Discurso durante a 176ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão destinada ao debate da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Sessão destinada ao debate da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2016 - Página 48
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • SESSÃO, OBJETIVO, DEBATE, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETO, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL, LIMITAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, REFERENCIA, INFLAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Senadoras, caros professores e especialistas que nos ajudam neste debate tão importante para o Brasil hoje. Disse o Senador Omar que estamos tendo um desfile de mulheres na tribuna. Não digo que só as mulheres falaram.

     

    O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM. Fora do microfone.) – Mulheres guerreiras.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Mas, na verdade, as mulheres do Parlamento brasileiro, embora poucas, são muito ativas.

     

    O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM. Fora do microfone.) – Valem por dez homens.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, quero registrar até que considero um certo equívoco termos na Mesa apenas economistas. A PEC não diz respeito à questão apenas da economia, mas traz aspectos importantes da vida nacional que não se restringem à economia, embora eu queira saudar, de maneira muito especial, os economistas, por quem tenho uma enorme admiração e afeto. E o grande momento em que eles aparecem no Brasil é exatamente o momento da crise. Quando não há crise, economista só é consultado para dizer onde você vai investir o seu dinheiro, para quem tem dinheiro. Mas, na crise, não. Aparecem muitos e são muito importantes. Eu parto do princípio de que todos os que estão na Mesa e fora dela têm o mesmo objetivo: buscar soluções para melhorar a vida do povo brasileiro. A divergência está em qual caminho cada um acredita para melhorar a vida do povo brasileiro.

    Quero levantar alguns aspectos dessa discussão: o primeiro aspecto de que discordo é que a PEC constitucionaliza uma política fiscal. Ora, eu fui Constituinte, e passamos esses 26 anos ouvindo os desaforos de muitos economistas e muitos senhores do mercado que acusavam a Constituição brasileira porque se colocou lá, nas Disposições Transitórias, timidamente, que tinha de haver um teto para o juro no Brasil de 12% – um Deputado do PMDB, claro que o MDB do passado, o PMDB do passado. O PMDB foi o Partido vitorioso naquela Constituição de 88. O PMDB celebrou o pacto social daquele momento no Brasil, que encerrava a ditadura militar. O PMDB representava o centro democrático brasileiro, nacionalista, desenvolvimentista e tem suas marcas deixadas na Constituição de 88. Esta Constituição tão acusada, agora, é remendada para se colocar dentro dela, diferentemente da maioria dos países capitalistas, das grandes economias do mundo, uma política fiscal para durar 20 anos.

    E ela incide em outro erro que é o da democracia. Ela fere a democracia, porque tira do povo brasileiro a possibilidade de, ao votar em um Presidente da República, este poder debater e apresentar uma saída para a crise, votada, debatida com a população.

    Agora, não. Nas próximas cinco eleições, nós vamos ter um Presidente da República que vai apenas discutir pedaços da economia brasileira, sem poder decidir sobre que novos caminhos apresentar. Isso é inédito no Brasil e certamente nas maiores economias do mundo.

    Aliás, para que o Reino Unido saísse do mercado comum europeu, houve um referendo popular, que indicou o caminho diverso do que desejava o próprio governo. Caiu o gabinete, mas houve um referendo popular. São referências democráticas, instrumentos que as democracias modernas usam e que nós estamos economizando na nossa forma de governar o Brasil.

    Por que não passar a PEC por um referendo popular depois de debatida no Congresso Nacional?

    Ao fazer isso – e dessa forma –, a PEC, sem dúvida nenhuma, rompe o pacto social da Constituição de 1988, e por isso é uma PEC. Isso ficou muito claro na palavra do representante do Governo, do Ministério da Fazenda, que esteve presente aqui na CAE e na CCJ. Ele conclui as suas referências sobre a situação da economia brasileira dizendo exatamente que a primeira consequência da Constituição de 1988 foi a hiperinflação no Brasil, deixando claro o seu desconforto com a chamada Carta Magna, com a chamada Constituição Cidadã, a Constituição de Ulysses Guimarães. Foi essa Constituição que nós aqui juramos honrar, essa Constituição que deu garantias e direitos ao povo brasileiro – um desses direitos foi justamente o salário mínimo do aposentado, que teve tanta importância social na distribuição de renda deste País.

    A Constituição de 1988 está sendo confrontada pela PEC, sim, porque a PEC rompe com essa possibilidade de a Constituição, que criou um tímido e atrasado estado de bem-estar social no Brasil, se viabilizar.

    Então, esse PMDB, que foi o PMDB da luta pela democracia, que estabeleceu esse pacto democrático no Brasil, é o PMDB que hoje, no Governo, rompe esse pacto e não coloca outro no lugar, porque não tem liderança política nem condições de organizar a sociedade brasileira para repactuar aquilo que nós pactuamos no passado.

    Foi dito aqui que a PEC fará a mágica de devolver a confiança dos mercados. Pois bem, eu acho que o mercado não está acordando muito rapidamente, porque a PEC já foi aprovada na Câmara dos Deputados, com ampla maioria, cantada em verso e prosa pelo Governo. E eu, apesar da resistência que faço, não tenho dúvida de que será aprovada aqui também. A ausência dos Senadores neste plenário e a ausência do próprio Ministro da Fazenda neste plenário hoje para debater aquilo que ele considera a medida mais importante do Governo para o Brasil, demonstram isso. Ora, é a mais importante medida que será votada pelo Parlamento brasileiro. O Ministro da Fazenda defende isso, mas está ausente daqui, demonstrando toda a tranquilidade de que este Parlamento, este Senado dará ao Governo a vitória.

    No entanto, o mercado continua pessimista. O mercado continua dizendo que o PIB brasileiro, em vez das expectativas de 1,5%, vai crescer 1% ou menos, ou menos!

    É preciso dar uma sacudidela no mercado. Essa PEC não fará a mágica de sacudir o mercado como está se pensando. Talvez seja preciso estudar, além de economia, um pouco de Freud para poder responder a psicologia social do momento.

    A valorização do salário mínimo foi o instrumento mais importante de transferência de renda em nosso País nos últimos anos. Na minha juventude, nós lutávamos por um salário mínimo de US$100. Nós já ultrapassamos muito esse salário mínimo de US$100. E foi um instrumento real de transferência de renda neste País.

    Pois bem. A PEC, no art. 104, inciso VIII...

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Já vou finalizar, Sr. Presidente.

     A PEC, no art. 104, inciso VIII, diz que, se houver estouro nas metas previstas, não haverá aumento real. As despesas federais, que são todas entre 40% e 50% vinculadas ao salário mínimo, também estarão congeladas.

    Além disso, há, desde o início, uma tentativa, principalmente na paixão do Plenário ao discutir a PEC, de não se discutir a PEC e suas causas e efeitos, mas discutir o governo passado. Eventualmente, esta Mesa também o faz dessa forma quando politiza a questão.

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Em um momento, acusa o governo de gastança, a gastança total que o outro governo fez. Em outro, acusa o governo dos cortes no Orçamento. É preciso que V. Sªs decidam se o governo gastou muito ou se cortou muito – ou se fez os dois ao mesmo tempo e, por isso, é mais culpado ainda.

    Está claro que, para o servidor público, nesse caminho, vai haver 0% de aumento, e acho muito bom. Acho bom para os altos salários, do Sr. Mansueto e de alguns outros, que ele aqui reconheceu que têm, mas tem servidor público que não tem salário alto como esses. E isso recoloca a questão: qual caminho que nós queremos para a saída da crise no Brasil?

    Em um País com as desigualdades sociais tão marcadas...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – ... desde o início da sua história, (Fora do microfone.)

     eu não tenho dúvida de que o caminho que nós temos que seguir é um caminho que não aumente nem aprofunde as desigualdades. E nós não podemos fazer isso sem discutir a questão tributária no País, sem mexer naquele 1%, naqueles que têm mais neste País.

    E os senhores não falaram em nenhum momento a respeito disto: qual é a tributação sobre grandes fortunas, sobre grandes heranças, sobre o capital rentável deste País? Não se discutiu em nenhum momento, apesar das acusações das desonerações excessivas.

    E eu quero dizer logo que não fui da Base do governo da Presidente Dilma. Não me sinto atingida pelas críticas que fazem, em alguma medida, ao governo, embora apoiasse muitas das políticas que o governo aqui apresentou na área social.

    Mas quero dizer que as chamadas grandes desonerações foram...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – ... assinadas pela Fiesp, que não saia do Congresso Nacional, embora o Sr. Mansueto tenha afirmado que não se faz lobby neste País, neste Congresso Nacional, que é uma ofensa os Senadores e os Deputados sofrerem lobby e que isso deve ser denunciado. Eu estou denunciando: a Fiesp não saía desta Casa. As desonerações, uma parte delas não foram promovidas pelo governo, foram promovidas pela Câmara e pelo Senado Federal – uma boa parte delas. No entanto, V. Exªs não fizeram até agora nenhum movimento que indique que vão contrariar a Fiesp, suspendendo as desonerações – nenhum!

    Aliás, mais uma vez, foi recebido, no conselhão do Presidente da República, com honras e glórias, o Presidente da Fiesp, que, em um dia, estava comemorando as conquistas da desoneração e, no outro dia, estava do outro lado da rua, promovendo e pagando as manifestações pelo impeachment.

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Por último eu quero dizer que infelizmente, Dr. Mansueto, não se pode dizer que o Congresso Nacional responda às pressões das ruas. Não se pode dizer isso.

    Este Congresso Nacional, com pessoas diferentes, foi o mesmo que, para responder à maior manifestação de massas deste País, no movimento Diretas Já, negou ao povo brasileiro o direito de votar para presidente diretamente.

    Não é assim que acontece a política, e V. Sª sabe disso, porque é integrante do Governo, de governos, é um homem muito qualificado, tanto como profissional, quanto como homem público, e sabe que não é assim que funcionam as coisas.

    Não é o pequeno trabalhador assalariado que vem para o Congresso Nacional, porque nem sequer tem dinheiro para vir a Brasília. E muitas vezes, quando...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – ... são patrocinados pelas centrais sindicais e pelos sindicatos, são acusados, (Fora do microfone.)

    como foram aqui, criminalizados, tudo isso.

    Por isso, eu voto contra a PEC. Sei que será um voto minoritário e estarei aberta para ouvir e ver os resultados, segundo dizem, mágicos, mas que, na minha opinião, apenas vão fazer com que os mais ricos continuem ganhando mais, e os mais pobres sejam mais pobres neste País.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2016 - Página 48