Discurso durante a Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Comentários sobre o problema da violência e sua relação com o desenvolvimento econômico do País.

Autor
Raimundo Lira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Raimundo Lira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA POLITICO:
  • Comentários sobre o problema da violência e sua relação com o desenvolvimento econômico do País.
Aparteantes
Armando Monteiro, Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 10/02/2017 - Página 71
Assunto
Outros > SISTEMA POLITICO
Indexação
  • CRITICA, ARRECADAÇÃO, TRIBUTAÇÃO, PAIS, MOTIVO, PREJUIZO, CONTRIBUINTE, INEFICACIA, LEGISLAÇÃO PENAL, CONTRIBUIÇÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, PRESENÇA, IMPUNIDADE, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), COMENTARIO, EXISTENCIA, CUSTO, DESTINATARIO, EMPRESARIO, MANUTENÇÃO, SEGURANÇA, DIFICULDADE, CRIAÇÃO, EMPREGO, DEFESA, EDUCAÇÃO, QUALIDADE, FAVORECIMENTO, CRESCIMENTO, ECONOMIA, DESAPROVAÇÃO, REELEIÇÃO, CARGO, PODER, EXECUTIVO, REPUDIO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, INCONSTITUCIONALIDADE, CLAUSULA DE BARREIRA, PARTIDO POLITICO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, PARTICULAR, REFERENCIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

    O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil está estarrecido com a violência que está assolando o País.

    Na década de 1970, o PIB brasileiro era inferior ao PIB da China. A China fez um projeto de nação. Qual foi o objetivo principal da China? Transformar a nação em um dos países de maior produção do mundo. E hoje a China é o segundo PIB do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. O Brasil escolheu o caminho do subdesenvolvimento. E, a partir da Constituição de 1988, esse caminho e essa decisão ficaram muito claros, quando aprovamos uma Constituição que dava absoluta segurança de que o Brasil permaneceria subdesenvolvido pelo maior número de anos possível, talvez até de séculos.

    Agora, vamos analisar a questão da violência em relação ao desenvolvimento do País.

    Então, quais foram as variáveis que definiram que o país tinha que ser subdesenvolvido? E o que é um país subdesenvolvido? Um país subdesenvolvido é um país pobre, um país injusto, um país corrupto e um país violento.

    Então, todas essas variáveis ou princípios foram desenvolvidos de forma absolutamente consciente e eficiente.

    Vamos falar aqui, inicialmente, antes da violência, da carga tributária. A carga tributária do nosso País era 25% do PIB, quando a Constituição Federal foi aprovada.

    Então, neste Congresso, presenciei aqui aumentos sucessivos da carga tributária do nosso País e perguntava: "Esses impostos que estão sendo criados aqui, com tanta rapidez, irão se reverter em benefícios para o povo do Brasil?" E não foram revertidos.

    O contribuinte brasileiro não recebeu a sua compensação. E aí fui me aprofundar em por que uma carga tributária tão grande, se os melhores economistas do mundo, os melhores institutos de economia do mundo, as melhores universidades deixam bem claro que, para um país se desenvolver, o limite da carga tributária é 25%, que era exatamente o que tínhamos, quando aprovamos a Constituição.

    E aí fui analisar por quê. Na medida em que foram sendo criados impostos, aumentando-se a carga tributária da União, dos Estados, dos Municípios, taxas, contribuições, isso fez com que a renda da população brasileira fosse confiscada paulatinamente.

    E hoje, Senador Elmano Férrer, a parte mais importante da formação do PIB de um país é o consumo. Na medida em que a Nação resolve, através de aumento de carga tributária, confiscar renda da população, está impondo a essa população um subdesenvolvimento permanente e eterno. E é exatamente o que está acontecendo no País.

    Hoje, o brasileiro trabalha cinco meses para pagar impostos, quando o máximo deveria ser três meses. Então, aumentamos impostos, para aumentar a corrupção, para criar corporações fortíssimas e privilegiadas, e o povo, que foi para as ruas para pedir a redemocratização do País, para pedir as eleições diretas, foi quem perdeu nessa divisão da riqueza nacional.

    E agora vou falar em relação à violência, Senador Cristovam Buarque. O que tem a violência com a economia? Os códigos tributários e os códigos de processo penal, ou melhor, os códigos penais e os códigos de processo penal dos países desenvolvidos têm várias funções: a função preventiva de proteger o cidadão, de proteger o patrimônio, de proteger o sistema econômico e de proteger o sistema social.

    O objetivo principal do Código Penal e do Código de Processo Penal é preventivo. Não é punitivo, é preventivo! Da mesma forma que nós temos hoje, no mundo, a medicina preventiva, nós temos a violência preventiva, que é um Código Penal bem feito, moderno, atualizado, e um Código de Processo Penal para não imobilizar o Poder Judiciário e tirar a eficiência dele.

    Com um Código Penal como é o nosso, antigo, superado, nós imobilizamos, nós tiramos a eficiência da polícia. Por mais que você invista na polícia brasileira, por mais que você a treine, por mais que você a equipe, ela não vai ser eficiente, porque o Código Penal não permite que ela seja.

    E hoje nós verificamos essa superlotação nas prisões brasileiras. Muitas delas são verdadeiros campos de concentração: péssimas condições de vida, dando ao apenado uma segunda pena. Ele é penalizado na sua condenação pela Justiça e é penalizado uma segunda vez nas condições em que ele vai viver numa prisão, a exemplo das nossas prisões brasileiras.

    Se nós tivéssemos, logo após a Constituição de 1988, aprovado um Código Penal moderno, rigoroso, nós teríamos possivelmente de 40% a 50% da população carcerária que o País tem hoje. Por quê? Porque o Código Penal rigoroso não é para punir o meliante, é para prevenir a violência.

    Nós verificamos, há poucos dias, aquele crime no metrô de São Paulo em que dois rapazes, de forma violenta, truculenta e perversa, mataram um pai de família que trabalhava ali, no pátio do metrô de São Paulo, há 20 anos com a sua banquinha de negócios para sustentar a sua família. E eles mataram de forma violenta, truculenta e desumana. Por quê? Porque antes de eles cometerem aquele ato eles pensaram: "O que é que vai acontecer conosco? Nós vamos responder o crime em liberdade e daqui a poucos anos estaremos aqui, no mesmo local que nós estamos hoje." Se eles pensassem antes que iriam pegar uma pena muito longa, a exemplo dos países desenvolvidos, eles possivelmente não teriam cometido aquele crime.

    E assim são cometidos, sistematicamente, diariamente, minuto a minuto, neste País crimes que poderiam ser evitados se nós tivéssemos um Código Penal preventivo.

    Eu já dei este exemplo aqui outro dia: na Copa do Mundo do ano de 2002, o Brasil fez as suas primeiras partidas numa cidade coreana que tinha um milhão de habitantes, e foi amplamente divulgado no Brasil que o índice de criminalidade, naquela cidade coreana, era de um assassinato por ano ou de nenhum assassinado por ano – zero assassinatos. Isso foi amplamente divulgado, e o Brasil nunca parou um minuto para perguntar por que, para pesquisar por que tão baixo o índice de criminalidade.

    Se fosse uma cidade brasileira, esse número de assassinatos, em vez de um ou zero, seria de 260 a 400 assassinatos por ano.

    Então, o que está acontecendo? Nós não estamos tomando as medidas preventivas para construir um País mais justo, mais seguro para os nossos filhos e netos. E esse Código Penal tem sido mantido ano a ano pelo impatriotismo, pela ganância e pela força de alguns setores que ganham muito dinheiro na economia formal com a violência no País.

    E o que tem a violência, como eu falei, com a economia? Tem tudo a ver com a economia. Na medida em que você não dá segurança ao País também não dá segurança às empresas. Hoje, as empresas industriais brasileiras, Senador Cristovam Buarque, gastam de 10% a 15% com os custos de segurança em relação às empresas americanas e na base de 20 vezes o que gasta a empresa alemã com o custo de segurança. Isso porque, além de terem um sistema rigoroso de segurança na própria fábrica, na planta industrial, toda vez que vão deslocar um produto de valor agregado, isso tem que ser feito com segurança, com escolta, e isso aumenta muito o custo do produto brasileiro, inviabilizando as nossas exportações e deixando de gerar para o País não só divisas, mas milhares e milhares de empregos, porque perdemos a capacidade de competição no mundo, no mercado internacional.

    E aqui vou dar um exemplo muito particular. Nos Estados Unidos, quase 20 Estados já adotaram, já aprovaram a Lei dos Três Crimes: um indivíduo que rouba um carro uma vez é preso, julgado e paga a pena correspondente ao roubo de um carro; na segunda vez, é preso, condenado e paga a pena correspondente ao roubo de um segundo carro; mas, quando ele rouba o terceiro carro, pega a pena máxima do país, à exceção da pena de morte. Ou seja, se o país tem a pena de morte, ele pega a prisão perpétua, porque roubou apenas três veículos. E, aí, nós ficamos estarrecidos quando conversamos, quando ouvimos na televisão algum especialista. Ele acha uma coisa estarrecedora um sujeito roubar três carros e pegar prisão perpétua.

    Vejam o que está acontecendo no Brasil. No Brasil, são roubados 500 mil veículos por ano; 300 mil veículos, Presidente, são desmanchados. Essas peças vão para o mercado clandestino e são vendidas sem pagar impostos municipais, estaduais e federais. Essa quantidade enorme de peças é suficiente para manter o mercado de reposição de peças no mercado brasileiro. E aí, centenas de fábricas de autopeças no País já fecharam; centenas, milhares de lojas de autopeças também já fecharam, acabando, destruindo milhões de empregos no nosso País. Milhões de empregos não só diretos, mas aqueles empregos também gerados pela arrecadação de impostos dessas fábricas e lojas, que gerariam novos empregos e mais recursos para dar uma melhor qualidade de vida ao povo brasileiro. A partir de um roubo de carro, destrói-se um setor econômico do País.

    Por isso que lá eles têm esta visão de ter um Código Penal que proteja não só a pessoa, não só o patrimônio pessoal, mas também o sistema econômico e o sistema social. O sistema econômico é prejudicado quando se destrói a empresa e o sistema social quando tira do país milhões de empregos formais que poderiam existir.

    É importante alertar o País de que, apesar do que está acontecendo agora – essas rebeliões, esses milhares, centenas de milhares de apenados que estão nessas prisões sem condições –, nós poderíamos ter hoje 40% ou 50% de presidiários se lá atrás, há 20, 25 anos, o Brasil tivesse um projeto de País desenvolvido.

    Nós temos de romper essa barreira, deixar de pensar e manter eternamente o País subdesenvolvido apenas para atender a setores minoritários do País, que têm força política, que têm influência, que são formadores de opinião. Por que, que interesse uma corporação que seja altamente privilegiada no Brasil – mais que nos Estados Unidos, na Alemanha ou na Inglaterra –, tem de que o Brasil se desenvolva?

    O que nós precisamos é abraçar o povo brasileiro. Este Congresso Nacional tem que, a partir de agora, ir ao encontro das aspirações do povo, deixar de receber as influências, que são recebidas diariamente aqui, de corporações, de grupos de pressão, cujos interesses são justos, mas muito mais justos são os interesses da coletividade.

    É isto que eu gostaria de dizer: essa violência que está acontecendo agora é resultado de o Brasil não ter tomado as devidas providências e modernizado o seu Código Penal e o seu Código de Processo Penal há 20 ou 25 anos.

    Eu sempre digo e vou continuar repetindo: para o Brasil melhorar, para que possamos entregar aos nossos netos um País desenvolvido, nós temos que começar a resolver as coisas pequenas, uma por uma, senão seremos eternamente um País subdesenvolvido.

    Senador Cristovam.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Permita-me, Senador. Eu creio que o senhor traz para nós uma proposta de reflexão que permitiria identificarmos nossos erros. Vou pegar um item e, a partir daí, trabalhar. Quando o senhor disse que os empresários americanos gastam muito menos dinheiro com segurança que nós, é porque construímos um País violento por não tomarmos as medidas corretas, na hora certa, de fazer um País pacífico. Mas os empresários estrangeiros também gastam muito menos com o transporte, porque nós não fizemos as estradas com a qualidade que deveríamos. Também nosso sistema de saúde gasta muito mais que era preciso, porque não fizemos saneamento na hora certa. Também nossas empresas gastam muito mais com advogados que com engenheiros, porque nós criamos um sistema tão complexo de legislações, que é necessária uma quantidade imensa de advogados e contadores só para fazer as coisas não errarem. Os engenheiros fazem as coisas acertarem; advogados e contadores fazem as coisas não errarem. Então, nós fomos tomando medidas que não levavam em conta a prevenção. Nossa gestão é vista não pelo que evitamos de erro, mas pelo que parecemos acertar. Vou dar um exemplo, Senador Elmano. Só se considera boa gestão a que faz novos hospitais; não se considera boa gestão as ações de um governante que faz com que não sejam necessários novos leitos de hospital. Eu tinha orgulho de ter sido um governador que fiz pouca obra de hospital, mas que consegui ter mais leitos sobrando – quando eu entrei, faltavam – apenas atacando o trânsito, com uma boa política de trânsito, que resolveu o problema de politraumatizados, reduziu muito; com um programa radical de saneamento...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – ... que fez com que as pessoas não precisassem ir para o hospital porque estavam com dor de barriga, porque não tinham dor de barriga; e com um programa chamado Saúde em Casa, em que as pessoas tinham médico perto de casa. Alugava-se uma salinha, uma casinha e colocavam-se ali um médico, uma enfermeira, uns pequenos equipamentos, e as pessoas que ficavam doentes iam ali, ou o médico ia a casa, e aí não precisavam ir para o hospital. É uma gestão diferente. Nós nos acostumamos com a gestão do consertar os erros e não com a gestão de evitar os problemas. Por isso, a situação que atravessamos hoje: um país de baixa produtividade, um país de baixa capacidade de poupança, de quase nenhuma inovação, com novos produtos no mercado. Nós somos até bons no desenho de sapatos novos, mas sapato é sapato; não se inventou uma coisa para que não se precise de sapato. Desenhamos mais, mas não somos inventivos com computadores novos, com tudo isso. Então, o que o senhor trouxe foi uma provocação de como devemos mudar a maneira de enfocar o enfrentamento dos problemas brasileiros, não para consertá-los apenas; mas para evitar que eles surjam. Com relação à violência que temos hoje, estamos querendo consertar como? Com mais cadeia e não com uma sociedade tão pacífica que nem precise de cadeias, como muitas que existem por aí, em que cadeia é uma exceção. Eu li recentemente que há um país no norte da Europa fechando cadeias. Nós aqui desesperados com a necessidade de construir novas cadeias. Por que não tentamos fazer um Estado pacífico? Agora, se formos olhar tudo isso, Senador Elmano, o senhor vai achar que, lá atrás, o problema foi não ter dado educação de qualidade a todas as crianças brasileiras, independentemente da renda da família e da cidade onde vivem. Esse foi o grande erro, como também não termos colocado saneamento. Mas, sobretudo, o erro da educação frágil, como deixamos que terminasse sendo a nossa educação. Frágil e desigual, dois problemas que hoje a gente resolve ou nada vai se consertar como deveria. Mas, para concluir, estou falando muito em "conserto" com "s", que é o conserto da técnica, da engenharia. Mas, por trás de tudo isso, está a falta de um "concerto" com "c", que é o concerto de estarmos juntos, como uma sociedade harmônica. E essa é a tarefa nossa aqui. Mas parece que não está fácil de fazer esse concerto com "c", pelos sectarismos, que não nos deixam dialogar; pelo desencanto – esta é a verdade – de muitos de nós com a atividade política; pela visão imediatista, de curto prazo, de cada um de nós; e até mesmo pela preocupação com problemas menores, deixando de lado os grandes problemas da sociedade brasileira. Eu espero que este ano de 2017 – que a gente começou nesta semana, na verdade, no plenário do Senado e do Congresso – possa trazer um pouco de concerto com "c" para a sociedade brasileira. Essa é a nossa tarefa, essa é a nossa obrigação. Nós somos aqui maestros da sociedade – ou pelo menos deveríamos ser, Senador Elmano. Eu espero que, em 2017, nós consigamos trazer isso, para que os problemas que o senhor trouxe aqui sejam consertados com "s".

    O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) – Senador Cristovam, V. Exª é sempre uma inspiração para mim. Eu ia até encerrar o meu pronunciamento, mas, inspirado no que V. Exª falou, eu vou me alongar um pouco mais, com a permissão do Presidente.

    A China está formando, nas suas universidades, quatro milhões de chineses por ano; desses quatro milhões, quinhentos mil são engenheiros, ou seja, 25%. A última estatística de que eu tomei conhecimento no Brasil era em torno de 4% a 5% de engenheiros.

    O que nós temos hoje aqui no Brasil, como V. Exª falou, é o maior número de faculdades de Direito do mundo. Algumas estatísticas dizem até que nós temos mais faculdades de Direito do que o resto do mundo. E qual o resultado disso? São 105 milhões de processos na Justiça, 3,5 milhões processos na Justiça do Trabalho por ano. Nos Estados Unidos, a Justiça do Trabalho não existe, e as ações trabalhistas ficam entre 80 e 100 mil por ano. Então, nós somos um país totalmente judicializado, em vez de sermos um país que procura, por meio da técnica, da tecnologia, da ciência, da pesquisa, do ensino de qualidade, se desenvolver.

    E eu quero aqui dar um exemplo do que V. Exª falou quando era governador. Quando V. Exª era governador, eu tive um parente que foi acidentado aqui e foi atendido no Hospital de Base. Eu o acompanhei. Naquele mesmo período, um médico suíço deu uma entrevista – V. Exª deve se lembrar – em que disse: "Se eu tiver de sofrer um trauma de um acidente, eu gostaria de estar em Brasília para ser atendido pelo Hospital de Base." V. Exª deve se lembrar disso que o médico suíço falou aqui em Brasília naquela época.

    Há pouco tempo, mais ou menos três anos, um funcionário meu acidentou-se, e eu o acompanhei no Hospital de Base, fui visitá-lo e vi as condições precaríssimas, e como estava sucateado aquele hospital que era referência nacional em hospital de trauma. Então, V. Exª está dizendo a pura verdade quando diz que, no seu governo, V. Exª deu uma saúde de qualidade ao povo do DF e do entorno.

    E, ainda na sua tese de educação, eu já disse aqui várias vezes que os países que têm se desenvolvido nessa fase moderna, a partir de 1900, a partir do desenvolvimento do Japão, que já tinha toda a sua população alfabetizada em 1900, todos os países que se desenvolveram de lá para cá o fizeram pelo ensino de qualidade e pela exportação de produtos, porque uma coisa está interligada à outra. Se o país tem um ensino de qualidade, ele desenvolve uma indústria através da pesquisa, do conhecimento, da tecnologia, das patentes, e aí ele tem produtos para exportar com valor agregado. E é exatamente a indústria que cria os melhores empregos no país, porque ela tem o valor agregado e, naturalmente, pronto para exportação e aceito no mercado internacional.

    Então, é esse casamento de ensino de qualidade com exportação de produtos. Só dessa forma acontece. Nós temos, como último exemplo, a Coreia do Sul. Na década de 50, beirando a década de 60, existia, em uma cidade nordestina, uma área degradada, uma área muito pobre, uma área sem qualquer infraestrutura, onde moravam as pessoas mais pobres daquela cidade, que era apelidada de Coreia, porque rememorava a Coreia do Sul e a Coreia do Norte, dois países muito pobres. Hoje a Coreia do Sul é um dos países mais modernos do mundo, que exporta produtos de qualidade, exporta tecnologia e disputa o registro de patentes com os países mais desenvolvidos do mundo, a exemplo dos Estados Unidos, da Alemanha, da Inglaterra e da própria China.

    Então, só o desenvolvimento econômico pode dar uma boa qualidade de vida à população. E, para que isso aconteça, nós precisamos ter um projeto de nação, o que nós não temos. Hoje nós temos o projeto das pessoas, o projeto das corporações, o projeto dos grupos de influência, e quem paga essa conta é o povo brasileiro, que não está recebendo a compensação pela redemocratização do País. O Estado democrático brasileiro não está sendo justo com a população brasileira. Nós precisamos resgatar e novamente entregar esta Nação para a maioria do povo brasileiro, um povo que trabalha, que ama o País, que é patriota, que acredita no País e que faz com que o País ande.

    Eram essas as considerações que eu queria fazer, Sr. Presidente, mas, antes de encerrar minhas breves palavras, quero registrar aqui a presença do meu amigo, o Deputado Estadual da Paraíba...

(Soa a campainha.)

    O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) – ... Ricardo Barbosa, que está sempre aqui em Brasília, nos ministérios – ele já é conhecido em todos os ministérios aqui –, um rapaz muito competente, muito preparado intelectualmente, de uma família de pessoas muito preparadas, que está sempre aqui reivindicando, tratando de assuntos de interesse das prefeituras do nosso Estado da Paraíba.

    Parabéns, Deputado Ricardo Barbosa! Continue esse trabalho e que Deus o abençoe!

    Muito obrigado a todos. Obrigado também aos telespectadores da TV Senado, e um abraço cordial à Rádio Senado, que completou, recentemente, 20 anos, a todos os seus funcionários e todos aqueles que ajudam a fazer com que essa rádio seja uma das mais respeitadas do Brasil.

    Muito obrigado.

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. PMDB - PI) – Cumprimento o nobre Senador pelo tema, pelo discurso, pelo pronunciamento, trazendo questões das mais relevantes para o País.

    Eu me somo às palavras de V. Exª e reconheço que nós vivemos momentos de profundas dificuldades, haja vista o tema tocado por V. Exª com relação à insegurança que predomina e paira sobre todos nesta Nação, sobretudo a crise do sistema penitenciário nacional. Hoje estamos com problemas gravíssimos em vários Estados da Federação como o Rio de Janeiro, o Espírito Santo, o Rio Grande do Sul, enfim, problemas que retratam a crise do Estado brasileiro.

    V. Exª se reportou à questão da alta carga tributária que nós temos, mas um dos aspectos importantes é a má distribuição de toda a arrecadação pública com os entes federados, que fica com a União, com os Estados-membros da Federação, o Distrito Federal e os Municípios. Quer dizer, são temas, no meu entendimento, que V. Exª levanta oportunamente aqui nesta Casa, que é a Casa da Federação, que leva todos a profundas reflexões e a contestar. Realmente, a crise nos Estados federados se agrava; a crise nos Municípios, nas cidades também, ou seja, algo tem de ser feito. Há problemas de planejamento. Já sabíamos dessa crise, dessa bomba de efeito retardado que culminou em várias penitenciárias do Brasil afora; quer dizer, não há planejamento em nosso País, lamentavelmente, na área da educação, na área de saneamento, enfim, em qualquer área.

    Daí porque V. Exª, como empresário bem sucedido, político que tem uma história, mas economista de profissão, a profissão que V. Exª abraçou... Creio que é por temas dessa natureza, desafios dessa natureza que esta Casa, o Senado Federal, como Casa da Federação, tem de fazer profundas e rápidas reflexões, buscando alternativas.

    O Estado do Espírito Santo está numa situação dramática. As Forças Armadas estão sendo convocadas nesse instante, além da Força Nacional, para todos os Estados. Nós estamos, inclusive, desviando as funções constitucionais das Forças Armadas, do Exército e da Marinha sobretudo; quer dizer, a impotência dos Estados através de suas forças de segurança, das polícias militares nos leva a profundas preocupações, sobretudo quando elas se aquartelam, não saem às ruas e deixam a população à deriva, sob o impacto profundo da violência.

    Então, eu queria me somar à preocupação de V. Exª, parabenizá-lo, e conclamar todos os Senadores para nos debruçarmos sobre essas questões rapidamente, buscando, ao lado dos Executivos, porque envolve o poder central...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. PMDB - PI) – ... o Governo Federal, além, sobretudo, dos Governos estaduais. Há uma perplexidade, há uma desesperança, há um desencanto da Nação, do povo com relação ao Estado, que não responde mais aos desejos e aspirações nacionais. Então, V. Exª foi muito feliz no seu pronunciamento. Creio que nós temos de buscar as alternativas, porque cabe a esta Casa, ao Senado da República, uma preocupação maior pelo funcionamento do Estado, sobretudo da Federação, dos Estados federados, do Distrito Federal, dos Municípios que agonizam. Muitos deles estão na UTI. Aí está a situação do Rio de Janeiro, sobretudo, e do Espírito Santo hoje, que é preocupante! A Marinha e o Exército estão lá, convocados pelo Executivo estadual. É uma situação difícil! Daí porque eu queria me congratular com V. Exª e parabenizá-lo. Que voltemos a discutir temas dessa profundidade, dessa relevância e importância para a Nação e para o Estado brasileiro.

    O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) – Muito obrigado, Presidente, Senador Elmano Férrer, do nosso querido Estado, o Piauí. Quero aqui aproveitar, mais uma vez, para dar as boas-vindas a V. Exª ao PMDB. Foi uma aquisição de grande qualidade, tanto do ponto de vista político quanto do ponto de vista pessoal. Portanto, estamos honrados com a presença de V. Exª no nosso Partido, o PMDB. Muito obrigado pelas suas palavras.

     Eu vou me alongar mais um pouco porque o nosso amigo, Senador Armando Monteiro, de Pernambuco, um dos maiores conhecedores do funcionamento do sistema econômico brasileiro, que conhece como ninguém as dificuldades que o País tem para usar o seu potencial econômico, o potencial das suas empresas, deseja um aparte.

    Concedo um aparte, com todo prazer, ao Senador Armando Monteiro.

    O Sr. Armando Monteiro (Bloco Moderador/PTB - PE) – Meu caro Senador Raimundo Lira, eu gostaria de ter assistido a todo o pronunciamento de V. Exª, mas tive oportunidade, no meu gabinete, de ouvir alguns fragmentos que, eu diria, dão a medida da dimensão, da qualidade, do conteúdo da fala de V. Exª. V. Exª, com muita razão, coloca, sublinha a sua visão de que o Brasil não tem um projeto. O projeto do Brasil é das pessoas, das corporações. Não há, por assim dizer, uma visão minimamente convergente na sociedade brasileira a respeito de um projeto de País que possa oferecer perspectiva, esperança a este País, que tem um potencial imenso, que tem uma dotação de recursos fantástica e que não realizou ainda nem de longe o sonho de construirmos uma sociedade mais equilibrada, mais solidária, mais dinâmica, mais inclusiva e mais próspera. V. Exª lembrava, por exemplo, a Coreia do Sul, o fenômeno que foi. Em pouco menos que três décadas, a Coreia do Sul foi guindada a uma posição extraordinária no concerto das nações e hoje é um país que exporta tecnologia e que tem um sistema educacional que foi a base desse processo de extraordinário desenvolvimento, a partir da formação e da qualificação dos seus recursos humanos. É triste constatar que, no Brasil, a despeito de todo o nosso potencial e da dimensão da economia brasileira, ainda tenhamos que conviver com mazelas que, no cotidiano, nos deprimem, como, por exemplo, essa questão da segurança pública, que revela essencialmente uma patologia social: uma sociedade que não se reconhece nos valores mais importantes da fraternidade, da convivência minimamente harmônica. Então, eu quero me congratular com V. Exª, meu caro Senador Raimundo Lira, pela maneira lúcida com que traz hoje uma palavra para esta Casa, valorizando o debate. E eu creio que, a partir de pronunciamentos como o seu, valorizado e enriquecido também pelo aparte e pelas palavras do nosso Presidente Elmano Férrer, nós possamos, nesta Casa, discutir de forma mais elevada os temas que são verdadeiramente de interesse da sociedade brasileira. Mais uma vez, eu me congratulo com V. Exª.

    O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) – Muito obrigado, Senador.

    Eu sempre gostei muito de estudar economia brasileira – fui professor dessa matéria –, sempre relacionando o Brasil com os outros países, o Brasil com a história econômica. Quando o Brasil era Império, governado por D. Pedro II, o parâmetro da força de um país era a armada – chamava-se armada, que era a Marinha de guerra. A Inglaterra possuía a primeira, a maior armada do mundo; o Estados Unidos, a segunda; e o Brasil, a terceira. Então, nesse contexto de simbologia de força, o Brasil era considerado uma grande Nação. E aí se falava que os Estados Unidos e o Brasil eram as duas potências emergentes. Na realidade, não se usava esse termo "emergente", isso é uma coisa nova que se criou para disfarçar um pouco de se chamar país subdesenvolvido – pega-se um grupo de países e os nomeia de países emergentes, mas, na realidade, essa palavra não tem nenhum significado do ponto de vista econômico, é apenas uma simbologia. E aí me lembro bem também de que, no início do século XX, se falava que os dois países do futuro eram Japão e Brasil. As coisas foram acontecendo, e, mais para a frente, se dizia que os dois países do futuro eram Brasil e Canadá. O Canadá foi, o Japão foi, e o Brasil ficou. Lá para a frente, começou-se a falar, em um ambiente econômico, que os dois países do futuro eram o Brasil e a Austrália. A Austrália foi, e o Brasil ficou. Recentemente, os dois países do futuro eram o Brasil e a Coreia do Sul. A Coreia do Sul foi, e o Brasil ficou.

    Por quê? Exatamente por aquilo que nós falamos – e V. Exª falou com mais qualidade e com mais clareza do que eu –: o País não tem um projeto de nação. Então, nós temos que ter um projeto de nação e deixar de improvisar.

    Eu me lembro bem de que, quando eu era Senador aqui na década de 1990, se alguém falasse em reeleição, era uma coisa que não tinha como falar, porque era tido como impatriotismo falar em reeleição de prefeito, de governador e de Presidente da República. Não se falava nisso, porque se sabia que o País não estava preparado para ter reeleição. Eu saí daqui do Senado por uma circunstância e aí vi ser aprovado um projeto de reeleição, elegendo o Presidente exercendo o mandato, o governador exercendo o mandato e o prefeito exercendo o mandato. Então, criou-se uma relação de disputa extremamente injusta, como é característica de país subdesenvolvido. O país subdesenvolvido sempre procura, em todas as suas ações e procedimentos, encontrar uma forma de ser injusto. Então, passou a ser uma competição injusta: um candidato competindo contra uma prefeitura, um candidato competindo contra um Estado e um candidato competindo contra o País. E o que aconteceu? Por exemplo, os governadores se reelegiam; no dia 1º de janeiro, havia a comemoração, a festa da posse; e, a partir do segundo dia, o governador já começava a preparar a reeleição. Ele reunia os seus secretários, dizendo que precisavam ter a imprensa do lado deles, precisavam ter dois terços da Assembleia Legislativa, precisavam ter todos os prefeitos, precisavam ter todos os vereadores, precisavam ter todos os cabos eleitorais, precisavam ter todas as forças políticas e as empresas de comunicação do lado deles. E começou a criar secretaria para atender também o número excessivo de partidos. E acabou-se aí a qualidade de prestação de serviço dos Estados, dos Municípios e da União. Então, em vez de evoluir, nós regredimos do ponto de vista político.

    E, por um erro do Supremo Tribunal Federal... O Supremo Tribunal Federal acabou com a cláusula de barreira, permitindo que haja hoje mais de 30 partidos em atividade, 27 a 28 partidos com representação na Câmara dos Deputados, 16 a 17 com representação aqui no Senado Federal. Isso acabou com a eficiência da produção legislativa, Senador Randolfe. Por quê? Porque os projetos mais importantes são aprovados por consenso. Então, quando você vai fazer um consenso na Câmara dos Deputados, tem que botar numa mesa 28, 29 Líderes. Então, isso acabou com a eficiência do sistema da produção legislativa do Congresso Nacional.

    Depois, o Congresso Nacional aprovou também o financiamento de campanha pelas empresas.

    Aí, hoje, nós estamos nos deparando com o maior escândalo de corrupção da história política e econômica do nosso País. E nós não falamos na origem disso. A origem foi: reeleição, que foi criada pelo Congresso Nacional, e contribuição e financiamento de campanhas por empresas, por pessoas jurídicas. Então, juntaram-se essas duas variáveis altamente explosivas. Elas criaram isso? Não, mas elas foram a base, o incentivo, o instrumento para que o Brasil se tornasse, nos últimos anos, o País mais corrupto, possivelmente, do mundo, havendo, internamente, o maior escândalo de corrupção da história do nosso País, repito.

    E há agora, como um refresco, essa Operação Lava Jato, que nós aqui do Congresso temos que proteger de todos os modos, sem levar em consideração que pode, eventualmente, haver algum excesso, alguma injustiça, porque isso existe em qualquer sistema que eventualmente seja criado pelo homem, mas o importante é o seu objetivo, o objetivo de limpar o País, de dar uma nova mentalidade e um novo momento e de criar uma nova esperança para o povo brasileiro de que o Brasil vai dar certo.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/02/2017 - Página 71