Pronunciamento de Humberto Costa em 06/12/2016
Discurso durante a 189ª Sessão Especial, no Senado Federal
Sessão especial destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e à entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.
- Autor
- Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
- Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
- Sessão especial destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e à entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.
- Publicação
- Publicação no DSF de 07/12/2016 - Página 8
- Assunto
- Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
- Indexação
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- SESSÃO ESPECIAL, SENADO, OBJETIVO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, DIREITOS HUMANOS, HOMENAGEM, ENTREGA, COMENDA, DOM HELDER CAMARA.
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente e requerente desta sessão especial, Senador Paulo Paim; Senador Lasier Martins; homenageados - Cristina Lopes Afonso, Omar Ferri, Padre Airton Freire de Lima, representado aqui pelo Superintendente da Fundação Terra e seu irmão Wellington Santana Lima, Luciana Lealdina de Araújo, a Mãe Preta, representada pela Srª Tirzah Araujo de Salazar, do Instituto São Benedito.
Quero, também, aqui registrar e saudar o Deputado Federal José Stédile; o Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Igor Sef; e o Vice-Presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Sr. Luiz Francisco Corrêa Barbosa.
Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, o Senado da República vive hoje um dia muito especial. Esta Casa, que é do povo e que o acolhe, representa, homenageia uma figura ilustre cuja vida e trabalho têm sido a favor do povo. Uma personalidade do nosso tempo cuja missão transcende o próprio tempo, firmando-se, pela sua importância e pela sua relevância social, como uma das mais exitosas de que se tem notícia em nosso País. Um trabalho que vem mudando uma realidade doída de uma região sofrida e carente do Nordeste.
Estamos falando de Airton Freire de Lima, o Padre Airton, pilar-mor da Fundação Terra, instituição pernambucana, como o seu criador, e que hoje se firma como uma das mais importantes do nosso Estado no tripé caridade, educação, responsabilidade social.
Ao padre Airton o Senado concede a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, um dos galardões mais significativos que a Câmara Alta oferta. A ele e ao seu trabalho, que tanto significa para tanta gente e que tem feito a diferença em uma região carente e, muitas vezes, fora do alcance pleno do Poder Público. Tive a graça e a honra de ser o autor desta concessão, o que muito me orgulha e alegra. Na verdade, o que considero para mim, acima de tudo, um privilégio.
Reconhecer um trabalho como o da Fundação Terra e de seu idealizador é quase que uma obrigação para o poder e para os agentes públicos. Trata-se de um trabalho profícuo, que sobrevive de doações de pessoas físicas e jurídicas e de recursos públicos governamentais provenientes de programas e projetos cujos resultados se apalpam e se conferem com satisfação e com absoluta transparência. Igualmente, um trabalho perene, que há mais de três décadas vem plantando amor e solidariedade em terras nordestinas, cujo resultado tem sido uma colheita rica em formação, amparo e assistência social.
Os números falam por si. Na região de Arcoverde, sertão pernambucano, a Fundação Terra mantém duas escolas, três creches, uma biblioteca e uma casa para crianças e adolescentes. Dispõe de dois abrigos para idosos, sendo um em Sertânia, a 60 quilômetros de Arcoverde, onde fica a sua sede. Completam o arco de serviços um centro de reabilitação intelectual, motora, visual e...
(Soa a campainha.)
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... auditiva em Arcoverde, o Mens Sana, que atua através de convênio com o SUS e que atende pessoas de 20 cidades sertanejas, e um centro de reabilitação para usuários de álcool e drogas, o Terra Terapêutica, situado em Mimoso, Distrito de Pesqueira, a 20 quilômetros de Arcoverde.
Essa estrutura atende mais de mil crianças nas escolas e creches; 70 crianças em situação de vulnerabilidade; 30 idosos; 292 crianças e jovens nos pontos de educação complementar (músicas, artes marciais, dança, percussão e artes cênicas); 339 jovens e adultos em cursos profissionalizantes; mais de 1.500 famílias atendidas, anualmente, por programas e ações de longo alcance social.
Criada em 1984, a Fundação Terra completou os seus 32 anos de existência no dia 8 de setembro. A instituição nasceu na Rua do Lixo, subúrbio de Arcoverde, Município sertanejo a 250 quilômetros do Recife. E começou em um local que era um ponto de despejo de resíduos sólidos. Ali, centenas de famílias tiravam o seu sustento da forma mais insalubre possível, recolhendo as sobras das sobras do que era consumido na cidade, catando e comendo restos de alimento.
Recém-ordenado pela Igreja Católica, Airton Freire iniciou seu trabalho pastoral de forma diferente. Deixou a Casa Paroquial e estabeleceu-se naquele local, onde até então ninguém queria ir, com o qual poucos se importavam. A igreja do jovem padre era diferente e fez o que devia ter feito e o que mandam os mais básicos ensinamentos cristãos: foi para o meio do seu povo. Assim como sempre fez a igreja de D. Hélder, patrono dessa medalha, que hoje cai como uma luva em seu agraciado.
Ali mesmo na Rua do Lixo, uma semente foi plantada e um trabalho começou a nascer. Trabalho árduo que obteve o apoio de toda a cidade e o grato e fraterno entusiasmo da comunidade, que viu a transformação e os frutos serem postos à mesa em uma divisão equânime e solidária.
Com o tempo, o trabalho expandiu-se para além da comunidade da Rua do Lixo. Chegou a outras cidades da região e transformou-se em uma referência de fraternidade, acolhimento, serviço social, educação e caridade.
Sem dúvida, o trabalho da Fundação Terra constitui um exemplo de dedicação à população carente no Nordeste. Um exemplo que deve ser seguido por outros Estados e por outras Regiões. Um exemplo que precisa ser seguido por todo o País.
E quem é este homem que dedicou sua vida à causa de servir ao povo pobre, a espalhar obras importantes de assistência social e a deixar sua marca em rincões nordestinos onde tudo, em termos de miséria e de dor, é superlativo?
O Pe. Airton Freire é um sertanejo do Pajeú, nascido em São José do Egito, em 1966, e que aos seis anos de idade foi morar com a família em Sertânia, onde ficou até concluir seus estudos do primeiro grau, em 1971. Migrou então para o Recife, onde passou a morar em uma pensão e a frequentar a lendária Casa do Estudante de Pernambuco, onde fazia as refeições. Iniciou o segundo grau no Colégio Martins Júnior e concluiu o ciclo em uma escola técnica, onde cursou desenho e arquitetura.
A vida religiosa chamou-o, e, em 1975, foi estudar no Instituto de Teologia do Recife (Iter), que, é bom que se relembre, foi o berço sacerdotal por onde passou a maioria dos padres alinhados com Dom Hélder e com a teologia da libertação, a corrente progressista criada na Igreja da América Latina após o Concílio Vaticano II e a Conferência de Medellín, de 1968, e que consolidou a opção preferencial pelos pobres, que mudou os rumos da Igreja Católica.
Em paralelo com o Iter, Pe. Airton cursou psicologia na Facho (Faculdade de Ciências Humanas de Olinda).
Foi ordenado diácono em 1981 e padre em fevereiro do ano seguinte, na Catedral de Santa Águeda, em Pesqueira. Celebrou sua primeira missa na sua terra natal, São José do Egito, e de imediato foi transferido para a Paróquia do Livramento, em Arcoverde. Dois anos depois, a convite de um grupo de jovens, foi conhecer a Rua do Lixo. Impressionado com a miséria do lugar, resolveu rezar uma missa. A cena de uma criança faminta pedindo para comer a hóstia mudou a vida do jovem pároco, que resolveu morar na Rua do Lixo. A partir daí, tudo é história. Nascia ali a Fundação Terra dos Servos de Deus.
Pe. Airton chegou a ir a Salvador também, em 1986, onde ingressou na Companhia de Jesus. Quando voltou para Pernambuco, para Arcoverde, para a Rua do Lixo, morou na comunidade até o ano 2000 e decidiu se mudar para o povoado de Malhada, perto de Arcoverde, onde está até hoje.
A mudança para Malhada ocorreu por conta da criação de outra obra do Pe. Airton, a Comunidade de Vida dos Servos de Deus e o Instituto dos Servos de Deus. A partir da primeira, nasceu uma série de grupos de oração denominada Grupos da Terra, apoiados pelo Instituto Padre Airton, o IPA.
Trata-se, portanto, de uma figura rara e prolífica em seu trabalho pastoral na área de assistência social, auxílio a quem mais precisa, solidariedade e caridade.
(Soa a campainha.)
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Vou concluir, Presidente.
O incansável Pe. Airton, um homem que fala fluentemente mais três idiomas, que foi professor de colégios importantes do Recife, que fez formação analítica freudiana e pós-graduação em Paulo Freire, o escritor que já produziu oitenta livros e o compositor e cantor que gravou 180 CDs de músicas autorais e pregações em retiros.
Trata-se de um homem cujo trabalho beneficia, de forma direta, mais de 2 mil pessoas, o Pe. Airton, que hoje homenageamos com uma medalha que traz o nome da maior expressão da igreja dos pobres do Brasil em todos os tempos, que é Dom Hélder Câmara.
O Senado Federal se congratula com o Pe. Airton e com a Fundação Terra, representada nesta solenidade pelo seu superintendente, o Sr. Wellington Santana.
Particularmente, eu me associo às homenagens aqui prestadas, sabedor da justeza deste tributo e com a certeza de que o trabalho da Fundação Terra vai continuar rendendo frutos. Mais ainda, que continuará multiplicando o número de beneficiários entre uma faixa da população que tem, quase sempre, o desamparo e o esquecimento oficial como características perversas e dolorosas.
Em nome do Senado, digo da honra de conceder a Comenda Dom Hélder Câmara ao Pe. Airton. Em nome do povo do meu Estado, expresso o mais sincero sentimento de gratidão e o nosso muito obrigado.
Obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância. (Palmas.)