Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da reforma da previdência proposta pelo governo federal.

Defesa da necessidade de reformar o sistema político-eleitoral do país.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Defesa da rejeição da reforma da previdência proposta pelo governo federal.
SISTEMA POLITICO:
  • Defesa da necessidade de reformar o sistema político-eleitoral do país.
Aparteantes
João Capiberibe, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2017 - Página 71
Assuntos
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Outros > SISTEMA POLITICO
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETIVO, ALTERAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, APOSENTADORIA POR IDADE, APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, SISTEMA ELEITORAL, SISTEMA, POLITICO.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores...

    Não, Senador Romero, o Senador Eunício me garantiu a palavra.

    Sr. Presidente, ele estava insinuando – está vendo? – que o senhor ia me impedir de falar. Está vendo? É fogo amigo.

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Senadora Lídice, jamais impediria V. Exª de falar. Pelo contrário, aprecio ouvi-la.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Muito obrigada, Presidente.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, primeiro, eu queria destacar o que aconteceu hoje, à tarde, aqui, que foi a indicação feita pelos Líderes, inclusive do PMDB, das pessoas, dos Senadores e Senadoras que comporão a CPI da Previdência. Acho que isso já trará um diferencial ao processo de debate da reforma da previdência no Senado Federal. Esta reforma cujo conteúdo nefasto, cruel e injusto cada vez fica mais claro sobre a vida dos trabalhadores brasileiros, especialmente das mulheres trabalhadoras deste País.

    Ouvi dizer que vão diminuir a idade exigida para as mulheres se aposentarem de 65 para 62, como se isso fosse uma grande dádiva. O que não está dito e que é preciso ser compreendido é que as mulheres exigem condições iguais de trabalho, oportunidades iguais, salários iguais, fim do sistema de sobretrabalho que a mulher tem não remunerado em casa. Para tanto, era necessário que o Governo Federal e os governos estaduais, municipais investissem nos equipamentos indispensáveis para substituir a mão de obra gratuita da mulher no lar, inclusive da trabalhadora doméstica.

    Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a reforma da previdência hoje significa uma reforma cruel, uma reforma absurda colocada como ameaça à vida do trabalhador brasileiro. Ela se inicia, portanto, no Senado com a nova forma que é a CPI da Previdência. Esperamos que ela possa contribuir para reverter esse processo de avaliação, de uma reforma da previdência que não responde ao interesse do povo.

    É claro que reformar a previdência, corrigindo sempre os equívocos, os possíveis privilégios, tem que ser objeto de um Governo, no Brasil, que tenha realmente interesse em fazer com que a previdência corresponda à necessidade de melhoria da condição de vida do povo brasileiro, assegurando ao trabalhador e à trabalhadora a dignidade na sua velhice, no momento em que não tem mais condições de produzir com o mesmo nível de produtividade que tem no seu período jovem, no período de produtividade maior, mais larga, de capacidade de trabalho mais ativada.

    Quero, em um primeiro momento, firmar aqui a minha posição de votar "não" à reforma da previdência que hoje foi enviada para o Senado Federal, para a Câmara dos Deputados, melhor dizendo, e que penaliza, ameaça o trabalhador, que se prepara para um grande processo de mobilização nacional para dizer não à reforma trabalhista, para dizer não ao processo que nós vivemos de terceirização – um absurdo que passou pela Câmara dos Deputados – e, finalmente, para dizer não à reforma da previdência. É o movimento do dia 28, o movimento paredista nacional para dizer não a essa pauta nefasta aos interesses dos trabalhadores do nosso País.

    Pois não, concedo um aparte ao Senador de luta, Senador Paulo Paim.

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Senadora Lídice da Mata, não poderia deixar de cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento, pela sua história, que orgulha o povo da Bahia e o povo brasileiro. Quero cumprimentá-la pelo tema que V. Exª trouxe à tribuna: reforma da previdência e trabalhista. Sobre a reforma trabalhista, ontem, a Câmara rejeitou o requerimento de urgência. Mas fiquei um pouco preocupado, porque me parece que Cunha fez história neste Congresso. Disseram-me que hoje o Presidente Rodrigo Maia irá apresentar outro requerimento de urgência para a matéria que foi derrotada ontem. Engraçado, a pessoa saiu, está respondendo pelo que fez e o atual Presidente dá a impressão de que é herdeiro da forma de atuar de Eduardo Cunha e acaba querendo votar hoje o requerimento. Parece-me que não vai conseguir. Os Deputados têm a clareza de, no mínimo, deixarem a Comissão decidir. Se ganhar, ganharam, mas vamos para o voto e que cada um responda pela consequência dessas reformas. Chegaram a colocar um artigo lá na reforma da previdência, vinculado à reforma trabalhista, em que vão dar anistia para os devedores da previdência. Por isso é que V. Exª, de forma correta, vincula as duas reformas. Olhe só: dizem que a previdência está com déficit – e que bom que todos os partidos indicaram e que vamos discutir esse tema –, mas apontam para dar anistia aos grandes devedores da previdência. Por isso, V. Exª está de parabéns, meus cumprimentos. Com certeza, essas reformas, como estão, não passarão. Oxalá as duas sejam retiradas e possamos discutir com equilíbrio, numa linha de bom senso, olhando e participando dos debates com a sociedade, como faremos na Bahia. V. Exª mesma tem uma grande audiência pública agora, que estou sabendo, lá, e eu também voltarei à Bahia, se eu não me engano, ainda no mês de maio, para participar dos debates sobre reforma da previdência e trabalhista. Parabéns a V. Exª.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Muito obrigada. O meu Partido também debate esse tema com muita intensidade nesse momento. Nós tivemos ontem 19 votos contrários ao requerimento de urgência...

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – De urgência, da trabalhista.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – ... e 12 contra. Portanto, uma posição amplamente contrária a esse posicionamento. O diretório do Partido – a Executiva do Partido, mas, antes disso, o diretório – também já se posicionou em relação à reforma da previdência.

    Eu acho que, nesta questão, sobre aquilo que no início os trabalhadores não tiveram a oportunidade de refletir estão refletindo agora, estão compreendendo o quanto são perversas essas propostas de reformas para a sua vida. E essa oportunidade nós vamos ter que debater aqui também.

    É impressionante, como V. Exª falou: quando se trata de votar contra os interesses do povo, o Regimento é rasgado. Um requerimento que foi negado ontem, se força a barra para votá-lo hoje, com o mesmo teor, quando o Regimento não permite que uma proposta possa retornar tão imediatamente para votação.

    Então, eu quero parabenizar V. Exª, que é um símbolo da luta em defesa da previdência neste País, do direito do trabalhador à previdência, à aposentadoria digna. V. Exª, aqui, fala disso, e eu sou testemunha: há mais de 20 anos, quando nós estávamos na Constituinte, V. Exª já tratava desse assunto. São mais de 26 anos em que V. Exª acompanha o debate constituinte. Mesmo durante o Governo do seu Partido, pontuou sempre posições diferenciadas em relação ao próprio Governo, mas nunca deixou de negociar, de se colocar como instrumento, como ferramenta do processo de negociação, para, ao final, conseguir sempre que posicionamentos fossem modificados na direção de atender melhor os interesses dos trabalhadores brasileiros. E agora nós estamos colocados nesta situação, quando o Governo chega ao mínimo da sua popularidade, porque coloca reformas que não era possível colocar neste momento para a Nação brasileira.

    Alguns dizem – em geral, todos eles não políticos – que o Presidente da República devia aproveitar esse momento de dificuldade dele de popularidade para, aí sim, apresentar propostas que fossem duras. É uma compreensão absolutamente na direção contrária do que é o comportamento universal, mundial. Qualquer, mas absolutamente qualquer, dirigente de um país, diante da reação popular a uma posição, em geral, recua e negocia. Só um pensamento culturalmente autoritário pode imaginar que a política seja um caminho que vai numa direção só: um caminho que o Executivo propõe e o Parlamento aprova, sem mudanças, sem modificações, e a população, mesmo que seja ferindo os seus interesses, é obrigada a aceitar.

    Um exemplo disso, meu caro Senador Paim, é agora o Reino Unido. Vão-se antecipar, em três anos, as eleições daquele país para se discutir o Brexit, para se discutir a saída do Reino Unido do Mercado Comum Europeu. Ou seja, há uma crise de legitimidade do poder, porque é uma posição tomada com muita força na Constituição do Mercado Comum Europeu que, no entanto, via plebiscito, foi negada pela população. O gabinete caiu. Constituiu-se um novo gabinete e esse novo gabinete agora convoca novas eleições, dadas as contradições que estão vivendo, no Reino Unido, neste momento.

    Só no Brasil, um país de dimensão continental, com realidades tão díspares da população, quando a vida média da população do Sul é bastante diferente da do Norte e do Nordeste, se pode imaginar que você pode empurrar goela abaixo da população medidas amargas – mais do que amargas, medidas cruéis, medidas injustas – sobre a cabeça do trabalhador brasileiro, para levá-lo a receber uma reforma dessa natureza, dessa perversidade, e que ele simplesmente aceite e que este Congresso aceite, sem discussão, com um Presidente da República que tem tantas fragilidades e vulnerabilidades, porque vindo de um processo de interrupção do mandato legitimamente eleito, que se disponha a ir até o fim numa carreira despencada, sem nenhum limite, para levar adiante essa proposta.

    É claro que isso não é possível. É claro que é preciso levantar as vozes das consciências dos Srs. e Srªs Congressistas. É claro que é necessária a intermediação dos Líderes – dos Líderes do Governo, dos Líderes da oposição –, porque o espaço de negociação é o Congresso Nacional. O Congresso Nacional é o espaço de negociação dos interesses da sociedade. Não pode ser apenas o interesse dos empresários que vai ser atendido. Os interesses dos trabalhadores, ainda que aqui representados minoritariamente, têm que ser levados em conta pelo Parlamento brasileiro. Essa que é a história e a necessidade de existência do Parlamento.

    Por isso é que, ao lado disso – e vou dar um aparte ao Senador, querido amigo, João Alberto Capiberibe –, nós estamos também iniciando o debate sobre a reforma política e a reforma eleitoral. Nós não podemos enfrentar o momento que o Brasil está vivendo de crise política das suas instituições, de crise da política, crise da participação política, sem dar respostas. E, como se nada estivesse acontecendo, vamos discutir reforma da previdência, reforma trabalhista, reforma de não sei o quê e não tratamos dessa reforma essencial para o povo brasileiro que é a reforma política e eleitoral, aproximando-se o ano de 2018, que é o ano, em tese, de eleições.

    Com aparte o Senador Capi.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Senadora Lídice, eu fiz questão de me levantar para reverenciar as ideias que V. Exª está compartilhando com todos nós e com a sociedade brasileira. V. Exª tem inteira razão. O problema nosso é um problema político. Nós estamos vivendo a maior crise política, que já se estende por três anos, e nós, aqui, no Senado, estamos imobilizados. O Parlamento está promovendo reformas como se os responsáveis pela crise política fossem os trabalhadores, os pensionistas, os aposentados. Esses não têm absolutamente nada a ver com a crise; a crise é da representação política. Veja: nós temos ainda muito a aprender com a política dos países que lograram um grau de desenvolvimento e que romperam com a pobreza, com a indigência. O melhor exemplo que eu poderia citar e que V. Exª acaba de citar é o exemplo dos ingleses. Os ingleses estão mergulhados numa crise política provocada pela decisão popular, pelo voto do cidadão de deixar a União Europeia. Fizeram o plebiscito, e o povo inglês disse que não quer mais participar da União Europeia. O governo perdeu! O governo perdeu e não teve mais alternativa, senão reconhecer a soberania do voto popular e convocar novas eleições imediatamente. As eleições estavam previstas para 2020, e vão acontecer em junho deste ano. É isso que as lideranças políticas do nosso País precisam perceber – e V. Exª percebeu. É necessária uma tomada de posição, é claro, para vencer essa crise. Quem tem autoridade para pôr um ponto final na crise é o povo brasileiro.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) – É o povo.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Não tem ninguém capaz. Sr. Presidente, cada vez que se abre uma delação de alguém que está sendo investigado, isso atinge inúmeros representantes, representantes políticos do Congresso Nacional e de outras instâncias. Isso, evidentemente, é resultado de um sistema que apodreceu. Em vez de trabalharmos para dar um basta e reconstruir ou fazer um sistema novo, o Governo está preocupado, o Congresso está preocupado em fazer a reforma da previdência para punir trabalhadores, para punir idosos, para tirar direitos. Primeiro, vamos fazer aquilo que a senhora está recomendando: uma reforma política que reduza custos. Nós temos que acabar com as negociatas de eleições. As eleições viraram verdadeiros negócios fabulosos. Então, para acabar com isso, é preciso fazer o que eles fazem em outros países. Como os ingleses fazem eleições lá? Como os franceses fazem eleições lá? Não há custo. E os suecos? O custo é reduzido. Por que não imitar esses países naquilo que eles têm de melhor? Eu acho que esse tema a gente deveria torná-lo o tema de pauta desta Casa, daqui e da Câmara Federal, mas eles estão discutindo reforma da previdência, reforma trabalhista, tentando atropelar, acelerar esse processo.

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Portanto, eu quero parabenizá-la. Somo-me com V. Exª, e fiz esse meu discurso de pé em homenagem a V. Exª. Muito obrigado.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – Muito obrigada por sua generosidade.

    Vou terminar voltando a dizer: o Congresso tem que dar respostas concretas às crises. E nós vivemos uma crise econômica, mas vivemos, antes dessa crise econômica, uma crise política. Como V. Exª falou, já se vão três anos de decorrência dela. E não temos nenhuma só atitude que venha no sentido de debelar essa crise e apresentar um caminho para o povo brasileiro.

    Nós estamos discutindo pautas importantes – reforma da previdência, reforma trabalhista, terceirização...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) – ... foro privilegiado, debate sobre o abuso de poder de autoridade –, mas nenhuma dessas reformas dá o rumo para a saída da reforma política, do sistema político em que nós vivemos. Nós encerramos um ciclo de organização da política brasileira e precisamos reiniciar o outro com coragem, sem nos amedrontarmos com a formação de opinião antecipada dos meios de comunicação ou de alguns meios de comunicação que decidem – se o voto é distrital, não pode ser; se é aberto, tem que ser; se é fechado é porque estão querendo se esconder. Ora, isso é um absurdo, e digo até uma ignorância!

    A ciência política analisa o voto aberto em lista fechada, o voto em lista aberta, assim como o voto distrital e o voto de representação direta como nós temos de forma igual. E essas análises terão que ser feitas pelo Congresso Nacional, porque só o Congresso Nacional pode dar uma solução a essa questão, a não ser que tenhamos que fazer uma constituinte exclusiva, que é uma polêmica, mas uma constituinte para dar solução ao sistema político eleitoral do Brasil.

    Do jeito que está, repeti-lo é a pior coisa que pode acontecer no Brasil.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2017 - Página 71