Discurso durante a 66ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2017 - Página 62
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, DEFESA, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidenta, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, senhores ilustres participantes desta audiência pública, eu entendo que muito do que já foi dito aqui contempla a minha maneira de ver, mas eu queria salientar alguns aspectos que considero importantes.

    O primeiro diz respeito à motivação. Talvez essa não seja a melhor palavra, mas o pretexto que está sendo utilizado para que seja feita essa reforma. E esse pretexto diz que há necessidade de modernização das relações do trabalho e da melhoria da competitividade dos produtos brasileiros, inclusive no mercado internacional, já que a parte da exportação pode ser um dos fatores significativos para que nós possamos sair dessa crise. E, no Brasil, a visão canhestra da nossa elite econômica pensa que a maneira de melhorar essa produtividade, de dar maior combatividade é achatar o componente salário, é promover diversas flexibilizações para que isso dê aos empresários a possibilidade de que produtos que tenham maior competitividade possam ser feitos em maior escala.

    Na verdade, estamos indo na contramão daqueles que efetivamente conseguiram melhorar a sua produtividade, ampliar as suas escalas e ganhar em competitividade.

    Quem quer ganhar em competitividade não arrocha salário, não adota emprego informal para as pessoas, não implementa medidas como essas que estão colocadas. Ele vai investir em tecnologia.

    Nem o Governo, nem o empresariado brasileiro investem. Esse Governo que está aí está retirando recursos dos Ministérios da Ciência e Tecnologia, da Educação e da Saúde, que hoje são fontes importantes para o desenvolvimento tecnológico e inovação no nosso País.

    O outro fator importante é o crédito. Enquanto, nos outros países, as taxas de juros reais não ultrapassam 0,5% ou 1% ao ano, qual a taxa de juros real, aqui, no Brasil, para que os empresários possam buscar recursos para financiar a sua produção e o seu empreendimento?

    E o terceiro é a escala. Hoje, no Brasil, há uma capacidade ociosa da nossa indústria, gerada exatamente pela crise que estamos vivendo hoje e pelo fato de que não existem consumidores no nosso País. Por quê? Porque o Estado não faz investimento público, porque o crédito não é acessível às pessoas. Então, como é que vamos resolver? Vamos tornar o Estado cada vez menor, vamos trazer uma relação selvagem para o mercado de trabalho.

    Isso poderia até funcionar, embora, no mundo inteiro, não tenha funcionado. Não funcionou na Espanha, em Portugal, na Inglaterra, nos Estados Unidos. E aqui não funciona por uma razão simples: vamos lembrar, por exemplo, quanto o Brasil, nos últimos anos, deu exatamente de desoneração, especialmente da folha de pagamento de recursos que eram da Previdência? Mais de 500 bilhões no período de 2008 até 2015.

    Quanto desse recurso foi empregado como investimento nas empresas? Quanto desses recursos foi empregado para passar aquela tempestade do risco do desemprego? Praticamente zero. Tudo entrou como ampliação da taxa de lucro do empresário e foi parar nos bancos, em investimentos financeiros. É essa a verdade do que há no nosso País.

    Então, alguém chegar aqui para dizer que a mudança dessa legislação vai criar mais empregos? Isso é um engodo, é uma mentira. Quem tem um empregado formalizado ou vai terceirizar, ou vai contratar em jornada intermitente, ou vai usar qualquer outro mecanismo desse que está aqui, para o custo do seu serviço, do seu trabalho, da sua produção ser menor.

    Então, não venham querer iludir a população brasileira de que isso está sendo feito para gerar novos empregos, para formalizar empregos informais que existem hoje. Tudo feito de maneira antidemocrática, sem discutir com a população brasileira, com os trabalhadores e com as centrais sindicais, numa lógica que é exatamente a de acabar com a proteção ao trabalhador, conquistada a duras penas ao longo do século passado e ao longo do início deste século também.

    Vejam, por exemplo, a discussão do negociado se sobrepondo à legislação. Primeiro, para o que é que vão servir as leis agora, pelo menos nesse caso da legislação trabalhista? Para que vão servir? A Justiça do Trabalho perde todo o sentido. Se eu posso negociar diretamente com o empregado ou com um grupo de empregados, se eu posso afastar o sindicato da negociação e isso vale mais do que a lei, como é que fica essa situação?

    E, simultaneamente, o Governo procura enfraquecer as representações coletivas dos trabalhadores. Quer dizer, é uma negociação ou entre o indivíduo e o patrão, é uma negociação de total igualdade entre um grupo de indivíduos e o patrão, também igualdade zero, ou, então, é um sindicato fraco que não consegue nem organizar os trabalhadores para fazer aqueles enfrentamentos coletivos.

    Então, essa legislação vem de encomenda, no meu ponto de vista, para ampliar a taxa de lucro dos empresários, retirar direitos dos trabalhadores, retirar obrigações conquistadas a duras penas.

    Veja, por exemplo, o caso do trabalhador que sai de casa para o trabalho. Aquele horário que anteriormente se computava como parte do trabalho – aquilo é o trabalho, é o deslocamento – vai deixar de ser. Então, se ali acontece um acidente, alguma coisa, ele não é considerado um acidente do trabalho.

    Nós poderemos ter a dispensa dos trabalhadores sem negociação coletiva.

    Podemos ter rescisão por acordo com pagamento de metade do aviso prévio e eliminação da multa do FGTS.

    A terceirização sem qualquer tipo de limite. E, aí, no momento, inclusive, em que nós estamos discutindo a reforma da previdência, para aprovar essa legislação, o Governo está fazendo acordo até com o diabo. Está fazendo acordo com os ruralistas para perdoar débitos com a Previdência Social. Veja que coisa engraçada! Quer reformar a Previdência Social, porque está quebrada, mas faz negociação de Refis com a Previdência, com os ruralistas, com vários outros segmentos. O País está com a arrecadação lá embaixo. O Governo está fazendo acordos para isentar de impostos vários e vários setores econômicos do nosso País.

    Portanto, eu entendo que essa reforma não pode ser chamada como tal.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Como disse o ex-Presidente Lula, a reforma é geralmente uma coisa boa, para melhorar. Isso aqui é um desmonte, é uma criação de uma situação de desproteção completa dos trabalhadores do nosso País, sob o argumento, o pretexto de que nós estamos modernizando as relações de trabalho.

    Isso aconteceu no México. Aumentou o emprego ou diminuiu? Melhorou a qualidade do emprego ou piorou? Na Espanha, na Itália, em Portugal, em nenhum desses lugares, esse objetivo foi alcançado, e com elites econômicas que pensam muito diferente dessa elite brasileira escravocrata, canhestra, que só olha o seu umbigo. Essa é a verdade dos fatos.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Então, o que este Senado tem que fazer – e eu aqui também lamento a ausência de muita gente – é rejeitar essa proposta. Não há acordo possível com isso que está aqui. Não há acordo possível com um tipo de trabalho como o do contrato intermitente, que, como disse aqui um dos Ministros do TST, é uma servidão voluntária. Ou seja, eu fico na minha casa, aguardando que me chamem para trabalhar, e recebo um aviso – acho que a proposta é de sete dias de antecedência. Se eu chegar lá e trabalhar uma hora, ganho uma hora; se eu chegar lá e trabalhar duas horas, ganho duas horas. Eu não posso programar a minha vida, eu não sei quanto vou ter no final do mês, eu não posso ter outro trabalho. Minha gente, o que estão fazendo com o nosso País? Um governo que não tem a menor legitimidade...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Vou concluir, Presidenta.

    Não tem a menor legitimidade, é objeto de um golpe parlamentar, não tem o voto do povo. Eu duvido – duvido! – que qualquer candidato a Presidente da República tivesse a coragem de ir a um debate de televisão defender essa droga que está aqui, como disse a nossa Deputada Luiza Erundina. Nenhum deles teria a coragem de ir a um programa de televisão e dizer: "vou fazer isso", "vou fazer aquilo"; "é para modernizar", "vai ser bom para vocês". Não, tem que ser um governo como esse, fruto de um golpe.

    Então, eu espero que este Congresso Nacional, que o Senado Federal lembre duas coisas. Primeiro, no ano que vem haverá eleição. Vários que estão aqui vão disputar a eleição, e podem ter certeza de que, no ano que vem, os trabalhadores já vão estar sentindo...

(Interrupção do som.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fora do microfone.) – ... o efeito disso aqui. E segundo...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Perdoe-me! Desculpe-me!

    A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) – Para concluir, Senador.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Só para concluir mesmo.

    Segundo, lembrem-se do que estão fazendo aqui: estão aqui para tentar melhorar este País, melhorar a vida do povo, e não para tornar esse povo tão escravo quanto o foi em tempos passados.

    Muito obrigado, Presidenta. Desculpe-me por extrapolar o tempo. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2017 - Página 62