Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Discordância com a decisão do Governador de Sergipe, Jackson Barreto, em privatizar a Companhia de Saneamento de Sergipe-Deso.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO ESTADUAL:
  • Discordância com a decisão do Governador de Sergipe, Jackson Barreto, em privatizar a Companhia de Saneamento de Sergipe-Deso.
Aparteantes
Gleisi Hoffmann.
Publicação
Publicação no DSF de 16/02/2017 - Página 21
Assunto
Outros > GOVERNO ESTADUAL
Indexação
  • DISCORDANCIA, DECISÃO, JACKSON BARRETO, GOVERNADOR, ESTADO DE SERGIPE (SE), REFERENCIA, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA DE SANEAMENTO.

    O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Obrigado, Presidente, Senador Cássio Cunha Lima, uma das legendas da política do Nordeste, da grande Paraíba.

    Subo a esta tribuna, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para relatar uma questão que tem sido motivo de grande preocupação em Sergipe e que envolve a companhia de saneamento, a Deso.

    O Governador do Estado, Jackson Barreto, quer privatizar, quer vender, a estatal. Os sergipanos estão receosos e acreditam que a concessão desse serviço público à iniciativa privada poderá acarretar prejuízos irreversíveis para o patrimônio do Estado, para a população usuária dos serviços e para os trabalhadores do setor: aumento de tarifas, uso eleitoral dos recursos advindos com a venda da empresa e desemprego.

    Todos sabemos do desafio que é promover a universalização do saneamento básico em nossos Estados e Municípios. Isso demanda investimentos vultosos, e estamos falando basicamente do conjunto de serviços, infraestrutura e instalações operacionais de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos, bem como drenagem e manejo das águas pluviais. A universalização desses serviços é um dos grandes desafios do Brasil.

    Sabemos também das dificuldades financeiras em que se encontram os entes federados, notadamente os Estados, que são, em geral, controladores das empresas de saneamento.

    Em meio à crise, a privatização de empresas estatais tem sido apresentada por alguns governos estaduais como solução para a melhoria da situação fiscal. É o caso do Rio de Janeiro, que optou por vender a Companhia Estadual de Águas e Esgoto (Cedae) e de Goiás, que entregará a sua distribuidora de energia elétrica (Celg). É o caso, também, do Governo do Estado de Sergipe, que se prepara para promover essa privatização.

    Em Sergipe, porém, é inadmissível que a privatização da Deso seja a estratégia escolhida pelo governo para fazer o ajuste das contas públicas. Uma gestão séria optaria, antes, pela redução do número de secretarias, de cargos comissionados, e promoveria o uso mais eficiente dos recursos públicos, antes de vender suas empresas.

     O que estamos vendo em Sergipe é justamente o contrário, e com um agravante, pois a redução de cargos não é um assunto que esteja no horizonte das preocupações do Governador Jackson Barreto. O que se vê é o uso da máquina do governo, que está sendo utilizada de forma despudorada para cooptar políticos como aliados.

    Não é à toa que a dívida de Sergipe já superou os R$6 bilhões. O Governo do Estado age sem responsabilidade. Os recursos que quer obter com a venda da Deso servirão apenas para cobrir o rombo que ele está criando nas contas públicas.

     Como eu já disse aqui em outro momento, Sergipe já recebeu empréstimos do Proredes, do Proinvest, recebeu mais de R$300 milhões da repatriação, já retirou dinheiro das contas judiciais, da previdência do Estado, e as contas públicas continuam caóticas. É um saco sem fundo. Já atrasou o salário do servidor público, o 13º salário, e agora vai prejudicar as famílias de trabalhadores da Deso.

    Há muito que a Deso vem sendo sucateada. Infelizmente, os trabalhadores da empresa não conseguem prestar um serviço melhor à população, porque não há investimentos na infraestrutura e nas unidades da companhia.

    Como bem lembrou o Senador Eduardo Amorim, na sessão de ontem, a dívida da Deso cresceu mais de 2.000% entre 2007 e 2014, um verdadeiro descalabro deste Governo Estadual.

    Como é possível conceber uma privatização vantajosa para o Estado nessas condições, com a dívida tão monstruosa, tão astronômica? Não existe essa possibilidade, assim como "não existe almoço grátis" – alguém sempre paga a conta. Com a privatização, já sabemos que a conta irá para quem? Para o povo sergipano.

    O governo de Sergipe deveria investir em uma melhor gestão, afinal não é concebível, por exemplo, que a empresa perca 50% da sua água tratada com vazamentos, nas suas estações, por falta de manutenção preventiva. Hoje, a empresa tem um faturamento de R$47 milhões, mas esse valor podia chegar a R$ 60 milhões, se trabalhar para evitar o desperdício, como afirmou o próprio Presidente do Sindisan.

    Vale lembrar que quem nomeia o gestor da Deso é o próprio Governador, ironicamente, o mesmo Governador que prometeu que não iria privatizar a Deso. Mas isso ele prometeu durante as eleições, Senador Romário, que está escutando o nosso discurso, e Senadora Gleisi, V. Exª que sempre se porta nesta Casa com espírito de justiça e ouve esse discurso de que uma empresa foi sucateada e agora está sendo vendida para desempregar milhares de trabalhadores e colocar a conta do aumento de tarifa à custa do sacrifício do povo sergipano.

    Agora, sem transparência e debate com a população do Estado, o governo conduz um processo de privatização que traz inúmeros riscos. O primeiro, a demissão de trabalhadores, justamente em um momento de grave crise. E são mais de 1,6 mil trabalhadores.

    Outro risco, Sr. Presidente, é o aumento da tarifa, pois o sucesso de uma privatização depende do modelo de estrutura tarifária que será usado bem como da existência de uma estrutura regulatória eficiente, capaz de acompanhar os custos do serviço, estabelecer padrões de qualidade, fiscalizar a empresa concessionária e planejar os investimentos necessários. Em Sergipe, porém, não temos clareza quanto a qualquer desses pontos.

    Os sergipanos tiveram uma experiência nefasta com a Empresa Energética de Sergipe (Energipe), que foi vendida e não trouxe nenhum benefício para o Estado, só o aumento de tarifa. Aliás, a privatização daquela empresa gerou um aumento em mais de 200% e não trouxe nenhum benefício para os consumidores.

    O aumento da conta de água prejudicará a industrialização do interior do Estado, pois a Deso atende a mais de 50 pequenas e médias fábricas de derivados de leite que, somados, processam mais de 500 mil litros de leite por dia. Para cada litro de leite processado, são necessários três litros de água tratada. Dessa forma, a produção será inviabilizada, gerando desemprego, inclusive para o pequeno produtor de leite, que já não terá a indústria para comprar sua produção.

    Além disso, a privatização pode representar o fim da tarifa social para milhares de pessoas. A empresa é responsável por abastecer uma população de dois milhões de habitantes e, desses, milhares dependem da tarifa social para terem acesso.

    A população é contra, os trabalhadores da própria empresa e do setor também. Em entrevista, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Sergipe, o Sérgio Passos, do Sindisan, declarou que é contra a privatização, baseado na visão de grandes especialistas, segundo os quais "a próxima guerra mundial não será por petróleo e sim por água".

    A situação, portanto, Sr. Presidente, é muito grave.

    E quero dizer o seguinte: apesar do incentivo que está sendo concedido pelo Governo Federal e pelo próprio BNDES para a venda das estatais de saneamento, nenhum Estado é obrigado a fazê-lo. O Governo Federal não pode obrigar, não pode, por decreto, determinar que o Estado de Sergipe venda a sua empresa de saneamento.

    O que nós temos que fazer é dar apoio total a essa empresa, para que os investimentos sejam realizados com recursos...

(Soa a campainha.)

    O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) – ... do próprio BNDES em favor da melhoria dos recursos hídricos no Estado de Sergipe e do esgotamento sanitário de muitas cidades que se encontram ainda em situação deficitária em relação a isso, prejudicando a saúde dos sergipanos.

    Senador Gleisi Hoffmann, é com muito prazer que ouço V. Exª.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Agradeço a concessão do aparte, Senador Valadares. Eu não podia deixar de comentar, ao ensejo do discurso feito por V. Exª, a situação de dificuldade por que passam os Estados brasileiros. Nós temos Estados que estão com as finanças praticamente no chão e não têm condições de pagar sequer a folha de pessoal, como é o caso do Rio de Janeiro. O próprio Espírito Santo, que fez um ajuste imenso nas suas contas públicas, mostrando austeridade, deixou de dar aumento e reposição salarial, e quem pagou essa conta foi a população por não ter os serviços da área de segurança. V. Exª traz aqui uma situação muito grave para os nossos Estados e para a nossa população. Quer dizer, num momento de crise, o que o Governo Federal oferta para os Estados não é um auxílio, mas uma determinação de vender o seu patrimônio, para que cubra os seus problemas financeiros. Isso é um verdadeiro absurdo. Quer dizer, não é assim que nós vamos tirar o Brasil da crise, com essa política de austeridade, de austericídio em nome não sabemos bem do quê. O Governo Federal, para pagamento de dívidas e de juros – e isso vai caindo como efeito cascata nos Estados –, está sucateando os Estados, os Municípios e está deixando as pessoas, a população sem a prestação de serviços tão essenciais. O que V. Exª coloca aqui sobre a companhia de água e saneamento de Sergipe é muito grave. Eles não podem colocar para a população pagar uma conta, aumentando a taxa que as pessoas têm que pagar para utilizar esse serviço que é fundamental à vida. Então, eu queria parabenizá-lo pelo seu discurso e dizer que nós estamos aqui sempre muito alertas a essa política.

(Soa a campainha.)

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Temos que enfrentar isso e vamos começar de novo com uma outra discussão que também vai ser perversa para o Brasil e que está nessa mesma linha da austeridade, que é a reforma da previdência. Tenho certeza de que V. Exª vai estar conosco nessa discussão no plenário e na Casa. Parabéns pelo seu pronunciamento!

    O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) – Agradeço a V. Exª o seu aparte e incorporo suas palavras ao discurso que ora faço nesta sessão.

    Contrariando o pensamento do Governo do Estado, eu me posiciono contra a privatização da Deso e tenho certeza absoluta de que o seu parecer, a sua opinião será levada em conta lá em Sergipe, porque a sua palavra, lá em Sergipe, também tem valor pela grande Senadora que V. Exª é do Partido dos Trabalhadores. Agradeço a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/02/2017 - Página 21