Discurso durante a 93ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Crítica a Deputado Federal por ingerência indevida na FUNAI e defesa do Sr. Antônio Fernandes Costa, ex-Presidente do órgão.

Crítica à proposta de reforma trabalhista.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Crítica a Deputado Federal por ingerência indevida na FUNAI e defesa do Sr. Antônio Fernandes Costa, ex-Presidente do órgão.
TRABALHO:
  • Crítica à proposta de reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 27/06/2017 - Página 7
Assuntos
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, DEPUTADO FEDERAL, MOTIVO, ILEGITIMIDADE, INFLUENCIA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DEFESA, EX PRESIDENTE, ORGÃO.
  • CRITICA, PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, ASSUNTO, REFORMA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, REGISTRO, VOTO EM SEPARADO.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senadores e Senadoras, eu venho à tribuna no dia de hoje – e não podia ser diferente –, porque esta semana é uma semana especial. Especial, mas que leva a nós todos um sentimento de tristeza e indignação com tudo que vem acontecendo no nosso País.

    Hoje pela manhã mesmo, o ex-Presidente da Funai, Sr. Presidente, fez denúncias gravíssimas. O Sr. Antônio Fernandes Costa, ex-Presidente da Fundação Nacional do Índio, disse que só foi afastado, porque um Deputado disse que a Funai era dele e que ele entendia que os 20 coordenadores regionais deveriam ser indicação dele.

    E aí ele dizia: "Mas esse cara não entende nada de índio, de povos originários, como é que eu vou demitir os profissionais e vou indicá-lo?" E ele disse para ele: "Ou você o demite, ou eu demito você também." Foi exatamente o que ele fez.

    Quer dizer que a política da negociata, do dando que se recebe não tem mais limite. As denúncias que ele fez hoje na Comissão de Direitos Humanos – e quero cumprimentá-lo pela coragem e pela firmeza, o Sr. Antônio Fernandes Costa – são da maior gravidade, da forma como o Governo Temer está destruindo praticamente aquelas áreas onde é fundamental a responsabilidade com o social.

    Pretendo aprofundar mais esse debate num outro momento e quero, Sr. Presidente, neste momento... Mas há isto aqui, que é muito importante também, que me foi lá entregue pelo Vitor Laércio, em que ele mostra inclusive que, na Comunidade Europeia, já se fala em barreiras humanitárias.

    Como o Brasil perdeu toda a responsabilidade social, todo o lado humano do debate e das causas, há um movimento na Europa de criar barreiras humanitárias em relação ao Brasil tanto no agronegócio, como também na área da indústria, porque, se o Brasil caminhar para esse lado de desumanizar o tratamento com o seu povo, isso não pode continuar.

    Veja o que fez a Noruega. A Noruega, porque o Brasil também se joga a um precipício em relação ao meio ambiente, mandou cortar 50% daquilo que investia no Brasil em matéria – foi o primeiro sinal – de meio ambiente. É nessa situação, Sr. Presidente.

    Veja o Fundo de Garantia, a última agora. Eles diziam que o Fundo de Garantia ia para a mão do trabalhador. Agora, ele não vai mais! Estão confiscando o Fundo de Garantia e vão usar o Fundo de Garantia para pagar o seguro-desemprego.

    Seguro-desemprego é uma coisa. Fui um dos autores. Lembro-me de que foi uma fusão do projeto do Senador Serra – tem que ser dito, foi quem encabeçou –, meu e do Senador Jorge Wecker. Criamos o seguro-desemprego. Ele não tem nada a ver com o Fundo de Garantia.

    Agora, o Governo inventou que, para pagar o seguro-desemprego, ele vai confiscar o Fundo de Garantia do trabalhador. Não recebe mais, se for pela proposta que está sendo vendida aí à população.

    Então, é tanta manipulação, Sr. Presidente – tanta manipulação! –, que eu resolvi, no dia de hoje, aprofundar o debate sobre a mentira, sobre a desonestidade, sobre a fala fácil e enganosa, a compra de voto vergonhosa. Este Senado não pode, Sr. Presidente, encolher-se, o Senado não pode, vendo que o projeto tem, no mínimo, no mínimo, no mínimo, 200 mudanças, porque são 117 artigos, mas, entre artigos e parágrafos, são 200 mudanças.

    Como é que o Senado vai dizer: "Olhe, é ruim mesmo. É perverso. É desonesto. É quase podre o projeto"? E como é que o Senado vai votar e vai dizer que o Presidente que estiver lá depois veta ou não o que ele achar; um Presidente que está sendo denunciado – vai ser denunciado amanhã pelo Janot, não é? – e vem pra cá o afastamento dele. Vai ser votado. O próprio Presidente da Câmara disse que ia votar rapidamente isso. E é nesse clima que vamos votar as reformas?

    Por isso, Sr. Presidente, tenho o meu voto já em separado. Tive o apoio – quero registrar aqui mais uma vez – da ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho), da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho), da Abrat (Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas), da Jutra (Associação Luso-brasileira de Juristas do Trabalho), da Associação Latino-americana de Advogados Laboralistas e do Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho).

    E aqui, Sr. Presidente, eles provam o quanto esse projeto, além de perverso, vai na linha de dizer que ele é desumano, o quanto ele é inconstitucional em diversos artigos. Ele fere a Constituição cidadã, liderada por Ulysses Guimarães, por Covas, por Lula, por Nelson Jobim, por Fernando Henrique Cardoso, por Ulysses Guimarães – claro, eu já falei, e principalmente. Ele rasga artigos da própria CLT. Nós vamos provar isto amanhã, inclusive com os juristas que estarão lá. Nós vamos provar que o projeto, além disso tudo, de acabar com os direitos sociais, rasga também a Constituição.

    Mas eu vou desenvolver um raciocínio, Sr. Presidente, que amanhã não vou poder desenvolver lá.

    Sr. Presidente, quero aqui fazer uma referência ao cientista, astrônomo e escritor Carl Sagan.

    Ele era mestre em explicar as complexidades do mundo. Há mais de 20 anos ele assinou O Mundo Assombrado pelos Demônios: a Ciência Vista como uma Vela no Escuro.

    Nessa obra, ele tratou sobre as inverdades que a sociedade é capaz de criar. Inverdades para não dizer mentiras vindas do Governo Temer. Há um capítulo com o título "A arte refinada de detectar mentiras", onde ele faz uma reflexão sobre os vários tipos de fraude a que somos suscetíveis, desde questões religiosas, científicas e fanatismos de todos os pensamentos.

    Carl Sagan demonstra que muitos pseudopersonagens revelam menosprezo pela inteligência das pessoas. É o que o Governo está fazendo.

    Eu aprendi na lógica da vida a nunca atacar todos os meus inimigos ao mesmo tempo. Esse governo usa essa tática ao contrário. Ele ataca o povo brasileiro, ataca o Congresso, ataca o Judiciário e ainda acha que vai se dar bem. Ele está expondo o Congresso. Ele quer que o Congresso concorde com os absurdos, porque eles inventaram da cabeça deles que o Congresso não pode mexer uma linha num projeto que teve 200 mudanças, como essa reforma – 117 só de artigos.

    Eles criam uma corrupção insidiosa das atitudes populares a respeito da objetividade científica. Eles se calcam na corrupção, mentem à população e querem que a população, como idiota, aceite que eles estão certos.

    A pesquisa última mostra que 96,5% da população é contra a reforma da previdência assim como é contra a reforma trabalhista. Mas vamos em frente, Sr. Presidente, porque é interessante esse raciocínio.

    Carl Sagan criou um kit de detecção de mentiras, um conjunto de ferramentas cognitivas e técnicas para fortalecer a mente contra os vários tipos de distorções e mentiras – reforma trabalhista e da previdência, e a própria CPI da Previdência também está ajudando a mostrar as mentiras.

    Entre os pontos que Carl Sagan ensina, estão quatro aqui que eu gostaria de citar, para que todos reflitam. Vejamos:

Devemos estimular um debate substantivo sobre as evidências, do qual participarão notórios partidários de todos os pontos de vista.

[...]

Devemos considerar mais de uma hipótese. Se alguma coisa deve ser explicada, é preciso pensar em todas as maneiras diferentes pelas quais poderia ser explicada.

[...]

Devemos nos perguntar por que a ideia nos agrada. Devemos compará-la imparcialmente com as alternativas. Devemos verificar se é possível encontrar razões para rejeitá-la. [...]

Devemos quantificar. Se o que estiver sendo explicado é passível de medição, de ser relacionado a alguma quantidade numérica, seremos muito mais capazes de [...] [chegarmos a uma conclusão e, a partir desse raciocínio de quatro pontos, verificar quem está mentindo].

    Aqui, claro, é o Governo que está mentindo, e a população, que não é boba, já percebeu isso.

    Observem bem que – abro aspas – "esse processo não é apenas uma ferramenta científica. Ele pode ser trazido para o dia a dia das pessoas e nos proteger contra truques e manipulações".

    Por exemplo, pegam o dinheiro da população e pagam propaganda na grande mídia para dizer inverdades. É manipulação vergonhosa, e a população vem percebendo: "Mas quem está pagando essa propaganda aí que quer acabar com os direitos dos trabalhadores e quer acabar com a Previdência?" É o Governo. É o Governo que está aí.

    Observem bem que ele pode ser trazido para a política, como está sendo trazido, para o Parlamento, para os discursos dos governos, para as políticas públicas que são apresentadas. É uma questão de você perceber o que se passa à sua volta, a vida do seu país, o que as pessoas esperam de seus governantes.

    Observem bem, senhores e senhoras, que a grande virtude que esse cientista, CarI Sagan, nos lega é que, no senso comum, na grande maioria, se encontram muitas e muitas armadilhas que só têm como sanha maior a ganância pelo poder.

    É isso. Ele deixa claro isso. O que está por trás de toda essa engenharia é a ganância, a avareza, para ficar cada vez mais bilionário um certo setor da sociedade, e o poder de alguns.

    Abro aspas: "Além de nos ensinar o que fazer na hora de avaliar uma [...] [informação, ele] nos ajuda a reconhecer as falácias mais comuns e mais perigosas da lógica e da retórica", fecho aspas.

    O que estou a refletir aqui, Sr. Presidente é que a reforma trabalhista e a reforma da previdência apresentadas pelo Governo Federal – a trabalhista a partir do PLC 38 – são uma grande farsa, uma grande falácia. Elas não são produtos para o desenvolvimento e crescimento do País e muito menos para gerar emprego. Como é que se tira o direito do trabalhador? Você tira o direito dele se você diminui o poder de compra dele. Metendo a mão no bolso dele, como é que ele vai comprar se o bolso dele está vazio? Se ele não compra, o comércio não vende. Se o comércio não vende, a empresa, por sua vez, que abastece o comércio não tem onde colocar o produto, porque está todo encalhado lá. Consequentemente, começa a demitir lá na ponta, ou seja, dentro da indústria.

    Eu diria que, pelo contrário, a reforma trabalhista do Governo Temer ataca a vida e os sonhos de milhões de brasileiros. As duas reformas atacam diretamente – e foram especialistas que me colocaram isso na CPI da Previdência – mais de 100 milhões de brasileiros (de forma direta); e indiretamente, eu diria, quase que outros 100 milhões.

    Tendo como base e ensinamentos – abro aspas – "a arte refinada de detectar mentiras" que pude estudar no final de semana, Sr. Presidente, quero que sejam registrados nos Anais desta Casa documentos tantos que recebi que vão nessa linha, que mostram que o projeto é totalmente inconstitucional, que fere a Constituição que eu ajudei a escrever entre 1987/1988, tanto no campo da previdência como também no da reforma trabalhista. Mas aqui o debate é da reforma trabalhista, porque a da previdência acho que nem passa na Câmara, não vai chegar aqui. Mas a trabalhista está aqui, teremos duas audiências públicas amanhã e teremos na quarta outra votação.

    Quero dizer que o texto que me deu subsídios para o meu voto em separado é assinado pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), pela Associação Nacional dos Magistrados – dos Juízes – da Justiça do Trabalho (Anamatra) e também pela Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat).

    Portanto, vamos às mentiras detectadas por essas entidades, que aqui eu citei, sobre a reforma trabalhista e à vergonha que está sendo este Governo, que quer vender a imagem ao País, à Nação, de que se fizer a reforma da previdência e a reforma trabalhista estará tudo resolvido. Não está resolvido coisíssima nenhuma.

    Por isso, Sr. Presidente, eu quero deixar aqui já, porque este é o meu relatório, com o apoio de todas as entidades que citei – no fim, são mais de oito entidades –, e que eu vou ler amanhã, pacientemente. Quem estiver com pressa não vá lá porque eu vou ler e vou mostrar que é totalmente inconstitucional, vou mostrar que no mérito também é. O Relator do Governo falou de mérito e falou também se é constitucional, e eu vou desmistificar, de uma vez por todas, todas as mentiras que estão colocadas naquele relatório.

    Dizer para mim que o trabalhador, em vez de receber mensalmente (pela CLT), vai receber um salariozinho por hora que vai dar menos que o salário mínimo é melhor? Então, abra mão aqui o Relator. Abra mão do seu salário e vá para lá para receber o salário por hora. Se vale para o trabalhador, vai valer, também, aqui dentro.

    Olhe, está vazio aqui. Há nós quatro aqui. Está vazio. Calcule, o assalariado brasileiro, se fosse a situação dele esta aqui: hoje já não receberia nada, e todo mundo vai receber.

    Mas não estou nem entrando no mérito. Cada um tem as suas agendas – falava, na última sexta-feira, quando aqui falei – e terão as suas agendas também na próxima quinta-feira ou sexta-feira.

    Mas e o trabalhador? E digo mais: se eles o convocarem, dizendo "Vou lhe dar três horas", e ele concordar e por um motivo não for, vai ter que pagar uma hora e meia para o empregador. Está aqui nesse projetinho – projetinho vagabundo, sem-vergonha, desonesto, coisa de corrupto mesmo, senão não tinha apresentado.

    Aqui dentro, Sr. Presidente... Por que eu digo que é corrupto? Porque alguém financiou esse relatório. Esse relatório é só contra os trabalhadores brasileiros. E ninguém financia de graça um relatório. Houve jogo no meio disso. Nós sabemos que infelizmente é assim. Está aqui o relatório que foi construído pelos 5% mais ricos deste País.

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – E nós vamos desmontando ponto por ponto.

    Calcule o senhor... Está aqui nesse relatório – são 200 mudanças – que mulher grávida pode trabalhar em área insalubre. Digam-me, na história do Planeta, se há um único país que bota na lei que mulher grávida pode trabalhar em área insalubre; digam-me um único país do mundo que manda que o trabalhador fique 12 horas, sabendo que a fadiga, o acidente, a morte no trabalho ali vai estar ao lado dele; digam-me um país do mundo em que o horário do almoço passa a ser de 30 minutos. Quem consegue sair da linha de produção...? Eu trabalhei em forja, fundição, enfim, trabalhei lá nas fábricas, durante longo período da minha vida. Sempre dou o exemplo e repito: saia da linha de produção, vá lavar as mãos, vá ali e bata o ponto – porque se tem que bater o ponto –, saia correndo, pegue o bandejão, vá para a...

(Interrupção do som.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... depois almoce – e depois tem que entregar tudo lá no refeitório –, entregue lá o bandejão, saia, saia correndo de novo, vá lavar as mãos, bata o cartão de novo, depois vá para a linha de produção. Quero ver quem faz isso em alguns minutos! Qualquer um de nós que saia para almoçar leva uma hora e meia, duas horas – no mínimo, duas horas. E querem que o trabalhador faça em 30 minutos.

    Eles admitem que... Propostas estou dando algumas aqui. São absurdas: "Não, mas vamos votar como está, e quem estiver de plantão lá na Presidência, porque não sabemos quem vai ser o Presidente, vai vetar ou não".

    Eu diria que o Senado está na seguinte situação: está entre Judas e Pôncio Pilatos – Judas, porque está traindo o povo; Pôncio Pilatos, porque está lavando as mãos, como Pôncio Pilatos fez, e Cristo foi crucificado.

    Ele está na crucificação do povo...

(Interrupção do som.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Sr. Presidente, último minuto.

    Ele perde a razão de existir. Para que haver o Senado, então? A Casa revisora? É a Casa que está aqui para dizer se é constitucional ou não é? Vamos ter esse debate.

    Esses pontos – destaquei aqui alguns, mas poderia falar de 20, 30, 40, 50...

    O tempo terminou e, naturalmente, V. Exª está coberto de razão. Eu estou indo agora, lá, para presidir a CPI da Previdência; são 14h30, e os convidados já estão lá.

    Mas o Senado não pode fazer de conta que não viu o que está aqui. Com que coragem quem fizer isso vai olhar para filho, para neto, para os vizinhos, para os amigos, sabendo que foi ele o que praticamente revogou a Lei Áurea e disse "Volte a escravidão para todos, negros, brancos, índios, ciganos, enfim, independentemente da origem, religião ou procedência"?

    Presidente, obrigado pela tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/06/2017 - Página 7