Fala da Presidência durante a 189ª Sessão Especial, no Senado Federal

Abertura da Sessão Especial destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e à entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Abertura da Sessão Especial destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e à entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/2016 - Página 4
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • ABERTURA, SESSÃO ESPECIAL, SENADO, OBJETIVO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, DIREITOS HUMANOS, HOMENAGEM, ENTREGA, COMENDA, DOM HELDER CAMARA.

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

    Declaro aberta a Sessão Especial do Senado Federal destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e a entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.

    A Comenda Dom Hélder Câmara, instituída pela Resolução nº 14, de 2010, é destinada a agraciar personalidades que tenham oferecido contribuição relevante à defesa dos direitos humanos no Brasil.

    Nesta solenidade serão agraciados com a Comenda Dom Hélder Câmara Srª Cristina Lopes Afonso; (Palmas.)

    Sr. Omar Ferri; (Palmas.)

    Sr. Airton Freire de Lima; (Palmas.)

    Informamos ainda que o Conselho decidiu, por unanimidade, prestar homenagem in memoriam à Srª Luciana Lealdina de Araújo, conhecida carinhosamente como Mãe Preta. (Palmas.)

    Vamos à composição da Mesa. Convido para compor a Mesa o nobre Senador que estava presente até o momento, Senador Lasier Martins. Ele faz parte da Comissão e foi um dos que trabalhou muito pela indicação de um dos nomes que ele aqui vai ter oportunidade de falar da tribuna.

    Convidamos agora para compor a Mesa os homenageados, lembrando que todos eles terão direito à palavra.

    Cristina Lopes Afonso. (Palmas.)

    Omar Ferri. (Palmas.)

    Pe. Airton Freire de Lima, representado pelo Superintendente da Fundação Terra, Sr. Wellington Santana Lima. (Palmas.)

    Luciana Lealdina de Araújo, representada pela Srª Tirzah Araújo de Salazar, do Instituto São Benedito. Ela representa Luciana Lealdina, a Mãe Preta (in memoriam). (Palmas.)

    Registramos a presença do Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Sr. Igor Sef.

    Representando também o Movimento de Justiça e Direitos Humanos, o Vice-Presidente, Sr. Luiz Francisco Corrêa Barbosa.

    Convido a todos para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional.

(Procede-se à execução do Hino Nacional.)

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Queria registrar a presença conosco do Deputado Federal Stédile, a quem eu rendo aqui, também, uma salva de palmas. (Palmas.)

    Aqui nessa sessão, Deputado, você representa a Câmara dos Deputados. Inclusive, se V. Exª quiser usar a palavra, pode saber que aqui você terá esse direito, porque eu entendo que o Parlamento tem que, cada vez mais, fortalecer a democracia em tempos tão difíceis. Por isso, às vezes o protocolo tem que ser quebrado - porque muitas vezes a gente chega à Câmara como Senador, em alguns tempos e só pode usar a palavra dentro do protocolo; aqui, a gente abre esse espaço para V. Exª, porque sei que essa também tem sido a posição de V. Exª toda vez que eu estive lá na Câmara dos Deputados. Obrigado pela presença.

    Essa premiação recebe o nome de Dom Hélder Câmara. O bispo católico foi um dos fundadores da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e ficou conhecido pela defesa dos direitos humanos durante o regime militar aqui no Brasil. Em tempos tão difíceis, eu digo: ditadura nunca mais!

    Foi o único brasileiro indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz. Nascido no Ceará, teve a sua atuação de maior destaque em Pernambuco, onde foi arcebispo de Olinda e Recife entre 1964 e 1985, período que coincide com o regime militar. Destacou-se por pregar uma Igreja simples, voltada para os pobres e pela defesa de atitudes não violentas em todas as interações humanas. Faleceu em agosto de 1999, aos 90 anos.

    Seguindo também a orientação regimental, eu neste momento faço o pronunciamento de abertura em nome do Presidente do Congresso e do Senado. Não me perguntem quem efetivamente é o Presidente. Em tempos tão tumultuados, eu diria que o faço aqui, porque foi uma liminar, em nome do Presidente do Senado. Ponto. Pode ser assim? Em nome do Presidente do Senado e da Mesa do Senado, eu faço este pronunciamento.

    A sessão especial de hoje destina-se a dois eventos de excepcional grandeza: a lembrança, a comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos e a entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.

    O Dia Internacional dos Direitos Humanos é celebrado todo dia 10 de dezembro. Neste dia, no ano de 1948, a Assembleia-Geral das Nações Unidas adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento revolucionário, fundamental para que elevássemos a inspiração pela dignidade humana ao nível da política.

    Em tempos tão difíceis, eu poderia lembrar aqui da Boate Kiss, verdadeiro forno em que 252 jovens perderam a vida, lá no Rio Grande do Sul.

    Poderia lembrar aqui, queiramos ou não, o que aconteceu com o time de Chapecó, em que as informações que chegam foi falta de combustível. Vejam o absurdo daqueles que só pensam no lucro e se esquecem das políticas humanitárias.

    Podia lembrar aqui do que aconteceu no domingo também numa boate nos Estados Unidos, onde 50 pessoas foram queimadas.

    Podia lembrar aqui - são muitos acidentes em pouco tempo - do helicóptero que caiu agora em São Paulo, que levava a noiva e o irmão para uma atividade.

    Podia lembrar aqui da situação dos imigrantes no Brasil e no mundo, situação que lembra a época do nazismo por tudo aquilo que estamos vendo pela imprensa nesse momento tão difícil.

    Por isso tudo é que foi a partir desse marco que a humanidade erigiu seu edifício dos direitos com o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, com o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, sempre em defesa da vida e com protocolos e convenções especializados, que estabeleceram a proibição da tortura, do racismo, da discriminação de gênero, dos desaparecimentos forçados e que consubstanciaram os direitos das crianças, das pessoas com deficiência e de tantos outros. Enfim, da defesa da vida.

    Senhoras e senhores, esse trabalho na linha dos direitos humanos é um trabalho que nunca acaba. Os valores que irradiam da noção básica da dignidade humana são infinitos e o edifício dos direitos humanos, apesar de indestrutível, apesar de ter suas funções firmemente plantadas na consciência de todos, muitas vezes se deixa corroer, se deixa degradar, se deixa iludir pelos ventos e trovoadas da história. É preciso, então, que nos mantenhamos atentos. É preciso que nos mantenhamos vigilantes.

    Eis a importância de dedicar este dia a parabenizar e a agradecer a todos aqueles que atuam na defesa dos direitos humanos mundo afora. Direitos humanos não têm fronteira.

    Senhoras e senhores, no Senado Federal, nós lembramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos, com a entrega de um prêmio àqueles que se destacaram nessa seara. Trata-se da Comenda Dom Hélder Câmara.

    O nome da homenagem faz referência a um dos mais ferrenhos defensores dos direitos humanos no Brasil e no mundo. D. Hélder era um homem de Deus, era um homem dos homens, era um pensador, era um mobilizador, era um intelectual, era um homem de ação. Eu diria: era um pescador daqueles que estão sempre à procura de buscar águas não turbulentas para salvar vidas.

    Suas reflexões sobre miséria, sobre desenvolvimento econômico, sobre as condições humanas; sua atuação como articulador da Igreja católica e das relações com o Estado; e sua militância, muito mais social do que política, ao contrário do que dizem os críticos, constituem um legado absolutamente imprescindível para os dias atuais, muito atuais.

    Oxalá tivéssemos hoje outros como D. Hélder! Em diversos aspectos, a sua biografia demonstra o quanto acertamos com essa homenagem.

    Em primeiro lugar, D. Hélder cresceu e formou seu pensamento em meio a um contexto político conturbadíssimo e, mesmo espremido entre tantas ideologias negadoras da política humanitária, da humanidade, pelo fascismo, pelo nazismo, pelo comunismo soviético e suas variantes, conseguiu desenvolver um sentimento de humanismo profundamente redentor.

    Tal sentimento pautou-lhe a atuação religiosa, social e política durante toda a sua vida e fez dele um exemplo muito inspirador para todos aqueles que observam a conjuntura atual de intensa polarização. Ele não se dizia comunista, mas também não se dizia capitalista.

    D. Hélder buscou a verdade, sempre a verdade, mesmo que tivesse de denunciar e desafiar os poderosos do seu tempo. Esse é um legado e tanto para uma época como a atual. Hoje em dia, o apelo emocional de uma mensagem, às vezes, vale mais do que a sua veracidade e do que o seu conteúdo.

    Quem dera tivéssemos um D. Hélder nesses tempos de pós-verdade, de desinformação em massa! Quem dera tivéssemos um D. Hélder!

    E, finalmente, D. Hélder seguiu uma vida franciscana, abraçando a pobreza em Cristo. Ao fazê-lo, D. Hélder arvorou-se em porta-voz dos desfavorecidos, dos socialmente excluídos. Um exemplo muito inspirador para a humanidade atual, dilacerada pela vaidade, pela desigualdade, pela opulência e pelo individualismo exacerbado que sufoca os projetos sociais, as iniciativas coletivas.

    Enfim, são esses os valores que nós queremos aqui hoje reafirmar com a Comenda Dom Hélder, premiando, anualmente, figuras de destaque na defesa dos direitos humanos no nosso País.

    Senhoras e senhores, a Comenda Dom Hélder Câmara encontra-se em sua sétima edição.

    Os ganhadores deste ano são a Srª Cristina Lopes Afonso; a Drª Eunice Paiva; o Dr. Omar Ferri; o Padre Airton Freire de Lima; e a Srª Luciana Lealdina de Araújo, Mãe Preta (in memoriam).

    A Srª Cristina Lopes Afonso, quando ainda muito jovem, sofreu uma agressão covarde, sexista, destrutiva, mas viveu, viveu para contar e fez, do seu trauma, uma narrativa de superação, com seu projeto social e político em favor das vítimas de queimaduras no Brasil todo. Hoje em dia, a Drª Cristina é sócia-fundadora da Sociedade Brasileira de Queimaduras e Vereadora do Município de Goiânia.

    Seja bem-vinda, Drª Cristina. (Palmas.)

    A Drª Eunice Paiva foi incansável na busca pela verdade a respeito do desaparecimento do seu marido, o sempre lembrado por todos nós, Deputado Rubens Paiva, perseguido pela ditadura militar.

    Apesar da tragédia, essa líder reuniu forças para, desde então, mobilizar-se, formar-se advogada e arvorar-se em ativista da democracia. Precisamos, podem crer, nesses tempos tão turbulentos, de ativistas em defesa da democracia e dos direitos civis de desaparecidos e de suas famílias.

    Ainda abraçou a causa dos povos indígenas, quilombolas, combatendo ações e políticas indigenistas expropriadoras.

    Palmas, palmas a ela, porque ela merece. (Palmas.)

    O Dr. Omar Ferri, advogado militante, tem uma longa trajetória na defesa dos direitos civis, da liberdade de imprensa e do devido processo, nos tempos da ditadura.

    Em sua atuação profissional, reconheceu, no sequestro dos uruguaios Lilian Celiberti e Universindo Díaz, os indícios da Operação Condor, de cooperação entre as polícias políticas do Cone Sul. Reiteradas vezes, enfrentou, de peito aberto, o aparato repressão.

    Lembro aqui, meu querido Omar Ferri, que eu acompanhei com um grupo - e você liderou - para irmos ao Uruguai para ver se encontrávamos Universindo Díaz e Lilian Celiberti. Não os encontramos, mas foi importante aquele movimento.

    Minhas palmas aqui a esse grande líder dos militantes dos direitos humanos, Dr. Omar Ferri. (Palmas.)

    O Padre Airton Freire de Lima, a exemplo de D. Hélder Câmara, dedicou a vida à causa dos pobres. Sua Fundação Terra instalou-se na chamada Rua do Lixo, em Arcoverde, Pernambuco, então endereço de um depósito a céu aberto de resíduos sólidos.

    Por meio da fundação, o Padre Airton desenvolve um projeto importantíssimo junto à comunidade, com programas nas áreas de assistência social, inserção produtiva, educação, cultura, saúde, entre outras. Um projeto que mudou e ainda muda, todos os dias, a vida de muita gente.

    Um abraço ao Padre Airton.

    Aceite aqui o nosso caloroso carinho por tudo o que tem feito. (Palmas.)

    Por fim, temos a Srª Luciana Lealdina de Araújo, conhecida como Mãe Preta, que nasceu em Porto Alegre, mas viveu em Pelotas, lá no Rio Grande do Sul.

    Ela superou a própria pobreza, a exclusão, para fundar o Instituto São Benedito, especializado no atendimento de crianças e adolescentes da periferia.

    Neste 2016, o Instituto São Benedito completou 115 anos de piedade, de caridade e de compaixão, que transformam as vidas de tantos jovens em situação de risco.

    Palmas! Palmas! Palmas! (Palmas.)

    A Srª Luciana Lealdina faleceu em 1930, mas nós hoje dedicamos esta simples homenagem a essa grande militante pela vida. Homenageamos, de forma humilde, consideradas as suas realizações, o seu legado e a sua bonita memória.

    Senhoras e Senhores, concluindo, das biografias de D. Hélder Câmara, da Drª Cristina Afonso, da Drª Eunice Paiva, do Dr. Omar Ferri, do Padre Airton Freire e da Srª Luciana Lealdina, nós extraímos o mais elevado exemplo da essência humana comum, o altruísmo, a generosidade, a dedicação aos nossos semelhantes, quaisquer que sejam as diferenças.

    Enfim, eu confesso que não me canso de refletir sobre essas histórias inspiradoras, renovadoras, construtoras de fé e de vida, mas percebo também que, neste momento, nós poderíamos, primeiro, dar uma salva de palmas a todos os militantes dos direitos humanos no mundo pelo papel fundamental que eles cumprem em defesa da vida, em defesa, eu diria, da democracia, em defesa da dignidade humana em tempos tão difíceis. Homens e mulheres que fazem o bem sem olhar a quem.

    Uma salva de palmas aos militantes dos direitos humanos do Brasil e do mundo. (Palmas.)

    Termino, pessoal, porque não dá para, num momento como este, deixar de lembrar, como eu falei na abertura, esses jovens, outros com um pouco mais de idade, que morreram, porque simplesmente não havia gasolina suficiente no avião.

    Chega-se a um ponto na vida, quando eu me lembro da boate Kiss e deste acidente - dois exemplos -, em que eu não consigo dizer que foi simplesmente uma tragédia. Foi um massacre, foi um massacre e eles terão que responder por esse massacre. Eles terão que responder. Por isso, nós temos que apostar que a Justiça e que a luta de todos nós hão de apontar um caminho, em que o lucro, a ganância não esteja acima da vida humana.

    Por isso, eu quero terminar pedindo que, de pé, batamos palmas por um minuto para as almas desses do time de Chapecó, que perdemos com a queda do avião. (Palmas.)

    Obrigado, que Deus ilumine a todos.

    Declaro, portanto, a partir deste momento, a abertura oficial deste evento e passo a palavra aos oradores inscritos.

    Primeiro orador inscrito, Senador Lasier Martins.

    Se o Deputado José Stédile quiser usar a palavra, fique tranquilo também.

    Eu havia me comprometido com a Senadora Lúcia Vânia no sentido que eu levaria a sessão até ela chegar na hora de os oradores falarem, e deu certinho.

    Senadora Lúcia Vânia. (Palmas.)

    Senador Lasier e, em seguida, ela usará a palavra.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/2016 - Página 4