Discurso durante a 12ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao monopólio existente nos direitos de transmissão de jogos de futebol e ao cancelamento da partida entre Atlético Paranaense e Coritiba devido ao impedimento da transmissão nos canais oficiais dos times, através do YouTube e do Facebook.

Crítica ao desmonte da indústria nacional, com ênfase ao cancelamento da prioridade da utilização de materiais do polo naval nacional nas concessões de exploração de petróeo e gás.

Críticas ao Governo Federal pela devolução de cem bilhões de reais do BNDES para o caixa do Tesouro Nacional, em prejuízo da produção e do desenvolvimento nacional, e da proposta de liberar o FGTS para a aquisição de imóveis para as classes média e alta.

Crítica à entrega de bens públicos para empresas de telefonia, sob a justificativa de aumento da internet de banda larga, e à proposta de antecipação das renovações das concessões de exploração de serviços públicos.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO:
  • Críticas ao monopólio existente nos direitos de transmissão de jogos de futebol e ao cancelamento da partida entre Atlético Paranaense e Coritiba devido ao impedimento da transmissão nos canais oficiais dos times, através do YouTube e do Facebook.
ECONOMIA:
  • Crítica ao desmonte da indústria nacional, com ênfase ao cancelamento da prioridade da utilização de materiais do polo naval nacional nas concessões de exploração de petróeo e gás.
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao Governo Federal pela devolução de cem bilhões de reais do BNDES para o caixa do Tesouro Nacional, em prejuízo da produção e do desenvolvimento nacional, e da proposta de liberar o FGTS para a aquisição de imóveis para as classes média e alta.
TELECOMUNICAÇÃO:
  • Crítica à entrega de bens públicos para empresas de telefonia, sob a justificativa de aumento da internet de banda larga, e à proposta de antecipação das renovações das concessões de exploração de serviços públicos.
Publicação
Publicação no DSF de 21/02/2017 - Página 7
Assuntos
Outros > TELECOMUNICAÇÃO
Outros > ECONOMIA
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, MONOPOLIO, DIREITOS, TRANSMISSÃO, TELEVISÃO, COMPETIÇÃO ESPORTIVA, FUTEBOL, PAIS, COMENTARIO, CANCELAMENTO, EVENTO, LOCAL, ESTADO DO PARANA (PR), MOTIVO, TENTATIVA, DIVULGAÇÃO, INTERNET, DEFESA, ESCOLHA, OPÇÃO, ELOGIO, DECISÃO, TIME.
  • CRITICA, DESMONTAGEM, INDUSTRIA NACIONAL, ENFASE, CANCELAMENTO, EXIGENCIA, UTILIZAÇÃO, PRODUTO NACIONAL, VINCULAÇÃO, CONTRATO, CONCESSÃO, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, GAS NATURAL.
  • CRITICA, DEVOLUÇÃO, IMPORTANCIA, VALOR, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), DESTINO, TESOURO NACIONAL, PREJUIZO, INVESTIMENTO, EMPRESA, MERCADO, PRODUÇÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, DESAPROVAÇÃO, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, LIBERAÇÃO, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), FINANCIAMENTO, AQUISIÇÃO, IMOVEL, DESTINAÇÃO, CLASSE ECONOMICA, RIQUEZA (SC).
  • CRITICA, ENTREGA, BENS, PATRIMONIO PUBLICO, DESTINAÇÃO, GRUPO, EMPRESA, TELECOMUNICAÇÃO, JUSTIFICAÇÃO, AUMENTO, INTERNET, BANDA LARGA, DESAPROVAÇÃO, PROPOSTA, ANTECIPAÇÃO, RENOVAÇÃO, CONCESSÃO, EXPLORAÇÃO, SERVIÇO PUBLICO.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos acompanha pela TV Senado e também pela Rádio Senado e pelas redes sociais, eu subo a esta tribuna para falar de um tema que penso que nunca falei aqui: para falar de futebol, a paixão nacional. E falo de futebol exatamente porque meu Estado, o Estado do Paraná, com seus dois grandes clubes, o Atlético Paranaense e o Coritiba Foot Ball Club, está no centro das atenções hoje, na imprensa nacional, pelo ocorrido ontem, num jogo que seria um jogo clássico nosso, o chamado Atletiba, que acabou por não se realizar.

    Foi um momento histórico na capital do meu Estado, Senador, em Curitiba. É o maior clássico do futebol paranaense, o Atletiba, que envolve as duas maiores equipes de futebol do Estado, o Atlético Paranaense e o Coritiba. E não aconteceu porque, segundo matérias que estão sendo divulgadas por jornalistas, a RPC, Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Rede Globo de Televisão, em conjunto com a Federação Paranaense de Futebol, não quiseram que acontecesse, apesar de estarem presentes no estádio e prontas para jogar as duas equipes e também milhares de torcedores e espectadores.

    Depois de 45 minutos de espera, o estádio com muitos torcedores e milhares de telespectadores aguardando a transmissão dos jogos pelo YouTube e pelo Facebook, a Federação Paranaense de Futebol resolveu suspender a realização do jogo – estava tudo pronto para ser jogado –, ao que tudo indica, atuando como um braço operacional de uma rede de televisão lá do meu Estado que é afiliada da Rede Globo, defendendo seu interesse de manter o monopólio das transmissões do campeonato estadual e contrariando os interesses de seus maiores associados. Ou seja, a Federação, ao invés de defender os clubes, foi contra eles, contradisse o interesse do Atlético Paranaense e do Coritiba.

    Para melhor ilustrar a situação, Presidente, passo a ler a nota publicada pelos dois clubes explicando o ocorrido.

O Coritiba Foot Ball Club e o Clube Atlético Paranaense informam que o clássico deste domingo (19), no Estádio Atlético Paranaense, não foi realizado devido à decisão da Federação Paranaense de Futebol de não autorizar o início da partida com a transmissão dos clubes em seus canais oficiais, no Facebook e YouTube, contrariando os interesses de seus afiliados CAP e CFC.

Os clubes lembram que a ação pioneira foi realizada, pois as duas equipes não venderam os direitos de transmissão de seus jogos no Campeonato Paranaense, por não concordarem com os valores oferecidos.

    Não quiseram vender para a Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Globo, o direito de transmitir o jogo. Não concordaram com o preço. Esse é um direito dos clubes.

Diante da posição arbitrária e sem qualquer razoabilidade da Federação Paranaense de Futebol, os clubes lamentam o prejuízo causado ao futebol paranaense, em especial aos seus torcedores.

    Aliás, ontem seria a primeira vez que nós, paranaenses, poderíamos assistir daqui, de Brasília, a um Atletiba, porque sempre passa só para o Estado do Paraná, para Curitiba. Nós já estávamos prontos para assistir ao jogo no Facebook e no YouTube e acabamos não conseguindo.

    Mas, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, apesar do desserviço prestado ao futebol do Estado pela própria Federação Paranaense, que deveria estar lá para defender os clubes, as imagens de ontem da Arena da Baixada devem servir de exemplo e orgulho para todos os paranaenses e brasileiros que viram os dois clubes, seus atletas, suas comissões técnicas e diretorias juntos, de mãos dadas, literalmente, resistindo ao monopólio...

    Eu queria mostrar esta foto aqui porque a acho muito bonita. É uma foto da Agência Gazeta do Povo. Ela foi veiculada nas redes sociais, eu a veiculei no meu Face, uma imagem bonita. Esses jogadores foram muito aplaudidos pelos torcedores presentes. Foram muito aplaudidos. Eles fizeram um círculo no campo, mostrando que estavam unidos com a torcida, que aplaudiu, e, por informações de jornalistas locais, os que saíram muito vaiados foram a Federação e a RPC, retransmissora da Globo, o que não surpreende.

    Diz o Diretor de Marketing do Atlético Paranaense: “Eu queria explicar para as duas torcidas. Atlético e Coritiba não venderam seus direitos por essa esmola que a RPC e a TV Globo quiseram nos pagar. É um direito nosso”.

    Pois é, parece que para a Federação Paranaense, que deveria ser a primeira a defender seus clubes, e para a RPC não é um direito dos clubes paranaenses decidir sobre a transmissão de suas partidas.

    Muito bem falou hoje o jornalista Juca Kfouri sobre o tema:

É direito da TV achar que o jogo vale menos do que os clubes querem?

É. [É um direito dela achar que vale menos.]

E é direito dos clubes fazerem o que bem entenderem com os jogos que não venderam para a TV?

Sem dúvida, também é.

    Se não querem vender para a TV, podem passar nas redes sociais, nos canais disponíveis nas redes sociais e que são mais democráticos, dão maior acesso.

    Ontem à noite, em contato telefônico com o Programa Bate-Bola do Canal ESPN Brasil, o presidente da federação, Hélio Cury, afirmou que o motivo da suspensão do jogo tinha sido a presença de cerca de uma dúzia de jornalistas não credenciados com 48h de antecedência pela federação no gramado da Arena da Baixada, o que, convenhamos, é algo inaceitável para justificar a não realização de um jogo dessa magnitude, com tantos presentes e com uma expectativa muito grande de audiência.

    Será realmente que não era possível solucionar essa pequena questão dos jornalistas e permitir a realização do jogo com a transmissão escolhida pelos dois clubes? Por que não? Não era só retirar os jornalistas? Atrasava um pouco, mas ia continuar, o jogo iria continuar, e o Facebook e o YouTube iriam mostrar.

    Na mesma conversa, entretanto, o presidente Hélio Cury, ao responder a questionamentos dos jornalistas do programa, afirmou que, para os próximos jogos, se as questões de credenciamento forem tratadas em tempo hábil, não haverá mais problemas por parte da federação. Veremos. Espero realmente que isso aconteça e que os clubes mantenham a sua disposição de democratizar a transmissão de seus jogos, quebrando, portanto, um monopólio de informação.

    O Atletiba de ontem poderia marcar o início de uma revolução no futebol brasileiro, com a primeira transmissão pelo YouTube de uma partida dessa magnitude. Infelizmente, por determinação da Federação Paranaense de Futebol, por motivo fútil e de interesse econômico, o jogo foi suspenso. Ou seja, em vez de termos uma transmissão histórica, democrática, autônoma e independente, que poderia conferir mais poder para os clubes do País, tivemos mais uma demonstração da força e do domínio do monopólio das comunicações no futebol nacional e de sua cartolagem.

    Episódios como esse demonstram o quanto a vontade e as opiniões de tevês, principalmente a Globo, valem neste País, quando a simples tentativa de dois clubes do Paraná de buscar alternativas mais rentáveis e democráticas para a transmissão de seus jogos é deliberadamente e descaradamente impedida de forma tão truculenta e absurda.

    Uma empresa não pode ser dona de tudo, dona do futebol, dona das transmissões esportivas em geral, dona do Carnaval, dona da informação e dona da verdade – e ai de alguém que tente desafiá-la! O Atlético Paranaense e o Coritiba sabem bem disso. Se não transmite com a tevê, como a Globo quer, não transmite – foi o que aconteceu ontem.

    Quem neste País que acompanha futebol não sabe que os principais jogos de meio de semana, quando é mais difícil para os espectadores irem ao estádio pois trabalham no dia seguinte, são iniciados por volta das 22h, bem tarde, justamente para não atrapalhar o horário das novelas? Então por que não se libera para outros canais, para as redes sociais? Democratiza, as pessoas assistem quando quiserem. Se quiserem assistir a novela, assistem, se quiserem assistir ao futebol, assistem. É disso que nós precisamos. Nós temos que ter democracia nos meios de comunicação. As pessoas têm que poder optar pelo que querem ver.

    O Atletiba que não ocorreu entra para a história como demonstração do poder de alguns poucos que se contrapõem ao interesse de centenas de milhares. Ontem o Paraná seria mais uma vez vanguarda ao inaugurar no País a transmissão via internet de grandes jogos nacionais, mas a força do monopólio de comunicação prevaleceu. Espero que tenha sido apenas um breve adiamento e que, logo, nós, torcedores do futebol paranaense, possamos nos orgulhar de mais essa conquista, que seguramente trará mais autonomia para nossos clubes, mais acesso às transmissões para nossos torcedores e mais democracia na comunicação em geral do País.

    Ontem pode ter sido um primeiro grande passo para a mudança. Saúdo a coragem dos clubes paranaenses e espero que se mantenham unidos e firmes, pois restou claro que a torcida está com eles. Parabéns aos jogadores que entraram em campo, ouviram o hino, foram para suas posições – mas não tocaram na bola. Parabéns à torcida, aos cerca de 20 mil fãs, que, segundo jornalistas presentes ao estádio, aplaudiu e vaiou – aplaudiu os jogadores, que se deram as mãos em círculo ao sair de campo, e vaiou a federação e a RPC/Globo.

    No Twitter, a hashtag #Atletiba ferveu na noite de ontem. A esmagadora maioria dos internautas elogiava entusiasmadamente a atitude dos times.

    Ao encerrar, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, ressalto como inadmissível o comportamento da federação, entidade-meio que deveria estar a serviço dos clubes e que jamais poderia extrapolar suas funções defendendo os interesses de terceiros. Aliás, eu pergunto: para que existem as federações de futebol? Gostaria muito de saber.

    Sou da opinião, Presidente Reguffe, de que o futebol brasileiro, que é um patrimônio do nosso País e do nosso povo, precisa ser reorganizado, e o Congresso Nacional, nós desta Casa, podemos ajudar nisso, até porque, se depender dessas entidades carcomidas que há décadas se adonaram do futebol, nada vai mudar e continuaremos enfrentando vexames como esse que se consumou nesse último domingo no Paraná.

    Estou convencida de que a organização dos campeonatos estaduais e nacional deve ser feita por ligas independentes dos clubes – não precisa de federações, mas de ligas independentes dos clubes –, ficando a CBF, a Confederação, com a função de cuidar apenas da Seleção Brasileira. Assim, quem organizaria tudo, inclusive as transmissões de rádio e tevê, seriam os próprios clubes, tirando esse poder desmedido e usurpado das mãos dessas federações, que são intermediárias. No que elas contribuem para o futebol local? São os clubes, que dão duro formando os jogadores, que devem organizar os campeonatos.

    Eu pretendo estudar mais essa questão, Senador Reguffe. Essa situação que ocorreu ontem no meu Estado me despertou para essa matéria. Acho que, como o futebol é algo que mexe com os corações e com as mentes da população brasileira, precisamos prestar atenção em como está sendo tratado, principalmente no que se refere à democratização e ao acesso das pessoas aos jogos, à possibilidade de poderem se divertir.

    Eu vou conhecer melhor os projetos que existem nesta Casa e na Câmara dos Deputados para ajudar a melhorar essa organização, ajudar a valorizar os clubes, os jogadores e garantir que os torcedores tenham o melhor retorno pelo entusiasmo e até pelo amor com que se envolvem e se dedicam a fortalecer os clubes de seus corações e que ficam tão frustrados quando eventos como o de ontem acontecem.

    Tinha até pensado em convidar a Federação Paranaense de Futebol para vir se explicar nesta Casa, mas acho que não vale a pena, Senador Reguffe. Acho que o que nós temos que fazer é estudar os projetos que estão aqui, temos que nos debruçarmos sobre esse tema e regulamentá-lo de forma diferente. Concordo que a democratização tem que ser um item importantíssimo nessa discussão. As ligas independentes podem fazer um bom trabalho pelo futebol brasileiro.

    A democracia no Brasil vive um momento de enorme dificuldade. Atentados ao Estado de direito e às liberdades e garantias repetem-se com gravíssima frequência. O que aconteceu em Curitiba é uma demonstração clara dos tempos difíceis que vivemos, quando contrariar os interesses dos grandes não é permitido.

    Se algo tão simples quanto à escolha de dois grandes clubes de futebol em relação aos seus direitos de transmissão não é respeitado, imaginem o que acontece com quem ousa divergir dos interesses diretos desses grupos.

    Que sirva de exemplo para o Brasil o Atletiba que não aconteceu como demonstração de quão essencial é assegurar a democratização da comunicação, o acesso à internet e tudo mais que possa verdadeiramente fortalecer a nossa democracia e, nesse caso, fortalecer nosso futebol.

    Eu sou atleticana, torcedora do Clube Atlético Paranaense, mas agora, Senador Reguffe, estou atletibana, porque estou aqui sentindo muito orgulho dos times que ontem fizeram essa bela intervenção na Arena da Baixada lá na minha cidade. Parabéns ao Atlético, parabéns ao Coritiba. Vocês orgulham muito os paranaenses, os torcedores paranaenses.

    E não podia terminar aqui, Senador Reguffe, utilizando o tempo que me resta, sem fazer duas colocações que eu acho de extrema importância.

    Na sexta-feira o Senador Paim e eu discutimos aqui, por muito tempo, o fortalecimento da indústria nacional, em especial através do conteúdo nacional de produção. O Senador Paim falava aqui do polo naval do Rio Grande do Sul, que está sendo desmontado, porque as concessões de petróleo e gás não estão mais priorizando o conteúdo nacional. Isso está acabando com as empresas que servem de fornecedoras de materiais e também desempregando muitas pessoas, algo que a gente já tinha conseguido superar aqui no País. Eu fiz um pronunciamento também lamentando isso.

    E eis que esse tema continua na imprensa. Hoje nós temos, no jornal Valor Econômico, uma matéria que vem apenas confirmar o que nós falávamos, na sexta-feira, de desmonte da indústria nacional.

    O BNDES é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, é um banco de fomento. Ele existe no Brasil, como em diversos outros países, para quê? Para fomentar, para dar dinheiro, fazer operações de crédito com recursos mais baratos, com juros mais baixos – senão você não desenvolve a indústria nacional, senão você não tem investimento. Você tem que ter prazo longo para as operações de crédito e juros mais baratos, o que o mercado financeiro não faz. Via de regra, o mercado financeiro coloca altos juros e prazo mais curto. Então, o BNDES tem essa função.

    Bom, nós já tivemos, no ano passado, a devolução por parte do BNDES de R$100 bilhões para o caixa do Tesouro para pagar dívida e juros – R$100 bilhões que, no momento de crise que vivemos, poderiam ter sido colocados no mercado exatamente para financiar as nossas empresas e financiar o investimento. Nós esterilizamos esse dinheiro, nós o mandamos para pagar juros.

    Bom, agora saiu a notícia de que, mesmo com essa devolução ao Tesouro Nacional de R$ 100 bilhões em dezembro, o caixa do BNDES cresceu nos últimos meses e supera os R$100 bilhões. Ou seja, o BNDES tem em caixa R$100 bilhões e não está emprestando para o sistema produtivo, nem para a indústria, nem para fazer investimento, está com esse dinheiro entesourado. Esperando o quê? Dizem eles que esperando as concessões, esperando as oportunidades para financiar os investimentos.

    Ora, se tenho um dinheiro parado e posso fazer com que esse dinheiro chegue mais barato às mãos de quem produz para que a economia retome seu crescimento, eu tenho que fazer isso acontecer, eu não posso esperar. A nossa economia está no chão, nós não temos economia.

    Aliás, ficam se vangloriando de que a inflação caiu. A inflação caiu porque a economia está no chão, nós temos uma recessão. Ou seja, para curar a doença, mataram o paciente.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Não é possível que a gente continue vendo notícias como essa e o Governo na defensiva.

    E aqui é importante dizer que, agora, os empresários estão batendo no Governo. Por exemplo, o presidente da Abiplast, que é uma entidade que representa a indústria do plástico, que também esteve nos manifestos pelo impeachment da Presidenta Dilma, que também queria tirar a Presidenta Dilma, está agora dizendo que o BNDES é o ponto fora da curva, que é consenso no empresariado a reclamação sobre o BNDES, que ele está travado, que o banco está sentado em cima do dinheiro e até devolveu recursos para o Tesouro no ano passado. Nós alertamos para isso, nós falamos que o BNDES ia se tornar um instrumento na mão de um governo que privilegia o mercado financeiro e não a produção do País, não o desenvolvimento nacional.

    Aliás, seria muito mais franco por parte do Governo, muito mais legítimo, muito mais sério, se ele viesse a público e dissesse: "Nós vamos acabar com o BNDES". De que adianta ter um banco de fomento que não faz fomento? Para que vai adiantar o BNDES? Será que é só para fazer as privatizações?

    Aí quero entrar em outro tema que é muito grave e que também foi manchete de um dos jornais brasileiros no final de semana, a Folha de S.Paulo: o Governo prepara um pacote de investimentos, inclusive incentivos – deve ser para isso que vai usar o dinheiro do BNDES –, para que sejam aplicados R$371 bilhões no Brasil nos próximos anos.

    Mas vejam: qual é a linha dos investimentos do Governo? Aí vocês vão me responder se não é um governo dos ricos, para os ricos e pelos ricos e atrelado ao interesse estrangeiro. Uma das primeiras propostas do Governo para fomentar o mercado imobiliário é liberar o FGTS para a aquisição de imóveis de R$1,5 milhão – R$1,5 milhão! O FGTS para poder financiar o Minha Casa Minha Vida, faixa 1, que foi o que efetivamente fez o mercado de construção e imobiliário se desenvolver, empregar gente, e a população mais pobre ter direito a casa, não pode. Isso não pode. Nós não vamos fazer isso com o FGTS – o Governo não vai fazer a operação. Mas passar para os bancos para financiar imóvel de R$1,5 milhão pode. Isso não é para rico? Para quem é? Quem pode comprar hoje imóvel de R$1,5 milhão? A classe média, a classe média alta, ricos neste País. Pobre não compra imóvel de R$1,5 milhão. Mas o FGTS, que é o fundo de garantia dos trabalhadores, vai para isso.

    A outra coisa é sobre o Minha Casa, Minha Vida. Anunciaram com pompa e circunstância que o Minha Casa, Minha Vida seria reformulado e que iria ajudar no desenvolvimento também da economia, no crescimento econômico. Sabe o que que eles fizeram? Estão privilegiando liberar dinheiro para aquelas famílias adquirirem casa, aquelas famílias que têm faixa de renda de R$9 mil – entre R$6 mil e R$9 mil.

    Quem tem entre R$6 mil e R$9 mil, que é a classe média brasileira, numa situação de aperto, se estiver empregada, não vai se lançar a comprar casa, não vai fazer um empréstimo, até porque o juro aqui não é o juro subsidiado. E quem está empregado, quem está bem... Quem está desempregado não compra, e quem está empregado vai guardar o dinheiro.

    Então, é óbvio que é para não funcionar esse programa e é óbvio que ele é direcionado para quem mais tem na sociedade. Esse Governo tem lado, e é claro o lado que esse Governo tem.

    A outra coisa interessante que eu acabei de falar é a diminuição de conteúdo nacional. Sabe por quê, Senador Reguffe? Eles estão dizendo o seguinte: para agilizar os leilões, a concessão de petróleo, dos postos de petróleo, eles têm que abrir mão do conteúdo local, porque é mais demorado, torna mais complexo, então eles podem importar.

    Essa gente está ficando louca. Nós vamos fazer concessão agora de campo do pré-sal? E nós vamos importar? Nós estamos fazendo plataforma na China, as plataformas que o Lula tinha internalizado. Nós estávamos fazendo plataforma aqui em vários Estados – Rio Grande do Sul, Pernambuco, Espírito Santo. Fecharam! Fecharam! Essa indústria naval está fechada. Agora, nós estamos fazendo plataforma na China e em Singapura. É bom, porque os chineses precisam do emprego, não é?

    Então, os brasileiros... Não estão nem aí, são números para o Governo. O problema é fazer com que o setor empresarial, os investidores tenham o seu dinheiro, os seus investimentos com uma rentabilidade maior e mais rápida. Isso é um acinte ao desenvolvimento nacional, a um projeto de nação.

    A outra coisa é a venda de terras para estrangeiros. Essa, então, é a melhor que nós temos.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Eles dizem que têm condições de injetar no País, para investimentos, R$71 bilhões vendendo terra para estrangeiro. Qual é o país que vende terra para estrangeiro? Eu gostaria de saber. Os americanos vendem? Os chineses vendem? As grandes nações vendem? Claro que não! Claro que não! Terra é soberania. Ainda mais num país como o nosso, que é provedor de alimentos do mundo, que é o maior fornecedor, um dos maiores fornecedores de alimentos do mundo.

    Para quem que nós vamos vender terra? Ora, tenham vergonha de fazer uma proposta como essa. Sejam menos entreguistas, gente. É muito feio o que vocês estão fazendo. É feio, horroroso, entregar o País desse jeito. Dar emprego na China, dar emprego em Singapura, vender as nossas terras para as grandes corporações? Aí, nós vamos ter as grandes corporações plantando aqui. Vai ser ótimo, porque nossos agricultores vão fazer o quê? Não vão mais plantar? Vão viver de renda também, do mercado financeiro?

    Outra coisa que eles colocaram no pacote...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Eu peço só mais cinco minutos, Senador, só para eu encerrar esta fala, porque eu acho muito relevante para que a gente debata nesta Casa, que é a Casa da Federação.

    A outra proposta, Senador Reguffe, é a entrega dos bens das teles para aumentar a banda larga. Está no jornal de sábado. Eles contam com isso. Isso não foi votado aqui. Foi objeto de uma ação judicial no Supremo. O Supremo mandou devolver o autógrafo que esta Casa tinha mandado, que o ex-Presidente Renan tinha mandado para o Presidente Michel Temer para assinar, aquela medida provisória, que virou projeto, para vender – para entregar, não é vender –, para entregar o patrimônio da comunicação, das telecomunicações às teles, esse patrimônio que deveria ser devolvido à Nação brasileira – devolvido. Eles estão dando.

    Aí eles dizem o seguinte: mas nós vamos dar, e queremos aumentar o investimento em banda larga. Só que eles estão fazendo um programa restritivo de banda larga. Estão fazendo um programa de incentivo à banda larga nas regiões economicamente viáveis. É isso que está acontecendo.

    Gente, é tudo negócio. Não é possível. É negócio em cima de negócio. Acho que há alguém lá dentro do Palácio do Planalto, da Casa Civil só para ver qual é o negócio que dá mais rentabilidade aos setores que já ganham dinheiro neste País, que eles tão bem estão representando. É negócio em cima de negócio.

    E aí também eles querem a antecipação das renovações das concessões, coisa que somos contra. Eu era Ministra da Presidenta Dilma, nós fomos contra antecipar renovação de concessão. Por que fomos contra antecipar? Porque a antecipação de uma renovação de concessão é um direito de quem está fazendo a concessão, é um direito do Poder Público. Portanto, se o Poder Público avaliar que aquela empresa não está utilizando seu tempo de concessão, para fazer os investimentos que precisa, por exemplo, numa estrada, num porto, um investimento na área de energia, o Governo pode dizer assim: "Olha, nós não queremos mais renovar e vamos licitar".

    Muitas vezes, você reduz a tarifa e aumenta a contraprestação que a empresa tem para com a União, para com o Estado, beneficiando, assim, o serviço público. Não, eles querem, cinco, seis, sete anos antes, antecipar, dizendo que as empresas param de investir. As empresas param de investir, porque não há fiscalização. Com um Governo como o de vocês, só têm que parar de investir: vocês não fiscalizam, vão lá e negociam com as empresas. Vocês tiraram toda a parte de cobrança das empresas sobre investimentos.

    Nós fizemos um marco novo de concessões neste País. Criticaram, mas as concessões que ficaram de pé até agora e que estão sendo melhores para o povo brasileiro são as últimas que nós fizemos, de rodovias, neste País. E, se houve problema financeiro, foi porque o BNDES não cumpriu com o acordo que nós fizemos, dizendo que não podia emprestar dinheiro para as empreiteiras que estavam na Lava Jato. Ou seja, em vez de punir os responsáveis das empreiteiras, os políticos, quem quer que seja, eles estão punindo a empresa, que dá emprego, que faz investimento.

    Essa gente é sem noção. Não é possível que o País esteja na mão de gente tão atrasada assim.

    E, por último, a pérola: eles querem também mudança na Lei dos Portos. Sabe o que querem fazer? Querem renovar os contratos anteriores a 1993. Isso é um acinte. Não é possível que a gente deixe fazer isso.

    Esta Casa debateu, a Câmara debateu. Nós fizemos um novo marco regulatório dos portos. Acompanhei isso de perto. Não é possível renovar os contratos de 1993, gente que não investe, que não tem competitividade, que quer ficar com um direito que não é seu, fazendo com que os portos brasileiros sejam ineficientes.

    Aliás, nós melhoramos muito os portos depois da Lei de Portos e depois das novas concessões e também da abertura dos terminais autônomos.

    Hoje os senhores ouvem falar, por exemplo, de crise nos portos? Como não ouvem falar de crise nos aeroportos. Quantos pronunciamentos há aqui dizendo que há fila no Porto de Santos, que não estamos conseguindo escoar a produção, que a nossa soja e o nosso milho estão parados, que estamos com dificuldade? Acabou. Acabou.

    E nós dizíamos, naquela época: vai acabar, porque o modelo que nós estamos preparando é um modelo que traz competitividade, redução de custos, mais rapidez. Ele não lidou só com as concessões dos terminais, só com a liberação dos terminais autônomos, lidou com uma série de regramentos que ia desde taxas da Marinha Mercante até outras situações que envolviam a Receita Federal, a Polícia Federal, o trabalho organizado desses órgãos nos portos.

    Hoje nós conseguimos ter um trabalho nos portos que melhorou muito e abrimos muitos terminais de uso privado nas regiões Norte e Nordeste do País. Quer dizer, a produção de Mato Grosso, a produção do Centro-Oeste, a produção do Matopiba não precisa descer para Santos para ser escoada, pode sair por cima, pelo Norte do País. Foi isso que nós fizemos.

    Não, mas eles querem mexer nessa legislação, para voltar ao que era, para voltarem os lobbies, para voltarem aquelas empresas que concentraram e que deixaram a competitividade do País no chão.

    Acorda Brasil! Acorda!

    Este Governo está entregando o País. Este Governo está desmontando o que nós construímos ao longo dos últimos 30 anos e, mais especificamente, nos governos do Presidente Lula e da Presidenta Dilma. Não é possível que a gente olhe tudo isso e ache que nada está acontecendo.

    Eu queria fazer esse alerta, porque é dever desta Casa. Se nós não resgatarmos um modelo de desenvolvimento nacional, nós não seremos uma Nação soberana. Vamos ser um País de quinta, como talvez hoje está o México, que tem que se ajoelhar para os Estados Unidos.

    Eu espero até que o México se recoloque nesse cenário internacional de melhor forma. Já vi que vão fazer uma articulação com o Mercosul.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Acho que está na hora de fortalecemos o Mercosul, coisa que também o Itamaraty estava querendo acabar, dizendo que não servia para nada.

    Um país só se desenvolve se tiver indústria forte, se tiver trabalho para o seu povo, se tiver programas de desenvolvimento social. Do jeito que eles estão querendo não se desenvolve. Nós vamos colocar o País no chão.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Muito obrigado, Senadora Gleisi Hoffmann.

    Com relação à questão das teles, eu concordo com V. Exª. É um projeto que foi aprovado numa comissão desta Casa, ao apagar das luzes do ano passado, sem uma discussão no Plenário desta Casa. Por isso, eu fiz questão de assinar o recurso para que o projeto tivesse que vir ao Plenário e não fosse direto à sanção presidencial.

    Assinei junto da bancada de oposição para que o projeto fosse debatido também pelo Plenário, porque não posso concordar com essa questão de um projeto ser aprovado na comissão e, sem passar pelo plenário, já ir à sanção presidencial.

    Com relação à questão do futebol, que V. Exª colocou, é importante lembrar, dando mais um argumento para V. Exª, que ninguém torce por federação. As pessoas torcem pelos times, pelos clubes de futebol; as pessoas não torcem pelas federações. O que as federações fazem hoje é serem meio gigolôs dos clubes, obrigam que os clubes tenham o tempo todo que pagar pedágio.

    E quero dar um argumento também para V. Exª, que diz que vai entrar nesse tema. O Flamengo, para vir jogar aqui em Brasília, tem que dar 15% da renda para as federações. Porque, normalmente, quando ele joga no Rio, a Federação do Rio já cobra 5% da renda para ela. Quando o Flamengo joga fora do Rio, a Federação exige os 5% e mais 5%, então exige 10% da renda que o Flamengo tem que dar para ela. E quando joga fora do Rio, tem que dar mais 5% para a federação local.

    Então, para o Flamengo vir jogar em Brasília, ele tem que dar 10% para a Federação do Rio e mais 5% para a Federação de Brasília. E ninguém torce...

    Muitas vezes, essas federações, essas confederações sugam o dinheiro, que, sem a prestação de contas devida, ninguém sabe para onde vai. Utilizam-se da paixão das outras para o enriquecimento próprio.

    Então, é importante, sim, o Poder Legislativo se debruçar sobre esse tema, porque ele às vezes é deixado para lá. Ele é o fruto do enriquecimento de muitos, mas à custa do sacrifício de uma grande parte da população. E quem sofre são os torcedores brasileiros...

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Que pagam mais caro.

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – ... que pagam mais caro pelo ingresso.

    Então, eu creio que esse é um tema sobre o qual esta Casa deve, sim, se debruçar. Congratulo V. Exª por tê-lo trazido.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Obrigada.

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Eu gostaria que V. Exª pudesse assumir a Presidência, ou um dos Senadores, para que eu pudesse fazer uso da palavra. (Pausa.)

    Os Senadores Elmano e Thieres estão ali...

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Eu assumo e passo a Presidência para o Senador Elmano.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/02/2017 - Página 7