Discurso durante a 66ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.

Autor
Regina Sousa (PT - Partido dos Trabalhadores/PI)
Nome completo: Maria Regina Sousa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2017 - Página 75
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, DEFESA, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI.

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado.

    É difícil falar, mas eu tive que me ausentar para dividir, com a Senadora Marta, uma tarefa ali na CAS, em uma audiência pública dos massoterapeutas. Então, eu deixei de ouvir algumas pessoas – pode ser que eu repita alguma coisa – e também não ouvi todas as respostas que foram dadas.

    Mas eu queria começar dizendo assim, que as falas que vêm aqui defendendo deixam sempre escapar: diminuir o custo do trabalho, que é legítimo, e implantar o modelo chinês. Pergunta ao trabalhador da China se ele está feliz com aquela jornada que tem lá. E outras coisas mais.

    Normalmente, os Senadores que falam são empresários – a favor, não é? E quando a gente diz, é porque a gente tem a experiência do que é o patronato brasileiro, salvo algumas exceções, que o representante do varejo aqui falou. Há empresários modernos, mas uma boa parte – ou, talvez, a maioria do empresariado brasileiro – tem uma memória escravista.

    E, quando se fala nisso, eu quero aqui dizer: a Corte Interamericana de Direitos Humanos, pela primeira vez, condenou o Brasil a pagar 5 milhões a trabalhadores escravizados. É uma ação de 98. Agora que foi.... É a primeira vez que a Corte Interamericana se manifesta sobre o trabalho escravo no Brasil.

    Então, não estou inventando nada. O patrão brasileiro tem uma memória escravista. Já disse aqui: 52 mil trabalhadores foram resgatados do trabalho escravo em 20 anos, só os que foram fiscalizados. E os que não foram? Isso aqui foi na Fazenda Brasil Verde, no Pará, uma fazenda de gado, 7 mil bois. Infelizmente, a maioria dos trabalhadores é do meu Estado do Piauí, lá de Barras. Os escravizados vão receber 5 milhões, que, divididos por mais de 100, dá em torno de 40 mil para cada um. Mas isso aqui é a prova contundente disso, do que a gente diz. A gente não confia nessa boa intenção, porque a gente tem a experiência. Eu fui sindicalista e sei o que é negociar.

    Então, aqui se dizer que vai receber hora extra e vai ficar melhor... Eu conheço patrões, cujo trabalhador, na mesa de negociação, não tinha coragem de dizer – tinham que sair com ele –, para o Ministério do Trabalho e para a gente, que o estava representando, que ainda hoje pagam o salário num envelope com dinheiro. E alguns pagavam a hora extra separada num clipezinho. O trabalhador assinava que recebia hora extra, mas dizia: "Passe no escritório." Ele passava no escritório, para deixar aquele dinheirinho que foi separado no clipe. Isso foi dito por trabalhador em audiências. E ainda hoje há patrão que paga com dinheiro assim: finge que paga hora extra, mas não paga. Na hora, ele devolve, porque o lucro é acima de tudo. O lucro está na cabeça como a coisa mais importante do mundo. Infelizmente, é essa a mentalidade que a gente tem.

    Aqui foi dito... A advogada que esteve aqui, cujo nome não me lembro mais, disse que ia citar 15 coisas boas. Não peguei todas, porque também tive que sair. Mas ela falou: respeito às decisões das assembleias.

    A assembleia, dentro da fábrica, dentro da empresa, é assembleia de patrão. Ele bota os trabalhadores no pátio e conversa com eles sobre o que quer conversar; normalmente, nem permite que a gente entre. E olhem que eu trabalhava num setor dito avançado, que era o bancário.

    Mas difícil a gente entrar numa assembleia do Bradesco, por exemplo. Não deixavam os trabalhadores irem a uma assembleia no sindicato. Então, essa é a mentalidade. Vai ser a assembleia dos patrões com os trabalhadores, para dizer o que eles querem.

    Diz também que a rescisão por acordo é uma coisa boa. Ora, uma rescisão de contrato: quem vai deixar o emprego tinha que receber todos os seus direitos, mas, não, o acordo vai permitir que ele não receba todo o FGTS, que não tenha direito a seguro-desemprego.

    Agora, qual é o poder de barganha que tem o trabalhador no contrato individual? Ele tem que ter a representação do sindicato, que é coletiva. O trabalhador não tem coragem de entrar com uma ação contra o patrão; quem entra é o sindicato. Isso, na época dos planos econômicos, a gente viu muito. Eles não tinham coragem de entrar, porque senão era rua no dia seguinte, se tivessem uma ação contra a empresa. Por isso, depois...

    Aí se falou aqui que a Justiça do Trabalho tem 98% dos processos do mundo. É exatamente por essa mentalidade do patrão brasileiro.

    Olhem só, quase 50% das ações trabalhistas são de verba rescisória – 50% –, porque o patrão faz a rescisão e faz errado. E eu sou testemunha, porque fazia rescisão em meu sindicato. Chegava lá no último dia da rescisão, e chegava errado, faltando alguma coisa. A gente devolvia, e ficavam zangados, porque aí iam ter que pagar em dobro algumas coisas. Não faziam corretamente e sempre em prejuízo do trabalhador. Nunca vinha a mais para o trabalhador, sempre vinha a menos.

    Então, 50% são verbas rescisórias. Isso é um absurdo. Aí se tem que sobrecarregar a Justiça do Trabalho mesmo, porque ele só entra depois. Enquanto está empregado, não entra, porque senão vai para a rua. Ele entra na Justiça depois. E por aí vai.

    Olhem só, os cinco primeiros: verba rescisória, 50%; indenização por dano moral, 7%; diferença salarial, 5%; seguro-desemprego, 4%; o terço constitucional das férias – olhem só –, 3% das ações trabalhistas. Como é que não quer uma Justiça...

    Por isso, a fúria contra a Justiça do Trabalho. Eu vi na votação na Câmara... Houve Deputado que chamava de "essa maldita Justiça do Trabalho", porque incomoda. Mas o trabalhador só procura a Justiça depois mesmo que perde o emprego. Não há jeito de ele recorrer antes.

    A questão da pejotização. Como ela vai ser evitada? Não vai. A gente tem no campo o famoso "gato", que vende a mão de obra. Ele enche um ônibus velho de trabalhadores e vai vendê-los para as fazendas. Agora, ele vai ter um CNPJ e vai oficializar a sua profissão de "gato", vendedor de mão de obra, geralmente escrava, porque no campo é onde a escravidão acontece mais.

    Onde é que essa lei olha para o trabalhador para melhorar? Eu não encontrei. Eu queria que alguém me mostrasse qual é o artigo que mostra que vai melhorar. Quanto a gerar empregos – já foi dito aqui –, quem é o benemérito que vai abrir mais postos de trabalho, abrir uma nova fábrica para empregar mais gente, se não há consumo? Quem vai consumir? Vai vender para quem? Então, é uma enganação. Parece que estão achando que a gente é besta.

    Há um artigo aqui sobre acidente de trabalho. É aquela história: vale o texto, mas vale o pretexto também, que está subjacente aqui. Olhem esse art. 75:

Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.

Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.

    Isso aqui já é uma vacina contra as indenizações por acidente de trabalho. "Olha, eu te avisei – você assinou aqui que ia prestar atenção – que essa prensa aqui podia cortar o seu braço. Eu te avisei, e você assinou. Não tenho nada com isso." Como é que a gente vai se conformar com uma lei dessas? Como é que a gente vai achar que essa lei é boa para o trabalhador? Eu quero que entrevistem os trabalhadores deste País. Pode haver exceções, há gente que tem empresa e é responsável – é como eu digo: há sempre exceções –, mas não é a regra. A regra é a exploração o quanto puder. Ao máximo que se puder explorar, exploram-se os trabalhadores, porque o lucro é a palavra-chave do empresário brasileiro. Está escrito na testa. Não adianta negar.

    E a negociação individual é a pior coisa que eu acho. O trabalhador brasileiro...

(Soa a campainha.)

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) – ... não tem condição de negociar individualmente em condições desiguais. É uma condição muito desigual! É aquela história: o patrão entra com a corda, e ele entra com o pescoço. Não há como ele negociar se é subalterno. Já há o complexo de subalterno, que o brasileiro tem; e aí ele sabe que, se falar alto, se engrossar a voz, vai para a rua, porque há uma fila imensa lá fora esperando a sua vaga.

    Então, minha gente, dizer que a gente também devia apresentar proposta de mudança... Como, se a gente não consegue aprovar a prorrogação dos debates? Que se debata mais, que se traga mais gente para debater? Imaginem! É uma luta para a gente conseguir... Já disseram aí que vão votar terça-feira de qualquer jeito na Comissão. Foi dito aqui pelo Líder do Governo: de qualquer jeito, na Comissão de terça-feira, vai ser lido o relatório.

    Então, como a gente vai aqui dizer que vai melhorar essa lei? Só temos mesmo que gritar, espernear e esclarecer ao trabalhador brasileiro. E é o que eu tenho feito.

(Soa a campainha.)

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) – Eu já andei no meu Estado muito esclarecendo o trabalhador sobre o futuro que espera por ele.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2017 - Página 75