Discurso durante a 50ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à proposta de reforma trabalhista.

Autor
Ângela Portela (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Críticas à proposta de reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2017 - Página 25
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), RESTRIÇÃO, ACESSO, JUSTIÇA DO TRABALHO, EXTINÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, LEGALIDADE, TERCEIRIZAÇÃO, REDUÇÃO, SALARIO, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

    A SRª  ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Srª Presidenta, Senadora Fátima Bezerra, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, já chegou ao Plenário da Câmara a Proposta da Reforma Trabalhista. Na verdade, tenho que dizer que é uma reforma antitrabalhista, que retira direito de todos.

    O próprio Relator admite que, nesse texto, elimina ou modifica nada menos do que cem dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho. Cem dispositivos! São, em sua maioria, dispositivos que reconhecem direitos ou conferem garantias aos assalariados brasileiros. A pedra de toque do projeto está na prevalência que estabelece dos acordos individuais e mesmo de eventuais acordos coletivos, em detrimento da lei e de convenções coletivas.

    Isso representa também um radical enfraquecimento da Justiça do Trabalho e, com ela, da efetividade das normas trabalhistas em geral.

    O relatório, na prática, acaba com a Justiça Trabalhista, porque impede reclamações nos tribunais regionais e no Tribunal Superior do Trabalho – TST depois que os acordos coletivos ou individuais forem fechados entre empresas e empregados. Pelo texto, o Judiciário perde a autoridade para anular os acordos individuais, os acordos e as convenções coletivas contrárias à legislação. As delegacias do trabalho, os tribunais regionais e, em último caso, o TST teriam suas funções praticamente eliminadas. É um desastre.

    A verdade é que o projeto de reforma trabalhista anula na prática direitos reconhecidos do trabalhador desde a década de 40, também previstos pela Constituição promulgada em 88. Talvez o principal deles seja a irredutibilidade dos salários para quem continua exercendo as mesmas funções em determinada empresa.

    A conclusão de estudos feitos por entidades sindicais, juristas, especialistas no assunto e até a Ordem dos Advogados do Brasil diz que, se o texto em votação na Câmara virar lei, as empresas poderão reduzir o salário de todos os empregados para continuarem exercendo as mesmas funções. Para isso, basta demiti-los e recontratá-los em regime de terceirização ou por acordo fechado individualmente com cada funcionário.

    O Relator alega que o projeto inclui salvaguardas. "Afinal", diz ele, "a Constituição Federal somente permite essa redução por meio de negociação coletiva que é realizada pelo sindicato da categoria." No entanto, nos termos do texto vigente, não haverá sequer como a Justiça do Trabalho interferir no assunto. Afinal, se não desaparece, a Justiça do Trabalho terá seu papel drasticamente reduzido pelo texto, que privilegia os acordos sobre a legislação trabalhista do País. É aquele chamado acordado sobre o legislado.

    Segundo estudos feitos pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), constam do texto mecanismos que eximem as empresas do recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e até da contribuição para a Previdência. Isso será possível com possibilidade de contratação temporária e a troca da carteira assinada pela terceirização dos mesmos trabalhadores que continuam prestando serviços à mesma companhia.

    As consequências serão o empobrecimento do trabalhador a médio prazo, a redução da massa salarial do País e até uma erosão da arrecadação previdenciária e de tributos, o que é prejudicial para o Governo.

    A Ordem dos Advogados do Brasil alerta que, a médio prazo, as mudanças não vão interessar sequer aos empregadores, já que a redução salarial vai ter como consequência a queda no consumo. ''O projeto agride a Constituição e todo o sistema normativo, representa um retrocesso civilizatório com o desrespeito aos direitos adquiridos'', diz o Presidente da Ordem, Claudio Lamachia.

     Outro desmonte previsto no projeto do Relator diz respeito à estrutura sindical. Ele propõe a criação da representação dos trabalhadores por empresa e retira das entidades sindicais a autoridade de fazer reclamações coletivas à Justiça.

    Com a terceirização até das atividades-fim, a proposta de Marinho acaba, na prática, com benefícios como o 13° salário, reduz significativamente as multas aplicadas às empresas que descumprirem a lei, regulamenta o teletrabalho por tarefa e não por jornada, e dificulta o acesso dos trabalhadores às reclamações judiciais.

    Pesa, nesse sentido, também que o texto acaba com o princípio de grupo econômico, para limitar possíveis reclamações dos trabalhadores exclusivamente à empresa que celebra o contrato direto com os funcionários, eximindo a holding e outras coligadas da responsabilização pelas possíveis ilegalidades cometidas pelo patrão direto.

    Para a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público, que representa mais 40 mil juízes, procuradores, promotores, inclusive do Trabalho, trata-se do maior projeto de retirada de direitos trabalhistas já discutido no Congresso Nacional desde a criação da CLT. Em nota assinada pelos presidentes de nove entidades, a Frente aponta o risco de que o trabalhador venha a receber remuneração até mesmo abaixo do salário mínimo.

    É que a reforma cria ou eventualmente amplia novas formas de contratos de trabalho precários que diminuem, em muito, direitos e remuneração.

    O próprio Governo admite, como ponto central do projeto, a prevalência do acordo coletivo ou individual sobre a legislação trabalhista. Isso possibilita que a empresa contrate o empregado com menos direitos do que prevê a convenção coletiva da categoria ou da lei. Esse dispositivo combina-se com a terceirização até das atividades-fim de qualquer setor.

    As empresas, de outro lado, ampliam em muito os seus poderes discricionários. Admite­se mesmo o parcelamento das férias em até três períodos, à escolha da empresa, ainda que não seja essa a intenção do assalariado.

    Conceitos originais da CLT, como o da remuneração por jornada, por tempo trabalhado, começam a ser demolidos. Por exemplo, o texto regulamenta o teletrabalho por tarefa e não por jornada; deixa ainda de contabilizar como hora trabalhada o período de deslocamento dos trabalhadores para as empresas, mesmo que o local do trabalho não seja atendido por transporte público e fique a cargo da empresa; permite jornada de trabalho de até 12 horas seguidas por 36 horas de descanso para várias categorias hoje regidas por outras normas; de quebra, acaba com o princípio de equiparação salarial para as mesmas funções na mesma empresa.

    Podemos constatar, assim, que essa reforma é profundamente prejudicial, profundamente prejudicial aos trabalhadores, e representa a abrangente regressão ao direito do trabalho, atacando simultaneamente as três fontes de Direito: a lei, a Justiça do Trabalho e a negociação coletiva.

    Srª Presidenta, não podemos aceitar essa proposta. A Câmara deve dizer "não" à essa reforma trabalhista. No Senado, eu direi "não" e manifesto aqui minha a convicção de que essa será a postura – esperamos – da maioria dos Senadores para honrar o direito do trabalhador brasileiro duramente conquistado ao longo de quase trinta anos, com a Constituição cidadã de nosso País.

    Era isso, Srª Presidenta.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2017 - Página 25