Discurso durante a 18ª Sessão Solene, no Congresso Nacional

Sessão solene do Congresso Nacional destinada a homenagear o centenário de nascimento de Miguel Arraes de Alencar.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Congresso Nacional
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão solene do Congresso Nacional destinada a homenagear o centenário de nascimento de Miguel Arraes de Alencar.
Publicação
Publicação no DCN de 15/12/2016 - Página 22
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO SOLENE, CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVO, HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, MIGUEL ARRAES.

     A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB-BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, saúdo todas as senhoras e todos os senhores convidados presentes a esta homenagem ao nosso querido Miguel Arraes, assim como o queridíssimo Senador Pedro Simon; Beto Albuquerque, nosso companheiro; Geraldo Julio, Prefeito da querida Capital de Pernambuco, Recife; Paulo Câmara, nosso Governador, e a nossa querida amiga, filha de Arraes, representando a sua família, Ministra do Tribunal de Contas da União e ex-Deputada Federal por Pernambuco, Ana Arraes.

      Como o querido Líder do PSB no Senado Federal, Senador Antônio Carlos Valadares, que me sucederá na fala, quero também saudar todos os colegas do Parlamento presentes a esta nossa reverência ao nosso querido Miguel Arraes; José Almino, representando também a família, os netos e os bisnetos de Arraes; e queridos companheiros e militantes do partido.

      Como o querido Deputado Tadeu Alencar, eu também desisti do meu discurso escrito ontem à noite, porque já compreendemos que, em função da mudança de horário, o estender desta sessão já torna difícil a participação dos diversos convidados que para ela vieram.

      Eu quero pessoalmente explicar que nós tínhamos feito um acordo no Senado Federal para que esta sessão se realizasse naquela Casa, por ser um espaço menor. Por meio do Diário do Senado Federal, esta sessão foi convocada e confirmada para 10 horas da manhã. Infelizmente, na última hora, o acordo firmado, e reafirmado diversas vezes por mim, foi modificado, para que se realizasse primeiro uma sessão de votação, que se estendeu até bem pouco tempo atrás.

      Eu registrei meu desagrado com esse comportamento do Senado, mas tivemos uma saída, organizada competentemente pelo companheiro Tadeu Alencar, que nos permitiu estar aqui, dando prosseguimento a esta desejada homenagem ao nosso Governador Miguel Arraes.

      Eu praticamente herdei a admiração por Arraes de meu pai, que também faria 100 anos de nascido no próximo ano, em 2017. Já me criei ouvindo o Sr. Aurélio falar de Arraes. Tive a oportunidade de vê-lo pegar um ônibus em uma excursão em Salvador, para receber Arraes em Recife e contar depois: “Arraes taí!” Esse era o grande clamor, a grande palavra de ordem que se usava naquele momento.

      Confesso que não entendia direito o que era aquilo. Entendia que o “Arraes taí!” queria dizer que Arraes estava lá, mas, ao mesmo tempo, tinha uma função fonética de se enganar aqueles que o perseguiam com a história de “arrasta aí”, como “arrasta o pé aí”. Essa é um pouco da memória que meu pai nos passava.

      Tive a oportunidade de conviver com Arraes, como a maior parte das pessoas aqui presentes, na militância no Partido Socialista Brasileiro. Ele era uma singular figura que, ao dirigir uma reunião, conseguia conduzi-la no sentido mais profundo, mas também sabia ser engraçado, fazendo com que participássemos quase que afetivamente daquele momento.

      O primeiro Governo de Arraes foi logo após ter sido Prefeito de Recife, cidade que ele muito amou. Ao assumir o Governo de Pernambuco, ele teve três pilares de construção no seu planejamento, que são marcas não apenas do seu primeiro Governo, mas de todos os outros Governos, e prosseguiram como marcas de uma atuação política também no Governo de Eduardo Campos.

      O primeiro pilar foi o campo, com uma política social de enfrentamento dos interesses dos grandes coronéis do açúcar em favor dos trabalhadores rurais no campo, portanto, abordando a base econômica da sociedade do seu Estado de Pernambuco. Redefiniu-se, assim, o olhar do Governo sobre essa base econômica a favor daqueles que mais necessitavam.

      O segundo é a sua política de cultura, o fortalecimento de uma visão de cultura popular que assegurava o enraizamento e a preservação dessa raiz do seu Estado; aliás, não apenas do seu Estado, mas de todo o Nordeste brasileiro.

      O terceiro é a sua ligação com o futuro, com o início de uma política de ciência e tecnologia lá trás, nos anos 60, depois continuada no seu Governo e finalmente no PSB, que absorveu e, digamos assim, se apropriou de todos esses elementos construídos por Arraes na sua gestão. Acrescentaria isso à sua defesa intensa, que também se fez presente como ferramenta de gestão da participação popular.

      Esses pilares expressos no pensamento de Arraes, desenvolvidos dentro do Partido Socialista Brasileiro e em diversos textos seus, são hoje exemplos que o partido continua a usar para passar a outras gerações o que é uma gestão vinculada às raízes do povo, pelo qual tinha preocupação e amor.

      Arraes, como já foi dito por muitos, era um sertanejo no mundo e do mundo. Ele desenvolveu uma solidariedade internacionalista a todos os povos com quem conviveu no período do exílio e deu uma contribuição imensa à articulação dos brasileiros na resistência democrática no exílio. Ele, sua família e sua irmã foram conhecidos de toda a resistência democrática na Europa, justamente pela contribuição que puderam dar a ela.

      De volta ao Brasil, associou-se imediatamente à consolidação da ideia de reconstruir o País com novas ideias, um Brasil que saía da ditadura, que queria e exigia que o novo momento fosse de divisão do bolo econômico com toda a Nação. Esse era o grande desejo dos trabalhadores e das camadas populares do nosso País.

      Por isso, eu decidi não ler o meu discurso. Como já assumi compromisso com o Deputado Tadeu Alencar, nós vamos incorporar todos os discursos escritos aos Anais da Casa, conforme permite o Regimento.

      Mas eu queria citar rapidamente alguns trechos do pensamento de Arraes. Quando ingressa no PSB, um partido socialista, ele busca expressar, à sua maneira, o que pensava sobre o socialismo:

Eu acho que a humanidade tem de encontrar um sistema que busque uma solução satisfatória para todos e pregue a pacificação das relações humanas. O socialismo seria essa busca da solução satisfatória para todos.

      Depois, em 1994, quando foi eleito para o terceiro mandato, enfrentou novamente, sem dúvida aclamado pelo povo, a asfixia de recursos em contraposição ao Governo Federal e a uma grave crise fiscal. Ele dizia que, nos tempos em que todos os esforços são feitos em nome da estabilidade econômica -- asseverava, colocando os pingos nos is --, a estabilidade que se queria é a que permitia reformular de modo construtivo os rumos do País, abrindo caminhos para a consolidação de uma Nação, onde brasileiros não fossem tratados como estrangeiros, separados pelo fosso de vergonha entre os que comem três vezes ao dia e os que nada comem. Mas também alertava: “A estabilidade total só existe na morte, e nós não queremos morrer, queremos sobreviver”.

      Assim era Miguel Arraes. Esse seu exemplo em gestão continuou com Eduardo Campos, que não só manteve os pilares fundamentais do Governo de Arraes, mas também o modernizou, adequando-o à nova realidade política e de gestão do Brasil, além de servir como referência para todas as gestões do nosso partido. Este foi o legado da família Arraes para a sociedade brasileira, para a política brasileira: um exemplo de ética, de honestidade e de compromisso com os interesses do povo.

      Finalmente, Arraes nos dá outra lição. Nesses tempos de tanta intransigência, de tanta dificuldade da convivência entre os diferentes, Arraes nos diz:

Nunca me preocupei com rótulos. O rótulo de radical, conciliador, não tem nenhum sentido para mim, como não tinha sentido me chamarem de comunista no passado. O que importa é a prática política; o que importa são os posicionamentos que se tomam ao lado de determinadas camadas sociais em defesa de teses que interessam à Nação como um todo.

      É esse exemplo de brasileiro que hoje aqui reverenciamos naquele que seria o seu centésimo aniversário.

      Que o Partido Socialista Brasileiro e todos nós saibamos honrar o seu legado.

      Muito obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DCN de 15/12/2016 - Página 22