Discurso durante a 185ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre as emendas apresentadas ao projeto de lei que cria a audiência de custódia e estabelece prazo para o encaminhamento do preso em flagrante à presença do juiz.

Autor
Simone Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Simone Nassar Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL:
  • Considerações sobre as emendas apresentadas ao projeto de lei que cria a audiência de custódia e estabelece prazo para o encaminhamento do preso em flagrante à presença do juiz.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2016 - Página 43
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL
Indexação
  • COMENTARIO, EMENDA, PROJETO DE LEI, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, OBJETIVO, REGULAMENTAÇÃO, AUDIENCIA, CUSTODIA, PAIS, AMPLIAÇÃO, PRAZO, APRESENTAÇÃO, PRESO, PRESENÇA, JUIZ DE DIREITO, ALTERAÇÃO, CODIGO DE PROCESSO PENAL, PROCEDIMENTO, PRISÃO EM FLAGRANTE, NECESSIDADE, PROGRESSO, JUDICIARIO, IMPEDIMENTO, INJUSTIÇA, ARBITRARIEDADE, PRISÃO, GARANTIA, DIREITO A LIBERDADE, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, SISTEMA PENITENCIARIO, MELHORIA, ECONOMIA NACIONAL.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS. Para proferir parecer. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente; obrigada pela deferência, mas, para fazer justiça a esta Casa e aos Senadores envolvidos neste projeto, antes de mais nada, eu quero parabenizar o autor da proposição, Senador Antonio Carlos Valadares, que, já em 2011, antes da parceria entre CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Ministério da Justiça e Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que introduziram, pela primeira vez, o instituto da audiência de custódia no Brasil – isso foi há um ano e meio, dois anos – já apresentou, há cinco anos, numa proposição pioneira, esse projeto. Da mesma forma, quero parabenizar a participação brilhante do Senador Humberto Costa, Relator deste parecer e deste projeto na Comissão de Constituição e Justiça. Houve também o aprimoramento decisivo do Senador Randolfe Rodrigues e a contribuição dos Srs. Senadores e das Srªs Senadoras em relação às emendas.

    Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, nós estamos votando, em turno suplementar, a audiência de custódia, nos termos do substitutivo do parecer da Comissão Diretora. Basicamente, esse projeto trata da audiência de custódia, que nada mais nada menos significa do que a obrigatoriedade, a partir da aprovação dessa lei, de encaminhar o preso em flagrante, em 24 horas, à presença do juiz. Esse parecer, esse projeto, foi aprovado já em primeiro turno, indo direto à votação em turno suplementar.

    Quero dizer que foram apresentadas dez emendas. A primeira Emenda, de nº 16, é no sentido de substituir a expressão "autoridade policial" por "delegado de polícia", de autoria do Senador Roberto Rocha. A justificativa é que poderia haver questionamentos de constitucionalidade.

    A Emenda nº 17 amplia de 24 para 72 horas o prazo de apresentação do preso em flagrante ao juiz, de autoria do Senador Ataídes. Já digo que está prejudicada porque o próprio Senador Ataídes, juntamente com o Senador Aloysio Nunes, apresenta uma emenda mais ampla, que estamos acolhendo, que é a Emenda de nº 18, que acrescenta ao CPP os arts. 106, "a", e 106, "b", com a seguinte redação:

O prazo previsto para a apresentação do preso perante o juiz competente poderá ser estendido para, no máximo, 72 horas, mediante decisão fundamentada do juiz e em decorrência de dificuldades operacionais da autoridade policial.

Parágrafo único. Excepcionalmente, por decisão fundamentada do juiz competente, em face à impossibilidade de apresentação pessoal do preso, poderá ser realizada por meio do sistema de videoconferência ou de outro recurso tecnológico de transmissão de som e imagem em tempo real, respeitado o prazo estipulado no caput.

Quando se tratar de organização criminosa, o prazo poderá ser estendido para, no máximo, 5 dias.

    A justificativa é mais do que plausível. Estamos acatando essa emenda do Senador Aloysio por uma razão: primeiro, trata-se de uma exceção, a regra é o prazo de 24 horas; 2º) segundo, para estender-se o prazo para 72 horas deve haver decisão devidamente fundamentada do juiz e ser comprovada a impossibilidade de apresentação do réu, do preso, à autoridade competente.

    Da mesma forma, a videoconferência passa a ser a exceção devidamente justificada, tendo que ter três requisitos: excepcionalidade, decisão fundamentada do juiz competente e impossibilidade temporária de apresentação pessoal do preso. Já aconteceram alguns casos de presos de organizações criminosas, como o PCC, cujo deslocamento traria uma série de dificuldades. Isso já está acontecendo no Direito Penal, o instituto da videoconferência.

    A Emenda nº 19, também do Senador Aloysio, merece ser acatada, juntamente com a nº 20. No caso, a Emenda nº 20 é apenas de redação, para colocar data e hora fixada na audiência de custódia. A Emenda nº 19 realmente não tem cabimento, porque seria um cerceamento de direito do preso no caso de se estender em demasia a prisão em flagrante sem apresentação em juízo.

    A Emenda nº 21, também do Senador Aloysio Nunes, que foi a mais polêmica – diga-se de passagem –, em um acordo com o próprio autor da proposição, junto com a Procuradoria-Geral da República, com o Supremo Tribunal Federal, ouvindo a magistratura, os juízes de 1ª instância, ouvindo a Defensoria Pública, nós estamos rejeitando, porque entendemos que a autoridade policial pode conceder a fiança apenas quando a pena em abstrato chegar até quatro anos, como já é no Código. Estender essa possibilidade para o delegado arbitrar fiança em uma pena em abstrato de qualquer tempo, 10 anos, 20 anos, só porque não houve violência, estar-se-ia entrando em uma seara muito delicada, em uma possível arguição de inconstitucionalidade, porque seria o caso de se estar tratando de uma atribuição privativa jurisdicional do Poder Judiciário.

    O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) – Se me permite, V. Exª tem toda razão e me convenceu com o seu argumento. Eu tomei conhecimento do seu parecer. V. Exª tem toda razão.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Eu agradeço, Senador Aloysio, e quero dizer que essa emenda está sendo rejeitada, inclusive porque, em um diálogo muito franco e aberto com o autor da emenda, que é V. Exª, entendemos que, embora tenha tido boa vontade no sentido de ajudar no desencarceramento, nós temos que também olhar pelo lado da sociedade, no que se refere a resguardar a sociedade e os cidadãos como um todo.

    Da mesma forma, na mesma emenda, a pedido do Supremo Tribunal Federal, da magistratura, da Procuradoria-Geral da República, nós estamos também rejeitando a possibilidade de o hipossuficiente, daquele que não pode pagar a fiança, ter a fiança liberada e sair em liberdade por conta de decisão da autoridade policial. Fomos convencidos, na reunião que tivemos, de que isso prejudica esse cidadão hipossuficiente, que precisa ter um primeiro contato com o juiz, até para ver se não houve tortura, se não houve maus tratos. Além disso, apenas o juiz pode aplicar as medidas cautelares, como tornozeleira, impossibilidade de se ausentar da residência ou da cidade.

    Da mesma forma, houve apresentação de quatro emendas do Senador Lindbergh Farias. As Emendas nºs 22 e 24 inserem o dispositivo para assegurar o direito do preso reunir-se com seu advogado ou defensor em local reservado, visando a garantia da confidencialidade.

    Estamos acatando as duas emendas do Senador Lindbergh. Da mesma forma, apresentou o Senador as Emendas nºs 23 e 25, inserindo dispositivo para vetar a presença de agentes policiais responsáveis pela prisão ou pela investigação durante a audiência de custódia para, segundo a justificação, evitar a intimidação e o constrangimento do preso. Também estamos acatando essas emendas do Senador Lindbergh Farias.

    Diante do exposto, senhoras e senhores, estamos em turno suplementar, analisando apenas as emendas, depois de muito diálogo,depois de muito debate – foram horas na CCJ, no plenário. Nós entendemos que chegamos a um parecer de um projeto de consenso nesta Casa. Das dez medidas, estamos rejeitando a emenda do Senador Paulo Rocha, que tenta colocar a expressão "delegado de polícia" no Código de Processo Penal e aí desvirtua a própria sistemática do Código, que não utiliza esses termos. Não existe, Senador Pimentel, esse termo no Código de Processo Penal. Então, leia-se: quando se fala em autoridade policial é óbvio que é o delegado de polícia, que pode arbitrar a fiança.

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Então, por isso, estamos rejeitando a Emenda nº 16; está prejudicada a Emenda nº 18 do Senador Ataídes; estamos acolhendo as emendas do Senador Aloysio Nunes, à exceção da Emenda nº 21; da mesma forma, acolhendo as emendas do Senador Lindbergh Farias.

    Quero encerrar aqui o meu parecer, mas não sem antes trazer um dado fundamental, Sr. Presidente: parece-me, num primeiro momento, que estamos aprovando um projeto que tem apenas a ver com o direito penal e com o direito do preso. É óbvio que nós estamos preocupados com aquele que é encarcerado e que hoje se encontra numa cela onde cabem quatro, com trinta, quarenta pessoas, mas, na realidade, a nossa preocupação, acima de tudo, é com a justiça e com a sociedade. Já dizia o nosso patrono, dos juristas e desta...

(Interrupção do som.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – "Justiça tardia nada mais é do que injustiça manifesta". Então, o que nós estamos fazendo aqui é uma demonstração de que nós queremos avançar no aperfeiçoamento da justiça; garantir, claro, que aquele preso, que realmente tenha causado mal à sociedade, cumpra a sua pena, mas nós não podemos desconsiderar as prisões arbitrárias. Os pais de família que, muitas vezes, fazem parte de um erro judiciário e policial ficam presos numa média de até seis meses antes de ter o primeiro contato numa audiência com um juiz, e não tem preço esse tempo que eles passam injustamente preso na cadeia, porque a liberdade apenas talvez seja um bem menor do que a vida.

    É disso que o projeto trata, aliado àquilo que vai ao encontro do interesse da sociedade, que é o custo financeiro, quanto custa para a sociedade, por mês, um preso no Brasil. A Ministra Cármen Lúcia, recentemente, de forma muito apropriada, foi muito feliz quando disse que um preso no Brasil custa R$2.400,00 por mês, enquanto um aluno do ensino médio custa R$1.200,00 por ano. Estamos falando na inversão de valores. O que gastamos com um preso corresponde ao de três estudantes.

    Diante de tudo isso, das estatísticas que temos, de um sistema carcerário, que hoje tem mais de 600 mil presos, dos quais quase 50% não tiveram contato...

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – ...nos primeiros três meses a seis meses com os juízes; 40% desses presos ainda não tiveram o seu contato com o juiz. Quando têm, na audiência de custódia, chega a quase 48% a liberdade condicional ou as medidas cautelares dadas pelo magistrado, o que significa que você vai responder em liberdade porque não é perigoso. Nós estamos falando, Sr. Presidente, de mais de 120 mil presos, que poderiam estar respondendo em liberdade. Nós estamos falando de uma economia para os cofres públicos da ordem de R$3 bilhões. Portanto, esse projeto é da mais alta relevância não só para a Justiça, não só para que possamos avançar no nosso sistema civilizatório, mas também para que...

(Interrupção do som.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – ... nos momentos difíceis econômicos que estamos passando, isso também resulte em economia, dinheiro que está faltando na saúde, na educação e na segurança pública.

    Faço minhas as palavras de Darcy Ribeiro, para finalizar a minha fala. Nos anos 1990, dando um recado e dando uma sugestão aos governadores, ele disse: "invistam na educação porque, se não, nos próximos vinte anos, faltará dinheiro para construir celas e presídios". Já está faltando, Srªs e Srs. Senadores.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2016 - Página 43