Discurso durante a 176ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão destinada ao debate da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Sessão destinada ao debate da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2016 - Página 27
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • SESSÃO, OBJETIVO, DEBATE, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETO, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL, LIMITAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, REFERENCIA, INFLAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Eu quero começar cumprimentando todos os convidados. Quero me dirigir ao Presidente, Senador Jorge Viana, porque às vezes há um descolamento, na história, das autoridades e do mundo real. Eu acho que nós estamos vivenciando isso aqui.

    Há uma história que é meio lenda, não é confirmada na história, de Maria Antonieta, na véspera da Revolução Francesa, numa manifestação em frente ao Palácio, quando o povo pedia pão, e ela dizia: "Se não há pão, que comam brioches."

    Eu estou falando isso porque eu acho que nós estamos caminhando para uma situação de convulsão social no País. Ontem o cientista político Aldo Fornazieri escreveu um artigo que falava sobre isso, a situação do País, do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul, e falava sobre convulsão social. Ele tentou aproximar-se dizendo o seguinte: "É quando o Governo não governa e os vários setores sociais se põem em movimento sem uma direção clara e definida, cada um lutando por seus interesses particulares."

    Quando eu olho para o Rio de Janeiro – e eu sei que o Rio de Janeiro teve problemas específicos, isenções demais, corrupção, o que seja –, entendo que ali não é só a situação dramática dos funcionários públicos, que não recebem salários. Fecharam os restaurantes populares; cortaram um programa estadual que é parecido com o Bolsa Família, que atinge 110 mil famílias dos mais pobres; acabaram com o aluguel social; acabaram com o bilhete único.

    Não é só o Rio de Janeiro que está em crise. Hoje o Rio Grande do Sul entrou em calamidade pública. São 20 Estados com problemas gravíssimos. E nós não estamos falando dos Municípios, porque eu, como sou Senador, ando nos Municípios e vejo a situação difícil dos prefeitos, alguns fechando os postos de saúde.

    A situação das empresas: a dívida das empresas brasileiras hoje beira 80% do PIB. O desemprego: a previsão de todo mundo é de desemprego – estou falando do mercado – crescente para 2017, chegando a 13% o grau de desemprego no próximo ano. E os senhores me vêm com a PEC 55, de cortes profundos na área social de recursos de saúde e educação. Porque saúde e educação pública são salários indiretos dos trabalhadores. Nós estamos querendo tocar fogo neste País!

    Eu chamo atenção aqui dos senhores, a gente está vendo claramente a piora nas expectativas. A cada dia o Boletim Focus diz que vai piorar a situação deste ano e do próximo ano. Porque, na verdade, os senhores construíram esta tese da confiança. Os senhores defendiam a tese que era o seguinte: vamos tirar a Dilma; tirando a Dilma, nós vamos melhorar a confiança dos empresários, vai haver investimento, e a economia vai se recuperar. Essa tese fracassou! Cadê os números? Os senhores falaram de gráfico de confiança. Eu tenho um aqui que cruza confiança com a realidade objetiva da economia.

    O problema é que nós temos mais de seis meses de Governo Temer e nenhuma medida foi tomada para melhorar concreta e objetivamente a situação da economia. Olha, nós não temos como recuperar o crescimento econômico. Aqui: consumo das famílias, gasto do Governo, investimentos e o setor externo. O setor externo tem um peso muito pequeno, mas, com a mudança da política do Banco Central, foi prejudicada a exportação. Investimentos: está havendo neste País, no momento, corte de investimentos públicos. Quanto aos investimentos privados, as empresas estão completamente endividadas. O gasto do Governo representa 20% do PIB; estamos em austeridade. Consumo das famílias, 63% do PIB. Está lá embaixo por quê? Desemprego, endividamento, queda de rendimento!

    Está todo mundo quebrado – família quebrada, empresas quebradas, Municípios quebrados, Estados quebrados, que não podem investir –, e os senhores propõem que nós façamos também austeridade fiscal? Isso é suicídio! Nós estamos colocando uma bomba para explodir neste País. É assim que nós vamos socorrer os Estados? Não.

    Olha o Trump nos Estados Unidos e a União Europeia. Na União Europeia, sabe o que é a política monetária, Senador Garibaldi? Juros negativos. Sabe o que a União Europeia decidiu nesta semana? Que vai mudar sua política fiscal, colocar 50 bilhões de Euros para estimular a economia. E o Trump nos Estados Unidos? Está falando sabe o quê? Um trilhão de dólares em obras públicas. O Obama tinha US$800 bilhões para recuperar a economia. Aqui no Brasil, parece que o gasto público, o investimento não tem um papel multiplicador para o crescimento econômico.

    Os senhores sabem que há um estudo feito por Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, do Ipea, que ganhou um prêmio do Tesouro Nacional – foi o segundo colocado no Tesouro Nacional – e que fala do efeito multiplicador do investimento público e do benefício social em situação de recessão. O estudo diz que 1% do PIB a mais em benefícios sociais é 1,5% a mais em crescimento econômico; e 1% do PIB em investimento, 1,6% a mais em crescimento econômico. Mas, se cortamos, a verdade também é a diminuição: 1% a menos de benefícios sociais significa 1,5% a menos de crescimento.

    Então, neste momento, nós precisávamos de uma liderança no País que dissesse o seguinte: vamos tirar o País dessa crise; a situação fiscal só vai melhorar se a economia crescer.

    Aqui eu trago dados. O Presidente Lula pegou a dívida líquida em 57% do PIB; caiu para 35%. Por quê? Porque a economia cresceu, e aí se fez superávit. Nós não temos condições de resolver a situação fiscal no meio da recessão. É isto que os senhores estão propondo: uma austeridade violentíssima no meio da maior recessão da história do País. Isso é uma loucura.

    E há mais: o erro do diagnóstico. Na verdade, o problema de 2015 foi a gastança com Levy. Vocês sabem que eu fiquei contra, que eu votei contra o Levy. Eu vi o Mansueto defendendo os ajustes. O que aconteceu ali? Gastança; 2,3% de PIB de ajuste fiscal, um ajuste draconiano na boca do caixa. Agora, cortar 2,3% do PIB não derruba a economia? Derruba a economia.

    Qual foi o resultado do ajuste fiscal do Levy? Melhorou a situação da dívida? Piorou. O déficit nominal, em 2014, foi de 6,7% do PIB. É claro: 6,1%, para pagamento de juros; só 0,57%, despesas primárias. Fizeram aquele ajuste, e o que aconteceu? Foi para 10,34% o déficit. Desses, 8,44%, para pagamento de juros, e cortando investimentos. Prof. Belluzzo, no momento de ajuste, 35% de corte de investimento – o Prof. Belluzzo está dizendo 40%. Também na PEC 55, a primeira vítima vai ser o investimento público, cortando investimento. Então, é uma loucura o que estamos fazendo no País.

    Eu digo, muito claramente – já falei dos juros –, que os senhores não falam de juros. Há essa discussão de déficit, no Brasil – volto a dizer –, de 10,34%, sendo 8,44% para pagamento de juros. Disso ninguém fala, quando temos taxas de juros estratosféricas que não se explicam. Não é por inflação de demanda. A inflação que nós tivemos, nesse último período, foi de preços administrados. Então, nós estamos caminhando para uma loucura.

    Eu digo o seguinte: para mim, o centro da política, hoje, tinha que ser a retomada do crescimento econômico. Mas os senhores colocam o problema fiscal como centro. Eu acho que nós só recuperaremos o problema fiscal depois de um plano de investimentos públicos, de ampliação de gastos sociais, para que tenhamos uma demanda, de fato, e façamos a economia deste País avançar. Mas digamos que os senhores estejam certos e que a grande questão é a questão fiscal. Eu pergunto: não podiam ter feito uma proposta de ajuste equilibrada? O que os senhores estão propondo para o andar de cima? O que os senhores estão propondo para os bancos? Os bancos estão tendo lucros cada vez maiores. Os cinco maiores bancos tiveram, nos últimos 12 meses, lucros de R$69 bilhões. O que os senhores propõem para os bancos? Nada! O que os senhores propõem para as grandes empresas? Para os milionários do País? Nada! É um ajuste...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – ... todo feito em cima do povo mais pobre.

    É proibido tocar na discussão de juros e tributação progressiva, para a qual temos vários caminhos: juros sobre capital próprio, tributação de lucros e dividendos.

    Eu só queria, para ir terminando, Senador Jorge Viana, Presidente desta Mesa, mostrar aqui, porque falam: "Ah! O Senado, o Parlamento, depois, vai dizer o que cortar." Quando a gente vai olhar as despesas primárias, dos 19,8% do PIB – que eles querem, em dez anos, fazer cair cinco pontos, Senador Jorge Viana, para 14,8% do PIB –, 40%, ou seja, 8% do PIB é previdência. Muita gente que vem discutir aqui diz o seguinte: mesmo com a reforma da Previdência, com os efeitos demográficos, vão aumentar para algo em torno de 9% do PIB. Mas você tem 8,1%, previdência; 4,2%, pessoal. Eu já vi.

    Sr. Mansueto, o senhor disse: nós, servidores, ganhamos muito bem. O senhor pode ganhar, mas um profissional de saúde, um professor universitário, infelizmente, não ganha muito bem. Eu já percebi que a política agora de vocês é igual à do Fernando Henrique: reajuste zero. Foram oito anos de reajuste zero. Mas, vamos lá: 8%, previdência; 4,2%, pessoal; 3,3%, despesas obrigatórias. Sabe quais são os maiores gastos aqui? Benefícios de prestação continuada.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – É um salário mínimo que se paga a idoso, a pessoa com deficiência de uma família que tem renda inferior a um quarto de salário mínimo. Então, eles podem mexer aqui: abono, IBPC. E o resto, que são 4%, são despesas discricionárias. Aí estão envolvidos todos os ministérios.

    Há um gráfico do Bradesco aqui que fala sobre o que seria essa PEC em dez anos. Ele cai das despesas discricionárias de 2,37% para 0,21%, Prof. Belluzzo. Cai obrigatórias de 5,54% para 1,77%. É por isso que digo, para concluir, Senador Jorge, que é um aperto concentrado nos mais pobres.

    E finalizo trazendo opiniões diferentes de economistas que defendem um ajuste. Há um economista que escreveu um livro com o Mansueto, que respeito muito, trabalha nesta Casa, que é o Felipe Salto. Ele escreveu um artigo com Monica de Bolle dizendo que a PEC 55 não é nenhuma Brastemp. Ele lança quatro argumentos: o primeiro, de que 20 anos é muito; e o segundo, em que ele diz – e eu quero ficar só nesses dois – que a PEC, no primeiro momento, é muito frouxa, mas, no final é excessivamente rígida. E faz ele uma conta que chega a um superávit primário de 6,5% do PIB. Achei interessante trazê-lo porque o Felipe Salto é um economista que tem uma filiação diferente da do Prof. Belluzzo, que trabalha, que defende com muita força a tese do ajuste fiscal, mas está mostrando a inconsistência dessa PEC.

    Senhores, encerro e chamo atenção, Senador Jorge Viana, para a gravidade desta crise. Em um momento como este, volto a dizer, com essa situação dos Estados, dos Municípios, das empresas, das famílias, era o momento para o Governo Federal assumir o seu papel, fazer uma política de investimentos públicos, estimular investimento público, porque, se não fizermos isso, os senhores podem ter a certeza de que esta situação que vive hoje o Rio de Janeiro será vivida em vários Estados do Brasil: uma revolta generalizada, uma revolta difusa, que não é contra um partido, mas contra toda uma política, pela incapacidade política de entendermos a gravidade deste momento histórico. Então, eu peço aos Srs. Senadores que reflitam e não caiam nessa ditadura do pensamento único que existe pelos jornais de que é necessário corte, corte.

    Concluo dizendo que ninguém do mundo está fazendo isso, ninguém do mundo está fazendo isso. Está todo mundo caminhando numa direção contrária, ampliando investimentos públicos, ampliando gastos fiscais para recuperar a economia.

    Espero que este Senado tenha responsabilidade e juízo e vote contra essa PEC, para que a gente consiga...

(Interrupção do som.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – ... encontrar uma saída para o nosso País.

    Muito obrigado. (Fora do microfone.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2016 - Página 27