Discurso durante a 66ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2017 - Página 40
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, DEFESA, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente, Srs Senadores, Srªs Senadoras que nos acompanham pela Rádio e TV Senado, que nos acompanham pelas redes sociais. Aos nossos convidados que estão aqui, quero fazer uma saudação.

    Queria só lembrar ao Senador que me antecedeu que, se houve governos que geraram empregos, esses foram os governos do PT. Em 12 anos, 23 milhões de postos formais de trabalho. Então, quanto a isso, não temos dúvida alguma.

    Eu quero falar sobre dois aspectos porque muito se fala aqui da reforma trabalhista. Primeiro, que essa reforma – pena que o Ministro não esteja, porque ele começou exatamente com esta fala, no sentido de que é uma reforma que vem para gerar empregos. E, depois, o segundo argumento de que ela não retira direitos.

    Primeiro sobre gerar empregos. Ora, o desemprego não é fruto dos direitos ou dos salários dos trabalhadores; é fruto de uma crise na economia. Quando a economia está em crise, temos desemprego. Não podemos nunca esquecer que o Brasil já foi, há dez anos, a sexta economia do mundo, e nós tínhamos a mesmíssima legislação trabalhista.

    Geramos, nos governos do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, 23 milhões de empregos. Terminamos 2014 com 4,9% de desemprego, e era essa mesma legislação trabalhista. Então, não é a flexibilização da legislação trabalhista que vai fazer com que nós tenhamos empregos no Brasil. Muito pelo contrário, para haver empregos, nós precisamos ter renda, dinheiro em circulação, tem que haver consumo. Se não houver consumo, se não houver renda, esqueça. Nós não vamos ter emprego. Temos de ter um círculo virtuoso. Um estudo da OIT que foi aqui referenciado por um de nossos convidados, feito em 63 países que fizeram a reforma trabalhista, entre países desenvolvidos e em desenvolvimento...

    O senhor citou o México. O México, por exemplo, tinha 1,2 milhão de empregos por tempo indeterminado e passou para tempo determinado. A renda média dos trabalhadores do México, que era de dois a cinco salários mínimos, caiu para um a dois salários mínimos. Isso aumentou a competitividade do México? Não. Trouxe mais pobreza para o México, trouxe mais miséria, trouxe mais problemas sociais, que afetaram toda a sociedade mexicana. Assim ocorreu na Espanha, na Grécia, na Itália. Por que no Brasil seria diferente? Por que flexibilizar o trabalho melhoraria as condições de vida do povo brasileiro e daria mais emprego?

    Nós já tivemos flexibilização aqui. No governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso nós tivemos cinco medidas de flexibilização. A primeira, em 1995, que impediu praticamente a aplicação de multas quando se encontrassem trabalhadores sem carteira assinada. Você tinha que, primeiro, ser pedagógico. Então, você não aplicava a multa. Era pedagógico e dizia: "Olhe, o senhor tem que assinar a carteira do seu empregado". A segunda foi uma lei em que houve a introdução do contrato de trabalho temporário para gerar empregos. Eram os trabalhos temporários. Depois, nós tivemos a lei que flexibilizou a remuneração e introduziu o trabalho aos domingos para os comerciários, porque nós não tínhamos previsão de trabalho aos domingos. Depois, tivemos a que permitiu a suspensão temporária por cinco meses só com o salário do seguro-desemprego.

    Eu pergunto: gerou emprego nesse período? Esse período do governo do Presidente Fernando Henrique, na década de 90, foi um dos períodos em que tivemos os mais altos índices de desemprego. Nós terminamos, em 2002, o governo de Fernando Henrique com 15% de desemprego no Brasil, com 11% de corrosão na renda salarial.

    Então, essas medidas foram aplicadas. Onde elas geraram emprego? Nós não tínhamos economia eficiente. Nós não tínhamos desenvolvimento econômico. Nós tínhamos aquela visão que era do Fundo Monetário Internacional de que tínhamos que fazer austeridade no orçamento e tínhamos que reduzir direitos da população. Entramos num círculo vicioso. É isso que nós não podemos admitir de novo. E tínhamos 75% de desempregados.

    Então, é falácia dizer que flexibilização vai gerar empregos. Desculpem-me, senhores, não vai gerar. Pode gerar mais lucro para quem está empregando, mas gerar emprego não. Ou, se gerar, vão ser empregos muito frágeis, com pouco salário, e isso não vai fazer bem para a economia do País.

    A outra falácia é que não retira direitos. Ora, por favor, é muito clara a legislação. É só ler o projeto. Retira direitos, sim. Acaba com as horas de deslocamento, que não fazem mais parte da hora remunerada. Dispensa em massa sem negociação coletiva. Há rescisão por acordo com metade do aviso prévio e multa do FGTS. Como não retira direitos? O empregado passa a ser responsável pela higienização do uniforme. As horas extras se tornam raras porque há a flexibilização da jornada. Cria obstáculos para a equiparação salarial.

    Dificulta o acesso à Justiça, porque, em relação ao empregador, ele pode estar na audiência com o seu advogado. Hoje ele não pode ter ausência, mesmo com a presença do advogado. Mesmo que o advogado esteja, ele perde com isso. E o trabalhador pode faltar a duas e comparecer à terceira audiência. Isso vai ficar invertido. Ou seja, o trabalhador que não comparecer na primeira audiência já perde o seu direito e tem que pagar as custas. E o empregador que mandar só o empregado não vai ser considerado ausente da ação. Então, nós estamos invertendo. É claro que retira direitos.

    Nós temos de ter cuidado com isso. Este é um País que garante poucos direitos e proteção às pessoas que mais precisam.

    E aí eu queria fazer algumas outras considerações aqui sobre a questão de judicialização. Ora, senhores, 49% das ações trabalhistas são de verbas rescisórias, hoje, no Brasil. Hoje as rescisórias podem ser feitas no ambiente dos sindicatos ou podem ser feitas no Ministério do Trabalho. O projeto está acabando com isso, porque retira Ministério do Trabalho e retira sindicatos. Então, a tendência é aumentar, em relação às rescisões trabalhistas, a judicialização. Aí o projeto diz assim: "Não pode judicializar". Isso é inconstitucional. Não se pode tirar nada da apreciação do Poder Judiciário. É inconstitucional.

    E não é verdade que é a Justiça trabalhista a que mais tem ações. Acho que o Ministro Barroso tinha que ter levado, no pronunciamento que fez, em consideração os dados do Judiciário brasileiro. Nós temos uma cultura de judicialização no Brasil, uma cultura. Judicializa-se tudo. Então, vamos ver, a Justiça do Trabalho hoje tem um estoque de 4,9 milhões de ações; o Juizado Especial tem um estoque de 7 milhões de ações; a Justiça Federal tem um estoque de 3,5 milhões; e a Justiça estadual, 19,1 milhões. Então, como é que a Justiça do Trabalho é a principal responsável por judicialização? Se é para falar de judicialização no Brasil, vamos falar de judicialização de forma geral. Este é um país com cultura de judicialização. Não podemos colocar isso em cima dos trabalhadores.

    A outra questão é o trabalho intermitente. O trabalho intermitente é uma coisa desastrosa, desculpem-me. Eu sei que o comércio reivindica isso. O senhor é do ramo de farmácia. Aliás, na farmácia, temos já uma situação difícil de trabalho, pois os salários são baixos, existe alta rotatividade, a maioria é composta de mulheres.

    O senhor vai falar depois de mim, mas a média de salários deve ser em torno de R$1,2 mil, R$1,3 mil para o balconista, porque um farmacêutico ganha R$2,9 mil. Pelo menos no oeste do Paraná é assim. Então, eu acho que dar emprego é importante. Agora, querer precarizar ainda mais esse setor? O senhor vem de uma família, o senhor é um dos homens mais ricos do Brasil. Está em 17º lugar na riqueza da Forbes. Por que precisamos fazer com que o trabalhador que está ali trabalhando ganhe menos e tenha mais rotatividade? Nós temos uma diferença de renda imensa neste País. O senhor respondeu por uma ação coletiva em que o Ministério Público do Trabalho o fez indenizar em R$250 mil um acordo, em 2011. Quer dizer, esse projeto que está sendo discutido agora volta a essa situação em que o senhor foi penalizado, ou seja, vai permitir-lhe fazer isso. E nós temos que lembrar que o trabalho intermitente veio para o Brasil...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Acho que um dos primeiros exemplos que nós tivemos foi no McDonald's. Não sei se vocês lembram, mas o pessoal do McDonald's ficava numa salinha esperando e, quando chegava o cliente, ele saía da salinha para atender o cliente. Ele passava a contar as horas trabalhadas aí, quando passava a atender o cliente. Ele tinha que ficar lá esperando. Nós estamos falando em trabalhos precários, que pagam pouco. Nós não estamos falando de trabalhos de altos salários, não estamos falando. Então, nós tínhamos que rever um pouco os nossos conceitos aqui. Talvez teríamos que começar por aqueles cargos que têm altos salários.

    E a questão da negociação coletiva, para eu já ir encerrando, é sempre para melhorar as condições de trabalho, porque a legislação é a base, a legislação é a base que dá direitos ao trabalhador. Você vai para uma negociação coletiva não é para precarizar o direito dos trabalhadores. É para melhorar as condições.

    Então, eu acho...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – ... Srs. Senadores e Srªs Senadoras, que não é uma questão de popularidade ou impopularidade, de voto ou não de voto. É uma questão de solidariedade, de justiça social, de construir um País com visão de desenvolvimento para todos, que possamos ter inclusão. É isso que está em jogo na discussão desta reforma trabalhista e que estará em jogo também na discussão e na votação da reforma previdenciária.

    Muito obrigada, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2017 - Página 40