Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque para evento de celebração da chegada das águas do Rio São Francisco ao Município de Monteiro-PB.

Autor
Fátima Bezerra (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
Nome completo: Maria de Fátima Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL:
  • Destaque para evento de celebração da chegada das águas do Rio São Francisco ao Município de Monteiro-PB.
Aparteantes
Otto Alencar.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2017 - Página 18
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, EVENTO, LOCAL, MUNICIPIO, MONTEIRO (PB), ESTADO DA PARAIBA (PB), PRESENÇA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE, OBJETIVO, COMEMORAÇÃO, CHEGADA, AGUA, ORIGEM, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, COBRANÇA, GOVERNO FEDERAL, CONCLUSÃO, OBRAS, REFERENCIA, ABASTECIMENTO, REGIÃO SEMI ARIDA, REGIÃO NORDESTE, ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, OBJETO, AUDIENCIA PUBLICA, DISCUSSÃO, ASSUNTO.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Senador Valadares, que preside a sessão neste exato momento, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, não poderia, ao ocupar a tribuna pela primeira vez nesta semana que se inicia, deixar de registrar o evento realizado no pequeno Município de Monteiro, no interior paraibano, no último domingo. Refiro-me ao ato popular que contou com a presença do Presidente Lula, da Presidenta Dilma, do Governador Ricardo Coutinho, e de diversas lideranças políticas, quando foi celebrada a chegada das águas do Rio São Francisco ao semiárido nordestino, começando pela Paraíba e Pernambuco e, em breve, chegando ao Rio Grande do Norte e ao Ceará.

    O dia 19 de março de 2017, também consagrado a São José, considerado pelos católicos e pelos nordestinos como padroeiro dos agricultores, pelo quanto de tradição se firmou em torno desse dia, pelo que ele anuncia no que diz respeito à questão das chuvas e de um bom inverno... Mas o que quero aqui colocar, Sr. Presidente, é que o dia 19 de março de 2017 ficará para sempre guardado na minha memória e no meu coração, assim como não tenho nenhuma dúvida de que ficará guardado nas memórias e nos corações de mais de 100 mil pessoas que participaram da inauguração popular da transposição do Rio São Francisco, ao lado, como já disse, do Presidente Lula, da Presidente eleita Dilma Rousseff, do Governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, de Senadores, de Deputados e de diversas outras lideranças políticas que participaram da comitiva.

    Quero ainda acrescentar, Sr. Presidente, que é muito emocionante ver as águas do Velho Chico mudando a paisagem e a vida do povo nordestino, castigado, diga-se de passagem, há cinco anos por uma das secas mais prolongadas dos últimos 100 anos. Mais emocionante ainda é reescrever a história com a tinta da verdade, com a caligrafia de quem, de fato, teve a ousadia e o compromisso necessários para retirar do papel uma obra vislumbrada e prometida desde o período imperial. Prometeram. Muitos. Mas foi preciso que um migrante nordestino que aos sete anos de idade já carregava balde de água na cabeça chegasse à Presidência da República para que as obras da transposição saíssem do papel.

    O projeto de integração do Rio São Francisco vai beneficiar cerca de 12 milhões de pessoas em 390 Municípios dos Estados de Pernambuco, do meu Rio Grande do Norte, da Paraíba e do Ceará, além de quase 300 comunidades rurais situadas às margens dos canais, inclusive comunidades quilombolas e indígenas.

    Na inauguração popular realizada em Monteiro, o povo nordestino demonstrou que sabe perfeitamente quem foi responsável por transformar esse grandioso projeto em realidade, expressando, portanto, sua imensa gratidão ao ex-Presidente Lula e à Presidente eleita Dilma Rousseff.

    Mas os desafios, Sr. Presidente, ainda são imensos, pois a transposição por si só não resolve os problemas da seca no Nordeste. Além de cobrar que o Governo ilegítimo conclua as obras da transposição, em especial do Eixo Norte, que vai fazer com que as águas cheguem ao Rio Grande do Norte e ao Ceará, queremos reforçar o quanto é necessário ficarmos atentos ao conjunto de obras ambientais necessárias à revitalização e à preservação do Rio São Francisco, bem como ao conjunto de obras sociais necessárias às comunidades afetadas pelas obras da transposição.

    Por isso mesmo, na condição de Presidente da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo, já estamos apresentando um requerimento para a audiência pública em que queremos dar início a esse debate sobre a questão das águas do São Francisco, o uso dessas águas, realizando um diagnóstico sobre as comunidades que serão contempladas e sobre o andamento exatamente das obras sociais, até porque, Sr. Presidente, para que a transposição cumpra seu papel social, ambiental e econômico, temos de cuidar da bacia hidrográfica do São Francisco, o que significa proteger as nascentes do rio, recuperar as suas margens e matas ciliares, sanear os Municípios para que não poluam a bacia, analisar o impacto das outorgas para o uso da água e debater a gestão e uso sustentáveis, comprometendo União, Estados, Municípios e sociedade civil organizada.

    Portanto, Sr. Presidente, eu quero dizer que com muita emoção nós estivemos, no domingo, em Monteiro, e vimos com os próprios olhos esse evento que – eu quero aqui acrescentar –, sem dúvida nenhuma, me marcou para sempre, Senadora Kátia, porque, assim como o Presidente Lula, eu também sou uma sobrevivente da seca. Assim como o Presidente Lula e a maioria dos nordestinos, sei o que era, às vezes, acordar às quatro horas da manhã, minha mãe acordando a mim e a meus irmãos para que nós saíssemos caminhando léguas em busca exatamente de água para beber. Hoje, de repente, vejo aquilo que nós pensávamos que era um sonho impossível ser realizado. São as águas do São Francisco chegando – repito – para, de um lado, trazer segurança hídrica para a população do Semiárido nordestino.

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – Senadora Fátima Bezerra, V. Exª me dar um aparte?

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Sim. Peço ao Presidente que possa conciliar com o meu tempo...

    O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) – V. Exª, como oradora, pode conceder o aparte.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Dou um aparte a V. Exª com o maior prazer.

    Senador, por favor.

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – Obrigado, Presidente. Eu concordo, Senadora Fátima Bezerra, com V. Exª quando lá, em 2007, o Presidente Lula tomou essa iniciativa, que foi uma iniciativa de coragem e de decisão, para levar água para os Estados receptores das águas do São Francisco. E se trata, sobretudo, da Paraíba, que é o Estado que tem o menor potencial de água de superfície e aquíferos para sustentar a sua população, e também dos outros Estados, como Ceará, Pernambuco e o próprio Estado de V. Exª, que tem um aquífero muito grande que poderia ser explorado com poços artesianos profundos, o Estado do Rio Grande do Norte. E eu nunca fui contra a transposição – e já discuti isso com a Presidente Dilma e também com o Presidente Lula. O que eu quero dizer é que essa transposição já está em R$9 bilhões e que se a revitalização não começar rapidamente... E aí nem o Presidente Lula fez, nem a Presidente Dilma fez, nem o Governo atual, que tem oito meses e que disse que ia fazer a revitalização, fez. Colocamos para este ano R$300 milhões, que o Ministério do Planejamento tirou da Codevasf, deixando R$18 milhões. O que eu quero dizer é o seguinte: deve-se começar a revitalização de forma urgente. Sabe como ela deve começar? O Presidente da República deve fazer um decreto de situação de emergência na Bacia do Rio São Francisco nos Estados produtores de água, que são dois, Minas Gerais e Bahia, para se começar a revitalização das nascentes, das fontes e dos afluentes, porque a maioria, mais da metade, já morreu. No meu Estado, cinco rios já foram considerados rios mortos, à margem direita do Rio São Francisco. E, hoje, a Barragem de Sobradinho está com 14,99% do volume útil; no ano passado, tinha 36%. Não vai chover mais na Bacia do Rio São Francisco. Nós vamos para o volume morto no mês de agosto. E o volume morto, que são 5 bilhões de metros cúbicos de água, já tem 30% de aterramento com areia, com argila e com sedimento de terra, que têm corrido. Portanto, a transposição só valerá para os Estados receptores, como Sergipe, que pode receber também essas águas, Alagoas, Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, se se fizer a revitalização. Sabem por quê? Porque, se não se fizer a revitalização, em 2030, não vai chegar mais uma gota d´água à Barragem de Sobradinho. Aí o dinheiro foi todo jogado fora, se não se fizer isso. O Presidente Lula acertou na transposição e errou, porque não começou a revitalização. A Presidente Dilma teve seis anos e meio...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – ... Ou praticamente cinco anos e meio para fazer e não fez. Eu tive duas reuniões com ela, com a Ministra do Meio Ambiente à época, Izabella Teixeira, e com o Mercadante e falei com a Presidente: "Presidente, comece a revitalização". A revitalização, Senadora Fátima Bezerra, vai depender da aplicação anual de mais ou menos R$600 milhões, em dez anos, para compensar o que em 60 anos o homem destruiu. Ele destruiu as matas ciliares da calha do rio, das nascentes e das fontes. Estou aqui com um relatório: o mar já entrou 15km no Rio São Francisco. O Senador Antonio Carlos Valadares conhece e sabe que, lá perto de Propiá, as águas já estão salgadas e já não há como captar água, porque o mar...

    O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) – É a chamada cunha salina, que está penetrando no nosso Estado.

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – Cunha salina. O mar já entrou 15km.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – O primeiro sintoma da morte de um grande rio como o São Francisco é quando ele não tem mais força para entrar no mar e o mar começa a penetrar no rio. São 15km em Propiá e em Penedo. Então, o Rio São Francisco terá 13 anos de vida se não se começar a revitalização. Nós do Nordeste deveríamos fazer o que o Senador Antonio Carlos Valadares fez há muitos anos. Ele constituiu um fundo, que está na Câmara Federal, para que, sendo regado com o dinheiro que o Rio São Francisco deu para a energia, para a irrigação, se pudesse começar imediatamente a revitalização do rio. Portanto, essa vitória de levar água para a Paraíba é uma vitória de Pirro se não se fizer a revitalização, porque, em 2030, não vai chegar uma gota d´água à Barragem de Sobradinho. Essa barragem está hoje com 14%; no ano passado, estava com 36%; Itaparica, 27%. Então, não há a menor condição. É uma falta de responsabilidade seja lá de quem for...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Otto Alencar (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) – ... matar o principal rio do Brasil, que é o Rio São Francisco, que leva água para o Nordeste brasileiro.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Senador, eu pediria só uma generosidade de V. Exª, porque, claro, para fazer o bom debate, eu cedi mais da metade do meu tempo ao Senador Otto.

    Primeiro, eu quero dizer ao Senador Otto que considero que tanto Dilma como Lula só tiveram acertos na realização dessa obra. Aliás, Senador, alguém ter a ousadia e a determinação para dar início a uma obra dessa, acima de tudo, mostra a sua visão de estadista; acima de tudo, mostra o quanto o seu coração tem de sensibilidade, pelo quanto tanto Lula como Dilma entenderam do valor humano e do caráter social que tem a transposição das águas do São Francisco. Então, a eles, mais uma vez, todas as nossas homenagens e todo o nosso sentimento de gratidão. Não foi à toa que aquela multidão acorreu a Monteiro no domingo. Mais de 100 mil pessoas foram lá, porque o nordestino, acima de tudo, não tem só caráter, o nordestino tem gratidão. E o povo nordestino, inclusive, se sentiu insultado quando, há poucos dias, o Governo ilegítimo e seus aliados lá estiveram e tentaram apagar da história aquilo que não dá para apagar, repito, que foi a ousadia, a determinação e a sensibilidade do Presidente Lula ao iniciar a obra e da Presidenta Dilma ao entregar a obra praticamente concluída.

    Segundo, no mais, eu concordo com V. Exª, tanto é que aqui já mencionei que nós temos que dar sequência ao debate, no sentido de que tenhamos um olhar muito cuidadoso, e exigir do Governo Federal, dos Estados...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – ... e de todas as esferas o uso sustentável dessas águas, a revitalização do São Francisco. No tocante a isso, absolutamente nenhuma discordância, tanto é que acabei de dizer aqui que, na condição de Presidente da Comissão de Desenvolvimento Regional, já apresentamos um requerimento para iniciar, Senador Otto, um ciclo de debates acerca exatamente do andamento da obra. Nós temos ainda o Eixo Leste, para trazer água para o Rio Grande do Norte, que precisa, e muito também, da segurança hídrica via águas do São Francisco, assim como o Ceará. Inclusive, eu convido V. Exª e todos os Senadores, em especial os Senadores e as Senadoras da Bancada nordestina, para que nós possamos realizar esse ciclo de debates aqui no Senado Federal no que diz respeito ao acompanhamento dessa obra, da sua conclusão, para que, de fato, ela cumpra o seu destino. E o seu destino...

(Interrupção do som.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – ... é trazer...

    Vou concluir, Sr. Presidente. (Fora do microfone.) O seu destino é trazer dignidade, respeito, cidadania para uma população, sem dúvida nenhuma, que há muito tempo sonhava com isso. E é desnecessário aqui dizer das especificidades que tem o Nordeste como um todo, especialmente o Semiárido nordestino, no que diz respeito à questão do acesso à água. Quantas gerações de nordestinos e nordestinas padeceram, inclusive até com a morte, em função da insensibilidade dos governos passados, governos que, na verdade, nunca tiveram compromisso real de resolver o problema da seca e da falta de segurança hídrica, até porque muitos dos políticos desses governos passados se alimentavam exatamente do sofrimento do povo nordestino, através da indústria da seca, para sobreviverem...

(Interrupção do som.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Já concluo, Sr. Presidente. (Fora do microfone.) Eles se alimentavam desse sofrimento para sobreviverem exatamente no exercício da política através do chamado coronelismo.

    Eu sei muito bem o que é isso. A maioria do povo nordestino sabe muito bem o que é isso. Por isso, o povo nordestino celebrou, com tanta emoção, com tanta força no seu coração, esse ato popular no último domingo. Ele sabe o que significa, repito, pelo valor humano, pelo caráter social, as águas do São Francisco finalmente chegarem para lavar a alma do povo nordestino, pelo que elas trazem de dignidade e de cidadania.

    Ao povo nordestino, que nunca abandonou essa luta, que teve perseverança e esperança, nossas homenagens. E nossas homenagens, repito, a Lula e Dilma pelo quanto de determinação...


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2017 - Página 18