Pronunciamento de Fátima Bezerra em 19/04/2017
Pela Liderança durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Críticas ao governo federal por políticas adotadas em relação à reforma agrária.
Críticas à reforma trabalhista proposta pelo governo federal.
- Autor
- Fátima Bezerra (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
- Nome completo: Maria de Fátima Bezerra
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Pela Liderança
- Resumo por assunto
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POLITICA FUNDIARIA:
- Críticas ao governo federal por políticas adotadas em relação à reforma agrária.
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TRABALHO:
- Críticas à reforma trabalhista proposta pelo governo federal.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/04/2017 - Página 76
- Assuntos
- Outros > POLITICA FUNDIARIA
- Outros > TRABALHO
- Indexação
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- CRITICA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RELAÇÃO, POLITICA FUNDIARIA, REFORMA AGRARIA, PARALISAÇÃO, DESAPROPRIAÇÃO, TERRAS, RESULTADO, CONFLITO, MOVIMENTO SOCIAL, GOVERNO FEDERAL, AGRICULTURA FAMILIAR.
- CRITICA, PROPOSTA, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, OBJETO, REFORMA, ALTERAÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Como Líder. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Senador Valadares, Srs. Senadores, Senadoras, telespectadores, ouvintes da Rádio Senado, nesta quarta-feira o Brasil celebra o Dia do Índio, desde o ano de 1943, quando o Presidente Getúlio Vargas, através do Decreto-Lei 5.540, estabeleceu a data, acolhendo a proposta dos indígenas brasileiros que participaram do 1º Congresso Indigenista Interamericano, realizado no México, em 1940. A data é importante para lembrarmos a dívida histórica de nosso País com os primeiros habitantes desta terra.
A demarcação das terras indígenas continua sendo motivo de litígio até os dias atuais e é sobre a questão agrária que eu venho, neste exato momento, ocupar esta tribuna, referenciando, portanto, todo o nosso respeito à luta dos povos indígenas, como também trazer a abordagem de forma mais ampla da situação em que se encontra a reforma agrária no Brasil.
Isto, inclusive, Sr. Presidente, porque nesta última segunda-feira, 17 de abril, foi iniciada a Jornada Nacional – e internacional – de Lutas pela Reforma Agrária. De acordo com informações do MST (Movimento Sem Terra), até esta quarta-feira já aconteceram movimentos em 15 Estados da Federação, dentre os quais Pernambuco, Alagoas, Santa Catarina, Pará, Piauí, São Paulo, Maranhão, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás, Ceará, Bahia, Mato Grosso, Paraná, Distrito Federal e Rio de Janeiro.
É importante aqui lembrar que os movimentos que defendem a reforma agrária definiram a data de 17 de abril como o início da jornada de lutas pela terra, porque ela coincide com um dia muito triste para a Nação brasileira – o 17 de abril, quando foram assassinados 21 agricultores em Eldorado dos Carajás.
Passaram-se, portanto, Sr. Presidente, 20 anos daquela tragédia, daquele acontecimento que trouxe imensa tristeza e vergonha para o nosso País perante, inclusive, a comunidade internacional.
E o contraditório de tudo isso é que a reforma agrária é para o Brasil, como foi para todos os países avançados: um potencial na promoção do desenvolvimento nacional. Ou seja, não há motivos lógicos, muito menos justos, que expliquem tanta reação à distribuição de terra para o acolhimento de pessoas e geração de alimentos.
O fato é que, apesar de todos os empecilhos do Estado brasileiro, a reforma agrária apresenta números vultosos na promoção da cidadania no campo e consequente apoio ao desenvolvimento nacional. Hoje, graças à luta dos agricultores e agricultoras familiares e suas organizações, temos mais de um milhão de famílias assentadas em todo o País, em que, apesar da não conclusão do processo de reforma agrária, as pessoas passaram a ter casas para morar, terra para plantar, criar seus animais e outras condições de crédito e de acesso aos mercados que possibilitaram importantes resultados na inclusão social das próprias famílias beneficiadas e, ao mesmo tempo, na geração de riquezas para o País como um todo.
Acrescento ainda aqui, Sr. Presidente, as políticas de inclusão social implementadas nos governos do PT, através de Lula e Dilma, no campo da educação – a expansão das escolas técnicas, a expansão do ensino superior, Senadora Regina, o que possibilitou que pela primeira vez os filhos dos assentados, os filhos dos pequenos agricultores tivessem também o direito de frequentar, por exemplo, uma faculdade de Medicina, uma escola de Medicina, realizar o seu sonho de receber um diploma de nível superior em Medicina através de um programa vitorioso, inclusive do nosso governo, que foi o Mais Médicos, hoje ameaçado pelo Governo ilegítimo que está aí.
O que eu quero aqui registrar é que eu guardo uma imensa alegria quando ando pelas cidades do meu Rio Grande do Norte e vejo escolas técnicas espalhadas pelas diversas regiões, quando vejo o crescimento da Ufersa, quando vejo o crescimento da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Isso possibilitou a democratização do acesso ao ensino superior, garantindo que, pela primeira vez, membros das famílias de assentados, antes entregues ao abandono, antes deserdados pelo direito à educação – repito: os filhos dos assentados, os filhos dos pequenos agricultores, os filhos de pescadores –, tivessem acesso a bons cursos técnicos nas escolas técnicas e também à formação no campo do ensino superior.
Eu quero ainda acrescentar que, no meu Estado, o Rio Grande do Norte, são cerca de 20 mil famílias assentadas com casos emblemáticos de inclusão social e produtiva. Dentre as quais, podemos citar a histórica experiência de exportação de frutas do assentamento Vale do Lírio, a recente exportação de melão no assentamento Maisa, com forte presença das mulheres produtoras, a significativa produção de mel e a produção de frutas e hortaliças orgânicas e sustentáveis na Chapada do Apodi, a experiência de atividades não agrícolas, como o restaurante Sabores da Serra, em Upanema, que foi destaque, inclusive, no programa rural da afiliada da Rede Globo lá no nosso Estado no último domingo. Acrescento ainda a produção de hortaliças agroecológicas e as feiras da agricultura familiar com forte presença dos assentamentos de todo o Estado. Enfim, esses são alguns exemplos de que, apesar das ausências, no plano estadual, dos apoios necessários, a reforma agrária conseguiu mudar para melhor muitas das vidas das famílias envolvidas no processo.
Os dados do último censo agropecuário de 2006 são contundentes quando apontaram que mais da metade da produção de alimentos no País é realizada pela agricultura familiar. Dentro dela, está a significativa participação da reforma agrária.
Apesar disso, Sr. Presidente, a desapropriação de terras para fins de reforma agrária encontra-se, infelizmente, praticamente estagnada e, agora, inclusive, ameaçada, repito, nesses tempos estranhos de Governo ilegítimo que aí está. Vejam bem. Dados do Incra afirmam a existência de 180 milhões de hectares de grandes propriedades definidas como improdutivas. Na outra ponta, o MST indica que são ainda 120 mil famílias acampadas à espera de um lugar – abro aspas: "de mato verde pra plantar e pra colher", como diz a antiga canção.
E qual tem sido a posição do Governo ilegítimo que está aí? Os gestos deste Governo ilegítimo que está aí, além de contrários e hostis à continuidade da reforma agrária, são gestos, inclusive, Senadora Regina, de criminalização, de ataque aos movimentos sociais, em especial, ao movimento dos sem-terra. Esses gestos de desprezo pela luta em prol do acesso à terra se expressam, por exemplo, com a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário – isso é um insulto – e se expressam, por exemplo, com a redução de investimentos para o Incra, inclusive para o Incra pagar o passivo e avançar nas desapropriações.
Na contramão da luta para fazer avançar a reforma agrária, o Governo ilegítimo do Sr. Michel Temer baixou a MP 759, no apagar das luzes de 2016, mais precisamente em 22 de dezembro de 2016, MP essa que alterou profundamente a legislação fundiária e os procedimentos para a efetivação da reforma agrária, conflitando com o que está previsto, inclusive, na Constituição Federal de 1988.
Dentre os retrocessos que fazem parte dessa famigerada MP 759, da lavra do Governo ilegítimo que aí está, nós podemos aqui citar, primeiro, a municipalização do processo de desconcentração de terras, porque agora a vistoria e a desapropriação das terras serão feitas pelas prefeituras, o que, na prática, estanca a reforma agrária, dado o temor que os trabalhadores têm, uma vez que os latifundiários em geral detêm poderes políticos municipais. Outro retrocesso é a retirada dos movimentos sociais de todo o processo de efetivação do acesso à terra, o que significa redução ou interdição do controle social. Outro retrocesso é a previsão de editais para a composição dos novos assentamentos, o que significa desconsiderar as mais de 100 mil famílias acampadas que aguardam há anos pelo direito do acesso à terra.
Esse clima de criminalização contra o movimento sem-terra, esse clima agressivo contra a reforma agrária tem refletido, Sr. Presidente, no aumento da violência no campo. A CPT (Comissão Pastoral da Terra), da Igreja Católica, apresentou o relatório "Conflitos no Campo Brasil 2016", em que, nada mais, nada menos, apresenta números que dão conta de 2016 como um dos anos mais violentos desde a criação desse relatório pela Comissão Pastoral da Terra em 1985. Em 2016, aconteceram 61 assassinatos, as ameaças de morte subiram 86%, e as tentativas de assassinato subiram 68%. Repito: o relatório da CPT "Conflitos no Campo Brasil 2016" apresenta o ano de 2016 como um dos anos de maior violência no que diz respeito à luta pela terra. E não é mera coincidência 2016 ter sido o ano também da ruptura democrática, do ataque à democracia, quando cassaram o mandato presidencial legítimo. Com isso, emergiu o que nós estamos vendo aí: a agenda de retirada de direitos.
Sr. Presidente, diante dessa denúncia da Igreja Católica, fica ainda mais incompreensível o comportamento de setores do Congresso com suas posições de criminalização dos movimentos que lutam pelo acesso à terra, quando, na verdade, deveriam ser uma postura de apoio, porque a reforma agrária é importante, é necessária. A tarefa de distribuição das terras improdutivas foi realizada, volto a dizer, em todos os países avançados, Senadora Regina, independentemente desses países terem orientações políticas de esquerda ou de direita. Infelizmente, há no Brasil ainda uma elite muito tacanha, muito atrasada, quando a luta pelo acesso à terra, em muitas ocasiões, inclusive, é tratada como um caso de polícia e não como um caso de luta pelo direito à cidadania.
Sr. Presidente, eu quero aqui, mais uma vez, saudar a luta dos povos indígenas e reafirmar todo o compromisso da Bancada do Partido dos Trabalhadores, assim como quero mais uma vez aqui saudar os irmãos assentados e irmãs assentadas, que não perdem a esperança, que resistem, que continuam sonhando com um Brasil justo, com um Brasil solidário. Os assentados e assentadas sabem que, mesmo em meio às dificuldades e limitações, o que representou do ponto de vista de avanços sociais os governos Lula e Dilma para a luta em prol do fortalecimento da agricultura familiar. Hoje, eles estão sentindo na pele o contrário: esse clima hostil, esse clima de ataque, esse clima de agressão aos que lutam pelo direito à terra. Então, fica aqui, repito, a nossa saudação, reafirmando o nosso compromisso de, junto com os sem-terra, não desistir, de resistir e de continuar lutando por um País justo.
Sr. Presidente, um País justo e cidadão passa por algo decisivo, fundamental que é a cidadania chegar ao campo. Para a cidadania ser conquistada e chegar à cidade, ela tem que chegar ao campo também, porque, só assim, poderemos avançar em prol daquilo que nós desejamos, que é um País justo e um País cidadão.
Sr. Presidente, nestes cinco minutos que me restam, eu quero mais uma vez me associar aos que têm chamado a atenção para a questão da reforma trabalhista, pelo quanto que essa reforma tem de perversidade. Ao que nós assistimos é um ataque brutal, Sr. Presidente, aos direitos sociais dos trabalhadores e das trabalhadoras não só através da reforma da previdência, mas também através dos projetos de lei que visam alterar a CLT.
O projeto de lei que está neste exato momento em tramitação na Câmara dos Deputados data da época do governo de Fernando Henrique. Em síntese, ele significa rasgar a CLT, na medida em que impõe o acordado sobre o legislado, em que impõe a terceirização irrestrita, em que impõe um ataque violento, Senador Paim, às organizações sindicais. V. Exª conhece muito bem essa matéria, pelo quanto tem lutado e pelo quanto tem exercido papel fundamental aqui no Senado, sendo o Relator de um projeto de lei que também trata da questão dos direitos trabalhistas. V. Exª, no seu relatório, apresenta uma proposição legislativa que não vai na direção de rasgar a CLT, que não vai na direção de suprimir direitos dos trabalhadores. Pelo contrário. Seu relatório nega a terceirização irrestrita, seu relatório nega a prevalência do acordado sobre o legislado; seu relatório vai na direção de reconhecer o quanto o mundo terceirizado, com os mais de 12 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, tem os seus direitos sociais negados. Que o seu relatório venha na direção de dar a eles, os trabalhadores terceirizados e as trabalhadoras terceirizadas, os mesmos direitos que têm os trabalhadores de contrato permanente e não na direção do que estão tentando fazer na Câmara dos Deputados, com o relatório de autoria do Deputado Federal do PSDB, Sr. Rogério Marinho. O relatório é tão perverso... E isso vem sendo dito não só pelos juízes do trabalho, mas pelos especialistas, pelas centrais sindicais e por todos aqueles que se preocupam em defender a cidadania do povo trabalhador, pelo quanto o relatório apresentado pelo Deputado Federal do PSDB se preocupou em defender os interesses dos patrões e em estabelecer regras para que os patrões cada vez mais consigam aumentar os seus lucros às custas do sofrimento e do sacrifício dos trabalhadores e das trabalhadoras.
Paim, eu encerro dizendo que tenho muita esperança de que nós vamos barrar essas reformas. Ontem mesmo, como V. Exª aqui já mencionou, o Governo sofreu uma derrota e não conseguiu aprovar o regime de urgência – estão tentando novamente. O fato, Paim, é que cada vez mais as ruas se expressam.
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – São os trabalhadores do campo e da cidade, repito, com amplo apoio da sociedade. As manifestações sociais e populares estão tão fortes que têm feito o Governo, inclusive, recuar, mas nós não recuaremos, porque a palavra de ordem continua sendo uma só no campo e na cidade: é a retirada dessas propostas tanto da previdência quanto trabalhista, pelo que elas têm de nefasto, ao negar e suprimir direitos sociais dos trabalhadores e das trabalhadoras.
Encerro, Sr. Presidente, deixando mais uma vez um recado muito claro para o Governo que está aí: nos aguardem, porque o dia 28 está chegando! Greve geral! Greve geral defendendo a cidadania não só das gerações presentes, mas das gerações futuras. Nada vai deter a luta e a marcha dos trabalhadores e das trabalhadoras do Brasil. O Governo queria aprovar, Senadora Regina, agora, já em abril, a reforma da previdência. Queria, inclusive, dar como presente de Páscoa aos trabalhadores brasileiros um chocolate envenenado, porque essa reforma da previdência é um veneno mesmo, em matéria de dificultar e de negar um dos direitos sagrados ao povo brasileiro, que é o direito a uma aposentadoria íntegra, integral e digna, assim como a reforma trabalhista. Mas a mobilização social e popular está se fazendo presente, está falando mais alto, e eles foram obrigados já a adiar o calendário. E eles vão adiar o calendário mais ainda, porque a greve geral vem aí, será forte, será bonita, será um momento de união, que vai ter um papel decisivo para a gente barrar definitivamente essas reformas, trazer a democracia de volta com a bandeira das eleições diretas já.