Discurso durante a 162ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Satisfação com a decisão do STF sobre o cumprimento imediato das penas aplicadas aos condenados em segunda instância.

Autor
Ricardo Ferraço (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Satisfação com a decisão do STF sobre o cumprimento imediato das penas aplicadas aos condenados em segunda instância.
Aparteantes
Lindbergh Farias.
Publicação
Publicação no DSF de 02/11/2016 - Página 16
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • ELOGIO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, INICIO, CUMPRIMENTO, PENA, CONDENADO, SEGUNDA INSTANCIA, REGISTRO, OMISSÃO, SENADO, CONGRESSO NACIONAL, CRIAÇÃO, NORMA JURIDICA, FALTA, ATUAÇÃO, POLITICA, DEFESA, INTERESSE SOCIAL, COMENTARIO, ENCERRAMENTO, IMPRESSÃO, IMPUNIDADE, GARANTIA, EFICIENCIA, DIREITO PENAL, PROTEÇÃO, SOCIEDADE.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Senadora Regina Sousa, Presidente desta sessão, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, capixabas, do meu querido Espírito Santo, que eu tenho a honra de representar nesta Casa, meu estimado Senador Lasier Martins, o Plenário do Supremo Tribunal Federal mais uma vez dá uma lição no Senado da República. E dá uma lição na medida em que legisla em razão da omissão do Senado da República, que poderia – e aliás, deveria – decidir e deliberar sobre uma pauta do absoluto interesse da sociedade brasileira. Mas não decide, não delibera e não tem capacidade de priorizar essa escala de importância.

    Como o Congresso brasileiro e o Senado não decidem, o Supremo Tribunal Federal, valendo-se da provocação – porque o Supremo só se manifesta, a nossa mais alta Corte, quando é provocada, e, tendo sido provocada, ela se manifesta –, em mais um debate acalorado, em mais um debate muito polêmico, por decisão apertada, com voto inclusive da Presidente do Supremo Tribunal Federal, a Ministra Cármen Lúcia, decidiu pelo cumprimento imediato das penas aplicadas aos condenados em segunda instância pela Justiça brasileira, colocando por terra essa percepção de impunidade que campeia em nosso Brasil, em nosso País, em razão da indústria recursos.

    Foi uma decisão – pelo menos a meu juízo – histórica, justa, aguardada, seguramente, por boa parte da população brasileira. Os Ministros de nossa Corte Constitucional encerraram ali um debate apaixonado, que travavam por longo tempo, basicamente em torno da presunção da inocência, que, em nosso País, tem uma dimensão elástica, como em nenhum outro país do mundo.

    Esse é o conceito segundo o qual a prisão só ocorreria quando estivessem esgotadas todas as possibilidades infinitas de recursos em nossa Justiça. Mesmo considerando o chamado duplo grau de jurisdição, no Brasil o que se pratica é muito mais do que duplo grau de jurisdição.

    Ao permitir a prisão de condenados em segunda instância, o Supremo consagrou a tese de que o Direito Penal deve ser efetivo para proteger a sociedade e seus direitos fundamentais, como a vida, a integridade física e o patrimônio, além de resguardar, evidentemente, a moralidade no exercício da atividade pública e administrativa.

    Mais do que isso, a Suprema Corte deu uma resposta contra – como disse aqui e reafirmo agora – o sentimento de impunidade em nosso País, como se a lei só valesse para os poderosos, ou melhor – o contrário; perdão –, como se a lei só valesse para os mais pobres, para os desprotegidos, para aqueles que não conseguem amealhar recursos para fazer sua defesa. Enquanto há impunidade para ricos e poderosos, fica efetivamente sem alcançar o seu resultado a efetividade da Justiça.

    Após o julgamento coletivo por um Tribunal do Júri em segundo grau, não há mais espaço para produção de provas ou mesmo revisão de mérito. São tratadas apenas questões formais do processo ou eventual agressão à nossa Constituição. Quase sempre esses recursos acabam se revelando instrumentos protelatórios, que deveriam ser exceção, mas viraram regra em função das estratégias que se estabelecem.

    A partir daí, em cena há outros valores e princípios também abrigados na nossa Constituição Federal, como o da efetividade do julgamento. A sociedade precisa ter a certeza de que a Justiça atuará com rapidez e eficiência para defendê-la, independentemente da sua condição econômica, da sua condição social, política e assim por diante, consagrando aquele princípio básico e fundamental de que a lei deve valer para todos, e não para poucos.

    Apesar de considerar de enorme valia esse posicionamento do Supremo, volto a defender a importância de que o Senado da República também decida sobre esse tema, visto que o Supremo Tribunal Federal ainda pode revisitar ou revisar essa decisão se alguma provocação no futuro houver.

    Além disso, não estamos aqui falando de um assunto qualquer; é algo que tem grande impacto na sociedade e merece uma resposta sólida do legislador para que não paire mais qualquer tipo de dúvida e incerteza sobre o posicionamento do Senado.

    O Senado poderia – e muito mais –, já deveria ter decidido sobre essa questão da efetividade da prisão em segunda instância, se tivéssemos tido a capacidade e a vontade política de enfrentarmos aqui no plenário a Proposta de Emenda à Constituição nº 15, de 2011, Senador José Aníbal, que continua perdida, andando de lado pelos escaninhos da burocracia parlamentar no Senado da República.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – V. Exª me concede um aparte?

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) – Eu ouço V. Exª adiante, com muita honra e com muito prazer.

    A PEC nº 15, de 2011, mais conhecida como a PEC dos Recursos, que foi por mim apresentada em 2011 e tão bem relatada e aperfeiçoada pelo Senador Aloysio Nunes Ferreira, está na pauta, na Mesa do Senado desde 2013, aguardando prioridade para que este Plenário possa se posicionar em relação a esse tema. Ou seja, o Senado não se posiciona, e o Supremo Tribunal Federal, provocado, posiciona-se, efetivamente, impondo uma desmoralização ao Senado da República pela inércia, pela omissão e pela covardia de não enfrentar um tema tão relevante como esse numa quadra tão delicada para a sociedade brasileira!

    Ouço, com prazer, o Senador Lindbergh.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Ricardo Ferraço, só para dar uma contribuição, eu tenho uma preocupação muito grande. Ruy Barbosa dizia que a pior ditadura é a do Poder Judiciário, porque ninguém pode recorrer contra ela. O senhor falou muito bem de uma PEC de 2011. Eu me lembro de uma campanha do Ministro Peluso, então Presidente do Supremo Tribunal Federal, que discutiu justamente a apresentação de uma PEC. E aquela PEC foi apresentada porque o art. 5º, inciso LVII, da Constituição diz que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Isso está na Constituição! Então, não é omissão do Senado, que poderia ter colocado para votar ou não, mas há uma norma constitucional. O fato é que os ministros do Supremo...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – ... desconsideraram essa norma constitucional e adentraram uma atribuição legislativa. Aqui não há omissão; aqui há uma norma constitucional muito clara, mas não é só isso. Quero fazer esse debate, quero aqui discutir na frente do Presidente do Senado, Senador Renan Calheiros, porque mais grave do que aquela prisão autorizada por um juiz de primeira instância dos policiais legislativos foi o que aconteceu na semana passada em dois episódios: o Supremo, também adentrando em atribuições legislativas do Congresso Nacional, decidiu sobre desaposentação. O que é desaposentação? Uma pessoa está aposentada, volta a trabalhar e a contribuir, pagando o INSS. Essas pessoas podem requerer que aquela contribuição paga, depois, seja incorporada na sua aposentadoria. Eles decidiram – mais grave –, na quinta-feira, que é dever, e não poder, do Poder Público, quando existe greve de servidores públicos, cortar o salário! Não é greve ilegal, porque há situações em que a greve é considerada ilegal e mandam cortar. Mais grave ainda: está marcada para o dia 9, no Supremo Tribunal Federal, uma decisão que pode abrir terceirização para tudo! Há um projeto aprovado na Câmara dos Deputados, quando Eduardo Cunha era presidente, conduzido com mão de ferro por ele, que chegou ao Senado, e nós decidimos que não ia tramitar dessa forma. O Relator era o Senador Paulo Paim. Só não vê quem não quer que há um gigantismo do Poder Judiciário neste sentido, ultrapassando suas atribuições, adentrando em atribuições legislativas do Congresso Nacional. Então, eu quero, com todo o respeito a V. Exª, registrar isso. Essa é uma preocupação que acho que nós temos de enfrentar. Esta Casa tem de preservar as suas atribuições constitucionais. Assim, eu fiz questão, com o máximo de respeito a V. Exª, de fazer este aparte para dar esta contribuição. Quanto ao tema que V. Exª abordou – volto a dizer –, está presente em nossa Constituição que, se o Congresso não deliberar, vale o quê? O que está na nossa Constituição! Então, não dá para caracterizar como omissão do Congresso Nacional. Eu agradeço a V. Exª a concessão do aparte.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) – Eu agradeço o aparte de V. Exª, mas manifesto a minha frontal divergência da sua posição. O mesmo Ruy Barbosa que V. Exª citou, patrono desta Casa, afirma que justiça que tarda não é senão uma injustiça efetiva. E a justiça no Brasil, em função da postergação e da falta de efetividade, gera uma percepção de impunidade que nós não encontramos em lugar nenhum do mundo. Ou seja, isso que V. Exª fala sobre a chamada presunção da inocência – esta é a questão que estamos aqui discutindo –, em nenhum lugar do mundo, tem o grau de elasticidade que tem aqui no Brasil. Países civilizados – diversos europeus e na América do Norte – trabalham com duplo grau. Aqui, não! Aqui nós trabalhamos como uma avaliação absolutamente extensa, até porque, depois do julgamento em segundo grau, julgamento coletivo, não julgamento monocrático – o julgamento monocrático se dá em segundo grau; aí você pode apresentar um recurso no segundo grau e ter um julgamento coletivo, num tribunal de Justiça – não caberão novas provas.

    Portanto, o que se percebe no Brasil é a utilização das alternativas, das chamadas chicanas judiciárias, vácuos legais para que você possa postergar ad aeternum a efetividade da lei. E nós estamos falando da efetividade até porque você sabe que os pobres, desvalidos, desprotegidos não chegam aos tribunais superiores porque são condenados em primeiro grau ou, no máximo, em segundo grau. A Justiça, em terceiro grau, serve para proteger os poderosos. Essa é a verdade. Você não assiste, no dia a dia, a um delito praticado por um cidadão pobre, desvalido, desprotegido chegar ao terceiro grau. Isso fica lá no primeiro grau, porque a percepção geral é de que a lei só vale para os pobres. E nós precisamos eliminar, de uma vez por todas, tudo isso.

    Por que eu cito aqui, Senador, a omissão do Senado? Porque esse tema já deveria ter sido enfrentado pelo Plenário do Senado. A conclusão, o resultado desse debate e da deliberação é outra questão, mas o Senado não deveria e não poderia perpetuar um debate como esse, sem deixar de priorizar esse tema na pauta.

    Quando apresentei essa proposta, ainda em 2011, eu o fiz, inclusive, por inspiração do Ministro Peluso, até porque esse tema foi parte de diversos Pactos Federativos. Esse processo tramitou na Comissão de Justiça, mereceu – como eu disse e reafirmo – o parecer do eminente Senador Aloysio Nunes Ferreira e está na mesa para ser votado desde 2013, prazo, portanto, além de suficiente para que o Senado delibere. Como o Senado não delibera, o Supremo Tribunal Federal é provocado e aí decide. E nós aqui ficamos pagando um tremendo mico exatamente por ausência de fazer o enfrentamento desses temas que são polêmicos – eu reconheço –, mas nós estamos aqui para exercer o contraditório.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Mas V. Exª concorda que aqui não havia uma lacuna jurídica. Então, não dá para falar propriamente em omissão, ou seja, não houve mudança da norma jurídica.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) – A omissão...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Eu entendo e sei que V. Exª foi autor da PEC. Eu acho que a PEC era o caminho natural. Agora, essa é uma decisão do Congresso. Nós falamos em omissão quando há uma lacuna jurídica sobre a qual o Congresso deveria legislar. Não é o caso. Com todo o respeito a V. Exª, agradeço.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) – A omissão a que me refiro é a falta de vontade política e determinação política para fazer o enfrentamento de temas como esse. Por evidente, são temas que contrariam poderosos interesses, porque é sabido que, em nosso País, a Justiça é muito efetiva para os pobres, mas ela não é efetiva para aqueles que dominam e detêm o poder. Acho que o Senado deveria se posicionar com relação a isso, até para tornar claro que, no Brasil, o sentimento dessa infinidade de recursos se transformou numa estratégia clara e efetiva de postergação da Justiça para todos.

    Portanto, Srª Presidente, eu quero saudar aqui, de maneira efusiva, a decisão do Supremo Tribunal Federal. A meu juízo, foi uma decisão acertada. A meu juízo, provocado, o Supremo definiu, com exatidão, a questão relacionada à presunção da inocência, e acho que isso nos nivela com países civilizados que trabalham a presunção da inocência, mas não trabalham a presunção da inocência como se ela fosse ad aeternum, como se ela fosse infinita, como se ela não tivesse limite.

    Portanto, quero crer que, a partir de agora, o papel do Senado, da Mesa Diretora, do Presidente do Senado Federal é, sim, pautar esse projeto para que nós possamos fazer um debate aqui sobre esse tema, e não postergar ad aeternum. O Senado, não enfrentando esse tema, está, sim, se omitindo diante de uma realidade, que, a meu juízo, é reclamada pelos brasileiros que desejam uma Justiça justa mas célere para que possamos colocar limite e um ponto final nessa impunidade que está efetivamente grassando diante de todos.

    Muito obrigado, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/11/2016 - Página 16