Discurso durante a 22ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão especial destinada a comemorar o centenário do poeta Manoel de Barros.

Autor
Waldemir Moka (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Waldemir Moka Miranda de Britto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão especial destinada a comemorar o centenário do poeta Manoel de Barros.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2017 - Página 12
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO ESPECIAL, OBJETIVO, COMEMORAÇÃO, CENTENARIO, NASCIMENTO, POETA, MANOEL DE BARROS.

    O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente da Mesa e requerente da presente sessão de comemoração, ilustre Senador Pedro Chaves; Sr. Senador Thieres Pinto; Sr. Deputado Federal lzalci Lucas; Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas, Srª Maria Inês Fini; Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, Sr. Marcos Henrique Marques; representando o Ministro de Estado da Educação, Srª Regina de Assis; eu quero, inicialmente, dirigir-me aos familiares do poeta Manoel de Barros e dizer da minha alegria em estar na tribuna. Não da alegria de comemorar o centenário, mas da alegria de poder, através do requerimento do Senador Pedro Chaves, prestar, ainda que singela, essa homenagem a uns... Eu tenho dificuldade com os cuiabanos para isso, porque Manoel de Barros só nasceu em Cuiabá, e logo em seguida já mudou para Corumbá e ficou lá. Então, eu tenho certa dificuldade, Marinoni.

    A verdade é que Manoel de Barros nasceu – como Manoel Wenceslau Leite de Barros, mas gostava de ser chamado, como já disse, Pedro Chaves, de Manoel de Barros, em Cuiabá – em Mato Grosso, no dia 19 de dezembro de 1916, e morreu aos 97 anos, em 13 de novembro de 2014.

    Pode-se dizer que Manoel de Barros foi o poeta que retratou com maior fidelidade a vida no Pantanal, tanto em relação ao homem pantaneiro quanto à fauna, à flora e à região. Importante deixar claro, no entanto, que Manoel não era poeta pantaneiro; ele era do mundo, embora suas obras tenham demorado a chegar, digamos, às pessoas. Manoel de Barros foi reconhecido, vamos dizer, no Brasil e no mundo, nas últimas duas décadas. Embora um grande poeta, ele demorou a ser reconhecido como tal.

    Manoel nasceu e cresceu em pleno Pantanal. Ainda criança, sua família mudou-se para Corumbá – tanto que, em Campo Grande, o chamam de corumbaense –, a nossa cidade branca, hoje Município localizado em Mato Grosso do Sul. Apelidado – confidenciou-me um amigo que conviveu com ele – de Neguinho pela família, a criança passou sua infância sentindo a textura da terra nos pés, brincando e correndo entre personagens que definiriam sua obra, os currais e os objetos que chamavam a atenção do futuro escritor.

    Sua formação escolar começou... E, na verdade, ele se mudou para Campo Grande, diz sua biografia, aos 13 anos. Então, nós podemos dizer que, embora tenha começado o ensino fundamental ainda em Corumbá, ele concluiu em Campo Grande, a capital do meu Mato Grosso do Sul, o hoje chamado ensino fundamental, que, na minha época e na de Pedro Chaves, era o ginásio. Na verdade, ele morou muito tempo em Campo Grande mesmo, seguindo logo depois para o Rio de Janeiro. Essa situação, em princípio, desagradou o menino, acostumado a acordar com o canto dos pássaros de que tanto gostava.

    Sem a natureza ao seu redor e para diminuir a saudade da família, o menino mergulhou nos livros. Foi aí que ele teve o primeiro contato com os livros do Padre Antônio Vieira, ao mesmo tempo em que descobriu que não precisava assumir nenhuma responsabilidade com a prática da verdade na literatura, e, sim, com a verossimilhança. Enquanto tomava conhecimento das disciplinas do ensino primário e ginasial, como Língua Portuguesa e Matemática, Manoel de Barros não dispensava a leitura de autores famosos.

    Com memória aguçada, atento aos detalhes e às nuances da natureza, escreveu seu primeiro poema aos 19 anos, a partir do qual não parou mais. Embora calado, de voz mansa e muito retraído, o escritor teve sua fase de militância política. Por volta de 1935, engajou-se no Partido Comunista.

    No entanto, o jovem Manoel de Barros abandonou o Partido por se sentir profundamente desapontado com Luís Carlos Prestes. Manoel entendia que Prestes não deveria dar as mãos a Getúlio Vargas, até então algoz dos membros do Partido Comunista. Para não ser preso, o escritor decide voltar para casa, ou seja, a fazenda da família no Pantanal.

    A literatura, evidentemente, agradeceu muito. Manoel passou um período na Bolívia e no Peru, depois partiu para Nova York, onde residiu por um ano, estudando cinema e pintura, povoando, assim, sua poesia com as imagens mais ricas e distintas.

    Ao retornar para o Brasil, o poeta conhece Stella, sua futura esposa. Com ela, teve três filhos, Pedro, João e Marta, e sete netos.

    Após muitas aventuras, ele volta ao Rio de Janeiro para fazer Direito, geralmente o curso frequentado pelos amantes da literatura naquela época. Em 1949, aos 33 anos, formou-se em Direito, retornando para Corumbá, onde herda a fazenda que era do seu pai.

    Tive a oportunidade de conversar com amigos do poeta, como o jornalista, professor e documentarista Cândido Alberto Fonseca, que, como ele mesmo diz, teve o privilégio de entrevistar Manoel algumas vezes. Segundo Cândido, Manoel de Barros era um homem simples, arredio à entrevista e fugia das câmeras como o diabo foge da cruz. A conversa andava bem, até o holofote da câmera ser ligado.

(Soa a campainha.)

    O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) – Uma das lutas de Manoel de Barros era pelos direitos autorais, dos quais não abria mão. Como era pouco conhecido, o que era seu de fato e de direito não chegava até ele, disse-me o documentarista. Cândido contou que o poeta mato-grossense e sul-mato-grossense só começou a receber parte dos seus direitos quando passou a ganhar prêmios de entidades conhecidas do mundo literário.

    Pouco conhecido pelo público, Manoel, no entanto, tinha muitos admiradores entre os próprios escritores. O primeiro a elogiar o trabalho de Manoel de Barros foi Antonio Houaiss, um dos maiores críticos literários do País, morto em 1999.

    A primeira obra nasceu no Rio de Janeiro e lá despertou para o público, há mais de 60 anos, e foi batizada de Poemas concebidos sem pecado, lançada em pequena tiragem com a ajuda de um grupo de amigos. Depois vieram muitos outros livros.

    O poeta ganhou prêmios importantes, como o Prêmio Orlando Dantas, em 1960, dado pela Academia Brasileira de Letras, pelo livro Compêndio para uso dos pássaros. Sua obra posterior, Gramática expositiva do chão, foi contemplada com o prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal, enquanto Livro sobre nada ganhou outra honraria, desta vez de contexto nacional.

    Apesar de ser pouco popular comparado a poetas pós-modernistas, como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, por exemplo, as obras de Manoel de Barros invadiram livrarias do mundo todo.

    Manoel de Barros, a quem Carlos Drummond de Andrade qualificou de o "poeta maior" do Brasil, morreu em 13 de novembro de 2014, em Campo Grande, onde residia há décadas, de onde saía somente para sua fazenda no Pantanal.

    Concluo essa simples homenagem citando frase do próprio Manoel de Barros que demonstrava a sua paixão pelas coisas simples da vida, abro aspas:

Prezo insetos mais que aviões.

Prezo a velocidade

das tartarugas mais que a dos mísseis.

Tenho em mim um atraso de nascença.

Eu fui aparelhado

para gostar de passarinhos.

Tenho abundância de ser feliz por isso.

Meu quintal é maior do que o mundo.

    Fecho aspas.

    Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2017 - Página 12