Discurso durante a 44ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o efeito do “caixa dois” no sistema político brasileiro.

Registro de entrevista concedida pelo presidente Michel Temer à Rede Bandeirantes, acerca da adoção do voto distrital.

Críticas ao Presidente da Petrobras, Pedro Parente, por sua postura no comando na empresa.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA POLITICO:
  • Considerações sobre o efeito do “caixa dois” no sistema político brasileiro.
GOVERNO FEDERAL:
  • Registro de entrevista concedida pelo presidente Michel Temer à Rede Bandeirantes, acerca da adoção do voto distrital.
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Críticas ao Presidente da Petrobras, Pedro Parente, por sua postura no comando na empresa.
Aparteantes
José Medeiros.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2017 - Página 36
Assuntos
Outros > SISTEMA POLITICO
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Indexação
  • ANALISE, RESULTADO, IRREGULARIDADE, CONTABILIZAÇÃO, RECURSOS, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, RELAÇÃO, DESENVOLVIMENTO POLITICO, DELAÇÃO PREMIADA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), DEFESA, MEMBROS, JUDICIARIO.
  • CRITICA, ENTREVISTA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EMISSORA, TELEVISÃO, ASSUNTO, ADOÇÃO, VOTO DISTRITAL.
  • CRITICA, PEDRO PARENTE, PRESIDENTE, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Presidente, segunda-feira. Segunda-feira, Senador Ataídes, as fantásticas segundas-feiras de plenário esvaziado, onde a Senadora Gleisi teve a oportunidade de viver um dia de Aécio Neves hoje: falou na tribuna por cerca de uma hora. Bom isso. Colocou as suas ideias, as suas opiniões...

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Graças à sua compreensão e também à do nosso Presidente atual.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – Paulo Rocha.

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Rocha. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – É porque houve muitos apartes, inclusive.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – O que é que eu posso dizer, depois dos pronunciamentos que me antecederam? Eu quero falar um pouco sobre o famoso caixa dois. O que é esse caixa dois, Senador Ferraço? Eu me lembro do BBB, daquela frase célebre de um dos personagens do BBB da Globo: "Faz parte."

    A impressão que se tem – e não é só uma impressão, é uma constatação objetiva da verdade – é de que o caixa dois se transformou, para a maioria quase absoluta dos políticos brasileiros, num procedimento aceitável. Mas, na verdade, o caixa dois transforma o Parlamentar, como diria, Senador Elmano, o nosso velho Brizola, num mandalete do seu financiador. O Parlamentar não pertence mais ao PT, ao PMDB, ao PSDB, ao DEM, ao PR. Ele passa a ser um instrumento de defesa das opiniões e interesses de quem financia a sua campanha.

    E grande parte dos políticos eleitos acabou se submetendo a essa distorção do sistema político, que é o financiamento paralelo de campanha eleitoral. É evidente que muitos o fizeram deliberadamente. Outros tantos foram nucleados pelos próprios interesses econômicos, para viabilizar a satisfação dos seus interesses por via de lei, de emendas e de medidas provisórias posteriormente.

    Mas eu pergunto, Senador Ferraço, qual é a diferença entre um político que aceita o sistema – "faz parte", dizem eles – e um procurador ou um juiz que recebe um auxílio-moradia ou que recebe um plano econômico, Plano Bresser, URV, um plano econômico desses que existiram num momento difícil do governo do Fernando Henrique Cardoso? Nenhuma diferença! É uma distorção ética e moral semelhante à distorção moral e ética dos Parlamentares.

    Eu considero que a criminalização de uma coisa ou de outra é absolutamente igual. É tão sem ética aceitar o caixa dois e depois negociar uma medida provisória ou uma lei, como é receber um auxílio para a educação dos filhos em escolas privadas e essas vantagens todas que se transformam nas emendas, nos privilégios e nos favorecimentos de algumas classes jurídicas da Administração Pública brasileira.

    Nessa história toda, Senadora Gleisi, impressiona-me e me assusta um pouco a delação premiada. A delação premiada acaba sendo uma tentativa de efetivação de uma narrativa que um investigador de polícia, ou um procurador, ou um juiz fez, no seu imaginário, a respeito de fatos que tenham ocorrido e que sejam fatos ligados à corrupção do sistema político brasileiro. Ela pode levar, por exemplo, em determinado momento, um procurador a viabilizar um PowerPoint dizendo que a corrupção no Brasil tinha um chefe, mas posteriormente nós descobrimos que a corrupção era sistêmica, que os chefes se atomizaram com o Vizinho, o Mineirinho, o Primo e uma série de nomes sociais Odebrecht, que se multiplicam...

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) – O Amigo.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – ... acertadamente ou erradamente, em Duro, Múmia e um elenco fantástico de apelidos sociais Odebrecht, que acabam recebendo os que tiveram o apoio da empresa. Um apoio diretamente comprometido com a corrupção legislativa, ou um apoio originado do nucleamento de algumas pessoas que a empresa julgava que teriam sucesso posteriormente e que seriam úteis para a defesa de seus interesses.

    Eu vejo, então, que há, nesse processo todo, uma distorção assustadora. E essa distorção ética, partindo-se do pressuposto de que juízes, procuradores, policiais e Parlamentares têm a mesma origem genética e formam as suas opiniões e o seu caráter no mesmo meio, é realmente assustadora.

    Está aí a Ministra Eliane Calmon dizendo que a Lava Jato não terá atingido seus objetivos fundamentais enquanto não revelar a corrupção no Judiciário. A opinião é dela, não é minha. É minha também, porque eu sei que a base genética é a mesma, as influências são iguais, a fraqueza não difere, e que os que corromperam o Parlamento, na luta pelos seus interesses e pelo seu lucro, devem ter corrompido a Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário. Então, a questão ética é muito mais ampla do que a questão colocada. Não se trata do PT, do PMDB, do PSDB, com o Vizinho ou Mineirinho, mas se trata de um processo sistêmico que destruiu a política brasileira por uma corrupção continuada e reversível, que é o mais importante.

    Podemos reverter esse processo, sim. Por que podemos reverter, Senadora Gleisi? Porque eu quero acreditar que, como existem, no Congresso Nacional, pessoas com uma visão filosófica sólida, realmente incorruptíveis diante das pressões e tentações do sistema, existem pessoas com as mesmas qualidades no Judiciário, no Ministério Público e na Polícia Federal.

    Nós temos que avançar com esse processo desnudando os vícios do sistema, mas fundamentalmente chegaremos ao domínio do capital financeiro sobre a economia política. Quem manda no Brasil hoje? Quem manda? O Vizinho? O Mineirinho? O Primo? O MT? Não. Nós estamos sendo governados pelos interesses do capital financeiro. São o Banco Central e o Ministro da Fazenda que estão dizendo ao Brasil o que devem fazer.

    Daí eu assisto, Senador Ferraço, à entrevista do Presidente Michel Temer, extraordinariamente bem articulada. Ele não titubeou. Ele não gaguejou. Ele colocou as suas ideias de uma forma fluente, evidentemente apoiado num grupo de jornalistas simpáticos a ele, mas foi absolutamente insensível em relação aos problemas sociais. Ignorou a crise econômica por que passa o mundo e por que passa o Brasil. Parecia a mim que o Presidente Michel Temer era um banqueiro defendendo os interesses da banca e dos rentistas, o aumento dos juros. E, na defesa desses interesses, Senador Ataídes, ele sacrificava os aposentados, os trabalhadores e a soberania nacional.

    Nessa crise de combate à corrupção, que é saudável – e este Plenário sabe que eu fui seguramente o primeiro Senador a, desta tribuna, saudar o início da Lava Jato –, esse combate à corrupção, que acaba se submetendo a narrativas formadas na cabeça dos seus promotores, oculta uma política clara de desnacionalização do Brasil, de quebra da nossa soberania e de sacrifício do trabalho. Não, não vou dizer que não precisamos de reformas, talvez até profundas, no sistema previdenciário, mas nós não podemos aceitar que, sem que se mexa no lucro dos rentistas, no domínio dos bancos, faça-se o povo pobre e trabalhador pagar uma conta que financiou uma festa para a qual eles sequer foram convidados.

    O Presidente Michel Temer propôs, nessa sua fluente e simpática entrevista à Rede Bandeirantes, o distritão. O que é o distritão? O distritão é a abolição da ideologia e da visão programática dos partidos no Brasil. O distritão, segundo o Presidente Michel Temer, é a eleição automática dos mais votados num determinado Estado, que é o distritão.

    Então, nós teríamos candidatos que viriam ao Congresso por razões de empatia religiosa, com suas denominações, apresentadores de televisão ou pessoas que poderiam, de alguma forma, gastar somas significativas do seu próprio patrimônio numa campanha eleitoral. O distritão anula os partidos. O Presidente Temer está dizendo que não quer mais o velho MDB de guerra do Ulysses Guimarães, o PMDB do documento Esperança e Mudança, o PMDB do desenvolvimentismo inicial, marcado por uma política social significativa, o PMDB da Constituição de 1988.

    Ele está propondo que os candidatos se elejam na medida da sua votação, nos seus distritões, sem nenhum compromisso programático, ideológico ou filosófico. Por quê? Porque o Michel Temer está deixando o controle da política brasileira sob o comando do dinheiro, de Mamon. E não se pode servir a Deus e a Mamon, como não se pode servir ao povo, à banca e aos rentistas ao mesmo tempo. A política, então, seria conduzia pelo Ilan Goldfajn, chefe dos economistas do Itaú; pelo Meirelles, representante da Febraban e dos banqueiros nesse processo amalucado.

    E, no meio dessa crítica que sensibiliza o Brasil e a população de forma massiva, lá se vai a Petrobras. A Petrobras, Ataídes, onde o petróleo é o sangue fundamental para o desenvolvimento de qualquer país, onde o petróleo viabiliza o crescimento econômico do Brasil no ritmo dos países desenvolvidos. E lá um Pedro Parente – que foi Ministro, ou parente do Fernando Henrique, não me recordo mais – diz, numa viagem ao Rio Grande do Sul, quando a população protestava contra a supressão de alguns investimentos da Petrobras que precarizariam a economia gaúcha e eliminariam milhares de empregos, com a maior franqueza, que ele era Presidente de uma empresa que se reportava ao mercado e aos seus acionistas. E completava: "A Petrobras, sob meu comando, não tem nada a ver com políticas sociais." O petróleo, o sangue do desenvolvimento, a disputa que provocou guerras e genocídios no mundo inteiro pelo seu controle, para o tal do Pedro Parente não tem nada a ver com o desenvolvimento do País, é um negócio que ele comanda.

    Imagine, Senador Ataídes, uma figura dessas comandando a Cedae, no Rio de Janeiro, que é 99% de propriedade do povo carioca. Ele diria: "Eu não tenho nada a ver com a saúde pública, com a expansão do fornecimento de água tratada e de saneamento. Eu tenho a ver com o mercado e com os acionistas, que seriam acionistas privados, de grupos nacionais e internacionais, porque a Cedae está à venda." O mesmo raciocínio, Senador Ferraço, aconteceria com a educação e com a saúde. Isso é o fim do Estado social, o Estado que reconhece as minorias, que respeita o trabalho, o Estado que garante a sustentabilidade do seu desenvolvimento. É o fim e é a sobreposição do Estado social pelos interesses do capital financeiro. Primeiro, é a precarização do Executivo. O Executivo não significa mais nada, o Executivo não tem programa, o Executivo se subordina ao interesse do mercado através do Banco Central, independente das políticas populares, independente dos objetivos nacionais permanentes, independente dos interesses do povo brasileiro.

    A precarização do Executivo transforma um Presidente da República numa espécie de gendarme, um policial repressor dos movimentos populares, que seguramente surgirá desse programa e dessa prática de opressão a direitos sociais conquistados através de décadas, parênteses, que precisam ser reformulados, melhorados, modificados, mas não deformados. Reformar não significa deformar, melhorar a previdência, não significa privatizá-la, porque amanhã, sob o comando de um Pedro Parente, representando os bancos que administram, alguém dirá: "Pouco importam os que querem se aposentar, porque a mim interessa o mercado e os acionistas do meu projeto, nada tenho a ver com políticas sociais." Minha gente, é esse o caminho que nós estamos trilhando. E é evidente que precisamos de reformas pesadas também nas corporações.

    Eu saúdo, com louvor, o início da Lava Jato, que desnudou os escândalos da política brasileira. Mas não venham a sacralizar corporações – não venham a sacralizar corporações. Um juiz não é o juiz substituto de Deus, que é onipotente, que não precisa de um texto legal. De repente, temos a proposta dos juízes, Paulo Rocha, off road, que saem da possibilidade de manejo no estreito limite da estrada em que trilham e resolvem sair pela mata, pela margem a caminho de objetivos por eles desejados. É claro que tem que haver flexibilidade, mas é evidente que juízes devem seguir também o caminho estreito, flexível, de alguma maneira, da interpretação legal. Senão, teremos oráculos, como o de Delfos e o de Delos, sem texto legal a adivinharem o que seriam os desígnios dos deuses na época da velha Grécia, ou pitonisas, que também adivinhavam o futuro, interpretando a vontade e os desígnios estabelecidos pelo Olimpo. Não, não pode ser assim.

    A Lava Jato oferece ao Brasil uma oportunidade incrível de revisão do sistema político, da conduta de juízes, promotores, policiais e Parlamentares, por todos os títulos muitas vezes reprováveis.

    Eu encerro afirmando aqui a minha esperança: assim como existe gente muito séria no Congresso Nacional, verdadeiros intelectuais orgânicos da sociedade e da soberania nacional, também existem no Judiciário, no Ministério Público, na Polícia Federal. E nós iremos superar este momento em que, depois de verificado o escândalo, as narrativas e a imaginação passam a conduzir as delações premiadas.

    Só se premia um delator à medida que ele diz exatamente o que quer o juiz, o delegado ou o membro do Ministério Público. Aí se estabelece uma fantástica distorção. E essa distorção se espraia pelo País inteiro: ela vai chegar ao pequeno Município, onde a arbitrariedade de um policial, de um delegado, de um promotor público atingirá com dureza o prefeito, um vizinho, um cidadão qualquer. E é disso que nós vamos tratar na próxima quarta-feira, quando eu estarei trazendo...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – ... a minha versão do relatório do abuso de poder, no qual eu me suporto em algumas ideias da antiga comissão de reforma da República – não do Renan, porque o Renan subscreveu aquele relatório da mesma forma como o Reguffe subscreveu o dito relatório do Janot, que sequer do Janot é, porque foi feito por um grupo de personagens do Ministério Público Federal, e o Janot assinou para trazê-lo ao exame e à consideração do Congresso Nacional.

    Espero estar construindo um relatório, um projeto de lei que acabe com a possibilidade da interpretação aberta, off road da lei, mas que não impeça, de forma alguma, a investigação e a punição dos corruptos...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – ... em todos os setores e em todas as instituições – no Parlamento, no Poder Judiciário, no Ministério Público, na polícia, agentes públicos de forma geral, desde o fiscal de renda do Município, do Estado ou da União.

    Era o que eu podia dizer a vocês nesta tarde de segunda-feira, quando a nossa Senadora Gleisi Hoffmann teve o seu dia de Aécio Neves e pôde falar e colocar as suas ideias por mais de uma hora.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2017 - Página 36