Discurso durante a Sessão Solene, no Congresso Nacional

Sessão solene do Congresso Nacional destinada à comemoração do Dia Internacional da Mulher e à entrega do Diploma Bertha Lutz em sua 16ª edição.

Autor
Marta Suplicy (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Congresso Nacional
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão solene do Congresso Nacional destinada à comemoração do Dia Internacional da Mulher e à entrega do Diploma Bertha Lutz em sua 16ª edição.
Publicação
Publicação no DCN de 09/03/2017 - Página 55
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO SOLENE, CONGRESSO NACIONAL, ASSUNTO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MULHER, ENTREGA, DIPLOMA, BERTHA LUTZ, PREMIO, HOMENAGEM, RECONHECIMENTO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, DEFESA, DIREITO A IGUALDADE.

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Quero, primeiro, parabenizar as homenageadas de hoje: Denice Santiago Santos do Rosário, Major da Polícia Militar da Bahia, responsável pela criação e pela implantação da corporação de um núcleo de gênero; Diza Gonzaga, criadora da Fundação Thiago de Moraes Gonzaga, que luta para reduzir acidentes e mortes no trânsito; Isabel Cristina de Azevedo Heyvaert, diplomata, Embaixadora do Brasil na Sérvia; e Raimunda Luzia de Brito, professora e doutora em educação, com luta por direitos humanos amplamente reconhecida.

    Eu indiquei Tati Bernardi. Tati não pôde vir aqui hoje, e vou falar um pouco dela. Tati me chamou a atenção por ser uma escritora e jornalista muito jovem. Ela escreve semanalmente na Folha e colabora com alguns programas de televisão. Eu sempre sinto que, nos seus escritos e nas suas interlocuções, ela se coloca como uma pessoa que fala do cotidiano da mulher. Ela fala das humilhações, ela fala da fragilidade, ela fala das dificuldades que nós mulheres enfrentamos. Agora, o mais forte sobre ela e que me levou a colocar o seu nome para votação, para o prêmio, é que ela é extremamente corajosa, Senadora. Ela não fala da mulher, ela fala dela. Como problemas que ela cita são problemas nossos, fica universal, como toda boa obra. O particular se torna universal. Aí ela vai propiciando reflexões sobre o cotidiano contemporâneo. Isso me pareceu muito instigante, porque é um trabalho de mídia, que atinge milhões de pessoas, por uma pessoa que está se expondo e fazendo reflexões, quando começamos a pensar: "Mas eu nunca pensei nisso. Isso é muito importante". Então, parabéns à Tati. Eu vou levar o seu prêmio pessoalmente a São Paulo.

    Nós sabemos que, milenar e sistematicamente, foi negado às mulheres o direito à sexualidade, à educação, à liberdade, à opinião, ao voto, à representação e, mais recentemente, tragicamente, até a viver. É a nossa luta.

    Eu vou dar um painel, pois que eu considero que nós temos quatro etapas no feminismo.

    Nós começamos no século XIX, em que ainda era uma luta de direitos iguais, voto – estava tudo muito distante.

    No século XX, nós atingimos o voto, em 1932, mas, depois, eu acredito que só nos anos 70 é que nós fomos, realmente, através da luta contra a ditadura, depois, da luta das mulheres pela anistia... Depois, as mulheres começaram a se organizar. Também houve o TV Mulher, que eu considero que foi um antes e um depois para a questão da sexualidade, que caminha junto com o poder. Então, nós tivemos aí um movimento muito forte.

    Agora, há o terceiro momento, que foi extremamente diferente e importantíssimo, quando a mulher negra e as mulheres lésbicas e transgêneros entraram no movimento. Até então, esse era um movimento de mulher branca heterossexual, que lutava por direitos. Esse movimento começou a ser chacoalhado com muita força pelas mulheres negras, exigindo direitos, querendo também estar nas pautas, querendo participação, e também pelas mulheres homossexuais e mulheres transgêneros. Isso criou uma turbulência – eu não vejo nada como negativo – que eu vejo como extremamente positiva, porque nós temos de agregar. Nós estamos todas juntas. Nós temos que trabalhar. Não somos iguais também. As pautas não são necessariamente as mesmas todo o tempo, mas essa união é que vai fazer com que nós consigamos para todas o que hoje poucas têm.

    Depois, há a coisa mais moderna, que é essa quarta fase, que estamos vivendo, da era digital, que começa já no final da terceira e coloca uma nova geração que estava totalmente fora. A nova geração não se interessava muito por feminismo. Era como um pouco antes, pois eu lembro que, quando se dizia feminista, nos anos 80, as pessoas diziam: "Credo! Mas o que é isso? Eu sou feminina". Era uma confusão danada. Depois, as gerações seguintes passaram a não achar nada, a achar que os direitos estavam meio adquiridos, que já se podia ter tudo, que já éramos iguais. Ficou meio sem luta, sem uma participação. A internet possibilitou uma participação extraordinária das novas gerações. Outro dia, fiquei de queixo caído. Liguei para saber como estava minha neta. Liguei para a mãe, porque era aniversário dela, e perguntei sobre a neta, que tem 13 anos. E a mãe falou assim: "Marta, você sabe que agora ela fez um grupo de empoderamento para meninas mais jovens que ela". Com 13 anos de idade! Nunca imaginei. Aliás, ela nunca falou disso comigo. E a mãe disse: "Você sabe que sua avó tem um trabalho nisso?" E ela disse: "Sei, já li os livros, mãe. Já li". Então, eu percebo que essa possibilidade é uma coisa nova que está acontecendo. Nós não vamos para trás. Aqui, não tem mais volta; só tem ido para frente.

    Também há essa criação tão importante do He for She. Acredito que toda essa juventude esteja participando. É uma nova mentalidade. O momento hoje no movimento feminista, o novo no movimento, é o homem estar junto. Nós temos de agregar. No que nós podíamos fazer sós, nós cumprimos um grande papel até aqui. Tem que vir o resto. Tem que vir o homem de mão dada. E esse homem está preparado. As novas gerações já entendem muito mais do que antigamente. Elas já compartilham o serviço doméstico, e eles estão junto. Claro, há uma parcela enorme que não está nisso que eu estou colocando, mas, se formos pensar – e estou falando de décadas –, o movimento é outro. Está tudo maduro para acontecer e está acontecendo. E, nessas mudanças, a internet tem ajudado enormemente.

    Nós temos que continuar a crescer. Esse crescimento vai implicar muitas mudanças, porque essa cidadania plena, nós temos na lei, mas vimos pela manhã, com tantas votações que fizemos na Comissão de Justiça, como tem muita lei ainda para ser feita. Tem uma lei que proponho votar, a PEC da Natalidade, que vai mudar bastante. Espero que tenhamos maturidade no Congresso para aprová-la. O que é isso?

    Hoje, temos direito à maternidade e temos direito à paternidade. O que acontece? Não é só maternidade. O filho tem pai e mãe. Essa é uma lei de cinco décadas atrás, quando a mãe amamentava, ficava em casa, cuidava das crianças, fazia comida, no máximo saía para levar a criança na escola. Não é mais assim. Então, a licença natalidade tem que ser para homem e mulher. Não tem que ser uma para homem e outra para mulher; que que ser junto. E fizemos a proposta de ampliar para 180 dias essa licença. O homem pode tirar 15 dias, a mulher pode tirar 10, tira toda a licença natalidade o homem, se quiser tira toda a licença a mulher. Depende do que cada um estiver fazendo e da necessidade que cada um tiver de cuidar daquela criança, da possibilidade de criar e alternar. É um grande avanço nessa mudança de mentalidade, que tem a ver com o Século XXI.

    Então, quando digo que a lei está pronta, ela está, mas temos que rever muita coisa que ficou para trás, e nós, em 1988, nem percebemos. São detalhes importantíssimos que não são detalhes. Essa lei que estou fazendo, da natalidade, também vale para quem é pai adotivo e para casais homoafetivos, vale para casais, para que a gente possibilite esse direito a todos.

    A outra é uma proposta de emenda à Constituição que garante a participação de ambos os sexos nas listas tríplices e sêxtuplas destinadas à escolha dos membros dos tribunais judiciários...

(Soa a campainha.)

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) – ...dos tribunais de conta e dos procuradores gerais do Ministério Público.

    Na sabatina que tivemos aqui com o Ministro Alexandre de Moraes, eu questionei sobre a falta de indicações. Ele disse que é fato e que tem aumentado expressivamente a aprovação de mulheres nos concursos destinados ao ingresso nas carreiras de magistratura, do Ministério Público e de auditores dos tribunais de contas, mas fica por aí. Falta o acesso a níveis superiores. São poucas as mulheres que se tornam procuradoras gerais no âmbito do Ministério Público. O Ministro comentou, de forma muito espontânea. Ele levou até um susto, porque não tinha pensado nisso. E eu respondi: nunca se pensa em relação à mulher. Por isso a gente não vai a canto algum.

    Mas nós estamos indo a todos os cantos. Nós vamos ocupar todos os cantos por direito e por merecimento. Homens e mulheres iguais com respeito à diferença. Esse é o ponto. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DCN de 09/03/2017 - Página 55