Discurso durante a 21ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas aos vetos apostos por Michel Temer, Presidente da República, ao Projeto de Lei de Conversão nº 35/2016, que reestrutura a EBC (Empresa Brasil de Comunicação).

Autor
Lasier Martins (PSD - Partido Social Democrático/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Críticas aos vetos apostos por Michel Temer, Presidente da República, ao Projeto de Lei de Conversão nº 35/2016, que reestrutura a EBC (Empresa Brasil de Comunicação).
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2017 - Página 19
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Indexação
  • CRITICA, VETO PARCIAL, AUTORIA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO (PLV), OBJETO, ALTERAÇÃO, ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO (EBC), EXCLUSÃO, OBRIGATORIEDADE, DIRETOR PRESIDENTE, SABATINA, SENADO, CRIAÇÃO, CONSELHO CONSULTIVO, AUSENCIA, PODER, DELIBERAÇÃO, PROGRAMAÇÃO, EDITORAÇÃO, INEXISTENCIA, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Thieres Pinto, Srs. Senadores, telespectadores, ouvintes da Rádio Senado, quero falar sobre a EBC, a Empresa Brasil de Comunicação, muito discutida nesses últimos tempos. Então, é por isso que eu venho à tribuna manifestar meu desacordo e grande surpresa com os vetos apostos pelo Presidente da República ao Projeto de Lei de Conversão nº 35 do ano passado, proveniente da Medida Provisória nº 744, de 1º de setembro do ano passado, que altera a Lei nº 11.652, de 07 de abril de 2008, para modificar contornos da organização legal e institucional a que estava submetida a Empresa Brasil de Comunicação – como se sabe, formada por várias emissoras de rádio, uma emissora de televisão, uma agência de notícias, enfim, a EBC, a ex-Radiobras.

    Como relator dessa matéria, Sr. Presidente, tive a oportunidade de examinar durante alguns meses, com profundidade, as questões envolvidas e ouvir vários segmentos da sociedade, por ocasião de audiências públicas realizadas no âmbito da comissão mista pertinente. Também tive conversas com representantes do Governo Federal, sempre na perspectiva da construção de um texto que contribuísse para a melhoria da comunicação pública no Brasil.

    Então, o pronunciamento que faço aqui, Srs. Senadores, é justamente para expressar contrariedade com a decisão do Executivo, do Senhor Presidente da República, de deixar de acatar as contribuições que todos trouxemos, que resultaram do esforço conjunto de Parlamentares desta Casa e da Câmara dos Deputados. A proposta foi aprovada aqui no Senado e foi aprovada lá na Câmara dos Deputados, a partir da ampla discussão com a sociedade, além de explicar aos nobres pares as razões pelas quais considero imprescindível a derrubada dos vetos em questão.

    Essa medida provisória encaminhada pelo Poder Executivo propôs uma nova estrutura administrativa para a EBC – a EBC, Sr. Presidente Thieres, custa em torno de R$600 milhões por ano para o dinheiro público – e teve como principais medidas o fim da estabilidade de quatro anos conferida ao diretor-presidente da empresa e a extinção do Conselho Curador. Foram intenções da medida provisória. Essas duas medidas tiveram como objetivo, conforme a exposição de motivos que acompanhou a medida, a melhoria da eficiência da gestão da empresa.

    Note-se que a intenção do legislador ao prever um mandato fixo de quatro anos – não coincidente com o do Presidente da República – teve como fundamento garantir autonomia ao corpo diretor em relação ao Governo Federal. No entanto, o fato de os diretores-presidentes anteriores terem tido essa garantia até o momento pode passar a impressão de que eram independentes, o que não se confirmou no dia a dia da empresa.

    Com efeito, a bem da verdade, é preciso admitir que o modelo concebido não logrou atingir os resultados pretendidos. De fato, uma avaliação criteriosa sobre a empresa – a EBC – não permite afirmar que ela tenha se consolidado como instituição de comunicação pública socialmente relevante. Por quê? Ora, há pouco conhecimento dos veículos da empresa pelos brasileiros.

    Os índices de audiência da principal aposta da empresa, a TV Brasília, no conjunto desses defeitos, não dão mostra de crescimento consistente. E é sintomático que os conteúdos veiculados pela EBC que mais tenham impacto no mundo real sejam os produtos feitos sob encomenda para o Governo Federal, como a Voz do Brasil e o Café com o Presidente. Também os demais veículos públicos mantidos pela empresa não têm conseguido crescimento, tanto do ponto de vista editorial, como de expansão nacional. A Agência Brasil, por seu turno, por exemplo, ainda não se desvencilhou dos traços de agência governamental, e as emissoras de rádio mantidas pela empresa ainda não lograram alcançar significância.

    Por isso, Sr. Presidente, a comissão mista que analisou a proposta do Executivo se alinhou à necessidade de se proceder à alteração na moldura administrativa da empresa, de modo a conferir mais eficiência à sua gestão. Nessa perspectiva, concordou a comissão com o fim do mandato fixo do diretor-presidente da EBC, com base no entendimento de que toda empresa pública está sujeita à tutela da Administração Pública – aí incluídas a discricionariedade em relação às nomeações e demissões de diligentes. No entanto, considerou imprescindível a adoção de mecanismos destinados a assegurar que as escolhas desses dirigentes não fossem resultantes unicamente da vontade soberana do governante ou baseadas em critérios de conveniência política. Conveniência política é uma praga, Sr. Presidente, na nossa vida pública atual. Por isso, também temos discutido aqui desta tribuna. No Supremo Tribunal Federal – onde a população brasileira não apenas desconfia, mas acusa – tem havido politização, tem havido consciência política. A EBC não tem fugido ao caso. De outro modo, aqui se estaria correndo o risco de repetir os erros e vícios demonstrados nas gestões anteriores da EBC.

    Assim, propusemos que o nome do diretor-presidente fosse aprovado pelo Senado Federal, como já é previsto para cargos como diretores de agências reguladoras, como nos casos dos embaixadores e do presidente do Banco Central. Sabatina no Senado foi a proposta que fizemos, com relação ao presidente da EBC. Pois não deu!

    De outra parte, a medida provisória propôs a extinção do Conselho Curador, igualmente sob a justificativa de que a instância, nos moldes originalmente concebidos, contribuiu sobremaneira para a ineficiência da gestão da EBC, em vista da falta de uma definição clara entre as atribuições do colegiado e as do Conselho de Administração, o que sempre constituiu foco de tensão interna. Também a composição do Conselho, com tendência claramente favorável ao Governo Federal, contribuiu para a confusão conceitual entre comunicação pública e comunicação estatal no âmbito da empresa.

    No entanto, a comissão mista considerou que a extinção pura e simples do colégio de representação da sociedade civil – órgão que, por isso mesmo, constituía o traço distintivo das instituições como da comunicação pública e não da comunicação governamental – colocava em risco a própria consolidação da EBC e do sistema público de comunicação.

    Por isso mesmo, o projeto de lei de conversão propôs, em substituição... A nossa proposta qual foi? A criação de um comitê editorial e de programação. De caráter consultivo e deliberativo, esse comitê – conforme a proposta que fizemos e que foi aprovada aqui e na Câmara –, composto por membros indicados por entidades representativas de diversos setores da sociedade brasileira, teria como competência fundamental assegurar que a programação proposta pela diretoria da EBC cumprisse os princípios e os objetivos da comunicação pública.

    No entanto, Sr. Presidente, para meu espanto, o Presidente da República vetou, com base em alegações sobre a conveniência de promover a agilidade na gestão da empresa, além de outras propostas de menor impacto, exatamente as duas contribuições mais relevantes deste relator, aprovadas pela comissão mista encarregada de examinar a Medida Provisória nº 744, de 2016.

    Com efeito, em primeiro lugar, a lei de conversão, Lei n° 13.417, de 1º de março deste ano de 2017, eliminou a determinação de que a indicação do nome do diretor-presidente da empresa fosse submetida à consideração do Senado Federal. O Presidente não gostou que o presidente da EBC fosse submetido à sabatina. Na versão final da lei, caberá ao ocupante do cargo de Presidente da República a decisão soberana sobre quem comandará a empresa de comunicação e por quanto tempo permanecerá no cargo, já que não há mais a previsão de um mandato fixo para o diretor-presidente.

    Os vetos também retiram as prerrogativas do comitê editorial e de programação que propusemos, quais sejam: a de deliberar sobre planos editoriais propostos pela diretoria executiva para os veículos da EBC; a de deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela EBC; e a de convocar audiências e consultas públicas sobre conteúdos produzidos, conforme constava dos incisos I, II e IV do art. 17 da Lei nº 11.652, de 7 de abril de 2008, alterados pelo texto aprovado pelo Congresso Nacional.

    Também foram vetados os §§ 5º e 6º do art. 15 da Lei n° 11.652, de 7 de abril de 2008, alterados pelo projeto de conversão, que assim estabeleciam:

§5º As determinações expedidas pelo Comitê, no exercício de suas atribuições, serão de observância cogente pelos órgãos de administração da empresa.

§6º Em caso de descumprimento, pela Diretoria Executiva, de suas determinações, o Comitê acionará a comissão temática pertinente do Senado Federal, que tomará as providências cabíveis.

    Como consequência, da nova lei resulta a existência de um comitê meramente figurativo, como era antes. Troca-se seis por meia dúzia, sem qualquer função ou atribuição prática, mantido no texto tão somente para que a moldura institucional da empresa tenha "ares" democráticos. Apenas os "ares".

    O novo texto dá carta branca à diretoria da empresa para decidir sobre a programação e o conteúdo a serem veiculados, sem qualquer participação da sociedade civil nessas definições. Volta-se, portanto, Sr. Presidente, à indesejável caracterização da EBC como uma empresa dedicada à comunicação estatal. Repito, senhores telespectadores: estamos tratando de uma empresa de comunicação e estamos falando para uma outra empresa de comunicação, que é a TV Senado. Volta-se, repito, à caracterização da EBC como uma empresa dedicada à comunicação estatal e não mais – e não mais – à comunicação pública, que é o que queríamos e o que queremos.

    Sr. Presidente, para concluir, meu objetivo, aqui nesta tribuna, é claro e específico. Estabelecido entre nós o consenso em torno da essencialidade da existência, em nossos canais de comunicação, de uma programação plural, de uma programação diversa, de uma programação inovadora, não pautada pela necessidade do faturamento e das ingerências políticas, com variedade de programas com alto padrão ético e de qualidade, não podemos compactuar com qualquer medida que vá no sentido oposto, isto é, no sentido de enfraquecer a radiodifusão pública.

    E é exatamente isso que fazem os vetos do Presidente da República: acabam por perpetuar os vícios que impedem a plena consolidação da comunicação pública no País. Temos que pôr fim ao falso entendimento de que a coisa pública é necessariamente do Governo – não, não é isso – e cumprir o mandamento previsto no caput do art. 223 da Constituição Federal, que prevê a complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal de comunicação. É isso que queremos.

    Por essas razões, senhoras e senhores, é que venho pedir a todos os pares que, quando for a hora de analisar, no Congresso Nacional, os vetos à Lei nº 13.417, de 2017, lembrem-se, lembrem-se, Senadores e Deputados, do retrocesso que eles representam, conforme demonstramos aqui. Teremos, então, a oportunidade de deixar claro o entendimento do Parlamento, acerca da comunicação pública e sua importância para o País, ao derrubar os vetos do Executivo.

    Era o que eu precisava dizer, Sr. Presidente. Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/2017 - Página 19