Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à falta de responsabilidade nos gastos públicos dos sucessivos governos do País.

Critica a indicação do ex-Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, para ocupar a vaga de Ministro do Supremo Tribunal Federal.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Críticas à falta de responsabilidade nos gastos públicos dos sucessivos governos do País.
PODER JUDICIARIO:
  • Critica a indicação do ex-Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, para ocupar a vaga de Ministro do Supremo Tribunal Federal.
Aparteantes
Lindbergh Farias.
Publicação
Publicação no DSF de 14/02/2017 - Página 82
Assuntos
Outros > ECONOMIA
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • CRITICA, FALTA, RESPONSABILIDADE, GASTOS PUBLICOS, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, INFLAÇÃO.
  • CRITICA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INDICAÇÃO, ALEXANDRE MORAES, OCUPAÇÃO, VAGA, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, CRITERIO SELETIVO, OBJETIVO, IMPARCIALIDADE, ELOGIO, DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, REDUÇÃO, DESEMPREGO.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o que esses discursos últimos têm-nos mostrado é que não estamos sendo capazes de combinar duas coisas: a ética de como cobrar dos que têm e beneficiar os que não têm com a aritmética de não gastar mais do que todos nós temos. Esse é o desafio.

    Nós caímos, ao longo de décadas, no chamado populismo de dizer "vamos fazer a ética beneficiando os que não têm sem tirar de quem tem". E aí estourou, gastamos demais, porque há um limite nos gastos. Fomos éticos, mas não fomos aritméticos. Ou seja, não fomos responsáveis. Falo bem devagar para dizer: nós não fomos responsáveis com as contas públicas. E essa não é uma questão do Lula, não é uma questão da Dilma, mas uma questão histórica no Brasil. Por isso, a inflação.

    A inflação é de você atender a quem não tem sem tirar de quem tem. Você gasta mais do que pode. E aí, como você só tem quatro e gasta cinco, você tem que dizer que cinco só valem quatro: é a inflação, 20% de inflação. Nós nos acostumamos com isso – é o populismo. Não dá para continuar com o populismo, porque no fim a gente diz "vamos dar a quem não tem sem sacrificar quem tem". Aí a gente sacrifica quem não tem por causa da inflação. Esses são os grandes prejudicados, porque os outros aplicam dinheiro, eles compram dólar, eles compram propriedades e, com isso, eles se protegem da inflação.

    O populismo é antipopular. É para isto que eu queria chamar atenção: o populismo é antipopular. Eles se dizem populares, mas são antipopulares, são populistas. Popular é dizer "eu vou dar a quem não tem e, por isso, eu vou tirar de quem tem". E isso é o que está faltando.

    Tem razão o Senador Lindbergh nesse ponto. Não tem no resto, não tem no resto: essa ideia de que dá para dar tudo a todos, Senador Lindbergh, não dá, isso é o populismo. Mas dá para ser popular. Quer dizer, vamos dar a quem não tem e, para isso, vamos tirar de quem tem. Aí entra a razão dele: nós não estamos tirando de quem tem.

    Então, mais uma vez, agora, para sermos responsáveis, para levarmos em conta a aritmética, estamos sendo não éticos. O que eu falo é que é preciso casar ética e aritmética. Esta é a responsabilidade e a justiça, justiça com responsabilidade, responsabilidade com justiça: nem a justiça irresponsável do populismo nem a responsabilidade injusta dos que concentram renda, dos que concentram o sacrifício nos que não têm.

    Está precisando, sim – aí eu estou de acordo –, que o Governo Temer traga aqui a justiça e não só a responsabilidade. O teto: eu sou favorável ao teto, porque o teto é aritmético, o teto é responsável. Como é que a gente põe a justiça e a ética no teto dos gastos? Aumentando para a educação e tirando dos dividendos, como o senhor sugeriu.

    Ou tirando dos benefícios à educação que não chega ao povo, porque há gastos educacionais que não chegam ao povo. Professor que não dá aula não chega ao povo. Subsídios para beneficiar educação que não interessa ao povo, só aos ricos, não chegam ao povo. Há gastos educacionais que não são justos, isso é preciso trazer para o debate. Nem todo gasto com saúde chega ao povo, nem todo gasto com educação chega ao povo.

    O Presidente Temer não está trazendo a justiça nos pacotes. Ele precisa trazer reformas além do teto, que é positivo para mim. Ele precisa trazer uma reforma fiscal que, por exemplo, cobre imposto dos dividendos. Como eu disse há pouco, até acho que não se deve cobrar imposto do dividendo reinvestido, porque gera emprego, mas do dividendo gasto no consumo tem que ser cobrado imposto, como é do meu salário. Eu não tenho dividendo. Eu sou muito orgulhoso de não ter dividendo de nada, nem de aluguel, nem de nada. Recebo o meu salário.

    Tem que trazer de volta a ideia, que morreu, do imposto sobre grandes fortunas, sobre bens de luxo, que, no Brasil, não pagam impostos. Tem que trazer reformas com cheiro do povo. As propostas que o Presidente Temer mandou até aqui até que beneficiam o povo quando controlam a inflação, mas não têm cheiro do povo. Por isso, os discursos do Lindbergh. Tem que trazer reformas com cheiro do povo. Está faltando isso.

    Além disso – e é o que eu vim falar aqui – certos gestos políticos do Presidente, além de não trazerem cheiro do povo, trazem cheiro de coisa ruim. Eu vou dizer: a indicação de um Ministro dele para ir para o Supremo não cheira bem. Não porque não seja competente – longe de mim dizer que o ex-Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, não é competente –, mas eu não consigo acreditar, Senador Lindbergh, que um homem que é do meio jurídico, como é o caso do Presidente Temer, não seja capaz de conhecer 20, 30, 50 juristas de competência sem o ônus de terem sido Ministros dele. Não consigo entender isto: ele achar que todos os outros são tão ruins que ele paga o preço da incompreensão de indicar um Ministro com o ônus de ter sido Ministro dele. É um ônus alto demais! Por que ele fez isso?

    E aí vem o temor do povo, que é armar, na presidência do Senado, na presidência da CCJ, com mais um nome no Supremo e outros, uma proteção. Isso é perigoso. Aí, eu temo que não seja só o Presidente Temer, que sejam todos que estão nisso.

    Tem gente que diz, Senador Lindbergh – e ontem mesmo eu ouvi –, que, quando o Presidente Lula falou – e eu estava elogiando isso – ao Presidente Temer, na despedida da D. Marisa, "me chame que eu vou conversar"... Eu imaginei como um grande gesto do Lula para um entendimento em defesa do Brasil, mas ontem, numa reunião em que eu estava, me disseram que não, que foi um entendimento para barrar a Lava Jato, porque interessa ao PT, ao PSDB e ao PMDB. Eu ouvi isso. Aí, se eu ouvi isso, é porque suspeita-se de coisas desse tipo.

    E há a indicação do Ministro da Justiça, a Presidência, com todo o respeito, do nosso colega Lobão. Termina passando essas coisas. Isso é ruim.

    E é nesse sentido que a Senadora Ana Amélia falou aqui de um projeto meu, uma PEC, que tenta mudar a maneira de escolher os Ministros do Supremo para que não pese suspeita sobre eles. Eu quero dizer, inclusive, que um ministro do Supremo chega indicado pelo Presidente, passa pela nossa sabatina e termina sendo independente, imparcial. Há diversos assim, mas pesa a suspeição. Por isso, a minha proposta é a de que o Ministro do Supremo deveria ser escolhido por um processo mais complexo. Primeiro, o Presidente não indicaria quem ele quer. Ele receberia uma lista de seis nomes. Ele só poderia escolher, entre esses seis, três, que mandaria para o Senado. O Senado escolheria um dos três. Acabou a dívida do ministro escolhido com qualquer um. Dois seriam indicados pelo Ministério Público; dois pelo CNJ; um pela Câmara dos Deputado, porque não participa do processo; e um pela OAB. Com esses seis nomes, o Presidente da República escolhe três; não um só, não o que é da cabeça dele, mas três. Ele manda esses três para o Senado. E o Senado não sabatina um e escolhe "sim" ou "não". Não. Ele escolhe entre os três. Há uma eleição, não uma sabatina apenas. Há um debate, não uma sabatina. Esse escolhido pela eleição do Senado, depois da escolha do Presidente de três nomes entre seis que ele recebeu da comunidade jurídica e mais um da Câmara e um da OAB, não vai dever nada a ninguém. Isso evitaria que a gente está vivendo hoje de ter que votar "sim" ou "não" a um indicado que foi Ministro, até ontem, da Justiça.

    E há um agravante, que eu acho que foi um erro do Presidente Temer: ele desfalcou o Brasil do comandante da luta pela segurança pública, que era esse Sr. Alexandre de Moraes. Ele era Ministro da Justiça e, portanto, desde a semana passada, também Ministro da Segurança Pública. O Ministro da Segurança Pública, neste momento em que o Espírito Santo estava passando por aquilo, ser retirado? É muito grave e terminou provocando algo, que tem até um lado positivo, mas tem um lado negativo: terminou fazendo com que a segurança pública do Brasil fosse uma questão do Ministério da Defesa Nacional. Isso é muito grave, muito perigoso. Temos um ótimo Ministro, eu acho, meu conterrâneo, do meu Partido, meu amigo, que é o Jungmann, mas é ruim que seja o Ministro da Defesa quem cuida da segurança, Senador Ataídes. É ruim para o Brasil. Felizmente, temos um competente, mas, independentemente da competência, isso não é bom.

    Eu li hoje no jornal, a Folha – creio que só virtual e não confirmei o lugar em que foi –, que um menino morreu por causa de um tiro. Está confirmado isso. Isso é uma mácula que vai ficar. É uma mácula. Foi na defesa da ordem pública? Foi, mas é ruim. Soldado das Forças Armadas é para matar soldado estrangeiro, em guerra, em campo de batalha e não brasileiro civil nas ruas de nossas cidades. A intenção é boa: manter a ordem, mas o caminho não é esse. Para isso, há polícia civil; para isso, há polícia militar, sobretudo.

    E há algo mais perigoso: se, em vez de enfrentar, um desses soldados, que não foram preparados para a defesa das ruas, jogar o fuzil na rua e sair correndo com a meninada atrás jogando pedra nele, com a televisão filmando isso? Aí é um desastre completo – desastre completo! – para a imagem do Brasil no exterior e para a imagem das Forças Armadas aqui dentro.

    Corremos esse risco, porque o comandante da defesa da segurança pública, em vez de estar no comando da segurança pública, está nos corredores do Senado pedindo voto para ser Ministro do Supremo. É um erro do Presidente Temer isso. É um erro, que eu acho que temos que comunicar aqui para poder fazer com que se endireitem as coisas – endireitar não no sentido de direita, endireitar no sentido de correção.

    Senador Lindbergh, da mesma maneira que eu acho que nós temos que casar ética e aritmética – a aritmética sem ética é injusta, a ética sem aritmética é irresponsável, uma cai no conservadorismo, a outra cai no populismo –, é preciso que a política seja feita querendo entender o que o povo está vendo, o que o povo está sentindo, porque o povo está muito desconfiado – muito desconfiado! – de como estamos conduzindo.

    E olhem que, discordando totalmente do Lindbergh, eu acho que a condução da economia está até correta, Senador Ataídes. Eu acho que a inflação está caindo, os juros estão caindo – e vão ter que cair na velocidade da taxa de juros e não por decreto. Isso exige reduzir a dívida. Para reduzir a dívida, exige superávit. Isso são realidades que não adianta querermos ideologizar e nem fazer conforme queremos, da mesma maneira que eu sei que, se eu soltar este lápis, ele cai, por causa de uma coisa chamada força da gravidade. Eu sei que, com dívida alta, os juros sobem. É uma regra, é uma lei, a não ser que se estatize o sistema financeiro, e, mesmo assim, a taxa de juros só cai se a dívida diminuir. Não tem como. Comprar muito, pedir dinheiro emprestado levam os juros para cima. É preciso controlar a dívida. Então, a economia até que está indo corretamente: dura, difícil, como todo ato de irresponsabilidade é difícil e duro. Responsabilidade é uma coisa difícil, é uma coisa dura, mas, na política, eu acho que estamos tendo desatinos.

    E aí chega para mim, agora há pouco, a Justiça, perguntando o que eu acho do novo Ministro da Justiça que está sendo indicado ou que, pelo menos, é um dos nomes. E é uma pessoa que já falou em defesa do mensalão, que já falou em defesa de coisas que é o contrário do que o povo está querendo hoje. É um perigo, Senador Elmano, que o Presidente Temer não tenha o sentimento do que o povo está querendo para que ele passe a imagem de credibilidade absoluta. E nós também aqui. É um perigo para o Brasil.

    Por isso, eu fiz questão de vir aqui, Senador Lindbergh, mas quero a sua palavra, porque os nossos debates são muitas vezes melhores do que os nossos discursos.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Cristovam, primeiro, eu queria falar no que o senhor disse em relação ao Presidente Lula, quando recebeu ali, nas horas finais de D. Marisa, Michel Temer e uma comitiva. Tenha uma certeza, Senador Cristovam: o Lula não estava participando de nenhum acordo sobre Lava Jato, até porque o caso dele não é no Supremo, o caso dele está em Curitiba. Eu estive presente com ele nesse período inteiro e devo dizer uma coisa, Senador Cristovam: o que sofreu D. Marisa nesse último ano e meio não foi pouca coisa. Isso deve servir para fazermos uma reflexão – os meios de comunicação também. No caso do Lula, não foi um ataque a ele só – nos últimos oito meses, foram 14 horas no Jornal Nacional –, foi a ele, foi à D. Marisa, foi a seus filhos. O que a Globo ganha com o Jornal Nacional filmando os pedalinhos dos netos do Lula? Eu digo mesmo sobre o Juiz Sérgio Moro. O que ele ganha divulgando uma gravação da D. Marisa com o filho dela? Sabe a lei de interceptação telefônica? É muito clara que gravações que não têm a ver com o processo têm que ser destruídas, mas com o Presidente Lula valeu tudo: gravaram o Presidente Lula a 1h da tarde falando com a Dilma; às 5h da tarde, isso estava na imprensa. E o impediram de assumir, ele nem réu era. Aí, agora, eles estão embananados, porque veio essa coisa do Moreira Franco aí. Eles estão embananados, porque é impressionante a seletividade. Há uma forma diferente de atuação com o PT. Então, eu digo uma coisa: Sobral Pinto foi advogado de Luís Carlos Prestes, houve uma vez em que ele usou o Estatuto de Defesa dos Direitos dos Animais para defender Luís Carlos Prestes. O Lula não está acima da lei, mas não está abaixo dela. De forma que o senhor fique tranquilo que, para eles, para essas elites do País, não há acordo com o Lula, querem impedir Lula de ser candidato, porque têm medo do Lula. Hoje, teve uma matéria no Valor Econômico falando da saudade de uma parte do povo brasileiro pelo Lula. É uma perseguição implacável. Não há acordo com o Lula. Agora, V. Exª tem razão: vem à cabeça de todo mundo aquela frase de estancar a sangria, de fazer um acordo com todo mundo, porque estão escolhendo, para Ministro do STF, um Ministro da Justiça de um Governo. Se fossem outras circunstâncias... Mas, não, é em um momento em que o Governo está todo implicado, o Ministro e o Presidente da República. Se fosse em outro momento, Senador Cristovam, isso talvez pudesse ser secundário, se bem que o próprio Alexandre de Moraes, na tese doutorado dele, diz que isso devia ser proibido, porque podia haver um sentimento de gratidão, e o juiz podia perder a independência. Agora, eu fico vendo. Esse caso da Folha de S.Paulo de hoje é muito grave, é censura, estão atacando aqui liberdade de informação, liberdade de expressão nesse caso. E eu acho que há uma coisa estranha também nesse caso: a atuação do próprio Alexandre de Moraes. Em uma velocidade incrível, o Ministério Público fez denúncia, e o hacker foi condenado, preso, cinco anos. Não há situação similar de "hackeamento": cinco anos no Presídio de Tremembé.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Eu não estou aqui acusando nada, mas estou dizendo que esse caso merece ser investigado, porque é muito estranho como o caso foi conduzido até o final. Então, eu quero aí me associar a várias partes; eu tenho algumas discordâncias, mas, na maior parte do discurso, eu concordo com o discurso de V. Exª. Eu só discordo do seguinte, Senador Cristovam: não dá para dizer que a economia vai bem. A inflação caiu, porque nós estamos em uma depressão do tamanho do mundo, e essa tese sobre juros e inflação não é assim: "Ah, não, os juros vão subir se a dívida pública..." Na verdade, a subida dos juros aumenta muito a dívida pública. É por isso que esse artigo do André Lara Resende, que eu recomendei e que trouxe um debate de volta ao País entre vários setores, é interessante, porque ele começa a dizer, Senador Cristovam, que os juros, no médio prazo, significam aumento da inflação. Essa é uma tese. Ele diz o seguinte: os juros significam elevação da dívida pública, e os agentes já contabilizam aquilo, havendo uma subida da inflação pelas expectativas de futuro. É um debate muito interessante. Não é da forma como eu defendo e como os economistas com quem eu tenho ligação defendem, mas abre um debate sobre este momento do País. Então, não dá para achar que a economia está bem quando o País está derretendo. Eu repito isto desde o ano passado aqui, parecendo o profeta do apocalipse: eu acho que estamos indo para a convulsão social, porque nós estamos perdendo o controle. E eu me preocupo muito, porque você sabe, Senador Cristovam, que, quando acontece isso, é ruim para todo mundo, em especial para as forças democráticas, porque não há nada que facilite mais um discurso fascista, autoritário que dizer o seguinte: "Olhem o descontrole!" O cara vê aquilo no Espírito Santo, vê no Rio de Janeiro a confusão que vai ali... Isso é um terreno muito fértil para um discurso autoritário, fascista, da ordem. Eu não acho isso bom, muito pelo contrário, mas eu acho que estamos indo para esse lado. Quero acabar o aparte prolongado, mas sempre digo que nesses economistas do PSDB – e eu respeito vários aí – falta a razoabilidade. Nenhum deles em um momento como este pensa: "Como isso vai ter impacto no povo?" Não, eles vão com tudo. E, Senador Cristovam, quando eu disse isso aqui... Não estou no populismo: dar tudo para todo mundo como se fossem infinitos os recursos; não, estamos querendo proteger que retirem dos mais pobres, no momento em que não mexem nos mais ricos. É um discurso equilibrado. Eu sou admirador de V. Exª há muito tempo, somos amigos, gosto muito de V. Exª, mas eu acho que V. Exª poderia, neste debate, inclusive, sobre o ajuste fiscal que V. Exª defende – para mim, a prioridade é crescimento econômico, temos que deixar isso um pouco de lado até para melhorar as contas lá à frente –, dentro dessa sua lógica, pela sua autoridade, trazer para cá alguns projetos, que eu topo assinar em conjunto, sobre tributação progressiva que sejam justos, que acabem com isso que está acontecendo no Brasil: um ajuste feito e dirigido somente para os mais pobres. Eu acho que V. Exª tem autoridade aqui nesta Casa – circula nos mais diversos grupos – para tentar uma concertação no sentido de que, se houver um ajuste, ele seja equilibrado entre todas as partes da sociedade. Desculpe pelo aparte tão longo. Parabenizo V. Exª.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Desculpe nada. Eu é que tenho que agradecer.

    Agora, vamos ao âmago do problema. Para mim, o âmago do problema hoje, Senador, não é o ajuste de hoje, é o desajuste criado no passado. Tivemos um desajuste, não adianta querer ignorar isso. Segundo, os juros cresceram no momento da recessão maior no governo Dilma. A recessão no governo Dilma era maior do que hoje. Hoje, já está se equilibrando, já se fala em um crescimento de 0,8% neste ano, ou seja, a recessão está desaparecendo, a inflação está caindo e os juros também, pela credibilidade que o Governo Temer passa na economia, mas não passa na política. E aí a política vai contaminar a economia. Então, o erro não é o ajuste, o erro é o desajuste, e, para corrigir o desajuste, tem que fazer um ajuste, tomando as providências para proteger os mais pobres. Por exemplo: eu vi no jornal que 500 mil novas famílias estão no Bolsa Família. Eu já dizia à época que não...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Porque ficaram desempregadas.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Sim. Então, protege-se por aí, como se protege pelo seguro-desemprego, mas não se protege emitindo dinheiro. Não se protege pedindo emprestado aos bancos, porque depois vai se pagar. Paga-se, agora, dessa maneira.

    E eu dizia, na época, que não durariam os efeitos do Bolsa Família se...

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – ... não investíssemos para valer na educação e fizéssemos uma mudança estrutural. Eu dizia que ele não tirou da pobreza; manteve o pobre comendo – o que é bom em relação a não ter o que comer. Mas eu dizia: o Bolsa Família não se manterá em seus benefícios se não fizermos reformas estruturais como, por exemplo, na educação.

    Finalmente, sobre o Moreira, estou de acordo com o senhor. Quem criticou o Lula, a presidente Dilma, ao nomear o ex-presidente Lula para ministro, porque era para proteger o foro, tem que criticar agora a nomeação do Ministro Moreira Franco. Como não entrei nesse debate à época, talvez nem entre agora, mas estou tomando posição, estou de acordo com o senhor.

    Eu não vejo muita diferença, como tentaram mostrar, entre o foro privilegiado que quiseram dar para o Lula e, agora, o foro privilegiado que se quer dar para o Moreira Franco. Não vejo diferença. Como não vejo, quando, lá atrás, o presidente Lula deu status de ministro ao presidente do Banco Central, e eu critiquei aqui. Critiquei. E olha que eu tenho uma relação muito boa com o Meirelles, muito antes de ele ser ministro, muito antes de ele ser Presidente do Banco Central. E eu disse: o Presidente do Banco Central não pode ser ministro! Ministro defende a moeda da Pátria, não do Governo, mas, ao ser ministro, sentado à mesa com os ministros, ouvir o da Educação querendo mais dinheiro, ele vai terminar abrindo e imprimindo dinheiro.

    O Presidente do Banco Central está acima dos ministros. O Presidente Lula deu foro privilegiado ao Meirelles, porque havia a suspeita de que ele seria incriminado em algo que havia feito antes. Foi um erro? Eu denunciei. No caso do Lula, eu tinha outros debates a fazer, mas eu acho que quem criticou a nomeação que a Dilma fez do Presidente Lula tem que criticar agora a nomeação do Meirelles.

    Finalmente – e não vai dar tempo agora, mas valia a pena o debate, Senador –, estou de acordo com o senhor. E já digo isso aqui há anos: nós caminhamos para uma desagregação social, mas não é por culpa do Temer, não; é por culpa de erros muito maiores que estamos cometendo no Brasil há alguns anos ou talvez décadas. O que está acontecendo no País é uma desagregação, e por contribuições mútuas. Quando a Mesa do Senado não atendeu a uma determinação do Supremo em relação ao Presidente Renan, nós contribuímos para que não se respeitasse a Justiça. Quando um ministro diz que uma pessoa pode ser Presidente sem ter o foro, está desmoralizando a Constituição. Isso ajuda na desagregação. Quando a reforma da Previdência, necessária, não toca nos de cima, a PM reclama, não vai ao trabalho no Espírito Santo e morrem 140 pessoas em poucos dias, está se contribuindo para a desagregação. Estou de acordo.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Quando se afasta uma Presidente sem crime, está se contribuindo para a desagregação. Disse isso Joaquim Barbosa, pois, a partir disso, você criou uma instabilidade política tão grande, no País, que vale tudo.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Eu preferiria dizer outra coisa aí, porque eu votei por isso, porque houve crime. Pode dizer não foi muito, houve um crime de responsabilidade. Eu poderia dizer que foi – e aí assumo a minha parte – quando a gente destituiu a Presidente e diz que ela continua com os direitos civis, como o senhor também votou, e eu também. Pois eu fui olhar com cuidado, porque, naquela hora, estava aqui o Presidente do Supremo. Para mim, eu olhava para o Presidente do Supremo, e eu via a Constituição encarnada.

    A Constituição ali disse: é possível cassar o mandato e manter os direitos civis. Acho justo. Eu votei para cassar o mandato. Direitos civis quem cassa é o eleitor. Não somos nós. O eleitor tem direito de votar depois, mesmo que a gente tenha cassado. Mas ali a gente contribui também para desmoralizar a Constituição. A Constituição, aliás, ela própria, não é agregadora, é corporativa. Cria direitos, direitos e direitos sem criar deveres. Não há deveres na Constituição. O que agrega um povo são os deveres que cada pessoa tem com a Pátria e os direitos que recebe para justificar os deveres. Mas privilegiamos na Constituinte os direitos. Concorda, Senador Elmano? Estamos caminhando para um processo de desagregação. Quer ver maior sinal disso? Esta Casa devia estar reunida em caráter permanente, e só temos quatro aqui.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Devia ser em caráter permanente. Não vamos dizer quatro, não. Três, porque, como eu moro aqui, eu não mereço ser respeitado por estar aqui. Vocês três merecem. São três que estão aqui. Eu não mereço esta comemoração de estar aqui. É a minha casa. Eu moro em Brasília. Isso é prova de desagregação. Nós estamos caminhando para uma desagregação e, aparentemente, sem consciência dela. E aí talvez a gente só venha a aprender – e quero concluir, Senador Lindbergh, com isto aqui – pela catástrofe, pedagogia da catástrofe. Eu temo que, no final, a saída deste País – e eu vou lutar até o fim para que não seja por aí – termine sendo, Senador Ataídes, por duas coisas terríveis: autoritarismo e inflação. Eu temo que a saída de pagar a dívida termine sendo, mais uma vez, a inflação. A gente inflaciona, o dinheiro se desvaloriza. Aí todo o mundo acha que não perdeu direitos, porque continua recebendo os R$100, mas eles valem R$70, depois R$50. Segundo, que terminemos caindo em regimes autoritários. É preciso pensar se não estamos diante deste risco: inflação e autoritarismo, duas vertentes a que o Brasil recorre cada vez que fica perto da desagregação social como nós temos hoje. Ainda há tempo, mas aparentemente não estamos despertos para enfrentar esse desafio. Talvez o pior, Senador Elmano, seja que talvez não estejamos nós, os líderes de hoje, à altura da crise que o Brasil atravessa. E repito: eu disse "nós". Eu me incluo. Talvez nós não estejamos à altura e o povo, ao perceber isso, vai procurar fora de nós. E às vezes erra mais ainda.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – É isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/02/2017 - Página 82