Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a necessidade de se construir harmonia entre os Três Poderes com o fim de promover o progresso do Brasil.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Comentários sobre a necessidade de se construir harmonia entre os Três Poderes com o fim de promover o progresso do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 03/08/2017 - Página 31
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, HARMONIA (RS), PODERES CONSTITUCIONAIS, DEFESA, DIALOGO, PARTICIPAÇÃO, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, JUDICIARIO, RESPEITO, ESTADO DEMOCRATICO, OBJETIVO, PROGRESSO, BRASIL.

    O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidente, Senadora Vanessa Grazziotin, Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, minhas senhoras e meus senhores, quero registrar que está aqui, no plenário do Senado, o ex-Senador Expedito Júnior, que nos visita nesta tarde. Seja bem-vindo, Senador Expedito.

    Srª Presidente, quero falar aqui, nesta tarde, sobre a harmonia dos Poderes.

    Marco Túlio Cícero foi um Senador romano que viveu no século I antes de Cristo. Ele é considerado por muitos o maior orador de todos os tempos. Seus textos e suas ideias sobreviveram aos milênios e formaram a base para o florescimento das ideias políticas do Renascimento a partir do século XIV.

    Cícero era um ferrenho defensor do sistema de governo da República Romana. Os Senadores, a assembleia popular e os cônsules constituíam centros de poder distintos e independentes. Esses centros de poder se equilibravam conforme um sistema de freios e contrapesos, que impediam a preponderância de uns sobre os outros. Segundo Cícero, qualquer ameaça ao sistema de freios e contrapesos poderia fazer com que o governo, segundo suas próprias palavras, fosse "jogado de um lado para o outro, como uma bola".

    Infelizmente, Cícero tinha razão. A ambição desmedida de alguns cidadãos deu início a um processo de desequilíbrio, que culminou com o esfacelamento da república. Cícero foi assassinado. Ditaduras revezaram-se no poder. E o governo, como Cícero sabiamente havia previsto, acabou sendo "jogado de um lado para o outro, como uma bola", para desespero dos cidadãos romanos.

    Muitos anos mais tarde, no século XVIII, Montesquieu, filósofo e político francês, aprofundou a concepção ciceroniana sobre a divisão do poder e concluiu, após análise minuciosa de todas as formas de governo do presente e do passado, abro aspas, "a deterioração de um governo quase sempre começa pela decadência de seus princípios".

    Segundo Montesquieu, o princípio mais fundamental da organização de qualquer governo era a separação dos Poderes. O poder conferido ao governo precisava ser fatiado de forma equilibrada para que a influência de qualquer deles não se sobrepusesse a dos outros. A chamada trias politica, para usar um termo caro a estudiosos do tema, deveria ser composta por três Poderes independentes e harmônicos entre si – independentes e harmônicos, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores –: Executivo, Legislativo e Judiciário.

    Esse formato de divisão equilibrada e harmônica entre poderes é tão valioso nos dias de hoje quanto era nos tempos de Montesquieu. Seus fundamentos se baseiam na observação do comportamento político real dos seres humanos.

    Ao longo da nossa de nossa história, uma série de experiências políticas desastrosas resultantes da fome de poder por parte de um grupo ou de outro infligiram injustiça, fome, doença, miséria, sofrimento e morte a milhões e milhões de pessoas.

    A separação e a harmonia entre os Poderes da República, baseada no sistema de freios e contrapesos, constituem o alicerce político de todas as democracias modernas bem-sucedidas mundo afora. O engenho humano ainda não descobriu sistema mais eficiente e seguro do que esse.

    Trazendo essa discussão para mais perto de nossa realidade, é interessante analisar alguns resultados recentes de avaliações de governança feitas pelo Banco Mundial. Ao longo dos últimos anos, o Brasil perdeu pontos valiosos em uma série de indicadores de governança, como efetividade do governo, qualidade regulatória, controle de corrupção e estabilidade política. É como se nossa democracia, a democracia brasileira, estivesse dando sinais de cansaço, de esgotamento, de fracasso, de fadiga.

    Nossa situação atual, sem dúvida, é difícil, e alguns podem até defender a ideia de que é preciso tomar medidas drásticas, quebrar paradigmas, vergar as leis segundo as necessidades do momento e da hora.

    Eu penso diferente, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Eu concordo com Montesquieu. Eu concordo com Cícero. Em momentos como este, é essencial que permaneçamos fiéis aos princípios republicanos e democráticos mais básicos. É preciso que cada um dos Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – desempenhem seu papel constitucional com equilíbrio, isenção e respeito às leis. É preciso que cada um dos membros de cada Poder – Deputados, Senadores, Ministros de Estado, o Chefe do Poder Executivo, Juízes, Promotores e Procuradores – se comportem dentro de seus respectivos limites de atuação legal.

    Não se pode perder a perspectiva do conjunto, do Estado, da Nação, do bem comum da sociedade e do povo brasileiro. Esta não é a hora de invadir competências, de buscar privilégios para si e para seus pares, sob qualquer pretexto. Não é hora de forçar as vigas que sustentam o delicado equilíbrio entre os poderes. Não é hora de atropelar as leis e a Constituição em nome do que quer que seja. Não é hora e nunca será a hora de pôr em risco as conquistas democráticas e republicanas que, a muito custo, o Brasil conseguiu alcançar.

    Srª Presidente, encerro este pronunciamento, dizendo mais uma vez, porque já falei muitas vezes da tribuna deste Senado Federal que há de haver equilíbrio entre os poderes. A nossa Constituição Federal já diz que os poderes têm de ser independentes, porém harmônicos. Temos que ter harmonia, e o que não está havendo nos últimos tempos é harmonia. Não é só aqui na República. Até nas câmaras de vereadores, nos Executivos municipais, tenho aconselhado muito – já fui vereador, prefeito e governador – câmaras de vereadores, tenho aconselhado o Executivo lá do meu Estado para que trabalhe em harmonia.

    Quando os poderes brigam, quando os poderes se desentendem, quem sofre é a sociedade. Falei muitas vezes ainda para a Presidente Dilma, assim como falei para o Presidente Temer: reúna os poderes. Será que é crime um Presidente da República se sentar com o presidente de outro poder ou mesmo num jantar? Quando eu era Governador do Estado, convidava desembargadores, convidava juízes, convidava procuradores, convidava conselheiros do Tribunal de Contas para jantar na minha casa. Será que é crime os poderes se sentarem na mesma mesa? Agora, não pode. Parece que é crime nesta Nação, neste País, o chefe de um poder conversar com o chefe de outro poder. Por que, se a Constituição Federal diz que os poderes têm de ser independentes, porém harmônicos? Têm que ser amigos, têm que ser harmônicos, e é o que está faltando no nosso País. Repito: quando não há harmonia, quando os poderes brigam, quem paga é a sociedade, quem paga é o povo.

    Muito obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/08/2017 - Página 31