Discurso durante a 44ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca de lista divulgada pelo ministro do STF Edson Fachin, contendo pedidos de abertura de inquérito, no âmbito da operação Lava Jato, contra diversas figuras políticas do país.

Críticas ao governo do presidente Michel Temer.

Análise das possibilidades para a eleição presidencial de 2018, com destaque para o papel do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Considerações acerca de lista divulgada pelo ministro do STF Edson Fachin, contendo pedidos de abertura de inquérito, no âmbito da operação Lava Jato, contra diversas figuras políticas do país.
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao governo do presidente Michel Temer.
ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS:
  • Análise das possibilidades para a eleição presidencial de 2018, com destaque para o papel do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Aparteantes
Cristovam Buarque, José Medeiros.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2017 - Página 23
Assuntos
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS
Indexação
  • COMENTARIO, FATO, LUIZ EDSON FACHIN, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DIVULGAÇÃO, NOME, RELAÇÃO, SOLICITAÇÃO, POLICIA FEDERAL, ABERTURA, INQUERITO, OBJETIVO, INVESTIGAÇÃO, CRIME, AUTORIA, GRUPO, MINISTRO DE ESTADO, DEPUTADO FEDERAL, SENADOR, GOVERNADOR, EX PRESIDENTE, REFERENCIA, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), PARTICIPAÇÃO, EMILIO ALVES ODEBRECHT, EMPREITEIRO, REALIZAÇÃO, DELAÇÃO PREMIADA, IRREGULARIDADE, CONTABILIZAÇÃO, RECURSOS, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, ALTERAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, TERCEIRIZAÇÃO, AJUSTE FISCAL.
  • ANALISE, POSSIBILIDADE, ELEIÇÕES, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ENFASE, CANDIDATURA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos acompanha pela TV Senado, pela Rádio Senado e também pelas redes sociais, não poderia deixar de vir hoje a este Congresso e não subir a esta tribuna para falar daquilo que tem mais impactado a vida deste País. Não digo nem a vida política. Eu digo a vida no sentido geral, que são as relações ligadas à Lava Jato, a famosa lista da Odebrecht, que envolve políticos aqui no Congresso Nacional, com mandato ou sem mandato, envolve também pessoas da gestão pública brasileira e obviamente também da gestão empresarial.

    Eu não vim aqui para tentar justificar a minha situação específica, que dizem que eu recebi dinheiro para fazer minha campanha de 2014. Já falei sobre isso, soltei uma nota, falei no meu Face. Nunca conversei com os executivos da Odebrecht sobre isso, não pedi o dinheiro a eles, nunca tratei, mesmo como gestora pública, de interesses que fossem deles com contraprestação de ajuda. Mas não adianta falar isso aqui, até porque, depois que sai essa lista, depois que os nomes são colocados nela, publicamente você já tem uma condenação.

    Nós somos políticos, vivemos da opinião pública, estamos expostos a ela, chegamos aqui através do voto popular. Quando uma lista como essa sai e não faz separação sobre o tipo de acusação que se faz entre as pessoas, faz uma grande mistura entre todos, obviamente que é muito difícil você dizer que está inocente. As pessoas já te condenaram. Então, não venho aqui tentando salvar a minha figura pública. Sei das consequências que isso tem. Sei também que vou comprovar a minha inocência no processo judicial. Mas o processo judicial demora – demora muito tempo, Senador Reguffe. Talvez tivesse de ser mais rápido mesmo, como V. Exª estava falando aqui, para que pudéssemos atestar a inocência e pudéssemos demonstrar que o que estão falando não corresponde às verdades dos fatos e sequer existem provas. Mas vai demorar.

    Então, quero partir do pressuposto aqui de que a minha grande responsabilidade não é com a minha campanha eleitoral em 2018, não é com a minha volta a esta Casa. A minha grande responsabilidade é com a democracia deste País, é com a política como instrumento da democracia, porque, do jeito como as coisas foram divulgadas e estão sendo feitas, nós corremos o risco do desmanche da política, do desmanche dos partidos e do desmanche da democracia. Por isso, eu queria fazer algumas reflexões aqui que eu acho que são importantes.

    O que denota, o que mostra para o País isso tudo que está acontecendo, as delações, as acusações, as questões relacionadas às campanhas e algumas coisas também não relacionadas às campanhas? Mostra o domínio do capital sobre a política. A partir do momento em que o Brasil, em que este País disse que eram legais as doações empresariais para campanha, disse que os empresários podiam se articular, fazer doações e que os políticos podiam pedir.

    E o que nós vemos agora, ao abrir essa caixa de Pandora, é que houve um financiamento sem precedentes da política brasileira, ou seja, o capital financiando a política. Os valores que foram transacionados são valores muito grandes. E, como dizem aqueles que fizeram a delação, que antes eram bandidos absolutos e que agora passam quase a ser heróis da Pátria, isso não é recente na história da política brasileira. Mas não vem ao caso. O fato é que nós temos de considerar isso.

    Eu acho que cabe, por parte de nós políticos, especialmente por parte de nós do Partido dos Trabalhadores, Senador Requião, que ficamos no governo durante 13 anos, uma autocrítica muito séria: nós não mexemos com esse sistema, nós não fizemos a reforma política. Nem o Presidente Lula nem a Presidenta Dilma quis enviar para o Congresso Nacional uma proposta. Achou que isso era função desta Casa fazer a reforma política e mexer no sistema. Nós já tínhamos de ter impedido, sim, a doação empresarial para as campanhas. Nós não podíamos mais ter permitido valores de campanhas absurdos como nós tínhamos e que faziam com que as pessoas fossem atrás de recursos para financiar as campanhas. Nós tínhamos de ter denunciado isso e dito: chega! Temos de fazer uma reforma política e uma reforma eleitoral no País!

    Nós não fizemos. Muito pelo contrário. Aceitamos as regras do jogo, Senador Requião. Achamos que para ganhar eleição deveria haver, sim, financiamento de campanhas, que as campanhas teriam que ser caras, e que nós teríamos que ter essas condições para disputar. De fato, se você olhasse aquele momento da política, é isto que dava competitividade aos candidatos: quem tinha dinheiro, quem fazia o melhor programa, quem tinha mais cabo eleitoral, quem tinha avião para se deslocar para os lugares mais distantes, quem tinha recurso para ter carro, para ter outdoor, para ter propaganda bonita. Era isso que estava em jogo, era assim que as campanhas eram ganhas neste País. Tanto é assim que mostra que os financiamentos de campanha, depois da redemocratização, vêm para todos os presidentes e para todos os partidos.

    Nós devíamos – e esta é a grande autocrítica que eu faço –, nós devíamos ter enfrentado isso. Eu não sei se nós ganharíamos, Senador Reguffe, porque a correlação de forças não era favorável a isso. Mesmo as tentativas que nasceram desta Casa, do Congresso Nacional, não conseguiram prosperar, porque a correlação de forças era contrária. Nós só conseguimos aprovar que não houvesse mais doação privada de campanha agora, depois que estourou a Lava Jato, e V. Exª se lembra disso. Foi na pressão, porque antes a gente não conseguia fazer isso, Senador Elmano. Antes a gente tentava a discussão – não ia, não fazíamos força; mas nós teríamos que ter enfrentado, nós teríamos que ter denunciado, nós teríamos que ter feito esse enfrentamento. Nós poderíamos não ter tido força, mas nós poderíamos ter ganho uma narrativa política e um debate político, que nos ajudariam mais tarde a reformar.

    O problema é que as coisas ficaram como estavam. E aí eu pergunto: será que todos os que receberam dinheiro de campanha, independentemente da forma como receberam o dinheiro, tinham obrigação de saber que aquilo era dinheiro ilícito, que era dinheiro negociado, que era dinheiro sujo? Será que todas as campanhas receberam doações de dinheiro sujo? Porque é isso que se está colocando agora: que toda a campanha, todas as doações, inclusive no caixa um, eram provenientes de dinheiro sujo, porque logo a empresa teria um interesse e, por ela ser correspondida nesse interesse, ela doava para a campanha.

    Quantos nessa lista, inclusive eu, tivemos contribuição de campanha, lá nas nossas contas eleitorais aprovadas, de empresas e não nos dobramos a nenhuma pressão ou não fizermos a correspondência? Não fizemos isso. Eu diversas vezes subi a esta tribuna e votei contra matérias que eram de interesse inclusive de gente que me doou na campanha. Mas aí não adianta você falar. Então nós também podemos estar cometendo uma injustiça de colocar em cima dessas pessoas todas que receberam que elas eram obrigadas a saber que era dinheiro irregular, ilícito e de propina, quando a regra era essa. A regra era receber recursos de empresas. A regra era fazer campanhas que tinham estruturas grandes. Essa era a regra da disputa eleitoral, e era aceita. Não é mais aceita, ainda bem. E ainda bem que nós estamos limpando isso. Agora, para limpar isso, nós não podemos jogar o bebê com a água da bacia suja junto. Nós não podemos jogar a política, o total dos políticos e a democracia às favas para tentar arrumar o processo. Nós não podemos misturar e generalizar tudo.

    Hoje há uma entrevista muito interessante do Ex-Ministro – que foi Presidente da Câmara, inclusive, Senador Requião –, o Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Célio Borja. E ele diz que a generalização é a salvação dos canalhas. As delações serem tomadas como verdades absolutas antes de as investigações prosseguirem vão ajudar aqueles que sempre fizeram ilícitos. Disse que as delações não são prova, que elas narram fatos, que podem ser criminosos ou não. E vamos sempre nos lembrar de que quem está delatando está envolvido com o crime que está apontando. Tem de provar que os candidatos sabiam que o dinheiro veio de fonte ilícita. Disse que estão criminalizando quem não é criminoso e que isso serve aos criminosos, serve aos canalhas. Muitas vezes os corruptores são tratados como heróis ao fazerem as delações, como se fossem santos, como se fossem aqueles a serem pressionados por um bando de políticos corruptos que sabem que suas campanhas só poderiam ser financiadas por dinheiro ilícito, e como se eles, na realidade, fossem vítimas do processo.

    Aí quero pegar uma das falas colocadas à disposição do público, de um executivo da Odebrecht chamado Hilberto Mascarenhas. Ele disse que em 2014 falou para o Marcelo Odebrecht que estava muito preocupado com a situação. Ele disse que aquilo estava ficando perigoso demais, porque era muito dinheiro, e aquilo iria dar errado. Aí ele continua dizendo que não era ouvido, porque, na realidade, havia também um prazer de incitar, de dar o dinheiro, de fazer com que as campanhas e as pessoas dependessem daquele recurso para fazer as suas campanhas eleitorais, e que, portanto, aquilo também era uma demonstração de poder, prazeroso, em comprar partidos ou comprar pessoas. Foi o que disse um executivo da Odebrecht.

    Então, não vamos nos esquecer de que nesse processo não é só o sistema político que está podre, que está com dificuldades, que precisa ser também modificado – também o sistema empresarial está assim.

    Eu fico pensando, Senador Requião, que, se a Odebrecht fez lobby nesta Casa, com certeza outras empresas também fizeram. Se a Odebrecht doou assim, outras empresas também doaram. Se a Odebrecht comprou medidas provisórias, quantas outras empresas não compraram?

    Então, nós precisamos fazer um balanço total do Brasil. Não podemos ficar olhando apenas por um lado e fazer com que esse lado pague a conta. E o que me preocupa aqui não é o político pagar a conta, não é eu não me reeleger em 2018, não é o PT não se reeleger: é nós comprometermos a democracia, nós comprometermos aquilo que é a sustentação de conquistas que nós tivemos, nós dizermos que a política e os partidos não prestam. O que entrará no lugar? Vamos lembrar que a humanidade já vivenciou isso, que já vivenciamos isso no Brasil, mas o caso mais clássico talvez seja o da República de Weimar, na Alemanha, onde setores da política alemã, querendo combater os comunistas, deram foco e deram luz dizendo que a política e os políticos eram todos corruptos e que era preciso uma limpeza. Quem ascendeu no lugar? Adolf Hitler. E ele ficou por muito tempo administrando aquele país – fazendo gestão, fazendo guerras, matando todos, porque quem mata um com uma justificativa dessas mata dois, mata três, e ele matou os judeus, matou os poloneses, matou, enfim, milhares de pessoas. Então, nós vivemos uma situação muito parecida, em que as caças às bruxas de forma generalizada podem levar a isso.

    Como eu dizia, aqui, antes, tudo era aceito.

    Eu não posso deixar também de falar de uma outra fita de delator, que é o pai do Marcelo Odebrecht, Emílio Odebrecht, uma pessoa de grande caminhada no setor empresarial e também na influência política. Ele diz o seguinte em um de seus depoimentos:

Isso se faz há trinta anos. O que me surpreende [o que quero ter oportunidade de enfatizar] é quando vejo todos esses Poderes, a imprensa, tudo [tratando isso] como se fosse uma surpresa. [...] porque em 30 anos é difícil as coisas não passarem a ser normais, não é? O que me entristece é a própria imprensa. Por que agora estão fazendo tudo isso? Por que não fizeram isso há dez, vinte anos, atrás? Por que tudo isso é feito há trinta anos? É a própria imprensa. Vamos colocar claro, essa imprensa sabia disso tudo e fica agora com essa demagogia. Me perdoe, mas eu realmente acho que todos deveriam fazer uma lavagem de roupa de suas próprias casas para ver o que a gente pode fazer.

    Ou seja, nós vivemos numa situação de hipocrisia. Se ele está falando isso, que conhecia e que a imprensa sabia, obviamente ele é uma pessoa com trânsito nos círculos do poder. O que a imprensa não deve ter ganho? Quais são os financiamentos que tiveram? Quais são os pecados que tem a nossa mídia? Mas aí não vem para a delação, porque se vier não dá notícia, como o Judiciário.

    Sabe com o que fico impressionada, Senador Requião? É que o Governador Cabral... Aliás, o Rio de Janeiro é um dos Estados onde mais aconteceram essas situações, com o Governador Cabral envolvidíssimo nisso. Ele disse que queria fazer uma delação. Até agora não permitiram a delação do Cabral. Eu acho que tinha de permitir a delação do Cabral para que ele falasse dos seus pares políticos, com certeza, mas para ele falar, como já disse que queria falar, da promiscuidade com o Poder Judiciário e com setores do Ministério Público, porque, como disse a Juíza Eliana Calmon, ex-Ministra e Corregedora do CNJ, essa delação não vale se não entrar o Judiciário. Está falando quem conhece. Então, nós vamos ter uma limpeza pela metade? É isso o que estamos colocando para o Brasil? Quem vai assumir o poder é o Judiciário e o Ministério Público? Têm eles salvo-condutos e estão, com certeza, livres de qualquer acusação dos seus setores? Não me parece que seja isso, parece que os Judiciários estaduais já começaram a ser envolvidos, assim como nós também temos acusações a setores do Ministério Público, mas é importante a gente ter isso às claras para que a gente tenha a preocupação com os rumos que estamos seguindo.

    E aqui volto a falar: quem deve tem de pagar. Não estou preocupada com a eleição individual desse ou daquele, nem com a minha: estou preocupada com o sistema democrático brasileiro, que não podemos jogar na lata do lixo. Vou repetir: não podemos jogar a criança com a água suja da bacia junto. Não podemos fazer isso. Nós lutamos muito para chegar a um processo democrático. Agora, nós temos de ajudar a resolver essa situação. Se é em momentos de crise que podemos ter saídas, vamos conseguir ter as saídas agora, independentemente da salvação individual. Não é isso o que está sendo colocado. Se nós tivemos a coragem e, mais do que isso, a oportunidade de acabar com o financiamento privado, vamos fazer uma reforma política agora para baratear as campanhas eleitorais, para que não precisemos fazer programas estratosféricos de televisão, para que não precisemos estar todo o tempo em todos os lugares na época da campanha para falar com os eleitores, para que não precisemos contratar cabos eleitorais, para que não precisemos gastar em papeis, em propagandas eleitorais, para que usemos a internet – mas isso tem de ter limite, tem de ser para todos. Vamos fazer isso.

    Talvez o mundo, a vida, a situação esteja nos dando uma oportunidade para que, mais do que nós ficarmos lamentando aqui, mais do que nós ficarmos julgando aqui, nós tenhamos ação e atuarmos para melhorar esse processo e colocar uma alternativa para o povo brasileiro. Nós não podemos é entrar nesse clima da descrença com a política; isso é muito ruim. Volto a dizer: se nós não tivermos a política, que é um sustentáculo da democracia, o que nós vamos oferecer no lugar? Uma ditadura? O que nós vamos colocar no lugar? Pessoas iluminadas, seres técnicos e assépticos que terão condições de conduzir este País às suas veredas? É isso que nós vamos colocar no lugar, seres que não foram testados na política, na contradição e no debate? E vamos acabar com tudo que está aí, com aquilo que foi erguido?

    Os partidos políticos fazem parte da democracia, eles não podem ser condenados. Não vamos fazer com eles o que a Lava Jato fez com as empresas: ao misturar pessoa física e pessoa jurídica acabou com as empresas e com o emprego de milhões de brasileiros. Nós não podemos fazer isso com os partidos políticos – são instituições que são programáticas. Por isso a importância de fortalecer os partidos políticos numa reforma política. Nós não fazemos política por outsider, por pessoas; não são as minhas ideias e as minhas convicções. Eu faço parte de alguém que defende um programa, um projeto de Nação, uma visão de mundo. Não é a minha opinião, é a opinião que eu tenho sobre como as coisas devem se dar. E eu posso fazer alianças, sim, com outros partidos e com outras pessoas que comungam dessas ideias.

    Essa visão de salvadores da Pátria já nos levou a situações vexatórias. Vamos nos lembrar recentemente da nossa história. Não dá certo, porque não existe salvador da Pátria, porque não existe herói, porque a saída tem que ser no coletivo. Então, esse clima de descrença pode levar, sim, ao autoritarismo.

    Eu queria aqui falar do que nós estamos vendo ser construído na nossa sociedade. O maior debate que nós temos hoje, entre os articulistas políticos, é como se dará a eleição de 2018, e a aposta é assim: não pode ser em político! Pensa: nós vamos fazer a política a partir da antipolítica, do não político. Nós vamos trazer à sociedade brasileira pessoas que se dizem apolíticas para fazer a política. Isso é uma farsa, isso é uma inverdade, isso é apostar contra a inteligência da sociedade brasileira!

    Nós temos vários movimentos – acho que os senhores já viram aí – que estão pululando na sociedade brasileira, movimentos como o Acredito, o Brasil 21, o Agora, o Livres, o Meu Rio, a Nova Democracia, o Partido Novo, como foi o MBL, que puxou as manifestações pelo impeachment. Aí quando você vai ver, são todos operativos ou braços operativos de partidos políticos dizendo que são apolíticos, são o novo, são a forma nova de fazer política. O que trazem de programa esses movimentos ao Brasil?

    Eu ouvi, esses dias, uma entrevista do Luciano Huck num jornal – eu não lembro o jornal agora – em que ele dizia o seguinte: "É a vez da minha geração". Bonita a discussão, uma renovação geracional sempre é necessária. Comecei a ler a entrevista – não sai nada dela, é ele como alternativa de melhora da política. Qual é o projeto de Nação? Qual é o projeto de desenvolvimento do País? O que ele pensa para nós hoje e daqui a algum tempo? Nada! Niente! Mas estava lá falando de forma pomposa. E faz parte de um desses movimentos que devem usar alguns partidos políticos, porque não vão conseguir acabar com os partidos até 2018, para lançar o novo na política.

    Isso é muito sério, gente, porque isto é mentir para a sociedade: fazer política com seres apolíticos. A política é um instrumento de mudança. É pela política que se faz a democracia. Ruim com ela, pior sem ela. Ou vão dizer que, em regimes ditatoriais, nós não temos problema nenhum de desvios de recurso, de corrupção? Eu não estou defendendo isso. Eu só estou dizendo que a forma como nós olhamos para o que está colocado na sociedade pode nos levar ao caos completo.

    Eu também li, neste final de semana, uma entrevista muito interessante do Wanderley Reis, que, aliás, falava exatamente sobre esse risco que nós temos de a política ser execrada. Ele dizia o seguinte: "Nunca tivemos algo parecido com o ódio que [estamos] vivemos neste momento. Nem mesmo na mobilização anticomunista que culminou no golpe de 1964. A relação desse ódio [...] [tem a ver com a Lava Jato]". E ele se diz preocupado com o clima antipolítico gerado pela operação. "Não podemos prescindir dos políticos e dos partidos. Não existem alternativas reais a não ser que abdiquemos de fazer democracia."

    E Luis Nassif, no GGN, pergunta, completando: "O que se tem para colocar no lugar? O que nós vamos fazer para continuar a fazer este País se desenvolver?"

    Eu concedo um aparte ao Senador Cristovam.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Senadora, seu discurso merece não um, mas muitos apartes. Eu vou começar pela última colocação, que é essa citação da radicalização que nós temos hoje, da sectarização, que é verdade. E isso é uma maneira de acabar a democracia, porque a democracia é o resultado do diálogo e não do confronto. O confronto só se plasma, só se realiza democraticamente quando ele leva a diálogo. Agora, a culpa não é da Lava Jato. A culpa é nossa, que fizemos a Lava Jato necessária e que demos substância à Lava Jato. Pode ter seus erros – é verdade –, mas a culpa é nossa. E não vamos jogar a culpa em um, ou outro, ou outro, ou outro. Nós, essa geração de políticos, somos culpados de que tenha sido necessária uma Lava Jato. Aliás, a senhora citou o artista Huck. Eu acho que a geração dele, se ele tem mais de 30 anos, já está metida. Eu só acho que a nova geração é quem tem menos de 30. Nossa geração provocou isso nos políticos. Acho lamentáveis duas coisas: uma, dividir políticos entre os que estão em lista e os que não estão em lista, primeiro, porque os que não estão em lista podem aparecer em lista a qualquer momento e, segundo, porque o que diferencia um político não é o comportamento ético ou não – isso tem que ser obrigação de todos –, mas, sim, quais são as posições em relação ao projeto de Brasil, ao projeto do seu Estado e da sua cidade... Nesse ponto, eu concordo. É claro que quem não tem condições éticas e morais de atender tem que estar fora da política, mas, entre os que estão dentro, há uns em cujo lado não sinto a menor simpatia de estar, só porque não entraram em lista. Eu quero alguém que diga que quer um Brasil democrático – primeiro ponto –, que quer um Brasil sustentável, que quer um Brasil estável. E eu, mais pessoalmente ainda, gosto mesmo é daqueles que dizem que isso será construído no dia em que o filho do trabalhador estudar na mesma escola do filho do patrão. Mas, aí, já é um detalhe, não precisa pensar isso. Nós vamos entrar num período muito difícil, nós estamos entrando, e, de fato, uma reforma política é fundamental, porque senão eu temo, Senador, que estejamos caminhando para as velhas soluções que o Brasil sempre usa: autoritarismo e inflação. Inflação para pagar as dívidas com dinheiro falso. Em vez de reforma da previdência, em vez de reformas, todas elas, faz-se uma inflação. Aí, paga-se a dívida com o dinheiro falso da inflação. E o outro, o autoritarismo. Eu temo, sim, que nós estejamos, talvez, caminhando pela descrença geral dos que fazem política democraticamente, que a gente esteja caminhando para isso. Talvez não em meses ou anos, mas em algum tempo, se não formos capazes de dar a resposta – e, aí, vem a sua fala sobre a reforma política. É claro que tem que haver uma reforma. Agora, quando eu vejo falar em voto em lista, isso é a negação da reforma para democratizar. Fortalecem-se os partidos, sim, mas esses partidos que estão aí, esses 40, 50 – parece que vão chegar a 70 até o fim do ano? Isso não é fortalecer a política nem a democracia. Em vez disso, sinceramente, eu acho que a gente deveria ter coragem de dizer que podem ser candidatos cidadãos e cidadãs sem partido. Neste momento, é mais progressista o voto avulso do que o voto em lista, que vai esconder o eleito dos olhos do eleitor. Se, pelo menos, pensassem no que eu já defendi aqui há algum tempo, que o eleitor votasse duas vezes para Deputado, uma vez no partido – aí, apareceria a lista dos candidatos daquele partido –, e o eleitor escolheria o seu candidato, até que daria para aceitar. O partido apareceria e apareceria o nome escolhido do candidato, mas não é isso que estão propondo. Estão propondo que a burocracia de cada partido vai tutelar o eleitor, escolhendo quem será o eleito. Isso aí é a negação da reforma de que a população brasileira precisa para uma maior participação. Tem que caminhar para radicalizar. Radicalização seria permitir a candidatura avulsa. Segundo, tem que acabar com o financiamento privado de campanha, mas também eu não tenho a menor simpatia pelo fundo estatal de campanha. Quem tem que financiar partido e candidato é o militante, é o simpatizante, é quem tem a mesma causa. Radicalizar não é criar o fundo público para financiar as eleições. Radicalizar é acabar com o fundo partidário e cada partido, como qualquer clube, como qualquer entidade, como qualquer empresa, que financie os seus candidatos, e, aí, o custo baixa, aí, a eleição fica barata. E talvez tenha que se chegar a algo pelo que eu nunca tive simpatia, porque eu acho que diminui a ideologia no processo, que é o voto distrital. Mas, se for necessário para baratear, sem tirar dinheiro do Estado, da educação, da saúde, da segurança para a eleição, eu até acho que é algo a que se poderia chegar. E olhe que vai bem diferente do que eu, aliás, tenho defendido, que é o voto distrital, o voto estadual e 50 Parlamentares eleitos com o voto nacional. Eu creio que essa reforma tem que acabar é com o Parlamentar ser ministro, o que termina fazendo com que o Presidente da República, o Governador e o Prefeito interfiram no processo legislativo, ao nomear Parlamentar – como aqui Senador nomeado –, porque o Presidente levou para ministério. Eu sei que o que estou falando deveria ser um pronunciamento, não um aparte, mas creio que tem que se fazer uma reforma, mas uma reforma para valer da política, uma reforma que avance, e não uma reforma que regrida. E temo que se está querendo fazer uma reforma que vai regredir, inclusive para esconder aqueles cujos nomes aparecem na lista. Nós não podemos votar, porque é da lista ou fora da lista, temos que votar pela posição da pessoa. Mas esconder o candidato é um erro, um equívoco e uma traição ao que o povo hoje deseja. Vamos radicalizar na reforma. Vamos permitir o candidato avulso, que não se identifica com nenhum partido. Por que não pode ser candidato, se recusa todos os partidos? Seja candidato com as suas posições. Vamos radicalizar, e não regredir – radicalizar, avançando.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Agradeço, Senador Cristovam, seu aparte. É sempre bom debater com V. Exª.

    V. Exª chegou um pouquinho depois que comecei a fazer meu pronunciamento. Eu abri meu pronunciamento falando que não estava culpabilizando a operação, que não achava que não tinha que ser feita, que não achava que os responsáveis não têm que responder pelos seus atos. E falei também que não estava aqui tentando salvar o meu mandato, justificá-lo ou querendo que eu consiga ser candidata em 2018. Isso para mim...

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Senadora, só um detalhezinho. Eu ouvi seu discurso pelo rádio...

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Ah, muito bem, pelo rádio.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – ... e entendi tudo isso. Minha fala foi sobre uma citação sua de um jornalista, quando falou que a culpa é da Lava Jato. Foi um jornalista que a senhora citou no último momento, não a senhora, de jeito nenhum.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – E que nós vamos colocar no lugar – quem falou.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Eu creio que...

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – O que estamos questionando – fiz o questionamento aqui – é a forma como isso está sendo exposto, que vai acabar desestruturando a política, e isso vai ter consequência para a democracia.

    E falei que, independentemente das questões pessoais aqui, da minha, inclusive, quero ajudar a ter essa solução. Não estou fazendo isso olhando 2018 ou não olhando. Eu já estou julgada pela opinião pública, Senador Cristovam. Mesmo que eu comprove a minha inocência, já estou julgada, porque as coisas são assim, infelizmente são assim. Mas tenho responsabilidade, como Senadora eleita, de ajudar a dar uma saída. E falei da reforma política.

    É óbvio que não vou fazer aqui o debate, Senador, sobre os pontos que V. Exª colocou. Eu divirjo de V. Exª. Defendo o voto em lista, há muito tempo. Essa é uma posição do Partido dos Trabalhadores já, desde que nós nos constituímos como partido, fazendo a disputa no Parlamento, porque sempre achamos que o voto do eleitor tem que ser programático.

    Acho que a candidatura avulsa leva ao heroísmo, leva ao personalismo, leva quase ao ditado la garantía soy yo. Ninguém consegue dar garantia, se não estiver dentro de um programa. Como eu me comporto, como eu me coloco aqui, nas minhas posições, como defendo as minhas posições? Tem que estar comprometido com um programa, para o eleitor saber o que você pensa sobre tudo – sobre a economia, sobre os valores sociais, sobre tudo.

    A questão do fundo partidário também é uma proposta fácil para um momento como este. Não acredito que seja a saída acabar com o fundo partidário. As democracias financiam o seu processo político. É mais claro. Vai ficar evidente quanto custa. Tem-se que baixar as campanhas, tem-se que baixar os recursos também, mas tem que ser às claras e não haver mais dinheiro de empresa nisso.

    Os membros do partido têm que participar, claro que têm. Mas é difícil hoje. Talvez, fora o PT – temos contribuições, eu contribuo, os militantes contribuem –, não sei qual outro partido tem um sistema de contribuição como o nosso. Acho que não há. É difícil você incutir na cabeça das pessoas a contribuição. Nós temos que começar a mudar.

    Então, o voto distrital para mim é uma catástrofe total, porque o Deputado passa a ser um Vereador de um determinado distrito. Ele vai ficar falando sobre a rua do distrito, ele vai ficar falando sobre o dinheiro para a comunidade, ele vai ficar falando sobre a escola de lá e não vai fazer aqui, no plano federal, a discussão da política macroeconômica, que eu acho que nos cabe, a discussão da política macro para a educação, para a saúde e para todos os temas. Vai ficar tão voltado ao seu distrito que vai esquecer de discutir as questões gerais e isso vai ser terceirizado, com certeza, para gestores do Governo ou para burocratas que fazem as propostas.

    Eu concedo um aparte ao Senador José Medeiros.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) – Senadora Gleisi, há tempos que, em Mato Grosso, começou essa discussão. É incrível como Mato Grosso serve de estudo de caso para essa situação que está acontecendo nacionalmente. Em Mato Grosso, começou uma onda dos chamados não políticos. E o que mais se ouvia era: "a nova política", "eu não sou político". E era moda dizer que não era político, Senador Cristovam. Eu concordo quando dizem que... É estranho, é bem estranho que você venha para o campo de futebol e jogue futebol, mas diga: "Olhe, eu não sou jogador de futebol", e todo domingo você está lá jogando. Você é jogador de futebol. Como é que eu venho para política e digo: "Eu não sou político"? Eu vejo secretários que vão e falam: "Não, eu sou técnico, eu não sou político". Ora, você é um agente político. E, se o técnico não é um agente político, ele não é um bom um bom técnico. Se o político não é um bom técnico, ele não é um bom político. Tem que estar jungido. Agora, vir com esse agá de que "eu não sou político" ou de que "eu faço a nova política"? Isso é agá para tentar enganar eleitor, porque, no momento em que você começa a fazer a discussão você está dentro da... Então, quando as pessoas vêm falar sobre: "Ah, o caldo todo!", eu me incluo, eu me incluo, embora a minha ficha seja uma folha A4. Mas o Senador Cristovam disse bem isto: não cabe aqui dizer, separar os listados e os não listados. Não existe essa coisa de boa e má política. Existe a política correta, que todo mundo deve fazer. Agora, você se aproveitar do momento difícil da Nação para tentar fazer um discurso totalmente diferente e dizer assim: "Olhe, eu não estou nisso aí", ficar que nem garça na lama não vale. Eu penso que temos que enfrentar, vir para o debate nacional, propor e fazer como V. Exª faz. Não é confete, porque está na frente de V. Exª, Senador Cristovam, mas V. Exª enfrenta todos os temas aqui. Então, me faz lembrar os cem anos do nascimento de Roberto Campos, que chegava a dizer: "Boa parte das vezes em que todos estavam contra mim, agora vejo que eu estava certo". Nós como políticos temos muita vontade – é quase, eu diria, uma doença – de estar com a galera, mas temos que saber também que essa mesma galera gritou "crucificai" com Jesus Cristo. Nós precisamos é analisar todo esse cenário que temos e ver qual é a saída. E essa pergunta, embora eu discorde de quase tudo que o Nassif escreveu de certo tempo para cá, depois que ele entrou na folha – a folha que eu digo não é a Folha de S.Paulo não... Mas é uma realidade. O que nós vamos colocar no lugar? Não basta dizer: "Olha, eu sou o cara e eu vou me colocar." Nós precisamos também dizer o que vamos colocar no lugar. Então, temos que ter essa responsabilidade. Até mesmo quando do impeachment, eu sempre fazia a pergunta. Nós precisamos ver o que vamos colocar no lugar. E essa pergunta nós temos que nos fazer todo dia. Agora, concordo plenamente, Senadora Gleisi Hoffmann: essa história de nova política, de "eu não sou político", vou dizer uma coisa, ela iguala o cara, a pessoa que diz isso, ao mais pilantra de todos que já está dentro da política. Muito obrigado.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Agradeço o aparte, Senador José Medeiros.

    Realmente, isso demonstra um oportunismo muito grande. É você se valer de um momento em que há um enfraquecimento da política, dos Partidos, e vir com um discurso que, no meu entender, falseia e mente para o eleitor.

    Agora, o que mais me preocupa em todo esse processo que nós estamos vivendo é o que está acontecendo ao lado disso e que agora passa a ter uma luz menor, que são as reformas que estão sendo feitas e que estão sendo propostas para o Estado brasileiro.

    Ontem, houve uma reunião do atual Presidente Michel Temer... Aliás, eu não posso deixar de lembrar que hoje faz um ano que a Câmara dos Deputados deu aquele show pavoroso, abrindo o processo de impeachment da Presidenta Dilma. Muitos que lá votaram, envoltos em bandeiras verdes, por Deus, pela família, pelos amigos, pela moral e pelos bons costumes, hoje estão figurando como pessoas que, possivelmente, podem ser beneficiárias de recursos ilícitos. E foram também pessoas que votaram contra os interesses do povo: votaram pela terceirização do trabalho; votaram pela entrega do pré-sal; aprovaram a PEC 55, que hoje é a Emenda 95, restringindo recursos para saúde e educação e congelando por 20 anos os investimentos.

    E nós dizíamos à época: esse impeachment está sendo feito para isso. E é isso que está acontecendo. E o que me deixa mais apavorada é que as coisas continuam, o golpe continua. Nós vamos ter, daqui a pouco, o desmanche da Previdência.

    Ontem, o Presidente que entrou no lugar da Presidente Dilma – que está amestradíssimo, fazendo o que manda o mercado –, disse que nenhuma reforma vai parar e que a reforma da previdência vai continuar; disse que eles já fizeram algumas concessões, mas não vão mexer na idade, enfim... E isso me preocupa, porque a atenção inteira da Nação está agora sobre a operação Lava Jato, a lista da Odebrecht, que está tirando a atenção sobre a reforma da previdência que está sendo feita. E o Governo vai continuar tocando isso.

    Então, nós temos que fazer um alerta para a população. Os seus direitos vão ser destruídos! A terceirização já foi uma barbaridade para os direitos dos trabalhadores. Vão agora fazer a reforma trabalhista e a reforma da previdência.

    E o que é que acontece? Não existe o foco público sobre essas discussões, porque está em outro fato, que é esse negócio da lista da Odebrecht, e fica o Congresso extremamente acuado, com medo, porque não está querendo enfrentar.

    Então, é bem provável que os Deputados vão sofrer uma pressão grande do Governo, que está sendo protegido. O Michel Temer está sendo protegido, porque dizem que ele não pode ser investigado por fatos anteriores ao mandato. Vai ser investigado depois. Mas ele está tendo o respaldo do mercado financeiro, principalmente deste País, para levar a cabo as reformas que destroem a Constituição brasileira, que destroem os direitos adquiridos dos trabalhadores.

    E nós vamos deixar isso assim? Olhando passar? Vamos ter a passividade de deixar isso acontecer? Nós não podemos deixar isso acontecer. Nós precisamos continuar a mobilização dos trabalhadores, subir a esta tribuna e falar o que está acontecendo.

    Por isso, Senador Elmano, eu vou estar todos os dias aqui, nesta tribuna, independentemente do que falam de mim, independentemente de como me classificam. Eu tenho um compromisso de quando fui candidata à Senadora, o compromisso de defender os interesses do meu Estado e defender os interesses da maioria da população, dos trabalhadores. Jamais votei contra eles aqui e não vou votar. Esse é o meu objetivo e esse é o meu compromisso.

    Portanto, não posso deixar de subir a esta tribuna e dizer que isso pode estar se transformando numa grande cortina, para anestesiar o povo brasileiro em relação a luta que tem que fazer contra as reformas que estão aí, principalmente a reforma da previdência. Por isso, quero dizer: o povo, no dia 28, que é quando vai ser votado o relatório na Comissão Especial na Câmara da Reforma da Previdência, precisa fortalecer a greve geral que está sendo chamada pelas entidades sindicais, que está sendo chamada pelas entidades representativas, pelos movimentos sociais, para que todos vão às ruas, para que todos nós vamos às ruas, dizer: "Não é isso que nós queremos!"

    Este Governo não foi eleito, não tem legitimidade para fazer essas reformas e, principalmente agora, na situação que nós estamos vivendo, não tem condições de pedir para que o Congresso vote reformas tão profundas sem isso ter sido pactuado com a população.

    Não foi pactuado na minha campanha. Eu não falei para os meus eleitores que eu iria votar reforma da previdência, que eu iria votar reforma trabalhista, que eu iria fazer a terceirização. Muito pelo contrário: me elegeram porque eu tinha outra pauta, que é a pauta que eu defendo aqui. Agora, nós não podemos deixar que essa pauta entre. Por isso é que nós temos que dar força à greve geral.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – E gostei muito de uma proposta que o Senador Requião soltou nas redes essa semana; E eu queria aqui, Senador Requião, dizer que estou com V. Exª e que acho que nós devemos propor um plebiscito revogatório das medidas aprovadas pelo Michel Temer – as medidas enviadas ao Congresso, aprovadas aqui, coordenadas pelo Michel Temer. Nós temos que saber o que a população pensa disso.

    Está certo o senhor, Senador Requião. O que a população pensa da terceirização, que é geral e irrestrita? O que a população pensa da Emenda 95, que congelou os gastos de saúde, educação e investimentos, por 20 anos, e vai diminuí-los? O que a população está pensando sobre a entrega do pré-sal, sobre o fato de que nós não temos mais a Petrobras como a empresa principal na questão do pré-sal, na exploração dos poços de pré-sal, que agora estão indo só para as estrangeiras, porque as nacionais não podem entrar?

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – A população tem que dizer o que pensa. Então, quero concordar com V. Exª sobre o plebiscito revogatório. E não tenho dúvidas de que a saída são eleições. Só o voto cura essa situação por que passa o Brasil. Eleições diretas e eleições gerais, inclusive para este Senado, inclusive para a Câmara dos Deputados, inclusive para os governadores, para as assembleias legislativas. Vamos antecipar as eleições.

    Mas eu não poderia terminar – e queria pedir ao Presidente que me desse um pouco mais de tempo, porque eu tive muitos apartes – sem falar do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da desconstrução que estão fazendo do Presidente Lula e do próprio PT. Aliás, quando se iniciou esse processo da Lava Jato, diziam que era o PT e o Lula os precursores, os inventores da corrupção, desde prisca zero, que nós que tínhamos implantado a corrupção no Brasil. Como a verdade sempre prevalece, a mentira não dura para sempre e nem todos são atingidos por ela, conseguiu a verdade vir à tona e mostrar qual é o processo e o problema que nós temos de sustentação do sistema político brasileiro e dos financiamentos de campanha.

    Agora, é um absurdo, porque continua a mídia, continuam os meios de comunicação a dar carga para o Presidente Lula. Todos os dias, em todos os jornais: saem alguns, mas sai Lula e o PT; saem alguns outros, sai Lula e o PT; saem alguns outros, e sai Lula e o PT. Eu fico pensando: imaginem se o Presidente Lula tivesse mandado dinheiro para o exterior, como muitos dos que estão aqui mandaram; que o Presidente Lula tivesse feito riqueza... O Lula continua no mesmo apartamento dele, lá em São Bernardo. Por causa de um sítio que não é dele, de um apartamento que ele não comprou, fizeram um escândalo. Agora tentam demonstrar que ele tem uma relação muito íntima com empresários. Inclusive, falam coisas absurdas.

    Eu queria aqui até relatar uma coisa... A mídia ultrapassa, realmente, a responsabilidade: para criminalizar Lula e dizer que Lula não é uma pessoa confiável aos trabalhadores e à esquerda, a mídia divulgou uma fala pela metade do Emílio Odebrecht. O Emílio Odebrecht disse o seguinte do Lula: "Quando estive com o Golbery [todo mundo conhece quem é o Golbery aqui, não é? Golbery, o grande mentor intelectual do golpe militar de 1964], ele me afirmou que o Lula não tem nada de esquerda; gosta de viver bem."

    Pois bem: a Rede Globo e as outras emissoras de TV cortaram isso e colocaram que o Emílio tinha falado que o Lula gosta de viver bem e que era uma prova que ele estava dando. Ou seja, não era uma delação; era uma confirmação. Era quase que um testemunho do Emílio Odebrecht. Isso foi para todos os jornais, para todas as redes, dizendo que o Lula é um bon vivant.

    Isso é um inferno, gente. Como é que se pode tratar assim alguém que administrou, que governou este País, que inverteu prioridades e deixou um grande legado para o povo brasileiro? É medo de o Lula voltar em 2018? Só pode ser isso, porque é o único candidato que, embora sendo desconstruído noite e dia, ainda tem a maioria das intenções dos votos nas pesquisas. Hoje um jornal, se não me engano o jornal Valor Econômico, disse que 83% dos ditos repasses irregulares, ilegais, da Odebrecht, estão concentrados nos presidenciáveis do PSDB – 83%! Mas não são os presidenciáveis do PSDB que estão sistematicamente sendo desconstruídos pela mídia. É sobre isso que nós temos que falar.

    E aí vêm os salvadores da pátria. Então, o PSDB precisa dizer: "Nós não temos ninguém para disputar". E os próprios jornais já estão lançando o nome do Dória, como o cara que não é político, o antipolítico. Mas que fofo isso! O Dória, antipolítico? Filiado desde 2001 no PSDB, foi filho de Deputado Federal, é descendente de uma família abastada, de grandes proprietários de terra... Seus membros foram políticos, militares... Seu pai, inclusive, chegou a ser cassado pelo Ato Institucional nº 1. Mas é político, é publicitário e jornalista. Entrou na vida pública muito cedo: foi Secretário de Turismo de São Paulo, no Governo Mário Covas; Presidente da Embratur no Governo José Sarney... Como não é político? Então é o quê? Saiu de onde?

    E vai ainda ter a cara de pau de enfrentar ou dizer que o Lula não pode voltar a presidir o Brasil? Qual é o legado que esse Dória deixou para o povo brasileiro? Nem bem começou uma prefeitura em São Paulo...

    Então, tenhamos cuidado com isso. Eu acho que a nossa democracia não merece esse tipo de desconstrução. Quem deve tem que pagar. Agora, não se pode colocar tudo no mesmo balaio...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – ... e achar que a política é o problema da Nação.

    E quero fazer aqui um desagravo ao Presidente Lula. Eu não tenho dúvida de que a eleição de 2018, Senador Requião, vai ser uma eleição em que vão estar, de um lado, os donos do capital, do sistema financeiro, e, do outro lado, o povo brasileiro, lutando pelos seus direitos. Eu vou estar ao lado do povo brasileiro, lutando pelos seus direitos!

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2017 - Página 23