Discurso durante a 54ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para a situação dos povos indígenas no País.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Alerta para a situação dos povos indígenas no País.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2017 - Página 39
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • AVISO, SITUAÇÃO, INDIO, PAIS, REFERENCIA, OCORRENCIA, ATO, VIOLENCIA, VITIMA, TRABALHADOR RURAL, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), COMUNIDADE INDIGENA, ESTADO DO MARANHÃO (MA), LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ASSUNTO, MATERIA, CRITICA, NOTA, AUTORIA, OSMAR SERRAGLIO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), MOTIVO, DESRESPEITO, GRUPO INDIGENA, ELOGIO, ATUAÇÃO, SEBASTIÃO SALGADO, FOTOGRAFO, COMENTARIO, CONJUNTURA ECONOMICA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DEFESA, FUNCIONAMENTO, QUALIDADE, AUTARQUIA.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Obrigado, Sr. Presidente. Eu queria cumprimentar a todos que nos acompanham pela Rádio e TV Senado.

    Sr. Presidente, vários colegas já se sucederam aqui na tribuna, relatando o embate da sociedade brasileira contra essas reformas, essas mudanças para pior que o Governo apresenta tanto na Previdência como também nas leis trabalhistas.

    Eu sou daqueles que defendem uma atualização da legislação trabalhista, uma atualização para o século XXI, mas está levando, do meu ponto de vista, para a era pré-Vargas, para o começo do século passado. E isso não tem nenhum sentido.

    Venho à tribuna, Sr. Presidente, para também fazer um alerta, repercutir aqui algo que alguns dão como normal. Refiro-me a dois episódios que mostram bem o período e o momento grave que nós estamos vivendo no Brasil: a chacina contra trabalhadores em terra em Mato Grosso a mais de mil quilômetros da cidade de Cuiabá, a capital, na semana passada e, agora, a chacina, a violência contra indígenas no Município de Viana, no Maranhão. A imprensa hoje traz artigo escrito por Josias de Souza na Folha de São Paulo e no UOL sobre essa situação muito grave. E nós não podemos nos calar.

    A situação da Funai é de dar dó. Na semana passada, tínhamos 4 mil índios aqui, que sofreram violência quando buscavam a garantia de seus direitos, como estabelece a Constituição. Quatro mil índios de 305 povos estavam aqui.

    Não fizeram nenhuma manifestação contra a Funai, contra o seu Presidente atual ou contra os seus funcionários – ao contrário, foram lá hipotecar solidariedade ao Presidente atual da Funai –, mas vieram aqui ao Ministério da Justiça protestar contra o Governo e contra o Ministro.

    Eu vou ler um pouco do artigo do Josias de Souza, de hoje, no UOL, na Folha de S.Paulo, em que ele fala:

O governo de Michel Temer ainda não notou, mas viver em zona rural conflituosa é muito perigoso. A qualquer instante pode-se morrer. Há três meses, Temer mandou para o Diário Oficial portaria que esvaziou a Funai e criou um grupo com poderes para rever demarcações de terras indígenas.

    Isso é de uma gravidade, Senadora Regina, que eu pensei que nós não íamos mais viver em nosso País.

    E segue o jornalista Josias de Souza – vou pedir, inclusive, para constar nos Anais do Senado Federal esse artigo e as matérias que falam da matança de índios no Maranhão.

Nas pegadas dessa novidade, o Presidente entregou ao correligionário Osmar Serraglio o Ministério da Justiça. Simpático ao agronegócio, Serraglio apressou-se em escolher um lado [aspas]: "O que acho é que vamos lá ver onde estão os indígenas, vamos dar boas condições de vida para eles [imagine o descolamento de uma proposta dessa, da realidade, da história, do respeito que devemos ter a esses povos originários!], vamos parar com essa discussão sobre terras." [Diz o Ministro da Justiça, chefe do Presidente da Funai, responsável pelo que a Constituição estabelece, que é proteger os povos indígenas.]

    E faz uma pergunta o atual Ministro: "Terra enche a barriga de alguém?"

    Ora, só quem não tem nenhum respeito com a história dos povos originários indígenas, só quem não tem o menor bom senso, só quem não leu a Constituição pode falar uma asneira dessa. Terra tem um significado muito mais amplo, muito maior do que nós não índios entendemos ter. Para os índios, a terra é a mãe terra, é a sua história, a sua vida.

    E o que nós estamos vivendo agora, nesta segunda-feira, com atraso de um dia? Ganhou manchetes no noticiário o ataque contra indígena da tribo gamela, no Maranhão. Foram 13 feridos, e, segundo nota que nós tivemos, o Ministério da Justiça solta uma nota diante dessa barbaridade em que cortaram a mão de indígenas, mataram, feriram, com facões e armas de fogo... E o Ministro da Justiça, responsável, como estabelece a Constituição, diz em nota – está aqui na notícia do Josias de Souza, no artigo dele: "Serraglio disse que vai averiguar o que houve entre os 'pequenos agricultores e supostos indígenas'" – supostos indígenas.

    Uma hora depois, começaram as críticas, e aí a mesma nota foi editada, sem o "supostos indígenas".

    Eu estive na Funai, semana passada, Sr. Presidente, acompanhado de Sebastião Salgado. Fui lá. O Sebastião Salgado está fazendo um trabalho, um novo livro, que deve ser terminado daqui uns três anos –, ele já está trabalhando há sete –, contando a história dos povos originários do Brasil, das nossas origens. E vai fotografar. Esteve no Acre, fotografou dois povos indígenas. Eu o ajudei nessa ida ao Acre. E, agora, estivemos com autoridades no Ministério da Aeronáutica, no Ministério da Defesa e na Funai, porque ele quer retomar, depois de ter sofrido um acidente na perna, os trabalhos na Amazônia. Ele fica 20, 30 dias numa aldeia para começar a fotografar. E ele vai seguir fotografando nos próximos três anos.

    Fomos à Funai, porque todo o trabalho dele é feito junto com a Funai. Fomos muito bem recebidos pelo atual Presidente, que lamentavelmente – espero que o Governo volte atrás, diante do caos – está demissionário, porque a Funai virou uma disputa, um espaço de disputa partidária.

    Isso é um absurdo. Isso é criminoso.

    O Presidente da Funai, Antônio Fernandes Toninho Costa, trabalhou 26 anos com saúde indígena, conhece na palma da mão a história desse povo e é respeitado por ele, está lá com ameaça de demissão.

    Eu espero – faço um apelo ao Ministro da Justiça – que, se quer corrigir seus erros, suas notas, mantenha o atual Presidente da Funai, mas dê condição.

    O orçamento da Funai era de R$110 milhões para cuidar de 1 milhão de índios e foi cortado em 44% – houve um corte linear no orçamento da Funai. Depois, nós estamos colhendo as consequências, vamos ganhar as manchetes da imprensa internacional com essa matança dos índios, com essa chacina, e não ficamos sem saber o que está acontecendo.

    Está aqui: a Funai não tem como funcionar da maneira como está funcionando. Precisava de R$9 milhões por mês para trabalhar minimamente. Agora, está tendo que trabalhar com R$4 milhões por mês, para cuidar de 1 milhão de índios, para cuidar de dezenas de escritórios da Funai Brasil afora, para cuidar de 12 frentes que protegem os índios isolados.

    O Sebastião Salgado, junto comigo, lá na Funai, semana passada, falava: "Feliz o país que pode conviver com sua pré-história". E os índios isolados são nossa pré-história. No Acre, nós temos povos indígenas isolados, Presidente, que nunca fizeram contato. Nós demarcamos as áreas e as protegemos com postos avançados de proteção da Funai, que agora estão sendo fechados e desmontados por absoluta falta de recurso.

    A Funai tem bons funcionários. A Funai tem uma história. Vai completar este ano, em dezembro, 50 anos. E olhe como o Brasil está comemorando os 50 anos neste Governo da Funai, 50 anos. Marechal Rondon deve estar se revirando por conta da história. Este Governo está matando a Funai por inanição. O que fez esse povo originário, que protege as áreas, que protege o nosso País? Graças a eles, nós ainda temos a conservação da nossa floresta, do nosso meio ambiente, dos nossos biomas, graças a eles, aos povos indígenas. O que esse povo fez para receber um tratamento como esse? Um corte perverso de orçamento – e agora, com essa situação das matanças.

    Então, os 4 mil indígenas que vieram aqui semana passada, representando 305 povos, queriam apenas que o Congresso, que o Senado e a Câmara não tirem aquilo que a Constituição lhes garante, não modifiquem, como estão fazendo já no Executivo e querendo fazer a mudança na legislação, alterando radicalmente os critérios de demarcação de terras indígenas no nosso País.

    Sr. Presidente, nós não podemos aceitar que, com as 12 frentes de proteção existentes no Brasil para índios isolados, que podem chegar a 5 mil índios, que demandam recursos de R$1,5 milhão para podermos ter o maior patrimônio, que são esses povos originários, longe das chacinas, o Ministério da Justiça não dê a mínima condição para que a Funai funcione. O apelo que eu faço peço aos colegas Senadores: nós não podemos, nós não devemos nos calar diante dessa barbaridade, dessa matança que tivemos de indígenas, porque, nesses meses à frente do Ministério da Justiça...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – ... e o jornal Folha de S.Paulo denuncia – eu já concluo, Sr. Presidente –, o Ministro da Justiça não recebeu um indígena, nenhuma organização dos índios; mas recebeu mais de cem Parlamentares, e a grande maioria ruralistas.

    Eu não faço enfrentamento, eu não faço uma ação contra um lado, dirigida, porque para mim temos que encontrar diálogo com quem produz, com quem cria. Mas quem é que vai defender nossos índios? Quem é que vai trabalhar por esses que não têm voz aqui no Parlamento? Eu faço esta denúncia e espero sinceramente que a Polícia Federal possa agir rapidamente e prender os que fizeram essa chacina no Maranhão e que o Ministério da Justiça, a quem a Polícia Federal está subordinada, pare de destratar, pare de zombar desses povos que são patrimônio do nosso País, os nossos irmãos índios.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

DOCUMENTOS ENCAMINHADOS PELO SR. SENADOR JORGE VIANA.

(Inseridos nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

    Matérias referidas:

     – Governo Temer brinca de incendiário no campo, Blogue de Josias de Souza;

     – Serraglio chama índios atacados de "supostos indígenas";

     – Pistoleiros atacam e decepam mãos de índios no Maranhão;

     – Agenda de ministro privilegia ruralistas e alvos da Lava Jato;

     – Outro lado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2017 - Página 39