Discurso durante a 24ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2013, para acabar com foro privilegiado, de autoria do Senador Alvaro Dias.

Autor
Lasier Martins (PSD - Partido Social Democrático/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONSTITUIÇÃO:
  • Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2013, para acabar com foro privilegiado, de autoria do Senador Alvaro Dias.
Aparteantes
Roberto Requião, Simone Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 15/03/2017 - Página 33
Assunto
Outros > CONSTITUIÇÃO
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), AUTORIA, ALVARO DIAS, SENADOR, ASSUNTO, EXTINÇÃO, FORO ESPECIAL, PRERROGATIVA DE FUNÇÃO, AUTORIDADE PUBLICA, IGUALDADE, JULGAMENTO, CIDADÃO, CRIME COMUM, AUMENTO, CONFIANÇA, POLITICA, PAIS, RESPEITO, ISONOMIA CONSTITUCIONAL, CRITICA, DEMORA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CONDENAÇÃO, REU, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Meu eminente colega José Antônio Reguffe, Presidente dos trabalhos, admirado representante do Distrito Federal, por tudo o que tenho acompanhado, Senador de um enorme prestígio.

    Mas, Senador Reguffe, Srs. Senadores, Senadoras, telespectadores, ouvintes, quero falar aqui da tribuna de um dos temas mais palpitantes do momento, de um dos temas mais candentes na reclamação da sociedade brasileira: o foro privilegiado. A origem desse mecanismo chamado foro privilegiado é longínqua, herança da Constituição Imperial de 1824. A prerrogativa existe para alguns indivíduos que, na visão, do legislador, em virtude do cargo que ocupam, necessitavam e necessitam de julgamento em órgão jurisdicional diferente daquele que é levado para os cidadãos comuns.

    Na Constituição cidadã de 1988, inúmeras autoridades são abrangidas pelo foro privilegiado, até demais, muito exagerada essa nominata de dependentes, de condicionados ao foro privilegiado. O Constituinte, com a cicatriz de décadas de regime autoritário, então, ampliou, na Constituição vigente, ao máximo a quantidade de indivíduos, de pessoas abarcadas pela prerrogativa de função.

    Atendo-se às hipóteses da Constituição, mais propriamente no que se refere aos mais elevados cargos do País, embora o art. 53, §1º, da Constituição disponha sobre o foro privilegiado para os Congressistas, a partir da expedição do diploma, é no art. 102, inciso I, letra "b", que se verifica a competência do Supremo Tribunal Federal. A norma do artigo referido tratou de garantir que, nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente da República, os membros do Congresso Nacional, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador-Geral da República serão submetidos a julgamento perante a mais alta Corte da República.

    Com relação a esse tema, Sr. Presidente, o Supremo procura assumir o protagonismo. O Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, a fim de encontrar posição na Corte, pautou o tema que envolve um prefeito de Cabo Frio, Marcos da Rocha Mendes, ex-Deputado Federal, que renunciou para assumir o cargo. Com base nessa pauta, o Ministro busca emplacar a tese de que somente poderiam ser julgados no STF autoridades que cometeram os fatos durante a função.

    O assunto também já é tratado com avanço no Senado. Como sabemos bem, a PEC nº 10/2013, de autoria do Senador Alvaro Dias, com relatoria do Senador Randolfe Rodrigues – PEC à qual aderi, com muita satisfação, com assinatura, inclusive para a urgência –, essa PEC do Senador Alvaro Dias já possui parecer favorável da CCJ e aguarda ser levada a plenário. Ela estabelece o fim do foro privilegiado para todas as autoridades brasileiras, inclusive para o Presidente da República nas infrações penais comuns, permanecendo os crimes de responsabilidade sob a jurisdição atual.

    Não obstante as razões que levaram à criação do foro privilegiado pela Constituinte, atualmente ele representa enorme distância que há entre os políticos e os cidadãos comuns. E aqui está o problema: acaba por infringir e por instigar reflexamente a percepção da grande massa de que a lei dos poderosos é uma lei diferente para o resto da sociedade, já que o foro por prerrogativa de função não tem outro embasamento senão a ocupação num cargo público.

    É fato notório a impressão que a sociedade carrega sobre os políticos brasileiros. Todavia, nenhum recado foi tão claro quanto as últimas eleições. Vários exemplos, no ano passado, demonstraram que aqueles que se desvincularam da imagem de políticos acabaram tendo sucesso nas eleições para prefeito. O maior exemplo foi em São Paulo, a maior cidade brasileira: o candidato que repetiu a frase de que não se tratava ele de político, mas de gestor, teve ele uma preferência maciça no pleito para a Prefeitura de São Paulo.

    Isto é, parece que hoje é bom não ser político, Sr. Presidente. Essa visão é danosa ao País, já que afasta a juventude das eleições e da política. As pessoas passam a não querer se envolver com os problemas da Nação, bem como ocorre o prejuízo da sensação da representatividade e da confiança no Brasil.

    Por isso, há uma necessidade imperiosa de retomada da credibilidade da classe política, o que depende de nós aqui no Parlamento. A alteração da regra do foro privilegiado é um sinal à sociedade da mudança de que o País e o Congresso Nacional precisam, e simbolizará disposição para a aclamada transformação. E quem fizer parte disso terá grande arcabouço político.

    Para tanto, encontra-se motivação na própria forma do Governo brasileiro: o consagrado princípio republicano, que tem sido esquecido. O princípio republicano inibe qualquer espécie de privilégios e diferenciações com relação ao Governo e ao Estado.

    Então, por isso, Srs. e Srªs Senadoras, uma vez aprovada, a derrocada do foro privilegiado será a verdadeira materialização e o ajustamento com relação à coisa pública. Poderemos interromper uma das grandes diferenças em relação ao povo, respeitando-se, inclusive, outro princípio constitucional, o da isonomia.

    Sob o ponto de vista prático jurídico, o juiz de primeira instância é a pessoa mais indicada para a ação penal, é quem está mais próximo do delito e que tem o convívio permanente com esse tipo de assunto. É conferido a ele, inclusive, maior tempo. O Supremo, de sua parte, em vista de ser a maior Corte do País, está sempre distante dos fatos, possui apenas 11 Ministros, grande número de processos das mais diferentes naturezas, e não reúne condições de tempo devido para o julgamento de que a sociedade necessita.

    O Supremo Tribunal Federal não tem estrutura, Sr. Presidente, para julgar esse mundo de gente que está relacionado com o foro privilegiado. E, aí, a tendência evidente é de que venha ocorrer, mais uma vez, a extinção da punibilidade pela prescrição, como, aliás, se publicou há bem poucos dias...

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – ... nos grandes jornais do País.

    De 2011 a 2016, 408 envolvidos colocados na condição de foro privilegiado atingiram a prescrição por decurso de prazo. O que gera dois efeitos: a impunidade, com vários processos atingindo a prescrição, como disse; e a não celeridade – esse tipo de ação tem sempre sido demorado, vide o que está acontecendo agora com a Lava Jato no Supremo. Enquanto o Juiz Sergio Moro, lá em Curitiba, já condenou 116 envolvidos com a Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal, até este momento, em dois anos de Lava Jato, não condenou ninguém.

    De outra banda, o Supremo não definiu, objetivamente, questões importantes que envolvem a prerrogativa de função por se tratar diversas vezes de tribunal com estreita relação política.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Não há entendimento definitivo sobre o desmembramento em casos de processos que envolvam não políticos. A decisão sobre o desmembramento é subjetiva, analisada de acordo com o caso concreto e o contexto político em que o País se encontra. Isso confere grave insegurança judicial e grave insegurança jurídica.

    Assim, os advogados têm-se utilizado da realidade da Suprema Corte para assegurar a liberdade do seu cliente, muito embora o ordenamento jurídico defina, exija a punição.

    Com relação ao viés político desses casos, há que se ater também ao papel da Procuradoria-Geral da República no julgamento de autoridades. Mesmo que possua uma equipe, centraliza-se em sua figura o papel de denunciar ao Supremo. O alto grau de poder nas mãos de somente um indivíduo...

(Interrupção do som.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Se V. Exª me permitir, preciso somente de mais uns poucos minutos.

    Esse fato, Sr. Presidente, mostra que não há republicanismo na hipótese. Esse fato ganha ainda mais notoriedade com declarações como aquela em que o Presidente da República afirma que os ministros denunciados na Lava Jato serão afastados. Um julgamento por crime comum torna-se um emaranhado de interesses políticos, disputas pelo poder, vaidades, e é assistido como um espetáculo pelos cidadãos, através da grande mídia, não somente pelos envolvidos, porém pela própria exposição que o órgão em si já possui.

    É preciso tratar o tema com urgência. É por isso que pedimos que esta Casa discuta imediatamente e vote a PEC do Senador Alvaro Dias do fim do foro privilegiado, para que acabemos com os casuísmos políticos de hoje que, cada vez, mais envolvem a Suprema Corte, extinguindo a impunidade relacionada aos casos que temos visto ultimamente, porque, ao lado disso, também o Supremo protagoniza uma atuação que vai de encontro ou vai contra à grande reclamação, ao verdadeiro clamor público que se está vendo pelo País afora.

    A PEC é um importante passo, portanto. Todavia, a extinção completa do foro privilegiado não é do interesse nacional em vista da instabilidade política que pode causar a algumas autoridades sendo julgadas pelo juiz de 1º grau.

    Por isso, Sr. Presidente, quem sabe lá caiba uma exceção. Um dos cernes do problema está no grande número de abarcados pela norma do art. 102, inciso I, letra "b" da Constituição. Uma solução que não traz instabilidade e garante o que foi exposto neste texto é a manutenção do foro – e aí, quem sabe, uma ideia de solução para esse rumoroso caso – apenas para os presidentes dos Poderes, abrindo-se a exceção para o foro privilegiado, caracterizando uma excepcionalidade necessária ante a representação do Estado.

    Concluindo, Sr. Presidente, além desses aspectos materiais, o momento é primordial para o Senado, em vista da posição do Supremo. A Corte, encontrando uma solução antes do Parlamento, trará uma imagem ruim de imposição. A medida não será boa para o Parlamento. A forma com que a sociedade a receberá vai enfraquecer o Congresso Nacional, reforçando o ativismo judicial contra o qual nos insurgimos. Nossa dependência do Judiciário não pode prosseguir.

    Por tudo isso, precisamos decidir, aqui no Congresso, o fim do foro privilegiado – quem sabe –, ressalvando apenas a exceção para os presidentes dos poderes.

    V. Exª concede um aparte à Senadora Simone Tebet?

    A Srª Simone Tebet (PMDB - MS) – Obrigada, Senador Lasier. Eu quero parabenizar V. Exª e dizer que essa questão em relação ao foro privilegiado é uma questão sobre a qual a população tem feito uma grande pressão. Particularmente, eu tenho um posicionamento a respeito: acho que a injustiça do foro privilegiado é em relação aos bons políticos também. Fala-se da sociedade e que, no sistema republicano, onde impera a igualdade, tem que se acabar com o privilégio de função, mas eu acho que vai além. Diferentemente de alguns colegas, eu prefiro ser julgada em primeira instância, onde o juiz conhece a realidade e o meu trabalho. Eu acho que o fim do foro privilegiado vai ajudar a punir os maus políticos e também vai ajudar a dar o duplo grau de jurisdição, ou seja, a justiça aos bons políticos, porque ele vai ser julgado em primeira instância e vai ter direito ao duplo grau de jurisdição, podendo recorrer aos tribunais de justiça do seu Estado. No foro privilegiado, o agente político só tem uma instância que é o Supremo Tribunal Federal, que, por mais que erre muito pouco, é feito de homens. Homens são falíveis e, portanto, podem errar e cometer injustiças. Eu sou a favor do fim do foro privilegiado e apenas faço uma consideração. Acredito que, no momento que estamos vivendo de tantas dificuldades...

(Soa a campainha.)

    A Srª Simone Tebet (PMDB - MS) – ... onde o político já é prejulgado como incompetente, como corrupto mesmo sem ter sido denunciado – basta constar de algum inquérito para ele já ser considerado condenado pela sociedade –, nós só temos que nos preocupar com a competência, qual é o juiz competente para julgar a autoridade. Talvez juízes de primeira instância das capitais, para evitar que, na maioria dos Municípios brasileiros – eu diria que 70% dos Municípios brasileiros são considerados pequenos Municípios –, os juízes e promotores, que, normalmente, são muito novos – quando vão para o interior, têm, em média, 25 anos de idade –, não sofram a pressão. Eu não digo nem pressão popular, porque essa é saudável, mas a pressão de outros interesses, de quem está fora, do grupo político que perdeu a eleição, do grupo político, muitas vezes, mal intencionado...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    A Srª Simone Tebet (PMDB - MS) – ... que bombardeia de denúncia na polícia, no Ministério Público e faz com que essa pressão seja levada ao juiz. Ele apresenta uma denúncia, duas, três, e o juiz nega; já na décima, na décima primeira, o juiz acata. Talvez colocarmos como foro as capitais para dirimir qualquer problema evitaria com que os maus políticos se aproveitassem da falta de foro privilegiado contra prefeitos bem intencionados, competentes que estariam fazendo um bom trabalho. Do contrário, nós também podemos estar trocando a soberania popular do voto do cidadão comum por, talvez, uma decisão judicial, às vezes, errada, apesar de bem-intencionada. E, a cada dois anos, ter-se-ia eleição dentro de Município. Mas concordo. Sou a favor do fim do foro privilegiado. Acredito que pouquíssimas pessoas no Brasil poderiam ter – presidentes de Poderes, Presidente da República –, desde que nós conheçamos a realidade brasileira e não façamos com que as pessoas bem-intencionadas se afastem da política: "Não vou fazer política, porque não quero o meu nome envolvido com qualquer sorte de denúncias." Mas parabenizo V. Exª e comungo do entendimento de V. Exª de que não dá mais para conviver com o foro privilegiado de quantas mil pessoas no Brasil, diante de 200 milhões de brasileiros.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Muito obrigado, Senadora Simone.

    Agora, sugestões judiciosas, como essa sua, só terão vez, Senadora Simone, se nós abrirmos a discussão aqui, no Senado, o que se protela indefinidamente, quando, inclusive, nem há atualmente matérias suficientes para debatermos, em razão do atraso que houve para a formação das comissões.

    Portanto, tempo nós temos. Precisamos é de vontade da direção desta Casa, para que o debate sobre o fim do foro privilegiado venha para cá. Concluindo, Sr. Presidente, o foro privilegiado está sendo sinônimo de impunidade.

    Repito aqui: o Supremo Tribunal Federal não tem condições, não tem estrutura para julgar esse mundo de gente que lá está – afora os que já estavam, os que estão chegando – para foro privilegiado. Não há condições. Irão todos para a extinção da punibilidade, o que aumentará a indignação dos brasileiros.

    Obrigado, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Muito obrigado, Senador Lasier.

    Parabenizo V. Exª pelo pronunciamento.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – Eu tinha solicitado um aparte ao Senador. Acho que ele não...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – O.k.

    Com a compreensão da Senadora Lídice, que é a próxima oradora inscrita, o Senador Roberto Requião pode fazer o aparte.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Perdoe-me, Senador Roberto Requião, mas saiba da permanente admiração por V. Exª.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – Com a aquiescência da Senadora Lídice, que é a próxima oradora. Acho que o assunto é interessante. Quero lembrar um pensamento que me ocorre agora de um desses líderes da tecnologia nos Estados Unidos, se não me engano, Steve Jobs. Ele observava sempre a tendência da opinião pública, das maiorias, mas procurava sempre criar alguma coisa, para que posteriormente as pessoas dissessem: "Ah, bem, mas era isso que nós queríamos." Ou seja, utilizando a sua inteligência, a sua tecnologia, a sua experiência, a sua criatividade, criando alguma coisa que as pessoas, que não tinha uma informação focada no assunto...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – ... perceberiam posteriormente que era o que elas queriam realmente, e não aquilo que tinha sido objeto do movimento de opinião num determinado momento. Em segundo lugar, Senador, quero dizer a V. Exª que voto tranquilamente a favor da quebra do sigilo, como voto a favor da quebra do foro privilegiado. Mas eu queria fazer algumas observações. Eu voto a favor da quebra do foro privilegiado, porque sou tomado também pela indignação das prescrições. Considero essa sua observação de que o Supremo Tribunal Federal não está equipado para determinados julgamentos, o que leva crimes notórios à prescrição, mas quero citar alguns exemplos do meu percurso político. Em determinado momento, no Estado do Paraná, o órgão superior da magistratura...

(Interrupção do som.)

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – ...se reuniu e se deu um aumento, um aumento de salário corporativo, sem a participação do Legislativo nem do Executivo, e eu era o Governador. Ora, um aumento é possível, mas através de lei. E a lei é um ato complexo, que precisa ter sempre a participação dos três Poderes. A iniciativa seria do Judiciário, a Assembleia analisaria a proposta, o Governador sancionaria ou vetaria, e o seu veto seria submetido posteriormente à Assembleia. É isso que nós vemos todo dia aqui. Se eu concedesse o aumento sem autorização legal, eu estaria cometendo um crime de responsabilidade. Eu não remeti o dinheiro pedido ao Poder Judiciário. Por via de consequência, não tiveram aumento, e aumento não teve também o Ministério Público. Daí veio o vezo corporativo dessas instituições. Senador Lasier, eu respondi a 38 processos, os mais absurdos possíveis. Esses cabelos brancos que eu tenho aqui, embora eu seja ainda relativamente jovem – tenho apenas 76 anos –, eu atribuo, em boa parte, a essa pressão corporativa do Judiciário e do Ministério Público em cima da minha recusa de cometer um crime de responsabilidade em favor de uma visão corporativa e de um aumento, merecido, talvez, mas que não era possível nas circunstâncias econômicas do Estado do Paraná naquele momento. Então, é isso que me preocupa. Eu acho que nós temos que avançar na legislação. Vamos acabar com o foro privilegiado, mas vamos votar também esse projeto do qual eu sou Relator – a criminalização do abuso de poder; a irresponsabilidade corporativa na acusação e no julgamento –, senão nós estaremos colocando, por exemplo, um prefeito do interior em uma situação de extrema vulnerabilidade diante de um promotor público ou de um juiz de vinte e poucos anos, recém concursado, que antipatiza com o prefeito, porque não gosta de viver na sua vizinhança, porque teve um atrito num acidente de trânsito, e logo o processa e pede a prisão em primeira instância. Eu consegui absolvição nos 38 processos, mas eles me atrapalharam muito no Governo do Estado. Eram todos absurdos. Então, eu acho que nós precisamos começar a mexer nisso tudo, mas não só no foro privilegiado. Um juiz tem uma indulgência plenária por parte da sua categoria. Se criminoso, acaba sendo forçado a uma aposentadoria remunerada. Daí dizem: "Não, mas ele pode ser processado criminalmente." Não existem exemplos que confirmem essa possibilidade; um ou outro, exceções absolutas. Então, nós temos que ir com cuidado nesse processo. Pode contar com o meu voto e o meu apoio, inclusive para que isso seja discutido em plenário, mas não vamos cair na esparrela corporativa, porque acabamos entregando o Governo do Brasil a corporações, corporações de carreiras jurídicas, como promotores e juízes, e outras corporações também, advogados da União, advogados dos Estados, defensoria pública, que acabam se cercando de prerrogativas que são negadas ao comum dos administradores. Não é um privilégio pessoal o foro privilegiado. É um privilégio do cargo para viabilizar a possibilidade do exercício do cargo a salvo das pressões corporativas. Eu acredito que nós podemos discutir isso com inteligência, e eu já adianto o meu voto favorável, mas adianto o voto favorável na expectativa de que este Senado não vai se acoelhar e fugir da responsabilidade de criminalizar também o abuso de poder. A indulgência plenária concedida às carreiras jurídicas do Ministério Público e do Judiciário é extremamente danosa, porque, afinal, o foro privilegiado pode, de uma forma ou de outra, resultar num inquérito, e a indulgência plenária não resulta em nada, a não ser na possibilidade de acusações temerárias e irresponsáveis. Então, se vamos mexer nessa ferida, vamos mexer em todas as feridas da indulgência a autoridades no Brasil. E o meu exemplo é assustador. Eu respondia a 38 processos decorrentes do fato de ter me negado a cometer o crime de responsabilidade de repassar recursos sem lei.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Obrigado pelo aparte, Senador Requião. V. Exª fala que há feridas em excesso para mexermos aqui no plenário. Pena que nós não estejamos enfrentando essas feridas, como V. Exª denomina. E V. Exª trouxe mais um exemplo de absurdos, tantas vezes comentados e condenados pela sociedade brasileira. Aquele caso dos magistrados que cometem infrações graves, que cometem desvios, cometem crimes e são contemplados com a aposentadoria compulsória, levando a remuneração da época da atividade efetiva, bem como um outro caso que poderia ser invocado aqui, e tudo isso se prestaria para o debate, dentro do foro privilegiado, como sejam esses últimos casos que nós estamos...

    Queria complementar, Senador?

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – Eu queria aproveitar esta oportunidade para expor um pouco mais da minha indignação com os tais abusos, as tais indulgências plenárias e os mandatos sem controle, que acabamos outorgando em muitas instâncias. Eu queria citar um fato ocorrido comigo que tomei conhecimento hoje. Eu sou Senador aqui há seis anos. Eu fui governador três vezes, já fui Senador da República, fui prefeito da capital do meu Estado, fui deputado estadual. Eu sou formado em Direito, tenho uma pós-graduação em planejamento urbano e sou formado também pela PUC num curso que à época se chamava Jornalismo, hoje é Comunicação. Eu tenho algum preparo e tenho uma experiência acumulada razoável. Eu vi agora a distribuição, Senador Lasier, das indicações do meu Partido para as comissões. Eu fui contemplado com a exclusão da titularidade das principais comissões do Senado. Eu não sou mais titular da Comissão de Relações Exteriores, eu não sou mais titular da Comissão de Economia, eu não tenho titularidade alguma mais, conforme a...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – A que V. Exª atribui esse fato?

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – ... designação da Liderança. Eu, primeiro, pensei o seguinte: "Parece que, para ser designado pelo meu Partido a uma comissão, tem que ser denunciado pela Odebrecht". Mas, não, eu verifiquei que não. Eu conversava agora com uma excepcional Senadora, que estava aqui ao meu lado, a Senadora Simone, que me disse: "Não, eu também não sou denunciada pela Odebrecht, mas faço parte de algumas comissões". E ela me disse: "Algumas até me sobrecarregam, e eu gostaria de sair". Então, se não foi isso, o que foi? O que é que está me faltando para poder integrar a boa vontade da Bancada do PMDB? Eu me sinto aqui como um estranho no ninho. Fui excluído das comissões depois de seis anos de mandato, no segundo mandato de Senador da República. Na primeira vez, Senador, que me elegi Senador da República pelo Paraná, se não me engano, fui o mais votado proporcionalmente do Brasil. Eu tenho alguma experiência nisso. E o meu comportamento – pelo menos, eu assim penso – é de uma lisura absoluta. O que é que está acontecendo no Senado da República? Eu agora sou suplente. Eu imaginei, de uma forma positiva, que talvez o Líder do meu Partido, Senador Renan Calheiros, tenha pensado o seguinte: "Eu tiro o Requião, que não está indiciado na Lava Jato, porque, logo depois, condenam alguns desses indiciados, e ele assume o lugar". Mas V. Exª me adverte da lentidão dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal. Então, eu fico aqui indagando ao Senado e ao Líder da minha Bancada o porquê da minha exclusão.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – É uma questão que V. Exª precisará decidir dentro do Partido, do seu PMDB.

    Concluindo, Presidente, eu só queria invocar, diante dos casos aqui trazidos, que também tem sido um absurdo o caso de não colocação aqui em votação de projetos que já têm até calendário especial, como é o caso da indicação dos Ministros do Supremo. E, para concluir, Senador Requião, há o caso da concessão do adicional de moradia indistintamente para todo mundo, decidida por um Ministro do Supremo Tribunal Federal que, há três anos, está sentado sobre o processo, quando o próprio Conselho Nacional de Justiça é contra essa distribuição indiscriminada de adicional de moradia para todo mundo. É outra matéria que caberia muito bem vir à discussão aqui, no Senado.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – Senador Lasier, estamos atrapalhando um pouco o início da Senadora Lídice, mas eu acho que o assunto merece algum espaço. Não é só o adicional de moradia. Exemplo do meu governo no Paraná. Eu assumi o governo depois daquele período de inflação muito grande, de congelamento de salários e eu dei, como mereciam os juízes e os promotores, um aumento de sustância, considerando a perda...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – ... no passado, mas o projeto de lei que eu mandei à Assembleia, Senador Reguffe, não dizia textualmente que era uma compensação pelas perdas anteriores. O que aconteceu, então? Essas instituições passaram a calcular o Plano Bresser, o Plano Real, aqueles planos todos...

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Senador.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – Imaginaram uma massa de salário que passou a ser corrigida. Depois, pressionam o Executivo e pagam mensalmente essas diferenças, de um ponto de vista corporativo e exclusivo. Imagine, Senador, se esse processo de correção...

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Senador Requião.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – ... fosse dado ao conjunto dos funcionários públicos do Brasil; precisaríamos de três ou quatro orçamentos para satisfazer. Então, é esse o problema. Não é só o foro privilegiado, não é o abuso dos Parlamentares, o salário excepcional que nós recebemos, o exagero das verbas de gabinete e a possibilidade de funcionários que temos de corrigir...

(Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Reguffe. S/Partido - DF) – Senador Requião, é que eu já dei 18 minutos a mais, e a Senadora Lídice precisa falar. Depois, há a Senadora Gleisi e o Senador Eduardo Amorim. Mas vou dar mais um minuto para V. Exª concluir o aparte.

    O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) – A conclusão é que nós temos que ir com mais profundidade. Essa história do foro privilegiado, que está entupindo o WhatsApp com mensagens de todo jeito, é unilateral e ela vem para divertir, Senador. Divertir do italiano divertere, desviar do que importa. É importante acabarmos com esse privilégio, mas não podemos nos distrair com todos os outros que são terríveis.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Obrigado, Senador Reguffe. Mas tenho certeza de que V. Exª tem simpatia com as causas que aqui debatemos.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/03/2017 - Página 33