Discurso durante a Sessão Solene, no Congresso Nacional

Sessão solene do Congresso Nacional destinada à comemoração do Dia Internacional da Mulher e à entrega do Diploma Bertha Lutz em sua 16ª edição.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Congresso Nacional
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão solene do Congresso Nacional destinada à comemoração do Dia Internacional da Mulher e à entrega do Diploma Bertha Lutz em sua 16ª edição.
Publicação
Publicação no DCN de 09/03/2017 - Página 88
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO SOLENE, CONGRESSO NACIONAL, ASSUNTO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MULHER, ENTREGA, DIPLOMA, BERTHA LUTZ, PREMIO, HOMENAGEM, RECONHECIMENTO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, DEFESA, DIREITO A IGUALDADE.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/REDE - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidente, Senadora Gleisi Hoffman, Senadora Fátima, Senadora Ângela Portela, em especial as Srªs Senadoras, senhoras e senhores que assistem a esta sessão, é fundamental, na data de hoje, em especial para ser destacado na data de hoje, não só ressaltar o papel, a função, a atribuição das mulheres na sociedade; aliás, o princípio da data de hoje é o reconhecimento de uma sociedade desigual que temos. A condição de ser feminista não é condição apenas para as mulheres, é uma condição também para os homens. Aliás, qualquer homem que prega uma sociedade igualitária tem que, por excelência, nos atos e nas atitudes, ser feminista.

    O Dia Internacional de Paralisação, que ocorre hoje no País, mobilizado pelas mulheres brasileiras e mulheres de todo mundo, é primeiro para destacar as diferenças que existem ainda hoje, em pleno século XXI, e a opressão ainda existente de homens sobre mulheres, a sociedade misógina, sexista, que ainda temos não só no Brasil, mas em todo o mundo.

    Por isso, há uma atitude simples que deveria ser a atitude de todos nós Parlamentares homens, e tomei como iniciativa em nosso gabinete hoje, liberar do ponto, facultar o ponto a todas as mulheres do meu gabinete e do escritório em Macapá para que elas participem das mobilizações do 8 de março. Essa atitude deveria ser uma atitude do Poder Público, do Governo Federal, e aqui do Senado, e que essa atitude fosse repetida nos próximos anos. A data de hoje tem que ser referenciada como Dia Internacional de Mobilização e de Paralisação das Mulheres para denunciar a sociedade sexista, misógina e machista que nós temos, mais ainda no Brasil.

    Nós temos um país de traço patriarcal, um país legatário da herança portuguesa, um país que, na sua primeira ordem jurídica civil, viu-se, as Ordenações Filipinas tratavam a mulher e o escravo negro como coisa. Aliás, o crime de adultério, para a mulher, era apenado com a morte; e, para o homem, era perdoado. Era assim o trato das Ordenações Filipinas, a primeira ordenação jurídica civil existente.

    Nós temos por legado um machismo intrínseco à sociedade brasileira, que é legatária de uma tradição patriarcal e patrimonialista portuguesa. São traços profundos em nossa sociedade. Assim também são legados disso as reformas propostas pelo Governo do Senhor Michel Temer, em especial, Senadora Gleisi, a reforma previdenciária. Eis aí uma reforma machista, misógina e sexista, porque o princípio elementar que está consoante na nossa Constituição, que assegura às mulheres terem aposentadoria diferente dos homens e jornada de trabalho diferente dos homens, é constante no caput do art. 5º.

    O caput do art. 5º não é uma declaração apenas de que todos são iguais perante a lei; é uma declaração que, para ser efetivada, pressupõe que a desigualdade é existente na sociedade brasileira e que o Estado brasileiro precisa tomar atitudes de afirmação em relação àqueles que, historicamente, foram desigualados, ao longo do tempo, ao longo da História. Por isso, o princípio da igualdade positiva, consonante no caput do art. 5º, pressupõe o seguinte: tratar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam.

    É por isso e em decorrência disso que assegurar, no Regimento Interno do Senado, uma resolução que garanta que temos de ter mulheres na Mesa Diretora não é favor; é por isso que proposta de emenda constitucional que assegura que, nas vagas em disputa ao Senado, haja, pelo menos, uma vaga para ser ocupada pelas mulheres não é favor; é por isso que as quotas de participação de mulheres não são favor. É direito conquistado ao longo do tempo; é consonante com a execução do caput do art. 5º tratar os desiguais desigualmente na medida em que se igualam, porque a tradição da formação da sociedade brasileira, do Estado patriarcal, misógino e machista, foi a exclusão das mulheres, foi tratá-las como coisa. É por isso que se precisa de políticas afirmativas de inclusão de direitos. E é por isso tem significado de diagnóstico esse 8 de março de 2017, com a palavra de ordem "nenhum direito a menos", porque, em pleno século XXI, são os direitos das mulheres que estão sob ameaça.

    Vejam a reforma da Previdência, ao eliminar o bônus concedido às mulheres no tempo de contribuição e idade de aposentadoria! Quando os formuladores, os machistas formuladores dessa reforma a elaboraram, desconsideraram a realidade existente hoje no mercado de trabalho, desconsideraram as condições desfavoráveis enfrentadas pelas mulheres no mercado de trabalho. Já foi dito aqui, por homens e mulheres nesta tribuna, que a jornada de trabalho das mulheres nunca é a mesma dos homens; a jornada de trabalho das mulheres é sempre tripla, às vezes, quádrupla, enquanto a jornada de trabalho dos homens é sempre menor.

    A outra questão quanto a esse aspecto, além disso, os números dão conta concretamente disso, ao igualar a aposentadoria por 65 anos para homens e para mulheres, ocorre uma violência contra um direito conquistado historicamente. Mais grave é essa violência contra as mulheres trabalhadoras rurais, que não terão, nunca, condições de chegar aos 65 anos de idade com direito à aposentadoria.

    A outra questão nesse aspecto é a desigualdade existente e evidente no mercado de trabalho. É óbvio que os traços machistas das políticas do Estado brasileiro implementaram maiores dificuldades para as mulheres terem acesso ao mercado de trabalho do que os homens. Eu estou falando do século XIX? Não, eu estou falando do século XXI. São os dados do IBGE que dão conta disso.

    A taxa de desemprego entre as mulheres sempre é maior. A última PNAD do IBGE diz que, entre as mulheres, a taxa de desemprego é de 8,7%, enquanto, entre os homens, a taxa de desemprego é de 5,2%. É um mercado de trabalho sexista por excelência, que paga uma média de salário de R$1,8 mil para os homens e de R$1,25 mil para as mulheres. Por isso que as condições são diferentes, são desiguais.

    Há desigualdade também na jornada de trabalho: cerca de 90% das mulheres ocupadas em atividades urbanas em 2014, ainda segundo essa própria PNAD, cuidavam dos afazeres domésticos. São 90% das mulheres. No caso dos homens, é de 52%. Na agricultura, é mais dramático: 96% das mulheres ocupadas cuidavam também dos afazeres domésticos. Na agricultura, no campo, é somente a 48% dos homens que também se atribui essa responsabilidade.

    As mulheres ocupadas em média consomem 19,21 horas por semana nos afazeres domésticos, enquanto os homens, só 5,1. Querer igualar aposentadoria de mulheres com a dos homens chega a ser de uma maldade atroz, chega a ser de uma perversidade atroz, chega a ser a mais grave medida machista, sexista e misógina que já houve na História brasileira desde o Império, desde as Ordenações Filipinas.

    Os números aprofundam muito mais isso: a jornada de afazeres domésticos das mulheres é de 54,7 horas semanais; os homens trabalham em média 46,7. Exatas, as mulheres trabalham, exatas, 8 horas a cada semana. A mulher ocupada acima de 16 anos trabalha ainda mais: em média quase 73 dias – 73 dias! – a mais que os homens em um ano.

    Por outro lado, a jornada remunerada das mulheres é inferior a dos homens: 35,5 horas, enquanto 45,6 horas para os homens. Ou seja, as mulheres trabalham mais, e recebem menos, por estarem no mercado de trabalho. A desigualdade já existe, o sexismo já existe, a misoginia já existe no mercado de trabalho.

    E o Governo do Sr. Temer, que assume, Senadora Gleisi, após impitimar uma presidente mulher da República, apresenta uma reforma previdenciária aprofundando o fosso, ampliando as desigualdades. Repito: é a mais sexista e misógina medida contra as mulheres que já houve na história republicana.

    Por isso, Srª Presidente, o aumento de 15 para 25 anos o tempo mínimo de contribuição na aposentadoria por idade trará para obviamente às mulheres maiores dificuldades. No exercício simples com as médias nacionais, podemos pensar em situações em que a desigualdade se ampliará e se aprofundará no acesso ao mercado de trabalho, no cumprimento da jornada e na remuneração.

    Por isso, Srª Presidente, Srªs Senadoras, hoje se espera de nós, homens, mais do que palavras. Subir a esta tribuna e se pronunciar, como estou fazendo, é, para nós, a mais fácil das atitudes. Esperam-se gestos concretos, ações concretas, medidas concretas.

    Eu espero que, no próximo dia 8 de março, todos colegas Senadores, o próprio Senado, e não só, também Governos Municipais, Estaduais e Federais, facultem o ponto para que as mulheres possam participar dos atos, manifestações e mobilizações. É o mínimo. Eu espero mais que isso: eu espero sinceramente que essa reforma aqui apresentada, Srª Presidente, contra os trabalhadores, contra o povo brasileiro, sexista, misógina, machista seja – num gesto concreto dos Srs. Senadores; este é um gesto que podemos fazer –, seja barrada aqui no Senado e no Congresso Nacional. Isso é ter coerência com o que foi dito no dia de hoje nesta tribuna e a prática concreta. (Palmas.)

(Manifestação da galeria.)

(Soa a campainha.)


Este texto não substitui o publicado no DCN de 09/03/2017 - Página 88