Discurso durante a 29ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentário acerca da dificuldade para a prática da filantropia por parte das entidades beneficentes de assistência social caso seja retirada sua imunidade tributária com a reforma da Previdência.

Autor
Lasier Martins (PSD - Partido Social Democrático/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Comentário acerca da dificuldade para a prática da filantropia por parte das entidades beneficentes de assistência social caso seja retirada sua imunidade tributária com a reforma da Previdência.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2017 - Página 40
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • COMENTARIO, ASSUNTO, DIFICULDADE, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, ASSISTENCIA SOCIAL, REALIZAÇÃO, OBRA FILANTROPICA, AREA, EDUCAÇÃO, MOTIVO, POSSIBILIDADE, RETIRADA, IMUNIDADE TRIBUTARIA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA, GARANTIA CONSTITUCIONAL, EXECUÇÃO, SERVIÇO, COMPETENCIA, ESTADO, CRITICA, EXTINÇÃO, GRUPO, ENTIDADE, RESULTADO, CUSTO OPERACIONAL, PREJUIZO, POPULAÇÃO, IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Thieres Pinto, Senadores, Senadoras, telespectadores, ouvintes, eu quero falar sobre a ameaça de extinção da filantropia nos ramos da educação e da saúde com o andamento da PEC da Previdência.

    Começo lembrando o significado etimológico da palavra grega filantropia: ela significa amor à humanidade. Na atualidade, significa o ato ou o propósito de dedicar-se a ações que acolhem o ser humano em suas carências ou necessidades. Portanto, são instituições que se identificam com o ato de assistir o ser humano nas áreas em que o Estado não o alcança: saúde, assistência social e educação. Portanto, em um país de tantas desigualdades, a filantropia é muito importante e indispensável.

    O termo filantropia no Brasil adquiriu um sentido técnico­jurídico específico: refere-se a entidades sem fins lucrativos que atuam na área da assistência social, que compreende a saúde, a educação e a assistência social stricto sensu, abrangência essa chancelada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Tais entidades, além da imunidade com respeito a impostos, prevista no art. 150, inciso VI, letra "c", da Constituição, são imunes de contribuição para a seguridade social, conforme previsto no art. 195, §7º, da Constituição brasileira.

    Duas observações importantes: quando a Constituição de 1988, no referido §7º do seu art. 195, menciona que as entidades beneficentes de assistência social são isentas, ela o faz sem precisão técnica, porque se trata, na realidade, de imunidade – assim já o proclamou o Supremo Tribunal Federal. As entidades beneficentes de assistência social, dentre as quais se incluem as educacionais – e principalmente por elas falo aqui –, para se beneficiarem desta imunidade do art. 195, §7º, precisam atender a requisitos estabelecidos em lei. Por isso, nem todas as entidades assistenciais sem fins lucrativos – beneficentes – são filantrópicas; somente o são aquelas que atendem a esses requisitos. As que não os atendem, beneficiam-se apenas da imunidade a impostos – Constituição de 1988, art. 150, inciso VI, letra "c" –, mas não da imunidade da chamada quota patronal da contribuição previdenciária – art. 195, §7º.

    A Constituição cidadã de 1988 consagrou, pois, o entendimento de que as entidades filantrópicas gozam de imunidade em relação à contribuição previdenciária patronal, PIS, Cofins e CSLL. Por que isso? Porque tais entidades executam serviços, projetos e programas complementarmente ao Estado, suprindo, inclusive, a ausência, total ou parcial, do Poder Público no enfrentamento de demandas sociais. Não fosse essa atuação, as carências sociais seriam ainda maiores, porque o Estado, sabidamente, não tem condições de provê-las sozinho.

    Se a imunidade lhes for retirada – e agora é essa a ameaça –, seus serviços se tornarão custosos e de difícil acesso a boa parte da população. No Rio Grande do Sul, por exemplo, meu Estado, são cerca de 100 mil alunos beneficiários de bolsas de estudo de 100% ou 50% – no País, são 600 mil alunos –, além de outras ofertas no âmbito da saúde e assistência social. Não procede, pois, o argumento de que a educação não faz parte da seguridade social. Faz parte, sim, e muito relevante.

    Além do mais, as instituições precisam qualificar-se para alcançar o status de entidade filantrópica através da Cebas (Certificação das Entidades Beneficentes de Assistência Social), prestando conta ao respectivo ministério a que está subordinado: a educação, ao MEC; a assistência social, ao MDS; e a saúde, ao MS. A legislação é rigorosa com as entidades, e o descumprimento acarreta pena de descredenciamento e consequentemente a perda do benefício.

    O que não dá para compreender é que, agora, o Sr. Relator da medida da previdência queira desqualificar a educação e retirá-la da seguridade social, porque é exatamente lá que se acolhem crianças e jovens carentes à proporção de um bolsista para cada cinco pagantes, selecionados a partir da carência, cujo controle é feito por comissão pública, que analisa os documentos comprobatórios do grau de carência. São, portanto, crianças e jovens protegidos da vulnerabilidade social e delinquência, por conta do acolhimento na entidade filantrópica. Tenho certeza de que os jovens que hoje são vítimas da marginalidade não o seriam, tivessem podido frequentar uma instituição educacional filantrópica, que lhes teria ensinado valores, princípios, respeito à vida, amor ao semelhante, cultura, preparo para o enfrentamento da vida e dado condições de aprender uma profissão para ganhar honestamente a vida.

    Também eu particularmente, Sr. Presidente, não estaria aqui não tivesse tido a bênção de ter podido frequentar uma instituição filantrópica, que supriu a falta de condições de minha família. Como silenciar-se diante do propósito do Relator da PEC 287 em sua equivocada pretensão de penalizar todas as instituições filantrópicas por conta de alegado desconhecimento de beneficiários de instituições filantrópicas de sua terra natal ou eventual desvio de conduta de outra?

    Se houve desvios, que essas instituições sejam penalizadas, mas não se podem penalizar as demais que estão dentro da lei e cumprem religiosamente os compromissos decorrentes da condição de entidade filantrópica. Se alguma irregularidade existe na saúde, na educação, na assistência social filantrópicas, é porque a fiscalização não funciona corretamente.

    Não vou recorrer a números, porque são sobejamente conhecidos, mas a questão é de justiça social, de que tanto precisa este Brasil problematizado.

    Há uma constatação da qual não se pode fugir: tributos são fundamentais para a sustentação do Estado, mas não constituem a finalidade principal do Estado. Finalidades principais são, entre várias, propiciar saúde, educação e assistência social stricto sensu. Quando o Estado não pode provê-las por inteiro e de forma adequada, deve poder contar com a colaboração da sociedade, exercida, no caso, através das entidades filantrópicas, indispensáveis no Brasil, hoje tão carente de recursos. É justo, portanto, que tais entidades tenham a contrapartida da imunidade.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Só faria sentido eliminar essa contrapartida – imunidade – se a perda de arrecadação fosse muito maior do que as vantagens – e aí um ponto importante – que a filantropia propicia ao Estado; e, ainda assim, se o Estado se dispusesse a aplicar todo o acréscimo de arrecadação no custeio dos serviços prestados pelas entidades filantrópicas. Não é o caso. Estudos confiáveis demonstram que o retorno de cada R$1 de renúncia fiscal é da ordem de R$5 a R$6, ou seja, para cada R$1 de benefício auferido pelas entidades filantrópicas, o Estado obtém retorno direto e indireto da ordem de R$5 a R$6. Portanto, o Estado ganha com a filantropia.

    Precisamos, na verdade, de respeito às milhares de pessoas envolvidas e favorecidas pelas atividades filantrópicas, sobretudo àquelas cuja vida tem sido dedicada aos menos favorecidos para ajudar a construir sentido de vida. Não podemos nos calar diante do risco de milhares de crianças e jovens serem jogados no olho da rua por conta da insensibilidade do legislador, que precisa avaliar as consequências de suas decisões e evitar que se consuma uma injustiça, cujas consequências serão irrecuperáveis. A sociedade não nos perdoará por este equívoco.

    Apelo, pois, em conclusão, Sr. Presidente, à sensibilidade do Relator, Deputado Arthur Maia, a quem assisti, ainda anteontem à noite, no programa Roda Viva da TV Cultura, dizendo que, no item da filantropia, há a necessidade de uma "calibragem melhor", conforme a expressão que ele usou. Ainda bem que começam a pensar nesse particular.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Apelo ao Sr. Relator e aos Srs. Parlamentares que têm sensibilidade, para que tenhamos a grandeza e a humildade de respeitar o legado histórico das instituições filantrópicas, que, há mais de um século, fazem com eficiência o que o Estado não vem conseguindo fazer. Destruir esta obra é um sacrilégio e não terá perdão.

    Eu espero que tenhamos suficiente inteligência para não consumar esse erro histórico que nos envergonhará para o resto de nossas vidas.

    Era o apelo que eu queria fazer: tenhamos sensibilidade para encarar esse item da pretendida reforma tributária e que hão haja o fim da filantropia na saúde, na educação e na assistência social.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2017 - Página 40