando disso, estamos tratando de algo que é essencial para a nossa cultura. Está entranhado no Nordeste brasileiro. A Globo acabou de fechar uma novela no Nordeste em que havia participação inclusive do vaqueiro. Esta Casa talvez tenha assistido aqui um dos dias mais bonitos, quando homens, todos vestidos de gibão de couro... As pessoas nem sabem o que é um gibão de couro. É para correr no mato, dentro da jurema, onde há espinho, para proteger o vaqueiro. Aquela olheira lateral e o que vai na cabeça do cavalo é para proteger o animal na corrida no sertão, na mata fechada, onde a criação de gado é extensiva. Portanto, eu queria colaborar com V. Exª nesse pronunciamento e dizer que sou autor de um projeto de regulamentação do assunto. Não há nenhum confronto com a decisão tomada pelo Supremo, pelo contrário. Eu acho que Brasília, desde a sua inauguração, nunca viu uma manifestação tão verdadeira, tão pura, tão real como essa manifestação pacífica dos vaqueiros do Nordeste brasileiro, para mostrar a pujança de como funciona a vaquejada e de que maneira é hoje tratado o animal. Não há maus-tratos de animal, não há maus-tratos ao boi hoje na corrida de vaquejada. Isso é fato. Quem quiser assistir é nosso convidado para ir a várias vaquejadas que acontecem no Nordeste brasileiro, com prêmios excepcionais no final, com a geração enorme de emprego no Nordeste sofrido, que precisa que a gente aqui defenda, nós, Senador Elmano – que também é cearense lá da Lavras da Mangabeira, mas faz política no Piauí –, e V. Exª que também representa tão bem o Estado do Rio Grande do Norte, nós que conhecemos essa cultura não podíamos ficar calados aqui diante dessa decisão, que, a meu ver, foi tomada por falta de conhecimento de causa, e, obviamente, na intenção de preservar possíveis maus-tratos a animais. Mas eu posso afirmar aqui para todo o Brasil que não há maus-tratos a animais na corrida de vaquejada.

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) – Obrigado, Senador Eunício. V. Exª agrega a esse meu modesto pronunciamento uma série de coisas muito interessantes, a começar pela clara colocação que V. Exª faz quando menciona uma luta de boxe. Nada é mais violento do que uma luta de boxe ou uma luta de UFC, em que a gente já viu campeão brasileiro quebrando a tíbia com um movimento de perna.

    O que é preciso? Eu não quero aqui fazer analogias inconvenientes, mas, nesses esportes – que esses, sim, são violentos – há uma coisa chamada regra e juiz. Há regra e há juiz. O que nós temos que estabelecer é regra. A vaquejada tem que ter regra. As regras eu já enumerei, V. Exª enumerou uma série de regras que já estão sendo cumpridas. O que é preciso é tornar claro que essas regras, que fazem parte de um jogo que, na verdade, é uma prática esportiva, sejam aceitas, sejam observadas e que haja uma lei, como V. Exª propôs, uma lei que guarde essas regras, para que, com as regras escritas, transformadas em lei, se possa preservar uma tradição cultural, um esporte e a geração de milhares de empregos na nossa região. Se não você vai dizer: então você acaba com a atividade da vaquejada e não move uma palha no sentido de... Se é prática de descaso ao animal, como é que você permite que o jóquei clube promova corridas de 2.500m, levando à exaustão os cavalos? E a prova de laço? E o hipismo? E o rodeio?

    Não pode haver, Senadora Ana Amélia, dois pesos e duas medidas, senão é injustiça. No mínimo, você tem que colaborar com a sensatez, para igualar as oportunidades e proteger, pela via da sensatez, aqueles que têm que ser protegidos.

    Essa é a nossa palavra, pela colaboração do raciocínio lúcido de muitos, levando a solução a um problema que está criado. Não é, longe de mim, por excessos cometidos pelo Ministro do Supremo. Acho que é nossa obrigação levar a eles o nosso entendimento do assunto.

    Eu acho que o evento que está ocorrendo na porta do Congresso reforça muito o nosso esforço, dá visibilidade nacional. Hoje, todos os noticiários vão mostrar o movimento que está sendo feito por vaqueiros cearenses, piauienses, gaúchos, potiguares, do Brasil inteiro, em torno de uma causa que é nobre.

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) – E a eles, Senador Eunício, Senador Elmano, Senador Lindbergh, Senadora Ana Amélia, Senador Randolfe Rodrigues, a nossa homenagem, o nosso aplauso. A eles que vieram do Brasil inteiro, para chamar a atenção do Brasil pela necessidade de uma solução para um problema que não pode perdurar. É uma injustiça o que está em curso. É uma injustiça! E eles vêm aqui pregar um grito contra uma injustiça. E o que nós estamos falando é verbalizando a iniciativa deles, antes que seja tarde a prática de uma injustiça.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2016 - Página 38