Discurso durante a 173ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências, utilizando como principal argumento a notícia de que a Comunidade Europeia abandonará sua política fiscal de austeridade e retomará os investimentos no continente.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Defesa da rejeição da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências, utilizando como principal argumento a notícia de que a Comunidade Europeia abandonará sua política fiscal de austeridade e retomará os investimentos no continente.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2016 - Página 15
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETO, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL, LIMITAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, REFERENCIA, INFLAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR, MOTIVO, ANUNCIO, POLITICA FISCAL, COMUNIDADE ECONOMICA EUROPEIA (CEE).

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, quem nos ouve pela Rádio Senado ou nos assiste pela TV Senado, minha saudação.

    Hoje vamos iniciar, em primeiro turno, neste Plenário, a discussão da PEC 55, a PEC do teto dos gastos, que, no entender de muitos, é a PEC da maldade, e tenho chamado de PEC da crueldade.

    Não posso ter outro nome a esta medida do Governo de Michel Temer para tentar resolver o problema da economia brasileira. Aliás, ele disse hoje, em vários jornais, que a recessão, para ser combatida, precisa de medidas amargas. E venho a esta tribuna, como voltarei aqui na discussão da PEC, para trazer uma notícia alvissareira que vem da Comunidade Europeia, que saiu ontem em todos os jornais e que hoje eu tive a oportunidade de debater em um evento da Fundação Friedrich Ebert, da Alemanha, sobre a retomada dos investimentos no continente Europeu.

    É isso mesmo, a Europa está abandonando a sua política de austeridade. No dizer de Clóvis Rossi, hoje – aliás uma coluna imperdível, que sugiro que todos os senhores possam ler para fazer o debate dessa PEC –, esse é o lado positivo da eleição do Trump nos Estados Unidos. Como ele vai fazer um programa expansionista, a Europa viu logo que, se ficasse na austeridade, não iria conseguir resolver o seu problema.

    O Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, disse: "Não sou fanático por austeridade". O Poder Executivo da União Europeia consumará uma guinada – e consumou ontem – na sua política econômica, que já foi adiada inúmeras vezes.

    Depois da austeridade reiterada entre 2010 e 2013 – uma máquina perfeita de contração econômica durante todos esses anos – e da política fiscal neutra em 2014, a Comissão recomenda agora um estímulo de 0,5% do PIB europeu, o que daria 50 bilhões de euros, cerca de R$184 bilhões, para impulsionar a medíocre recuperação continental. Medíocre – é assim que os europeus estão denominando a sua recuperação.

    Bruxelas pede reformas que atraiam investimentos e levem a desonerações tributárias. Reivindica que os países com maior margem, como Alemanha e Holanda, estejam à frente dos maiores gastos.

    Nos Estados Unidos, após quase uma década de políticas monetárias fiscais expansionistas, o Presidente eleito, Donald Trump, propõe um estímulo de US$1 trilhão, cujo simples anúncio já causou uma formidável oscilação nos mercados. A Europa está reagindo à sua maneira: Bruxelas recomenda uma expansão fiscal modesta de 50 bilhões. Mas já é um grande começo. Não é o estímulo sonhado pelos keynesianos, não – aqueles que acham que o Estado tem que investir nos momentos de crise econômica –, mas, com certeza, é um impacto na austeridade tão recomendada pela Comunidade Europeia e que não deu certo.

    E a Comissão fará vista grossa nesta quarta-feira, que foi ontem, para os países que claramente descumpram as metas de déficit, e tampouco congelará recursos para Espanha e Portugal, de forma a consumar essa guinada da sua política fiscal.

    Além de tudo isso, temos ainda o pronunciamento de Barack Obama. O Presidente norte-americano, sim, esteve na Europa, esteve na Grécia, responsabilizou as políticas de austeridade pelo fraco crescimento econômico que tem afetado o continente. Segundo Obama, as medidas de austeridade contribuíram para o abrandamento do crescimento da Europa: "Assistimos a anos de estagnação que alimentaram as frustrações econômicas e os medos que vemos em todo o continente". Jovens, que têm mais probabilidade de ficar desempregados, ficarão – referindo-se aos países mais afetados pela austeridade, como Grécia, Portugal, Irlanda, Itália e Chipre.

    Eu só tenho a pedir aos Srs. Senadores, ao nosso Relator da PEC 55, Senador Eunício, que se encontra neste plenário: mirem-se nos homens de Atenas. Eles já nos alertavam lá que a austeridade europeia não iria prejudicar apenas a Grécia, iria levar junto o continente europeu. Eles iriam continuar com as taxas crescentes de desemprego porque não havia investimento. Uma economia não se recupera sem dinheiro em circulação.

    Agora, a Europa corre. Corre para quê? Para fazer frente aos americanos, que, mesmo tendo uma política expansionista, elegeram um presidente que quer ampliar os investimentos para dar emprego aos americanos. Nós estamos indo na contramão do mundo.

    Por favor, Srs. Senadores, abram os olhos! Não é possível que nós vamos fazer a discussão da PEC 55 com um argumento tão leviano, de que nós temos que fazer economia para recuperar o crescimento do Brasil. Isso não procede. Se procedesse, a Europa não iria tomar essa decisão – tomou ontem.

    Por favor, leiam o El País. Por favor, leiam a declaração da Comissão Europeia. Por favor, leiam o que escreveu Obama. E para aqueles que são mais de direita, por favor, escutem o Trump, porque está dando melhores condições e melhores propostas para trazer o crescimento de novo.

    Não é possível que o Governo de Michel Temer seja míope a ponto de dizer que tem que cortar despesas para este País crescer, para pagar a banca internacional. Para quê? Para pagar os juros?

    É lamentável isso. Eu não posso acreditar que Senadores que conhecem a economia, empresários, como o Senador Eunício, que é o Relator da PEC 55, a quem eu respeito muito, que sabe que o investimento é fundamental... Se o investimento para uma empresa é fundamental, o que dirá para um País, cuja essência não é obter lucro, mas é o bem-estar da sociedade, é o emprego, é a renda.

    A Europa, Senador Eunício, está dizendo o contrário do que os senhores estão propondo aqui. Acabou de dizer que vai fazer um investimento de 50 trilhões; que está abandonando a política de austeridade porque ela causou dor, sofrimento. A política de austeridade levou ao desemprego, e, mesmo tendo ficado de 2011 até agora no continente europeu, não conseguiu recuperar a economia. Estão revendo a política de austeridade. Os Estados Unidos estão aumentando os seus investimentos. Por que nós vamos, de novo, cair no erro de fazer austeridade?

    Como diz o ditado popular, há dois caminhos que a gente pode escolher para fazer as coisas na vida: pelo amor ou pela dor. Façamos pelo amor a recuperação do nosso País. Peguemos o exemplo de quem está nos dando; de quem já cortou na carne; de quem já tomou o remédio amargo e quase matou o paciente.

    Não sou eu quem está falando, não é o PT quem está falando, não é esquerda brasileira quem está falando, é a socialdemocracia e parte da direita europeia.

    É a social democracia e parte da direita europeia que estão revendo os conceitos de austeridade e estão dando razão ao governo grego de que não pode afundar um país para pagar sua dívida.

    Mirem-se nesses homens de Atenas! Vamos fazer as coisas certas aqui no Brasil! Não vamos afogar o nosso País em uma crise social e econômica. Já basta estarmos afogados numa crise política. Nós temos condições de recuperar o Brasil, mas, para isso, nós temos que retomar investimento e investimento grande, investimento forte só se faz com recurso público.

    Nenhuma iniciativa privada vai colocar dinheiro numa economia que não tem perspectiva de futuro, que não vê o Governo investindo. Quais dos senhores, que são empresários aqui neste Senado, apostariam em investimentos se há um recuo do Governo, se não há perspectiva de futuro?

    Por favor, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, é um apelo. Não votem nesta PEC sem fazer uma reflexão, sem ler o que o mundo está mostrando para nós, sem ver o que a comunidade europeia decidiu, sem ler o discurso do Obama e leiam também o do Trump, que talvez como disse Clóvis Rossi, cuja coluna eu gostaria que fosse, na íntegra, colocada nos Anais da Casa. Como disse Clóvis Rossi, "tenha sido o único lado positivo da eleição desse senhor nos Estados Unidos", para mostrar que precisa-se de investimento...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – ... que precisa-se, sim, de dinheiro público para a economia voltar a crescer. Os sociais democratas de então, que estão no PSDB – está certo que deram uma guinada para a direita –, por favor, relembrem isso. Recorram aos sociais democratas europeus, que, aliás, V. Exªs conhecem, porque é isso que eles estão recomendando: o abandono da política da austeridade. Ela vai levar sofrimento ao povo brasileiro. Ela vai levar o País a uma recessão maior. É isso que a Europa está avaliando, depois de ter aplicado essa política.

    Muito obrigada.

DOCUMENTO ENCAMINHADO PELA SRª SENADORA GLEISI HOFFMANN EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

    Matéria referida:

     – "Potencial ampliação de investimento na Europa é lado positivo de Trump" - coluna de Clóvis Rossi na Folha de S.Paulo de 17/11/2016


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2016 - Página 15