Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Contrariedade à equiparação de critérios de aposentadoria entre homens e mulheres.

Autor
Rose de Freitas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Contrariedade à equiparação de critérios de aposentadoria entre homens e mulheres.
Aparteantes
Hélio José.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2017 - Página 92
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • DISCORDANCIA, EQUIPARAÇÃO, CRITERIOS, CONCESSÃO, APOSENTADORIA, HOMEM, MULHER, PROPOSTA, REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, ocupo esta tribuna para fazer uma reflexão.

    O nosso País está vivendo grandes debates, importantes reformas, propostas de toda natureza, principalmente na área trabalhista e na área previdenciária.

    Vejo que é importante destacar e saudar o que estou considerando até o momento – porque ainda não há uma votação, o relatório final ainda não está apresentado – um avanço em respeito a uma das principais mudanças que serão apresentadas no relatório da reforma previdenciária. Inclusive, estava prevista para o dia de hoje a leitura na Câmara dos Deputados. Eu me refiro exatamente à decisão de reduzir a idade mínima proposta para a aposentadoria das mulheres.

    A minuta do texto apresentada pelo Relator Arthur Maia ao Presidente Temer e à comissão que lá estava, da qual fizemos parte, que conta com o apoio do Governo e com o empenho do próprio Presidente, define que a idade mínima de aposentadoria das mulheres será de 62 anos, e não de 65 anos, como estava proposto originariamente. Era uma proposta que seria apresentada pelo Relator, e foi alterada após um debate exaustivo que foi realizado no Palácio do Planalto.

    Para os homens, a idade mínima é um pouco confusa – a gente falando em capítulos, intercaladamente, para uma proposta que ainda não está publicamente explicada, mas eu gostaria de dizer que, para os homens, a idade mínima fica mantida em 65 anos.

    A contribuição mínima para homens e mulheres permaneceria em 25 anos. Hoje, essa contribuição mínima é de 15 anos. A mudança sugerida na proposta original também contemplaria a regra de transição para nova aposentadoria e, na proposta do Governo, essa regra de transição começava aos 45 anos para as mulheres e aos 50 anos para os homens e previa também um pedágio de 50% sobre o tempo de contribuição que faltava para aposentadoria.

    Agora, não deverá haver um corte de idade para a transição, e o pedágio será de 30% sobre o tempo que ainda restar para o trabalhador se aposentar: 35 anos para os homens e 30 para as mulheres. A aposentadoria por tempo de contribuição vai começar aos 53 anos para as mulheres e 55 anos para os homens.

    Essa questão gerou muita polêmica desde o início porque é um tema importante. Ela divide opiniões a respeito da questão de igualar o gênero, inclusive nessa questão, mas é um debate que tem que ser enfrentado, levando alguns aspectos em consideração. O tema da aposentadoria das mulheres divide opiniões e nós temos que lutar para que nós possamos avançar nessa direção.

    Nessa segunda noite, Sr. Presidente, o Presidente Michel Temer reuniu a bancada feminina da Câmara para tratar da previdência para as mulheres. Temos discutido firmemente a importância de uma aposentadoria – isso já foi dito aqui no plenário – diferente entre homens e mulheres e a importância, Senador Hélio, de reduzir a idade para que as mulheres possam requerer o benefício.

    Nós não podemos e não devemos nos esquecer de que o discurso da igualdade ainda não é completo se não olharmos as diferenças na sociedade que ainda obrigam as mulheres a duplas, triplas jornadas de trabalho e à menor remuneração do que a dos homens, reduzidas inclusive outras questões – ofertas de creche, escolas em tempo integral que sacrificam ainda mais o trabalho das mulheres.

    Dados que nós temos mencionado em todos os momentos apontam que as creches públicas, que são uma bandeira que eu estou há anos levantando nesta Casa, e privadas, aquelas que o Governo construía e aquelas que eram ofertadas pela sociedade privada, atendiam a 24,6% de crianças de zero a três em 2014 – vamos ver se mudou muita coisa – e que só 9% inclusive dos estudantes – e nós não tomamos conta só de crianças, nós educamos uma família –, só 9% dos estudantes, Senador Hélio José, estão na escola em tempo integral, o que dá sempre um conforto às mulheres, saberem que seus filhos estão assistidos, alimentados, cuidados e aprendendo.

    Ao lado disso, nós sabemos que ainda é muito mais comum no nosso País recair exatamente sobre as mulheres a maior parcela de responsabilidade dentro da sociedade e, em alguns casos, até toda a responsabilidade, levando-se em conta o número importante das mulheres que são chefes de família, o que aumenta a cada dia que se passa – pela educação dos filhos, pelo trabalho doméstico, pela interrupção na carreira, muitas vezes dos seus sonhos, das suas ambições, nos seus projetos para atender a sua família. Está claro que isso, sim, prejudica a mulher em todos os aspectos e também na aposentadoria.

    Nós podemos perguntar: essa sociedade é igualitária? Não, não é! Igualitária seria se fossem proporcionadas às mulheres, em nosso País, as condições para que pudessem aprimorar seus estudos, estar no mercado de trabalho e planejar um futuro melhor para si, até para que ela possa se conduzir à frente desse papel, muitas vezes de chefe de família, e ter, vamos dizer, a capacidade de se dizer plenamente atendida nos papéis que ela acaba desempenhando e que, muitas vezes, não são compartilhados com ninguém.

    Nós esperamos por um futuro melhor, mas, agora, é realmente necessário termos um período de transição para o que está sendo proposto pelo Governo. E essa defesa encontra amparo em vários argumentos. Há uma economista e professora, Hildete Pereira de Melo, da Faculdade de Economia do Rio de Janeiro, que destaca, por exemplo, que, nos países em que há igualdade – e não é o nosso caso –, há também políticas compensatórias para as mulheres.

    Já a economista Lena Lavinas, também professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lembra que o modelo do nosso sistema previdenciário é de repartição. Ou seja, jovens pagam para os idosos e os homens pagam para as mulheres, uma vez que, como nós dissemos, há diferença no trabalho a mais realizado em casa, ou seja, uma carga de trabalho maior do que a dos homens e também diferença no salário que é pago às mulheres nos empregos formais.

    Em 2015, Senador Hélio José, Senador Flexa e minha querida amiga Moema São Thiago, que aqui se encontra, as mulheres ganhavam 76% do salário dos homens, e hoje já se sabe que a jornada de trabalho da mulher, fora e dentro de casa, ultrapassa em cinco horas a jornada de trabalho do homem.

    Então, sempre é bom lembrar que nós fazemos leis, construímos todos os nossos mecanismos de defesa dos direitos da mulher, mas estamos longe de pensar que há igualdade no trato da mulher em relação ao trabalho, em relação à família, em relação a todas as áreas que ela ocupa.

    A socióloga Maria Betânia Ávila, pesquisadora do Instituto Feminista para a Democracia, o SOS Corpo, lá de Recife, avalia que – aqui cito apenas, entre aspas, o que ela tem dito – "a mulher tem uma intensidade de trabalho bem maior. E é um trabalho contínuo", Senador Flexa. "Começa a trabalhar em casa, vai para o trabalho remunerado, depois volta para o trabalho doméstico. Sobra pouco tempo para as carreiras mais permanentes [,para o estudo] e até para a representação política", que nós, ano a ano, a cada eleição, estamos aqui lutando para poder ampliar...

    O Sr. Hélio José  (PMDB - DF) – Excelência...

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) – ... e poder até corresponder à representatividade das mulheres na sociedade brasileira. Essa é a verdade do Estado.

    O Sr. Hélio José  (PMDB - DF) – A verdade é essa, Excelência.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) – Nós somos mais da metade da população e, nesta Casa, não chegamos a 10% – nós a representação feminina.

    Concedo um aparte ao Senador Hélio José.

    O Sr. Hélio José  (PMDB - DF) – Primeiro, quero cumprimentar V. Exª, sempre tão sensível e uma estudiosa realmente dessa situação. Eu sou esposo e pai de três moças. Então, na minha casa, somos seis, eu, minha esposa, três meninas e meu filho, e eu sei o tanto que a mulher... Realmente, a minha esposa, que foi uma sindicalista, que, inclusive, me trouxe junto para a política, teve que fazer uma escolha em certo momento: ou continuaria na militância – a senhora está colocando aqui uma situação importante – ou cuidaria da família para eu poder também estar na militância. Há uma dupla jornada de trabalho. Ela era enfermeira e já aposentou, tendo trabalhado trinta e poucos anos na enfermagem, cuidando dessa meninada toda. Agora, a senhora imagine aquela cidadã do campo, a campesina, com todo o sofrimento, com toda a falta de assistência... Eu testemunhei isso na minha casa: uma mulher trabalhadora, a minha esposa, a Edy, com meus filhos. Então, o que a senhora está falando é totalmente procedente. Não há a mínima possibilidade, se a mulher faz uma dupla jornada de trabalho, se tem uma sobrecarga muito maior, de ela se aposentar com a mesma idade do homem. Então, essa diferença de idade é totalmente factível, totalmente aceitável e totalmente compreensível, principalmente, como falei, quando se trata das catadoras de café e de coco, das campesinas, das mulheres que pegam na enxada, que têm que cuidar da família, fazer o almoço, voltar, cuidar de nós homens – pois o que seria de cada um de nós se não tivéssemos uma boa amiga, uma mulher ao nosso lado para nos ajudar a sermos um pouco menos ruim? Eu falo até dessa forma complicada, porque a mulher tem amor, carinho, solidariedade, amizade, fraternidade e trabalho conjunto para que possamos fazer um Brasil melhor. Então, quero cumprimentar V. Exª, dizer do acerto e da profundidade da sua colocação e fazer até um apelo para que o nosso Relator dessa PEC na Câmara compreenda isso e que esse encontro do Presidente com as mulheres avance no sentido de haja uma compreensão dessa diferença, para que se possa fazer justiça a essas mulheres trabalhadoras do nosso País. Muito obrigado. Parabéns pelo pronunciamento.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) – Eu até lembraria, Senador Hélio José – são tempos tão recentes –, quando a mulher teve o direito de votar. O homem saía para votar até 1932, e a mulher ficava no lar ou o acompanhava até a porta da urna; ele escolhia quem ia governar o País, o seu Estado, a sua cidade. Então, é preciso pensar no todo, pensar no bem-estar, pensar na justiça social.

    Eu lembro que, como Constituinte, em 1987, uma das coisas mais assustadoras... E há outras que são recentes e que nós não conseguimos ainda demover, ou seja, o entulho desse pensamento cultural em relação à mulher. Eu me lembro de que escrevi na Constituição Federal a questão da titularidade da terra, porque o homem trabalhava e morava na terra com sua mulher e com seus filhos, e, se viesse a falecer esse homem que estava ali há 10, 15, 20 anos, ela perdia o direito de permanecer na terra. Ela não tinha direito ao pedaço de terra onde ficou a vida inteira, que era o usucapião, ao qual o trabalhador tinha direito e a mulher não tinha direito. Então, nós incluímos isso – acreditem – em 1987.

    Olhando agora a CLT, nós vamos encontrar coisas absurdas, com uma CLT de 70 anos que precisa ser modificada e está sendo modificada. Portanto, eu acho que além dos números e de tudo que se possa dizer, nós precisamos pensar, das estatísticas que abalam muito a vida das mulheres, no que essa reforma tem que contemplar. Está se caminhando nessa direção. Tivemos aqui, como registro, o apoio do Presidente Temer. As mulheres brigaram e lutaram muito, e a primeira palavra de apoio e de solidariedade foi do próprio Presidente da República. Então, para pensar como fechar as contas da previdência e fazer essa reforma, que é justíssima...

    Aliás, não é por causa de hoje que essa reforma se faz necessária e, sim, pelos anos das administrações que foram explorando e dilapidando o patrimônio público ainda pelos traços da política. Colocando para administrar uma questão de patrimônio previdenciário que é a Previdência Social e colocando a política como argumento imprescindível, acaba havendo gestões temerárias que nos levaram a essa situação.

    É preciso aqui pensar também nas questões das políticas públicas. Não é só escrever no texto o que nós podemos fazer em relação às mulheres e ao seu trabalho, mas como é que podemos atenuar o trabalho feminino, com filhos e tarefas domésticas: dando mais creches e mais oportunidade de competição no mercado de trabalho e também no ambiente político, que é um sonho que nós temos e estamos aí sempre defendendo. Inclusive, aqui está o Presidente Paulo Paim, que sempre foi um ardoroso defensor da maior representatividade feminina nesta Casa. Sem isso, Sr. Presidente, não há avanço possível, proposta de igualdade que não recaia, no fundo, em prejuízo e mais sacrifícios para as mulheres.

    Concluindo, eu considero que, quando pensamos em aposentadoria igual para todos, nós também pressupomos que haja justa distribuição do trabalho. Isso não existe hoje. Está claro que essas desigualdades no mercado de trabalho não serão resolvidas por meio nem da aposentadoria nem da conta previdenciária. Nós sabemos que a precarização da situação feminina, certamente, também com esse olhar de compromisso verdadeiro da política, não leva nenhum país nem a um melhor desenvolvimento, nem a um futuro justo ou promissor, quando nós falamos dessas desigualdades e da necessidade de que as atitudes tomadas hoje perante a reforma, como foi feito naquela noite de segunda-feira, sejam sempre para procurar – não para aprofundar as diferenças – um caminho que possa compensar ainda essa desigualdade.

    Um dia, se Deus quiser, minha filha Julia e a minha neta Sophia irão usufruir um presente que eu espero que esteja mais próximo do que aqui nós pensamos.

    Eu agradeço, Presidente, a V. Exª pelo tempo concedido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2017 - Página 92