Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao impeachment da ex-Presidente Dilma Rousseff e ao governo de Michel Temer, Presidente da República.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao impeachment da ex-Presidente Dilma Rousseff e ao governo de Michel Temer, Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2017 - Página 35
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, FUNDAMENTAÇÃO, OCORRENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, VITIMA, GOLPE DE ESTADO, INTERESSE, POLITICO, RESPONSAVEL, EDUARDO CUNHA, EX-DEPUTADO, RESULTADO, AUMENTO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, DESEMPREGO, REDUÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), COMENTARIO, TELEVISÃO, ASSUNTO, DEPOIMENTO, ACUSAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, REU, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), OPOSIÇÃO, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ILEGITIMIDADE, AUTOR, PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, LIMITAÇÃO, ACRESCIMO, GASTOS PUBLICOS, NATUREZA SOCIAL, EQUIVALENCIA, INFLAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos acompanha pela TV Senado, pela Rádio Senado e também pelas redes sociais, no dia 17 de abril, ontem, fez um ano, como bem definiu o escritor português Miguel de Sousa Tavares, que uma assembleia geral de bandidos, presidida por um bandido, iniciou o processo que depôs, sem apresentar provas de crime de responsabilidade, a Presidenta Dilma e colocou em seu lugar a turma da sangria.

    Foi o dia da infâmia, um espetáculo dantesco que envergonhou o País perante o mundo inteiro. As cenas ridículas da votação percorreram o Planeta, provocando risos de escárnio. Famílias inteiras de pessoas torturadas pela ditadura militar viram um torturador ser homenageado. Votos eram dedicados a todos os membros da família, a Deus, à Maçonaria, aos fiscais, corretores de seguros, médicos, cidades. Falou-se de tudo, menos dos crimes supostamente imputados à Presidenta eleita, que seriam base para lhe retirar o mandato.

    O Presidente daquela assembleia, Deputado Eduardo Cunha, hoje preso por ter desviado milhões para contas secretas no exterior, iniciou o processo do golpe, porque a Presidenta não lhe deu respaldo para protegê-lo das acusações que pesavam contra ele.

    O Presidente da República, que assumiu o Governo ilegitimamente, Michel Temer, confessou, no último dia 15 de abril agora, o que denunciamos inúmeras vezes aqui mesmo nesta tribuna e na Comissão instaurada do Impeachment. Confessou o que a defesa da Presidenta eleita Dilma Rousseff alegou e fundamentou e que foi rejeitado pelo Relator nesta Casa: o claro, evidente e espúrio desvio de finalidade.

    O Presidente ilegítimo Michel Temer confessou em entrevista transmitida ao vivo, em grande rede de televisão, aquilo que a antiga oposição e hoje sua Base Parlamentar se recusou a admitir. Aliás, é surpreendente, para não dizer absurdo, o absoluto silêncio da grande mídia sobre essa confissão pública de Temer.

    Vale inclusive registrar as palavras da Presidenta Dilma sobre o assunto: "Em qualquer lugar do mundo, essa é uma declaração que enseja a característica de desvio de finalidade do impeachment: um Presidente da República aceitando que era normal a chantagem, que se tivéssemos cedido a ela, eu ainda estaria na Presidência. Pergunto eu: algum impresso registrou essa denúncia feita em canal aberto de televisão? Ninguém. Só a rede social."

    Além disso, na resposta enviada da prisão, em carta escrita de próprio punho, o ex-Presidente da Câmara Eduardo Cunha afirmou que o parecer de abertura do impeachment foi submetido a Temer, que teria dado o "de acordo." Ou seja, o Presidente que hoje assume o Palácio do Planalto deu o seu "de acordo" num parecer que ensejou a abertura do processo de impeachment. Fala os detalhes de dia, hora e local da armação para depor a Presidenta eleita. Um bilhete vindo da prisão.

     Não estamos aqui preocupados com a verdade de um ou de outro. De qualquer forma, são narrativas de fatos indignos, desprezíveis e desonestos; duas versões igualmente sujas, que confirmam tudo aquilo que dissemos durante meses: tivemos um golpe Parlamentar. E o que vamos agora, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, fazer diante dessas confissões? Silenciar como a grande mídia?

    Um ano depois da sessão que iniciou o processo de golpe, confirma-se que as pedaladas fiscais e decretos de suplementação nada mais foram que artifícios para executar o que o então Presidente da Câmara dos Deputados, hoje preso, e o então Vice-Presidente da República tramaram nos escombros da política.

    É evidente que a confissão de ambos deve fazer com que o Supremo Tribunal Federal anule o processo de impeachment, porque está viciado na origem. É o mínimo que se pode esperar.

    O que começou mal, termina mal. O que começou sujo, termina mais sujo ainda. Um ano depois, constata-se que o processo viciado utilizado para tirar a Presidenta do poder, destruiu a democracia, a economia e a política do Brasil. O País está em frangalhos e tende a piorar.

    Diziam que a crise econômica se resolveria com relativa facilidade e presteza, assim que Dilma Rousseff fosse afastada. Mas o que se vê é um total descalabro.

    O que se vê são famílias e empresas com níveis recordes de endividamento, taxas de juros e spreads bancários estratosféricos, massa salarial em queda, acentuado desemprego.

    Conforme o IBGE, o desemprego continua a aumentar, Senador Elmano, e bateu seu recorde histórico. A taxa de desemprego foi estimada em 13,2% no trimestre encerrado em fevereiro de 2017. Essa foi a maior taxa de desocupação da série histórica, iniciada em 2012. A população desempregada chegou a 13,5 milhões e bateu o recorde da série iniciada em 2012.

    Segundo o IBGE, as vendas do comércio varejista brasileiro recuaram 6,2% em 2016. Também é a queda maior da série histórica, que foi iniciada em 2001.

    Após uma queda de 3,6% em 2016, a atividade econômica não dá sinais de recuperação. Conforme o Índice de Atividade Econômica do Banco Central divulgado em fevereiro, a atividade econômica voltou a cair, a economia voltou a cair em janeiro de 2017. Caiu 0,79% em relação ao mesmo mês do ano anterior e 4,4% no acumulado dos 12 meses anteriores.

    Que mudança melhor que nós temos para a economia, como diziam aqui aqueles que defendiam o impeachment, que era só mudar a Presidenta que tudo seria transformado como num passe de mágica?

    Os mecanismos de que a economia brasileira dispõe para alavancar seu crescimento estão sendo desmontados. A cadeia de petróleo e gás, responsável por 13% do PIB está desarticulada, junto com a construção civil pesada. Até a produção de carnes, fundamental para nossas exportações, foi atrapalhada pelas trapalhadas de procuradores e delegados sedentos de holofotes.

    A política de conteúdo local e outros mecanismos de estímulo à economia nacional já não existem mais. Postos do pré-sal, nosso passaporte para o futuro, e do pós-sal estão sendo vendidos a preços aviltados. O crédito público, inclusive o BNDES, instrumento fundamental para a superação do primeiro impacto da crise mundial em 2009 e 2010, está estancado, justamente no momento em que o crédito privado minguou. E não há perspectivas de melhoras – há no entendimento deles.

    Embora se considere natural que o decréscimo econômico tenda a ser menor este ano, após duas quedas brutais do PIB, nada indica que a recuperação tenha voltado. Ao contrário, as previsões mais confiáveis apontam para a nova queda do PIB em 2017.

    Agora, com o anúncio do novo rombo orçamentário de R$58 bilhões do primeiro bimestre, o Governo sem votos começa a ficar também sem apoiadores firmes, até mesmo entre as oligarquias neoliberais. À exceção de alguns investidores externos, que estão comprando o nosso patrimônio a preço de banana, todos estão frustrados com o pífio desempenho econômico do golpe. Para completar o quadro, o Governo do golpe continua e continuará isolado no plano externo.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – A solução Temer, na verdade, virou um problemão para os próprios apoiadores do golpe e, sobretudo, para o País. O Governo ilegítimo só prolonga e aprofunda a crise política e econômica. Mesmo que consiga aprovar as reformas impopulares e fazer o trabalho sujo para o consórcio golpista, não oferecerá saída viável para a crise. Falta-lhe um mínimo de credibilidade. Era exatamente isso que eles reivindicavam ao tirar a Presidente Dilma.

    Enquanto isso, vende-se o Brasil, destrói-se o Brasil. A construção civil pesada e a engenharia nacional se foram. Vem aí a venda das terras a estrangeiros e a abertura do espaço aéreo para o capital internacional. Subsolo, solo e ar brasileiros são leiloados, prepara-se a privatização dos bancos públicos e, como disse o Presidente ilegítimo, de tudo que for possível. São grandes negociatas que renderão muito dinheiro ao capital internacional e aos seus associados. Procuradores, acredita-se, não interferirão, continuarão a perseguir Lula e seus pedalinhos.

    Aliás, a perseguição ao Presidente Lula segue ainda mais implacável na grande imprensa. De acordo com o drive do jornalista Fernando Rodrigues, desde o lançamento da lista da Odebrecht – mais especificamente de terça-feira, dia 11, até sábado, dia 15 –, o Jornal Nacional, da Rede Globo, veiculou pouco mais de 4 horas, 3 minutos e 48 segundos de reportagens sobre o tema, sendo que 33 minutos e 32 segundos foram destinados ao ex-Presidente Lula. Das 4 horas de veiculação em Jornal Nacional, 33 minutos e 32 segundos foram destinados ao ex-Presidente Lula. Em segundo lugar, vem o atual Senador e Presidente do PSDB, Aécio Neves, com 16 minutos e 27 segundos, menos da metade do tempo, portanto.

    É injustificável isso! A Globo é uma concessionária de serviço público, tem que prestar contas de como está manipulando a forma de expor suas informações. Isso não é jornalismo; isso é perseguição – o que estão fazendo com o Lula. Pelo medo de quê? De que ele seja candidato, de que ele venha a ser novamente eleito Presidente da República.

    O atual Presidente da República, Michel Temer, responsável pelos rumos do País, que também está envolvido, teve apenas 5 minutos e 28 segundos. Isso sem falar na pouquíssima repercussão de sua confissão sobre o golpe na TV Band e sobre a carta de Eduardo Cunha sobre o impeachment.

    Eduardo Cunha mandou uma carta da cadeia para jornalistas, falando sobre a participação de Temer no impeachment. Isso não é notícia, mas o Presidente Lula fica por 33 minutos no Jornal Nacional. E os outros que estão na lista Odebrecht, que, inclusive, são mais envolvidos, têm mais problemas... Porque o Presidente Lula não tem dinheiro no exterior, não tem conta na Suíça, não distribuiu dinheiro lá. Não. O Presidente Lula fica; esses outros, não. Esses outros vão pouco para a televisão.

    O dano econômico é grande, e maior ainda é o dano causado à democracia e à política com tudo isso que nós vivemos. Com um Presidente com 5% de popularidade a tocar um ministério de acusados, e um Parlamento reduzido a cinzas, o poder real no Brasil deslocou-se definitivamente do sistema de representação política para um consórcio formado pelo grande capital, especialmente o internacional e o financeiro, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a mídia oligopolizada.

    O golpe desmoralizou a democracia e o sistema de representação política.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – O golpe é uma grande fraude contra o povo e contra o País.

    O grande engodo desse golpe foi o de mudar em 180º os rumos de todas as políticas do País – políticas econômicas, sociais, externa, políticas de educação, saúde, previdência. Sem fazer disputa política aberta e democrática, roubaram da população o poder de decidir seu próprio destino.

    Será que algum Senador aqui tem coragem de perguntar à população se alguém votou em nós para que se contribua por 49 anos ininterruptamente para conseguir se aposentar com proventos integrais? Votou para que o trabalho precário e terceirizado, sem férias e outros direitos, torne-se a norma no Brasil? Votou para vender o pré-sal e a Petrobras a preço de bananas? Votou para vender as terras do Brasil a estrangeiros? Votou para acabar com o Ciência sem Fronteiras e com o Farmácia Popular? Votou para desinvestir em saúde e educação por 20 anos? Claro que não! A população não votou em nós para isso e nem votou em Temer. Aliás, não votou em Temer; ele foi candidato a Vice, e Vice não recebe voto. Quem recebeu foi a Presidenta Dilma e por um programa que foi exposto perante os eleitores, que não condizia com as propostas que este Governo manda ao Congresso Nacional. Tudo isso foi feito pelo Governo ilegítimo de Temer nestes 12 meses em que assumiu o poder. E foi necessário um golpe para se fazer isso, porque esse programa não passaria nas urnas.

    Roubaram do povo, fonte do poder democrático, a capacidade de decidir. A partir daí, a criminalização de toda a classe política era apenas uma questão de tempo. Não há corrupção pior que o roubo da soberania popular. O Brasil está sendo vendido e destruído sem um único voto.

    O centro da crise brasileira é político. O Brasil não sairá da mais grave crise de sua história sem política. Não há nada crível para ser colocado no lugar do sistema de representação, mesmo com todos os seus problemas. Banqueiros, donos de meios de comunicação, juízes e procuradores não têm voto. Uns têm dinheiro, outros têm fama e prestígio ocasionais. Nenhum tem legitimidade para governar, a não ser que se aposte numa nova forma de ditadura, com a substituição de militares por juízes e procuradores.

    A política precisa reagir e sair do gueto moral em que foi jogada pelo golpismo e pela Lava Jato messiânica e partidarizada que nós estamos vendo.

    Não serão delatores e corruptores à procura de absolvição e procuradores e juízes à procura de holofotes que vão passar o País a limpo. A única coisa que passa um país democrático a limpo é o voto popular, é o voto do povo.

    Após um ano, constata-se que o golpe precisa ser desfeito. A soberania popular precisa ser reposta com urgência. Só ela salvará o Brasil. Nós precisamos de eleição já, eleições diretas e gerais. Sem elas, nós não sairemos dessa crise.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2017 - Página 35