Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a necessidade de assumir que a atual crise política foi resultado das ações da ex-Presidente Dilma Rousseff ao colocar Michel Temer como Vice-Presidente em sua chapa eleitoral.

Autor
Cristovam Buarque (CIDADANIA - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comentários sobre a necessidade de assumir que a atual crise política foi resultado das ações da ex-Presidente Dilma Rousseff ao colocar Michel Temer como Vice-Presidente em sua chapa eleitoral.
Publicação
Publicação no DSF de 03/08/2017 - Página 46
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, CRISE, POLITICA NACIONAL, LIGAÇÃO, DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, INVESTIGAÇÃO, ADMISSÃO, DENUNCIA, CAMARA DOS DEPUTADOS, APOIO, APROVAÇÃO.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srs. Senadores, Srªs Senadoras, eu vim aqui, Senador Cássio, falar sobre uma tentativa que me preocupa muito, que é de desfazer a Unila, uma universidade latino-americana que funciona em Foz do Iguaçu. Considero um grande equívoco se nós, por uma proposta do Deputado Sérgio Souza, que colocou uma emenda em uma medida provisória, votarmos para desfazer essa universidade ou descaracterizá-la, fazendo-a uma universidade igual às outras, como qualquer federal – um equívoco. É jogar fora um bom investimento, que veio do governo Lula e que está aí levando a nossa formação para os estudantes de outros países latino-americanos.

    Mas, Senador Cássio, depois de ouvir o discurso, eu acho que não posso ficar preso apenas ao assunto da Unila, que ainda vai demorar muito. Eu quero falar é sobre a maneira como muitos no Brasil estão jogando toda a responsabilidade dessa crise nos outros. Eu quero assumir, como Senador, parte da responsabilidade que nós temos sobre essa crise brasileira. Eu acho que às vezes parece até uma certa hipocrisia chegar aqui e dizer que a culpa é do Presidente que aí está há pouco mais de um ano ou até menos de um ano, o Presidente que era Vice-Presidente dos que agora o criticam. Eu não vou defendê-lo. Não votei nele. Mas não dá para dizer que a culpa é inteira deste Presidente que está aí. Nós temos uma responsabilidade, ou por ações, ou por omissões, ou por incompetência.

    Eu próprio tentei evitar isso. Tentei repetidamente, desde o comecinho do segundo mandato da Presidente Dilma. O Senador Randolfe, que aqui está, é testemunha, porque participou desse esforço que fiz de reorientarmos o governo dela, já que estava eleita, tinha mandato, e para o Brasil não era o melhor a interrupção do mandato. Eu tentei. Tentei aqui nesta Casa alertando que a economia caminhava para um desastre. Esse foi um texto que hoje muitos até comentam, Senador Cássio, que é um texto meu que dizia "a economia está bem, mas não vai bem". Senador Cássio, esse documento é de 2011 – 2011! Quinze itens estavam listados e que levariam o Brasil à crise que terminou acontecendo. Eu tentei. Fui ridicularizado. Disseram que ere coisa de cassandra, que era coisa de quem era pessimista, que o Brasil estava às mil maravilhas. Era óbvio para quem estudasse. Tentei. Eu tentei quando fiz uma audiência sobre as pedaladas. Dois anos antes desse tema aparecer, Senador, eu fiz uma audiência aqui no Senado. Chamamos de crime o que estava acontecendo, com especialistas que vieram de fora. Eu tentei! Podia se ter percebido, despertado, Senador Lindbergh, para aqueles problemas. Eu tentei, mas não jogo a culpa nos outros. Eu faço parte da liderança brasileira e, portanto, eu sou também corresponsável.

    Eu tentei, quando eu e mais seis Senadores fomos à Presidente Dilma. Levamos a ela que, diante dela – isso foi em agosto de 2015, quando ainda não havia essa ideia explícita de impeachment, era uma fala de alguns votos –, diante de nós, no Brasil, tínhamos três alternativas, todas negativas: o impeachment – está escrito, há uma carta que deixamos com ela –; a cassação, que já tinha o processo, e a continuação do governo daquela forma. E dissemos: Presidente, o ideal é a senhora continuar Presidente até o fim do seu mandato – agora, refazermos o seu governo.

    Lembro que não está escrito, mas eu disse: a senhora precisa ser a Itamar da senhora própria. Aliás, o Temer deveria ter escutado isso também. O Temer deveria ter colocado na sala dele um retrato do Itamar, para servir de exemplo de como é você adquirir legitimidade saindo de Vice para Presidente, compondo, dialogando.

    Saímos do gabinete da Presidente com a sensação de que faríamos um almoço, um jantar, Senadora Rose, com 15 Senadores, inclusive do PSDB e Democratas – 15. Acertamos até que seria na casa do Senador Blairo. A partir daí, não se falou mais nisso. Eu creio que o Randolfe estava nesse encontro com a Presidente em agosto, está certo? E assinou a carta, eu creio.

    Pois bem, eu tentei. Fiz minha parte, mas não dá para dizer que eu não sou também responsável pelo que está acontecendo aí. Mas não por ter votado no impeachment. Eu não votei no Collor. Desculpe! Eu não votei no Temer para Vice. Podem até dizer que eu votei no Aécio, que está envolvido em todo esse rolo aí. Eu acho que foi um erro da Comissão de Ética não levar o caso dele para ser julgado. Eu não votei, não sou culpado de estar aí o Temer.

    Agora, eu fiz audiência sobre pedalada, eu vi o relatório sobre pedaladas, nós dissemos que era crime dois anos antes. Naquele momento, eu achei – estou convencido – que era o certo. Lamentavelmente, o Vice que a Dilma escolheu foi o Temer. E aí, Senador Cássio, eu creio que a grande herança maldita deixada pela Presidente Dilma foi um casamento entre a tragédia econômica e a incompetência política do Temer.

    Eu acho que esse casamento se deve à Presidente Dilma. Não dá para dizer que não foi ela que escolheu o Presidente Temer. Foi ela que pediu voto para ele duas vezes, foi ela que conseguiu elegê-lo. E agora eu vejo as pessoas chegarem aqui e jogarem toda a culpa nos que votaram no impeachment, no Presidente Temer.

    Não! A culpa é nossa. É preciso parar com essa hipocrisia de jogarmos a culpa nos outros. E aí é preciso começar a pensar na saída, e a saída não é jogar a culpa nos outros, a saída é dialogarmos entre todos. Como vamos sair disso? Blindando a economia, como eu defendo, ou mudando a política econômica. Alguém tem uma ideia melhor? Eu não tenho, não tenho. Não gosto de atravessarmos com essa economia, com essa política econômica, mas não há outra neste momento, porque nós criamos um rombo monumental ao longo dos últimos dez anos. Não é uma coisa de hoje. O Temer não tem competência para provocar um rombo tão grande. Esse rombo é fruto de políticas equivocadas ao longo do tempo, e eu denunciei aqui – e não só com discurso, mas com textos escritos.

    É hora de a gente provocar um grande debate, um diálogo. Afinal de contas, nós somos ou deveríamos ser os líderes deste País. E líder não é apenas para jogar culpa, líder é para encontrar a saída, para encontrar caminhos. Eu tentei, insisti. Vou continuar insistindo, vou continuar batalhando.

    Eu defenderia, se estivesse na Câmara, votaria para aceitação do pedido do Ministério Público para que o Tribunal julgue o Presidente Temer. E que o Tribunal julgue. Se o Tribunal inocentar, foi o Tribunal. Se culpá-lo, foi o Tribunal. Mas impedir o processo de avançar, para mim, seria um equívoco.

    Mas, passada esta tarde, depois dessa votação, é preciso que comecemos a encontrar um caminho para este País. E aí, o Presidente Temer também deve ser responsável de procurar esse entendimento, e não um entendimento comprando Deputados e Senadores, se vier para aqui alguma vez um processo, através de emendas parlamentares. Nós já devíamos ter acabado com isso aqui, de emendas parlamentares.

    É preciso quebrarmos os muros que foram sendo criados aqui e entendermos que a responsabilidade é de todos nós; pararmos com a hipocrisia de jogar culpa nos outros...

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – ... e entendermos que este País precisa, mais do que nunca, de nós, que estamos nesta posição.

    Ontem, Senador Cássio, eu falei que um desses dias um diplomata estrangeiro me pediu para dizer, em duas palavras, qual é o maior problema do Brasil. Eu acho até que ele imaginava que eu dizer "educação e educação", como diria o Pedro, seu filho. Mas não. Eu olhei para ele e disse: "Embaixador, em duas eu não digo, mas em quatro eu digo". E ele perguntou quais eram as quatro palavras e eu disse: "nós não jogamos juntos". Esse é o problema que nós temos no Brasil. Não estamos jogando juntos. Nem temos um gol para onde chutar a bola, que é o futuro do Brasil, e nem estamos conseguindo, em posições diferentes, como jogadores de futebol, cada um em uma posição, mas sabendo o jogo em conjunto. Eu acho que é hora de jogarmos juntos, e não ficarmos jogando culpa nos outros hipocritamente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/08/2017 - Página 46