Discurso durante a 63ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca do primeiro ano após o impeachment de Dilma Rousseff, ex-Presidente da República, e críticas ao atual governo na gestão do Presidente Michel Temer.

Defesa da rejeição do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, de autoria do governo de Michel Temer, Presidente da República, que trata da reforma trabalhista.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Considerações acerca do primeiro ano após o impeachment de Dilma Rousseff, ex-Presidente da República, e críticas ao atual governo na gestão do Presidente Michel Temer.
TRABALHO:
  • Defesa da rejeição do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, de autoria do governo de Michel Temer, Presidente da República, que trata da reforma trabalhista.
Aparteantes
Gleisi Hoffmann.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2017 - Página 90
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > TRABALHO
Indexação
  • COMENTARIO, ANO, POSTERIORIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA, RESULTADO, PREJUIZO, POPULAÇÃO.
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, COMENTARIO, RETROCESSÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Presidente, eu estou impressionado com a sessão que antecedeu esta nossa sessão plenária. Foi uma sessão de discussão da reforma trabalhista proposta pelo Governo. Na verdade, foi uma sessão que expôs a ideia dos senhores em contradição à ideia dos vassalos, como se na idade média nós estivéssemos vivendo. A reforma trabalhista implica, segundo alguns dos expositores, disciplinar o momento em que trabalhadores realizarão a sua higiene pessoal.

    Um dos expositores dizia que os trabalhadores devem cuidar disso antes da sessão trabalhista na fábrica onde estão empregados, e querem reduzir o almoço dos trabalhadores para 15 minutos. Medeiros, para 15 minutos! A proposta que se sucederá a esse absurdo, provavelmente, vai ser a proposta de que os trabalhadores utilizem as suas férias para almoçarem e jantarem. Seria o que jocosamente me sugeriu, agora há pouco, o Senador Medeiros: que os Senadores utilizassem o recesso para as suas refeições. São os senhores da Idade Média tentando impor uma legislação da Idade Média aos trabalhadores brasileiros.

    Mas a minha intenção, apesar da indignação que me causou o que assisti aqui – com esses representantes dos senhores detentores do grande capital do Brasil querendo liquidar os direitos trabalhistas conquistados na história da humanidade e na história do Brasil, durante dezenas de anos, séculos em alguns casos –, era fazer o meu pronunciamento a respeito do aniversário de um ano do novo Governo do Brasil depois da queda da Presidenta Dilma Rousseff. Eu quero falar sobre isso.

    Há um ano, desta tribuna, apostrofei, senhoras e senhores, os Senadores que participaram do golpe parlamentar, empresarial e midiático que destituiu a Presidente Dilma Rousseff. Eu friso mais uma vez que fui, nesta tribuna, se não o único, o maior crítico da política econômica da Presidente Dilma Rousseff. Eu era a oposição aqui no Senado da República, porque o PT estava com a Presidente, com algumas exceções em alguns momentos, e o PSDB jogava junto com todas as medidas que eu achava rigorosamente contraproducentes para a nossa economia.

    Repeti, naquela ocasião, a interpelação de Tancredo Neves a Moura Andrade; repeti o esconjuro aqui desta tribuna, e eu dizia: "canalha! Canalha! Canalha!" Por três vezes. E cobrava: se, mesmo sem culpa, esta Casa condenar a Presidenta... Porque não havia culpa na tal manobra fiscal, que, de resto, havia sido repetida por Presidentes anteriores e por governadores, inclusive, presentes aqui neste plenário. Se, mesmo sem culpa, esta Casa condenar a Presidente, que cada um esteja consciente do que há de vir, que ninguém depois alegue ignorância ou se diga trapaceado, porque as intenções do Vice, que quer ser titular, são claras, são solares e estavam escritas no tal projeto Ponte para o Futuro.

    Em seguida, naquele dia 12 de maio, um ano atrás, eu enumerava o que estaria por vir. Eu dizia que o reajuste das aposentadorias e pensões seria desvinculado do aumento do salário mínimo e que o salário mínimo não teria reajustes reais; que a Previdência Social, o maior instrumento de distribuição de renda do País, seria destruída por reformas facinorosas; que a CLT seria fulminada, com a revisão de direitos e garantias sociais dos trabalhadores; e que a pedra de toque, a cereja do bolo da reforma trabalhista seria a prevalência do negociado sobre o legislado; que as despesas correntes e os investimentos da União, com a exceção das despesas financeiras para pagar banqueiros e rentistas com o serviço dívida pública, seriam congeladas; que seriam retomadas as privatizações e as concessões, selvagemente, como a entrega do pré-sal, do espaço aéreo, de nossas terras, de nossos minérios e assim por diante; que tudo isso aconteceria rapidamente, com a celeridade e a urgência de um gatuno pressionado pelo alarme que chama a polícia.

    Desgraçadamente, malditamente, tudo aquilo que enumerava, até – concedamos – com certo exagero, no momento, transmuda-se hoje em realidade.

    Neste plenário, naquele dia e dias seguintes, alguns Senadores tentaram desclassificar as minhas previsões, dizendo-as precipitadas e catastróficas. Alguns peemedebistas e Senadores do PDT, do PSB, do PP e mesmo do PR, que em um primeiro momento tendiam a ser contra o impeachment da Presidente, diziam-me não poder acreditar que o Governo Temer liderasse o recuo na legislação trabalhista, na Seguridade Social, nos programas sociais e nas áreas da saúde e da educação. Que eu estava exagerando, diziam-me eles; que o afastamento da Presidente faria com que o Brasil retomasse o crescimento econômico e estancasse o desemprego.

    Senhoras e senhores, de fato, errei. Mesmo que dissesse que o Governo haveria de agir com a velocidade do raio para aprovar as tais reformas e que seria rápido na abertura do País aos interesses multinacionais, eu previa pelo menos dois anos para que tudo isso acontecesse. Errei. Para os propósitos a que se reservou, o Governo Temer constitui um exemplo de eficácia e é um caso flagrante de sucesso. Nunca o processo legislativo, em toda a história da República se fez tanto em tão pouco tempo.

    Este Congresso, especialmente a Câmara dos Deputados, age naquele ritmo constituinte de 1988, imprimido por Ulysses Guimarães, com seu mantra, o mantra de Ulysses: "vamos votar! Vamos votar!". E vota-se, vota-se e vota-se. Vota-se para destruir tudo que a Constituição de 1988 consagrou. Este Congresso, especialmente a Câmara dos Deputados, na verdade passa a agir como se fosse uma Constituinte, embora caricata, com fortes tendências à galhofa e à fancaria e com irresistível tendência ao comércio, no varejo e no atacado. Mas, mesmo assim, é uma Constituinte de fato, mesmo que usurpadora de poderes, pois não fomos eleitos para redigir uma nova Constituição e mesmo porque mais de 90% dos brasileiros, fonte original do poder constituinte, rejeitam as reformas trabalhista e da Previdência.

    As senhoras e os senhores que me acompanham na TV Senado, na Rádio Senado e neste plenário poderiam me apontar uma só medida, umazinha que seja, em benefício da população! Uma só! Apenas uma! Neste furor legiferante, nesta contrafação constituinte, nem uma mísera vírgula a favor dos trabalhadores urbanos ou rurais, a favor dos aposentados, dos mais velhos, das crianças, dos pequenos agricultores, dos professores, dos desempregados, dos mais pobres, dos doentes e dos necessitados ou mesmo do empresariado nacional, do empresariado brasileiro.

    Há um ano, naquele fatídico 12 de maio, dizia que o afastamento de Dilma, cuja presidência eu criticava fortemente, franquearia o Palácio do Planalto a um Governo cujas decisões poderiam ser enquadradas em duas categorias: primeiro, a categoria do desmonte do Estado e do setor público, para abrir espaço à exploração e ao lucro privado; e a categoria da precarização do trabalho, para ampliar o lucro do capital suportado pela banca.

    Mais uma vez, confesso a minha perplexidade e meu espanto por ver realizado o que eu previra em tão pouco tempo. Naquele discurso de um ano atrás, fazia ainda uma advertência, dizendo: essa combinação explosiva de empreguismo com medidas contra os aposentados, os assalariados, os mais pobres, contra direitos e conquistas populares alimentam contradições de classe, em consequência alimentam a luta de classes.

    E eu perguntava: as senhoras e os senhores estão preparados para uma guerra civil? Eu me dirigia ao Senado da República. Não. Entrincheirem-se, então, porque o conflito é inevitável. O povo brasileiro, que provou por alguns poucos anos o gosto da emergência social, não retornará submissamente à senzala.

    Foram palavras que pronunciei naquela ocasião. Esse foi um dos trechos do meu discurso, que colegas mais criticaram, de novo classificando-me de desmoderado, de excessivo e de insuflador de movimentos sociais.

    Pois bem. Menos de um ano depois, o que aconteceu? Quarenta milhões de trabalhadores cruzam os braços, param o País, na maior greve de nossa história. Um movimento que, com a ajuda dos meios de comunicação, o Governo tentou desclassificar, como as patéticas, ridículas declarações do Ministro da Justiça.

    E pensar, Senador Lindbergh, que, na cadeira onde hoje se encolhe Osmar Serraglio, lá sentou Diogo Feijó, Rui Barbosa, Afrânio de Melo Franco, Osvaldo Aranha, Tancredo Neves, João Mangabeira, Prado Kelly, Luís Viana Filho, Nereu Ramos, Milton Campos, Petrônio Portella, Paulo Brossard.

    Srªs e Srs. Senadores, talvez no discurso neste plenário de um ano atrás, tenha eu cometido mais um brutal erro de avaliação. Não levei em consideração a rapidez com que ladravazes movimentariam negócios e nem previ tanta desinibição no assalto à Nação brasileira. Nem esses tempos da Lava Jato, esses tempos dos Torquemada, dos Savonarola, do Janot e do Fachin inibem os trapaceiros.

    Querem um exemplo? Ainda semana passada, este Plenário aprovou uma medida provisória para eternizar o prolongamento de concessões na infraestrutura sem licitações, patrocinada por um Ministro suspeito de maracutaias grossíssimas. E esse assalto, à luz do dia, que impressionar pela ousadia e pela extensão do esbulho, faz-se com a cobertura generosa e entusiasmada da mídia monopolista, com a assistência dos 250 especialistas e comentaristas da Globo News e da CBN e dos economistas do mercado – pior ainda, e sob a indiferença cúmplice do Judiciário, do Ministério Público, da Polícia Federal do Daiello. Enquanto o trio justiceiro ocupa-se de tostões, negócios sem limites acontecem no Congresso Nacional, nos Ministérios, nas estatais e nas agências reguladoras.

    Será que o juiz federal, o comandante da força-tarefa, o procurador-geral, o relator da Lava Jato no Supremo e o comandante da Polícia Federal não atinaram para o fato de que o apoio da mídia, do mercado, da banca, da embaixada norte-americana ao combate seletivo da corrupção no Brasil nada tem a ver com ética, moralidade, reposição da decência e defesa dos bons costumes?

    A pilhagem do País e a escravização do nosso povo, esse o preço do apoio que eles estão, por omissão ou ação, dando aos senhores do Brasil de hoje. Abro aspas:

Navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo mar Eritreu a conquistar a Índia; e como fosse trazido à sua presença um pirata, que por ali andava roubando os pescadores, repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício: porém ele [o pirata], que não era medroso nem lerdo, respondeu assim: "Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador?" Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza: o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, [faz] os Alexandres. [...]

De que eu trato [aqui], são [dos] outros ladrões, de maior calibre e de mais alta esfera. [...] os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos.

– Os outros ladrões roubam um homem: estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco: estes sem temor, nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados: estes furtam e enforcam.

    Esses dois trechos são do Sermão do Bom Ladrão, de Vieira, e, um ano depois da destituição da Presidente Dilma, retratam com precisão o Brasil de hoje: pilhado, retalhado e vendido. Confesso que não esperava tanta rapidez, quer na destruição da soberania nacional, quer na destruição do Estado social. Que triste aniversário estamos comemorando, que data funesta!

    Citei Vieira, encerro parodiando Gregório de Matos: triste Brasil, tantos negócios, tantos negociantes, no Executivo e no Congresso Nacional.

    Obrigado, Presidente.

    Com prazer, concedo um aparte à Senadora Gleisi.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Obrigada, Senador Requião. Eu queria, em primeiro lugar, elogiar o pronunciamento de V. Exª. Ele é contundente, com resgate histórico. E é uma data muito triste hoje para nós lembrar que tiraram uma Presidenta da República em nome da melhora do País, e o que nós vimos é este País piorando cada vez mais. Perguntaram-me agora qual é o balanço que eu tinha de um ano do Governo Temer. Eu disse: "Uma tragédia!" Primeiro, porque não entregaram o que propuseram à população e ao Brasil. Disseram que bastava tirar a Dilma, que a confiança iria voltar, que a economia iria crescer, o desenvolvimento, iria tudo melhorar. O que nós vemos agora? Estamos com 14 milhões de desempregados, a economia está no chão, continuamos aqui com os juros reais mais altos do Planeta, estamos assistindo a um verdadeiro desmonte da nossa Constituição e do nosso Estado através dessas reformas nefastas – a reforma trabalhista; a reforma da previdência; já votaram a terceirização, a Emenda Constitucional nº 95, que desvinculou os recursos de saúde e educação da Constituição. O que eles estão entregando para o povo brasileiro, Senador Requião? É isso o que eu gostaria de saber. Qual é a entrega que este Governo está fazendo? Aliás, o Ministro da Fazenda tenta, de todos os jeitos, dizer que o Brasil está melhor, que a confiança está voltando, que vai ter crescimento. Desde que assumiram, é o mesmo discurso, e o que nós vemos é o nosso Produto Interno Bruto cair; o que nós vemos é a economia esculhambada. E o que mais me deixa impressionada é como esta Casa, o Congresso Nacional, Câmara e Senado, assistem a tudo isso de maneira passiva, como se fosse normal o que está acontecendo. Aliás, o Chefe da Casa Civil deste Governo deu uma entrevista hoje, dizendo que o maior feito deste Governo é a boa relação com o Congresso Nacional. Desde quando isso é feito? É um absurdo! Eles governam para atender aos Deputados da Base deles, que também não têm compromisso com a maioria do povo, e governam para uma casta que domina a sociedade brasileira: o setor financeiro, os mais ricos. E não estão nem aí para o povo, não têm sensibilidade para tratar com a população. É escandaloso o que este Governo está deixando de legado para o povo brasileiro. Escandaloso! Eu espero que nós consigamos, Senador Requião, o mais rápido possível, colocar um fim nisso. Sei que V. Exª tem proposto uma revogação dos atos, através de um plebiscito, de um...

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – De um referendo revogatório.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Um referendo revogatório, para consultar a população sobre essas reformas. Eu acho que é urgente nós tentarmos articular isso e fazer ações no Brasil para ter apoio uma proposta dessas, assim como nós temos que discutir nesta Casa, votar, decidir a antecipação das eleições. O Brasil não pode esperar até 2018. As pessoas não podem esperar, o trabalhador não pode esperar. O desmonte é muito grande. Então, nós tínhamos que ter dignidade, como Senado da República e como Congresso Nacional, de votar uma proposta como essa. E mobilizar a sociedade. Eu acho que nós temos de voltar a fazer o que o Brizola fez lá atrás, antes do golpe: os comitês pela legalidade. Tem que encher este País de comitês, comitê pela eleição direta, comitê para revogar essas medidas, comitê para fazer uma reforma constitucional, enfim, debater isso pelo menos. Então, queria só deixar esse registro e parabenizar V. Exª. Amanhã também vou fazer um pronunciamento. Amanhã, faz um ano exatamente que este Senado aqui afastou a Presidenta Dilma. Uma sessão horrorosa, uma sessão para ficar registrada na página mais feia da nossa história, um rasgo da Constituição. Então, o que nós temos é que lamentar muito, Senador Requião, mas queria deixar esse registro e parabenizá-lo pelo pronunciamento.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – Mas não vamos deixar, então, o pronunciamento só na crítica.

    O que esse Governo pretendia com a tal Ponte para o Futuro? Em primeiro lugar, essa não é uma proposta do PMDB. Ela foi levada, numa Convenção Nacional das Fundações Ulysses Guimarães, feita aqui no Hotel Nacional, com 17 Estados presentes. Eu fiz, imediatamente, a contradita da proposta. Meu filho me segundou fazendo a contradita. E 17 Estados presentes, unanimemente, rejeitaram a proposta, que não foi posta, então, em votação. E acabou sendo exercitada como uma proposta peemedebista. Não! Era uma proposta de uma cúpula do PMDB, nunca discutida com a estrutura-base do Partido.

    O que eles diziam?

    Bom, aliás, ontem ou anteontem – não me recordo mais –, numa reunião da Bancada do PMDB, alguém fazia uma crítica: com tantas pessoas no Governo investigadas, envolvidas e denunciadas, essa Ponte para o Futuro vai acabar sendo chamada de Ponte para a Papuda. É na mão dessa gente que está a condução do Brasil.

    Mas o que eles pretendiam com a ajuda de uns economistas vinculados a bancos e ao liberalismo econômico? Eles pretendiam colocar na organização do trabalho do mundo o nosso País como o celeiro do planeta Terra e o grande produtor de minérios. Sem limites, num momento de dificuldade, vender terras em toda a extensão possível a grupos de multinacionais de diversos países ou grupos econômicos ou fundos financeiros. Nós seríamos, então, o celeiro do mundo, o grande produtor de minérios e de commodities agrícolas, de grãos, com alta tecnologia, grande mecanização, e, como consequência disso, um enorme desemprego.

    Esse desemprego seria corrigido com uma experiência semelhante à experiência das zonas de processamento industrial da China. Eles precarizariam o trabalho, eliminariam os direitos trabalhistas, reduziriam os salários e liquidariam a Previdência. O Brasil ofereceria, então, aos donos do capital financeiro do mundo um trabalho semiescravizado. Mas a China, à época em que isso foi feito, era um país praticamente desindustrializado, com 1,5 bilhão de habitantes, que aceitavam qualquer possibilidade de emprego formalizado em troca de um almoço, de um jantar ou da possibilidade de uma refeição melhor para a família.

    A China adotou esse processo. Mas o Brasil viveu o período da CLT, do getulismo, direitos assegurados, e viveu, com erros e com acertos, esse período do governo do PT: salário mínimo aumentado, bolsa família, a esperança, a inclusão do povo pobre no mercado de trabalho e no mercado de consumo. Foi uma época admirável.

    No entanto, mesmo essa proposta absurda fracassa. Fracassaria de qualquer maneira porque ela é irracional e irrazoável. Mas hoje até teoricamente fracassa porque o "Donaldo" Trump ganhou a eleição nos Estados Unidos. E ele ganhou a eleição contra os efeitos dessa política de tirar capitais da economia americana para explorar trabalho escravo em outros países dentro dos Estados Unidos, desempregando, eliminando a esperança do povo americano. Famílias que tinham nível universitário não conseguiam mais formar numa universidade os seus filhos por falta de trabalho e falta de salário. Então, o processo está amplamente fracassado.

    E qual é a solução que nós podemos propor para o Brasil, Senadora Gleisi? A experiência da nova política alemã. O que fez o famoso Hjalmar Horace Greeley Schacht na Alemanha? Em primeiro lugar, reduziu de forma drástica, brutal, os juros pagos ao capital financeiro no financiamento da dívida alemã e, junto com grandes grupos empresariais, criou uma taxa interna de retorno para quem investisse o seu capital num projeto de reestruturação da infraestrutura alemã. Daí saíram as autobahns, a indústria metalmecânica, as grandes metalúrgicas, e surgiu o desenvolvimento econômico, e se viabilizou o pleno emprego. Nos Estados Unidos, foi uma coisa parecida, um pouco posterior, na mesma década de 30.

    Nos Estados Unidos, foi uma coisa parecida, um pouco posterior, na mesma década de 30. Ford, inspirado nas ideias do economista Taylor, que dizia que a produtividade seria aumentada pela especialização do trabalho, apropria essa ideia da especialização e a vincula a uma linha de montagem. Trabalho especializado com linha de montagem aumenta de forma absoluta, de forma absurda a produtividade da economia. E a indústria americana sucede a Ford nessa experiência, apropriada pelo conjunto dos industriais.

    Em determinado momento, Senadora Gleisi, Franklin Delano Roosevelt, Presidente americano de então, resolve homenagear Ford pela linha de montagem taylorista, e o Ford diz ao Presidente:

– Presidente, estamos cometendo um grande engano. A linha de montagem e o aumento da produtividade está inviabilizando os Estados Unidos.

– Por quê? – pergunta o Presidente

– Por que nós não teremos mercado de consumo.

– Meu Deus, Ford, o que podemos fazer, então?

    E o Ford dá o início da solução do novo pacto do New Deal, que reabilitou a economia norte-americana. Ford propõe:

– Vamos reduzir a carga horária para dar mais emprego e subir o salário para recuperar a capacidade de consumo da economia norte-americana.

    Ford era nacional-socialista. Se era nazista não sei, mas era nacional-socialista. E ele dizia, inclusive, que um trabalhador que produzisse um automóvel na sua fábrica, deveria necessariamente...

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) – Poder comprar.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – ... ter o salário suficiente para comprar o produto do seu trabalho.

    Depois disso, Roosevelt parte para as grandes obras – rodoviárias, gerações de energia, portos – e recupera a estrutura da economia norte-americana, restabelecendo o círculo virtuoso do desenvolvimento.

    Então, só é possível recuperar a economia brasileira, nesta crise, a partir de grandes investimentos públicos, que são negados pela asneira absoluta do congelamento de investimentos por 20 anos. Investimentos públicos deficitários, sim, em determinado momento, porque, cá entre nós, não é a dívida pública o problema de um país, senão o Japão não existiria mais e os Estados Unidos estariam quebrados. É o custo dos juros da sua rolagem que inviabiliza a estrutura e a possibilidade do desenvolvimento.

    Nós estamos andando na contramão do mundo. Na recusa dessa globalização e dessa austeridade, provocada por Margaret Thatcher, a Inglaterra votou o Brexit; a Itália derruba o Primeiro-Ministro, revogando uma mudança constitucional que entregava o país nas mãos do capital; a Grécia praticamente desaparece como figura econômica no concerto das nações; mas sobrevive, neste momento, Portugal, que mandou às favas a austeridade fiscal, aumentou os salários e as aposentadorias, viabilizando o incremento do consumo e está saindo da crise com investimentos.

    Agora, nós estamos aqui esperando o quê? Os capitais que Trump não deixará sair dos Estados Unidos para não eliminar completamente o emprego dos seus eleitores? Nós estamos esperando que espécie de milagre: a entrega do Brasil, o fim do Estado social, o fim de um projeto de nação soberana?

    Meu Deus, não é possível que ninguém entenda o que está acontecendo. É o interesse do capital financeiro: Bradesco e Itaú comandam o Brasil. E, nesta crise fantástica, Senador Lindbergh, no primeiro trimestre do ano, o Itaú teve um lucro líquido de R$6 bilhões. Não é possível que o Brasil não abra os olhos.

    Eu não pude hoje, no plenário, deixar de conter a minha indignação quando vieram aqui os representantes dos senhores que dominam a economia financeira dizer que a solução é escravizar o trabalhador, para não deixar quebrar as empresas que hoje existem, querendo reduzir a 15 minutos o espaço de almoço de um operário e proibir, estabelecendo de patrão para empregado, até o momento da higiene íntima. Ou seja, o empregado, segundo alguns conferencistas escalados nessa reunião que antecedeu a nossa plenária, teriam que urinar no momento estabelecido pelo patrão, segundo o conferencista que aqui compareceu, antes de se iniciar a sua jornada de trabalho, uma coisa rigorosamente horrível e absurda, uma volta à situação social dos trabalhadores na Idade Média, relação entre senhores e vassalos, rigorosamente inadmissível pelo povo brasileiro.

    O Temer não está enxergando o que está fazendo. Aliás, ele, na sua longa carreira política, nunca se dedicou a essas disciplinas que estudam a economia e estabelecem as relações sociais, mas ele ainda não percebeu que essa política estará lançando o Brasil numa guerra civil, porque nós não somos os chineses que viviam na Idade Média. O trabalhador brasileiro já sentiu o gosto de usufruir direitos sociais, já usufruiu das prerrogativas do Estado social e as vantagens da legislação trabalhista. E a legislação trabalhista existe para equilibrar as relações entre o poderoso capital e o frágil trabalho, privilegiando, com a legislação, sindicatos. Querem o convencionado sobre o legislado, o convencionado no momento de recessão em que o trabalhador, se quiser o emprego, tem que aceitar trabalhar pelo almoço ou pelo jantar, senão fica sem comer, porque a economia está paralisada por iniciativa do raio do Governo que quer acabar com o Estado social e com projeto de soberania nacional.

    Senador Lindbergh, é o que nós podemos dizer na véspera do aniversário de um ano do Governo do Presidente Temer.

    O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Requião, a Senadora Gleisi.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Eu só queria complementar. Brilhante a sua intervenção final mostrando o quadro em que nós estamos. E é tão absurda a nossa situação que estamos trazendo, para dentro do debate do Congresso Nacional, em vez de propostas para melhorar a economia, melhorar a vida das pessoas no País, propostas como essas que debatemos aqui hoje, numa sessão especial, numa audiência pública no plenário da Casa. Aliás, feita de maneira rápida, açodada, porque eles estão querendo discutir a reforma trabalhista aqui em um mês, 30 dias. Disseram para nós aqui neste plenário que não haveria regime de urgência, não pediriam. Na realidade, eles estão fazendo regime de urgência na prática – é isso que eles estão fazendo – ao fazer audiências públicas concomitantes entre as comissões, e estão dizendo que os relatórios das comissões também vão sair de forma concomitante.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – Com relatores escolhidos a dedo também.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Exatamente. Que vão entregar o que o Governo quer. Não é nem o Governo, é quem domina o País quer, porque sempre, quando há problema na economia para o lado deles, eles têm que retirar direitos do trabalhador. E é totalmente contrário. Isso que V. Exª está falando já foi modelo de desenvolvimento não de um país socialista, de um país capitalista, os Estados Unidos, que apostaram nisto: no consumo, em boa remuneração, em renda para a economia interna avançar. Então, eu fico me perguntando como é que essas pessoas não enxergam o que está acontecendo no Brasil? E como é tão passivo o Senado da República, a Câmara dos Deputados. Eles estão enxergando cada um o seu interesse.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – O seu negócio.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – O seu negócio. Quer dizer, quem é dono de empresa aqui está achando que tem que ser assim. O outro representa um contingente de outras empresas, do sistema financeiro, e as coisas vão passando por aqui, Senador Requião. Nós não vamos ter condições de recuperar isso. Vai ser uma tragédia nacional – uma tragédia nacional. Aliás, um dos depoentes hoje da comissão – V. Exª tinha saído quando ele respondeu – fez uma brincadeira de mau gosto. Aliás, ele gostou de usar a tribuna e o microfone para fazer discussão política. O juiz do trabalho lá do Paraná falou que ele conversou muito aqui e, em nenhuma vez, ele falou de demônios. Estava fazendo uma referência à sua fala. Eu não tinha dito na hora, eu me esqueci de falar, mas eu tenho, reiteradamente concordado com V. Exª. Nós abrimos as portas do inferno. Nós não, o Temer, este Governo abriu as portas do inferno. Todos os demônios e fantasmas estão sobre o povo brasileiro. O que que há para proteger o povo? Acho que a única liderança a que nós podemos recorrer é o Papa Francisco, que tem visão de um mundo mais justo, mais equilibrado. A situação está muito ruim, Senador Requião, está muito ruim. E as pessoas estão vendo que estamos caminhando para uma situação que vai piorar ainda mais. Então, eles têm uma responsabilidade imensa com o que pode acontecer neste País, muito grande. Então, eu espero que a gente, gritando aqui dentro, fazendo o que a gente pode fazer, consiga barrar um pouco essas reformas e essas barbaridades que eles estão propondo.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – Um assessor do Bill Clinton, durante a campanha presidencial americana, dizia, com toda a clareza, para os que discutiam coisas assessórias ao desenvolvimento do País: "É a economia, estúpido!" E os estúpidos não entenderam ainda que nós precisamos da retomada da economia, que as nossas empresas precisam de financiamento barato, que nós temos que conter a ganância do capital financeiro, mas propõem, uma vez que são dominados pelo capital financeiro, a escravização do trabalho.

    Eu falei que essa proposta era do diabo. Essa proposta é uma regressão à Idade Média. Então, pensava eu lá comigo, enquanto assistia aos expositores mandados pela Fiesp aqui: eles querem voltar à idade média. Na Idade Média, as coisas terríveis eram atribuídas a satanás, ao diabo. Então, eu pensei comigo, só há uma maneira de contraditar esses representantes da época medieval: viabilizar uma sessão de exorcismo. E, se o nosso Frei Miguel Bottacin, da Cidade Industrial de Curitiba, estivesse vivo, eu estaria providenciando a sua vinda para o Congresso Nacional, porque não há razão possível, não há debate razoável com quem quer reduzir o horário de almoço do trabalhador e disciplinar as suas necessidades fisiológicas ao sabor da necessidade do capital, não há. Não há outra maneira, a não ser exorcizá-los.

    Este Governo não precisa ser derrubado, ele tem que ser substituído por uma eleição direta, numa ampla discussão nacional e, posteriormente, exorcizado, porque, como ele tem propostas medievais, que são propostas medievais comandadas pelo demônio, só o exorcismo livra o Brasil disso.

    Obrigado, Presidente, pela tolerância.

    O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Requião, só quero fazer um comentário. Eu, como Presidente, não ia fazer, mas V. Exª falou do New Deal, falou de Roosevelt. Nós estamos fazendo justamente o oposto do que foi feito nos Estados Unidos, depois daquela crise de 1929.

    Aqui nós estamos numa recessão de oito pontos e estamos fazendo planos de austeridade, estamos cortando investimentos públicos, estamos deprimindo o consumo das famílias. Esse debate que houve hoje aqui sobre reforma trabalhista, e também o da reforma da previdência, significa dizer que vamos estar tirando dinheiro das mãos dos mais pobres.

    Nós não temos como sair dessa situação de crise econômica sem outra política que aposte no Estado, num momento como este de recessão violentíssima, como indutor do desenvolvimento. O Estado tinha que estar ampliando investimentos. O Estado tinha que estar ampliando investimentos sociais.

    Então, quero parabenizar V. Exª pelo discurso. A Senadora Gleisi chegou aqui depois. Ele novamente lembrou uma parte dos discursos históricos que o Senador Requião fez aqui, nesse processo de resistência ao golpe ao impeachment da Presidenta Dilma, inclusive aquele discurso em que se referia a Tancredo Neves, que falou para Auro de Moura Andrade: "Canalha! Canalha! Canalha!" Quero parabenizar muito V. Exª, Senador Requião.

    Quero dizer que amanhã, 12 de maio, nós vamos fazer um ano daquele golpe, um golpe que acho sinceramente – concluo dizendo isso – que já está desmoralizado, porque eles achavam que era tirar Dilma e se revolveria tudo: a economia ia crescer, os empresários iam retomar a confiança. E estamos vendo que, depois de um ano desse processo, esse golpe está desmoralizado.

    Vou fazer um pronunciamento amanhã pela manhã, aqui no plenário. No final do dia, nós vamos ao Rio Grande do Sul. A Senadora Gleisi também vai estar no Rio Grande do Sul, junto com a Presidenta Dilma, onde vamos fazer um ato político, para marcar essa data, que é uma data que envergonha a história do nosso País.

    Parabéns a V. Exª.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) – Senador Lindbergh, essa rapaziada provavelmente – não tenho certeza disso – foi indicada pela Fiesp.

    Eu vi, numa entrevista com Fernando Rodrigues, o atual Presidente da Fiesp dizer que o trabalhador não precisava de mais de 15 minutos para o almoço; que ele tinha visto, em um país qualquer desses aí, um trabalhador que almoçava operando uma máquina com uma mão, enquanto comia um sanduíche com a outra.

    Então, o nosso juiz do Paraná disse que ele não falou em demônio. O diabo não fala dele mesmo. O diabo fala através dos seus intérpretes. Ele falou pelo demônio.

    E tenho certeza de que, se a população lá de Campo Largo jogar água benta, quando estiver presente o juiz do trabalho na sessão da Justiça do Trabalho de Campo Largo, ela explode numa fumaça de enxofre.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2017 - Página 90