Discurso durante a 66ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2017 - Página 89
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, DEFESA, MELHORAMENTO, PROJETO DE LEI.

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores, Sr. Procurador Ângelo, que permanece firme...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – E bravamente, acompanhando e participando.

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – ... e certamente deverá responder a muitos questionamentos nossos.

    Começo com a questão, uma pergunta que eu preciso me responder, mas não tenho os elementos: qual é a chance de um trabalhador que tenha que contribuir ao longo de 25 anos com a Previdência Social, trabalhando de forma intermitente, lograr se aposentar? Porque as duas reformas, a trabalhista prevê a jornada intermitente, o trabalho intermitente, e a previdenciária estabelece o mínimo de 25 anos de contribuição. É preciso calcular.

    Eu tenho a impressão de que o trabalhador que trabalha duas horas num dia, quatro no outro e soma, no final da semana, dez horas de trabalho, doze horas de trabalho, ele não vai conseguir... Pelo menos essa é a impressão de imediato. Não sei, calculando, qual seria a quantidade de horas intermitentes trabalhadas para somar 25 anos de contribuição, para poder se aposentar.

    O debate sobre a reforma trabalhista me remete ao Século XIX, quando, com a Revolução Industrial, a Inglaterra usava mão de obra infantil. Em torno de 15% a 20% dos trabalhadores de fábrica eram crianças de seis anos em diante, e a jornada de trabalho era de 16 horas. Alguns movimentos buscaram legislar para eliminar o trabalho infantil nas fábricas. E, na época, os capitalistas achavam que o Estado não deveria se meter na produção e, muito menos, romper acordos entre as partes. As partes eram crianças de seis anos em diante. O Estado não deveria se envolver nas questões da produção e do trabalho.

    Fico imaginando a iniciativa privada sem o direito à propriedade. Se de um lado se precariza ou se elimina... Porque, quando se propõe o negociado valer sobre o legislado, você elimina a possibilidade de proteção do trabalho. Esse é o meu entendimento. Pode até ser que eu esteja equivocado, mas a proposta é exatamente esta: eliminar a proteção do trabalho.

    Isso poderia até ser aceitável, na medida em que também se retirasse a proteção à propriedade privada. Acho que o mercado não sobreviveria se fossem retiradas as leis que protegem a propriedade privada e também a infraestrutura, porque são condições do mercado. O mercado exige, para produzir, o capital, a mão de obra, a terra, a infraestrutura e a proteção legal. Sem isso, desapareceria o mercado. O mercado não é autônomo, não vive por si só. Ele depende do Estado. É uma falácia dizer que o mercado não depende do Estado. Ele depende, sim, porque depende das leis que protegem a propriedade privada e também da infraestrutura que permite ao mercado se desenvolver.

    Nesse debate que nós estamos travando hoje há algumas semelhanças com o debate do Século XIX, porque se busca exatamente eliminar a legislação que protege o trabalho. É evidente que se uma reforma...

    Aliás, a palavra reforma é muito mal aplicada, porque reforma tem conotação de melhoria. E o que está sendo proposto pelo Governo realmente cria uma instabilidade, precariza de uma forma terrível as relações de trabalho com impacto direto no trabalhador. Então, é uma reforma pensada do ponto de vista dos empresários, daqueles que são detentores da propriedade privada. Daí que se nós propuséssemos eliminar a legislação que protege a propriedade privada certamente seria inaceitável. Da mesma forma é inaceitável eliminar o arcabouço legal que protege o trabalho. E tem mais: se essa reforma passar, nós vamos ter mais desemprego. É óbvio. Com a terceirização sancionada pelo Presidente, aprovada pela Câmara dos Deputados, muitas empresas estão terceirizando as suas linhas de produção. Essa terceirização, evidentemente, é para reduzir custos com a mão de obra. Num País como o nosso, com 14 milhões de desempregos, não faz nenhum sentido promover uma reforma trabalhista neste momento e precarizar as relações de trabalho.

    Eu trabalhei no Canadá e eu mudava de emprego à medida que me ofereciam alguns centavos a mais por hora trabalhada. Só que lá a carência de trabalhador é enorme. Então, eu podia escolher, diferentemente daqui. Aqui, na medida em que você estabelece essa autonomia total nas relações entre patrão e empregado, o lado que vai sucumbir nessa relação é o lado do empregado, porque ele vende a sua força de trabalho. Se ele não conseguir vender por 2x, vai vender pela metade, porque, se ele não conseguir vender a força de trabalho dele, vai passar fome. Esta que é a realidade dessa relação, dessa ideia de um contrato totalmente livre entre empregador e empregado: o empregado precisa vender a sua força de trabalho, e a oferta que lhe chegar ele vai aceitar. Essa que é a realidade. E, uma vez ganhando menos, o consumo é menor, e isso tem impacto na economia, no consumo. Evidentemente nós vamos aprofundar a crise.

    Eu acompanhei os fatos aqui nesta Casa o ano passado, numa época dessas, alertando permanentemente dos danos que poderiam ocorrer caso a democracia brasileira fosse atingida com um processo de impeachment. E um processo que se mostrou absolutamente forjado. Não havia nada que pudesse incriminar a ex-Presidente. Eu posso falar aqui com absoluta liberdade, porque não apoiei o governo anterior, assim como não apoio este. Acho que estamos distantes de construir, no processo democrático, governos que tenham profunda identidade com as aspirações da sociedade brasileira, ainda estamos distantes. Ainda temos uma mobilização política reduzida na sociedade brasileira, o que não nos permite as melhores escolhas para uma condução que possa melhorar a condição e a qualidade de vida do conjunto da sociedade brasileira.

(Soa a campainha.)

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – No entanto, vejo que este Governo, resultado de uma conspiração da elite política, que foi politicamente incapaz de dar uma condução melhor ao País, aprofundou a crise política, que perdura até hoje. Hoje o problema do País não é a Previdência, não é a relação de trabalho, é político. O Brasil vive uma crise profunda e este Congresso está mergulhado na crise, assim como o Governo que aí está não foi escolhido pelo voto, portanto, não é legítimo para promover essa mudança profunda que precariza as condições da sociedade brasileira. Não tem essas condições porque não está legitimado pelo voto, foi imposto à Nação.

    Então, vejam, para desviar a atenção da crise política, veio uma enxurrada de medidas provisórias, de propostas do Governo que muda completamente o arcabouço jurídico do País. Não é só Reforma da Previdência. Não é só Reforma Trabalhista. Está mudando a legislação agrária completamente, que vai abrir as possibilidades para ampliar a grilagem de terra, a comercialização de terras para estrangeiros. Enfim, é uma mudança total no País sem que o Governo tivesse sido eleito para isso. Nenhum governo se elegeria com essa plataforma, com essas propostas de reforma que o Governo está mandando para cá.

    E o Congresso não faz outra coisa que cumprir a agenda desse Governo, o que é profundamente lamentável. Aqui nós temos projetos de lei, propostas interessantes que melhoram a vida na sociedade brasileira, mas eles não andam, porque quem manda aqui...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – ...é um governo que foi imposto a essa sociedade e que não tem qualquer afinidade com a opinião pública. Inclusive se arvora – acha isso uma virtude – em não ter necessitado do voto. Só que aqui, nós todos que estamos aqui somos consequência das escolhas da sociedade e do voto da sociedade. Portanto, eu alerto os meus pares aqui no Senado para essa decisão sobre a reforma trabalhista. Essa é uma decisão extremamente complexa e de uma gravidade enorme para o futuro do nosso País.

    E volto a insistir: do mesmo jeito que eu alertava para o aprofundamento da crise política no ano passado, eu alerto para o aprofundamento da crise econômica. Não há saída precarizando o trabalho, pagando menos salários; ao contrário, há uma recessão. Portanto, nós temos que trabalhar aqui no Senado para modificar completamente – e aí, num momento de crise, Presidente Jorge Viana, num momento de crise, com 14 milhões de desempregados, nós tínhamos que fazer exatamente o contrário: em vez de ampliar a jornada de trabalho, nós teríamos que reduzir a jornada de trabalho.

    E é isso que eu estou propondo numa emenda: que a gente possa reduzir a jornada de 40 horas para 36 horas, para poder se ofertar mais emprego. E a tecnologia tem um impacto muito grande hoje na produção. A produtividade do trabalho cresceu enormemente em função da tecnologia, portanto, não há mais necessidade de o trabalhador passar 40 horas. Vamos reduzir para 36 horas e aí nós vamos ter muito mais empregos para pelo menos atenuar este momento de extrema gravidade que nós estamos vivendo.

    Era isso, Sr. Presidente. Obrigado.

(Soa a campainha.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2017 - Página 89