Discurso durante a 108ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de visitas realizadas durante o recesso parlamentar quando colheu opiniões e expectativas da população do Mato Grosso do Sul acerca da crise que o país enfrenta.

Autor
Simone Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Simone Nassar Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Registro de visitas realizadas durante o recesso parlamentar quando colheu opiniões e expectativas da população do Mato Grosso do Sul acerca da crise que o país enfrenta.
Aparteantes
Armando Monteiro, Cristovam Buarque, Telmário Mota.
Publicação
Publicação no DSF de 04/08/2017 - Página 34
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, GRUPO, MUNICIPIOS, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), ATUAÇÃO PARLAMENTAR, PERIODO, RECESSO, APREENSÃO, FALTA, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, CLASSE POLITICA, APOIO, OPERAÇÃO LAVA JATO, COMBATE, CORRUPÇÃO, CRITICA, ABUSO, DELAÇÃO PREMIADA, CRISE, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, PODERES CONSTITUCIONAIS, ENFASE, LEGISLATIVO, SENADO, DISCUSSÃO, SOLUÇÃO, ETICA, CONJUNTURA ECONOMICA, NECESSIDADE, REFORMA, REFORMA POLITICA, PARTICIPAÇÃO, SOBERANIA POPULAR.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras. Retornamos, esta semana, do recesso parlamentar a esta Casa, a Casa da Federação brasileira, dos Estados brasileiros, depois de percorrermos todos nós os Municípios do interior do nosso Estado. Ouvimos as pessoas, as demandas, anunciamos os recursos, e, principalmente, eu trago na bagagem muitas perguntas, indagações, questionamentos, perplexidade, indignação, descrença e até desesperança da população do meu querido e amado Estado de Mato Grosso do Sul.

    É que, andando pelas ruas, conversando com as famílias, o sentimento é único: de perplexidade, de indignação, infelizmente, de aversão à política, mas, principalmente, de cobrança. Afinal, não entende a população brasileira – e não tem como entender – como a mais Alta Corte parlamentar deste País e mesmo a Câmara dos Deputados não conseguem achar uma saída para essa severa crise ética, moral, política, social, econômica que assola o País há algum tempo.

    A sensação que me acometeu andando nas ruas do meu Estado é a mesma que tenho tido desde, pelo menos, o início deste ano ao vir para o Senado Federal: a sensação de que estamos todos no limbo.

    Sei que, há mais de dez anos, o Vaticano extinguiu esse que é um dos maiores dogmas das Igreja Católica, o limbo, o vazio, o não lugar, onde ficavam, permanentemente, eternamente, pagãos ou não batizados, que, mesmo tendo suas virtudes, por terem nascido e morrido antes do Cristianismo, pagavam por seus pecados, mesmo sem conhecê-los, simplesmente por não reconhecer a palavra oficial de Deus.

    É essa a sensação de limbo, uma vez hoje já extinta pela Igreja Católica, a sensação que me acomete quando venho ao Senado Federal. E não só aqui. É uma sensação que vejo e é o limbo que presencio não só nesta Casa, mas na Câmara dos Deputados, nas assembleias legislativas, nas câmaras de vereadores, no Poder Executivo, seja federal, seja estadual, seja municipal.

    Sei que política não é uma religião, nem o Senado é uma igreja, apesar de ainda ser o templo sagrado da democracia. Mas se, na igreja, não cabe mais falar em limbo, parece que ele ressurge com força no cenário político nacional. Na verdade, é a própria democracia, a instituição, a institucionalidade democrática que se encontra nesse limbo, onde, se não mergulhamos ainda no inferno, já não conseguimos visualizar mais o paraíso.

    E mesmo aqueles setores, Srs. Senadores, que parecem estar imunes a tudo isso, os chamados protagonistas do que é considerado hoje politicamente correto – Poder Judiciário, Ministério Público, órgãos de controle como a própria Polícia Federal e Tribunal de Contas –, encontram-se conosco, envolvidos nessa balbúrdia que nos acomete.

    Eu quero fazer um parêntese e deixar muito claro aqui na minha fala: defendo o combate à corrupção de forma incondicional, a Operação Lava Jato como um patrimônio da sociedade, o fortalecimento de instituições de controle, como o Ministério Público, a Polícia Federal e mesmo o Poder Judiciário. Mas não dá aqui para não dizer que até esses órgãos e instituições deixaram contaminar-se pelos excessos, vistos, Senador José Medeiros, como salvadores da Pátria. Não o são. Nem poderiam sê-lo. A Constituição não o permite. Seria até injusto com esses poderes e com a Operação Lava Jato dar tamanha responsabilidade a eles. Não há salvadores da Pátria. O único salvador de si próprio é o povo, que pode, sim, nas urnas, através do voto, mudar o seu destino, sabendo escolher os seus representantes, para que esses possam fazer a verdadeira revolução capaz de transformar o País, a revolução, Senador Cristovam, da educação e da cultura do povo brasileiro.

    Mas o mais grave é que, se não há salvadores da Pátria, o problema é que estamos diante de delatores da Pátria. Delatores hoje ditam as regras, conduzem o rumo do País, delatores como Eduardo Cunha, Lúcio Funaro, Eike Batista, Léo Pinheiro, Marcos Valério, irmãos Batista – delações enfraquecendo a política, contaminando a economia, abalando a democracia. Esse é o grande mal dos excessos.

    Eu pergunto se estaríamos ainda vivendo numa democracia. Temporariamente. O governo da maioria, como assim é conhecida a democracia, deixa o espaço e cede o seu espaço a talvez, quem sabe, a chamada "delacracia", o governo das delações. Aqui, repito, não vai aqui nenhum senão, nenhuma vírgula ao trabalho da Operação Lava Jato, do Poder Judiciário. Ao contrário: vejo este Poder fazendo a faxina ética e moral necessária, mas ele não é suficiente, e a Operação Lava Jato não vai consertar este País.

    Hoje, estamos no limbo, e esse limbo contamina, sim, todas as instituições. É porque no sistema constitucional brasileiro somos Poderes independentes, mas harmônicos, e essa harmonia impõe a interdependência. Exemplos simples mostram como o enfraquecimento de um Poder atinge diretamente o outro.

    Quando votamos o duodécimo, o orçamento, nesta Casa, estamos votando o duodécimo dos demais Poderes. Quando fiscalizamos o Poder Executivo, somos fiscalizados pelo Judiciário. No sistema de freios e contrapesos, estamos todos conectados. O que fortemente nos abala atinge diretamente as demais forças. Somos nós que indicamos ou que aprovamos, após uma sabatina, o nome de um membro do Supremo Tribunal Federal. Mesmo um Presidente da República denunciado por possíveis crimes cometidos no exercício do mandato depende da autorização da Câmara de Deputados.

    Esses exemplos são para dizer que hoje enfraquecido o Poder Legislativo, hoje no limbo o Poder Legislativo, embora o limbo seja o não lugar, ele está se movendo e se expandindo e nos atingindo num grande buraco negro. É este Poder combalido hoje do Executivo, paralisado hoje do Legislativo, esses Poderes todos contaminados que estão também tendo, como resultado final, o contágio, e contaminando a sociedade como um todo.

    A sociedade, hoje, sem expectativa de mudança, encontra-se mergulhada na descrença e na desesperança na democracia, no País e no futuro. Poderíamos continuar aqui, no mundo das metáforas religiosas, dizendo talvez que estejamos diante de um ateísmo político; aquele que nada crê. Estamos diante talvez do que os sociólogos vêm falando constantemente, no Estado social de anomia, na anomia social, onde não mais acreditamos em nada, nem mesmo no Poder que nos oprime. É a negação da negação.

    Chegamos a esse ponto. As instituições não mais funcionando. Chegamos a tal ponto de esconder ou tentar tampar essa realidade que conseguimos e temos a coragem de dizer: "É, mas, apesar de tudo, as instituições ainda estão funcionando". Eu pergunto aos senhores: será que estão? Será que estamos ainda diante da democracia e diante de instituições em amplo funcionamento?

    O cerne de uma democracia exige e impõe Poderes fortes, não combalidos, não cerceados, não limitados no seu poder. E, assim, ao invés de construirmos estradas por onde passar, erguemos muros e impedimos a saída, o caminho.

    A sociedade nos segue, Senador Cristovam, porque nós somos o reflexo e o espelho dela. Aqui muito ouvimos falar que a Congresso Nacional, que a classe política é corrupta. Quem somos nós a não ser fruto da sociedade? Aqui representamos as mais diversas matrizes ideológicas, políticas, religiosas e classes sociais. Somos uma amostra da sociedade. Na sociedade, também há corrupção, também há desonestidade, também há incompetência. E há também na classe política, mas, tanto lá quanto aqui, é uma minoria. Infelizmente, o espelho, o reflexo, aquilo que se mostra através da mídia é apenas o lado ruim, o lado negro, o lado negativo da política. E, ao perceber isso, as chamadas, entre aspas, "boas almas" já não querem fazer política, porque "boas almas" e limbo não se misturam.

    O problema é que, ao cederem o espaço a outrem, essas "boas almas" acabam por entregar o território político nas mãos daqueles que não têm nenhum compromisso com a democracia, com a população, com o cidadão e com o País. Na tentativa de continuarem boas, elas se omitem. Omissão aqui também é crime.

    Srªs Senadoras, Srs. Senadores, a crise é política. E só através dela, portanto, poderemos sair. Através da política, poderemos sair da crise, desde que nos firmemos em três grandes pilares: a política, a democracia e a Constituição. Os problemas enfrentados numa democracia se resolvem dentro da democracia, à luz da lei, da ordem jurídica da Constituição, através da política.

    Se o Executivo hoje encontra-se combalido, incapaz de capitanear essa grande solução, cabe aqui – e é esta a mensagem que quero deixar a esta Casa – cabe aqui, a nós este grande papel: de juntos encontrarmos a saída.

    O Senado, Senador Cristovam, nunca faltou ao Brasil. O Senado nunca faltou ao Brasil. Vale lembrar a história. O Brasil não seria este País de dimensões continentais, e talvez seríamos como nossos irmãos vizinhos hispano-americanos, uma fragmentação de países menores, sem qualquer projeção no cenário político mundial, se não tivesse o Senado, na terceira década do século XIX, emancipado, de forma prematura, Dom Pedro II para reforçar e fortalecer o poder central contra uma avalanche de eclosões, de esforços de uma população de norte a sul, que tentava emancipar os seus Estados e fazer do Brasil inúmeros brasis.

    Quando o Senado Federal, de forma corajosa, uniu os dois únicos partidos existentes para fortalecimento desse poder central, o Senado ali garantiu a geografia nacional. Ainda foi o Senado que conseguiu fazer com que nós passássemos de uma forma relativamente tranquila pelo maior trauma histórico do nosso País, quando três Senadores com três leis – a Lei de Eusébio de Queirós, a Lei dos Sexagenários, e a Lei do Ventre Livre – começaram a acabar com o regime escravagista de produção.

    Ali, com atitudes do Senado Federal, começamos a abrir um caminho relativamente pacífico, para que a Lei Áurea, atestado de morte da escravidão do Brasil, pudesse passar, pudesse ser aprovada e, com isso, pudéssemos nos encontrar com a grande matiz ética do nosso País e tentar uma reconciliação com o povo negro, que é o grande construtor da história do País.

    Naquele momento, também, o Senado marcava, de forma decisiva, a história do Brasil. Rui Barbosa, orgulho e honra desta Casa, também sustentou, na Primeira República, o federalismo e a tão combalida e discutida República.

    Dali pra frente, foram Senadores que sustentaram e garantiram as inúmeras crises por que passaram, principalmente a Era Vargas e o período do pós-suicídio; foram quem garantiram. Foi esta Casa que garantiu a estabilidade política do governo de JK.

    Pulando no tempo, para não me alongar nestes últimos cinco minutos que me faltam, a redemocratização, que só aconteceu em 1988, teve origem pós o golpe de 64, já em 1974, Senador Armando Monteiro, quando o antigo MDB, conseguindo eleger grandes e valorosos Senadores, com a sua força, com os seus discursos, acabou por mobilizar essa força irrefreável do povo nas ruas, lutando, pleiteando e exigindo Diretas Já na campanha de 84.

    Derrotada, mas foram dois ex-Senadores, Tancredo Neves e José Sarney, os últimos Presidentes da República no regime indireto, a abrir caminho para a Assembleia Nacional Constituinte. E esta Casa fez o dever de casa. O Congresso Nacional promulgou, então, a mais moderna, a mais avançada e cidadã Constituição brasileira, quiçá do mundo.

    É a esta história e a esses homens públicos que devemos invocar nesta hora. Que eles nos deem a serenidade necessária. Que possamos beneficiar-nos de seus pronunciamentos, de sua sabedoria, mas principalmente que ainda continue a ecoar em nossos ouvidos a sua paixão, a paixão por que defendiam a sua causa e o seu País.

    Se eles foram capazes de se unir, independente de posições ideológicas partidárias, nos momentos mais difíceis e cruciais da história, agora, neste momento de encruzilhada histórica em que vivemos, onde não temos outra saída, a não ser apontar a saída para o País, é hora, Senador Jorge Viana, que preside, neste momento, esta Casa, do grande pacto nacional, um grande pacto nacional a favor do País.

    Já estou nos meus últimos três minutos. Vou, ao final dar o aparte ao Senador Cristovam, mas não sem antes aqui poder continuar dizendo que é hora de a verdadeira política voltar ao cenário nacional, aquela que se escreve com p maiúsculo, aquela que, ao invés de nos envergonhar, nos orgulha, aquela que é o único caminho necessário a conduzir o País para o futuro que ele merece.

    E esta Casa – fazendo coro e utilizando, com a permissão do Senador Jorge Viana, a fala dele ontem nesta Casa – é a que reúne homens e mulheres mais experientes da política brasileira. Aqui, o voto popular e experiência reuniram ex-prefeitos, ex-governadores, ex-deputados, ex-ministros e até ex-Presidente da República. Sabedoria e experiência não nos faltam. A legitimidade vem e veio do voto popular.

    Para nós política não pode ser um substantivo abstrato, não pode ficar no mundo etéreo do imaginário, não pode ficar apenas em discussões, em debates e em palavras. Para nós política tem que ser uma substância concreta feita dos sonhos e feita do sangue do povo brasileiro. É nisso que acredito e, se há um lugar fisicamente, mas também simbolicamente capaz de reunir todos nós em busca desse grande pacto e dessa saída, este lugar é o Senado Federal.

    Encerro definitivamente – e depois concedo a palavra ao Senador Cristovam Buarque – apenas aqui dizendo no que advogo independente de discussão pontual, do que tenha acontecido ontem ou do que vai acontecer amanhã. Eu quero dizer aos senhores que o que advogo aqui é um grande pacto nacional; o que advogo aqui é que o poder realmente volte à mão do poder que tem o voto popular, que é, no caso, aqui, o Poder Legislativo; advogo que a saída seja a melhor para o País; advogo ainda o exercício da política como a única via de salvação para nós humanos, não divinos, que vivemos numa sociedade conflituosa, infelizmente não perfeita.

    Defendo a...

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – ...a lealdade aos princípios constitucionais, defendo o respeito ao povo e ao amor ao País como chamas a nos guiar.

    Sei, como disse antes, que estamos no limbo, mas diferentemente da igreja, do que pensava a igreja, lá quem ia para o limbo não conseguia sair. Nós aqui estamos no limbo, mas podemos encontrar um caminho que nos conduza para outro plano. Se não podemos e não conseguiremos, de um salto só, atingir o paraíso, quem sabe consigamos palmilhar as encostas do purgatório que, por mais árduas que sejam, sempre é um caminho para cima e nunca para baixo.

    Nesta geografia de Dante de A Divina Comédia, lá Dante percorreu o inferno e chegou ao purgatório pelas mãos do poeta Virgílio. Ele é um pagão por ter nascido antes de Cristo. Consequentemente condenado ao limbo, foi conduzido ao paraíso pelas mãos de sua amada Beatriz. Nós, aqui, sem poetas, sem Beatriz temos o povo a nos conduzir. Que nós possamos nos lembrar que é possível haver um povo sem Senado, mas jamais um Senado sem povo. É no que acredito mais do que espero.

    Se me permitir, eu concedo a palavra ao Senador Cristovam e assim encerro a minha participação nesta tarde, agradecendo, gentilmente, o tempo concedido pelo Senador Jorge Viana também pelo Senador Telmário, que me pede um aparte, e pelo Senador Armando Monteiro.

    Por favor, Senador Cristovam.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Senadora Tebet, a sua fala justificaria muito debate e não apenas um curto aparte. Quero começar por um lado, esse lado da sua comparação com o limbo – e eu achei interessante a sua visão. E lembrar que também comparto de um certo incômodo com a ideia da delação premiada, embora eu ache que, se não fosse esse instituto a corrupção continuaria por muito tempo atrás. É graças à delação premiada que estamos conseguindo colocar algumas pessoas em prisão, tomar conhecimento de fatos. Sem a delação premiada isso não aconteceria. Mas o que eu lamento é que eu não vi ainda, ninguém viu ainda uma autocrítica sem necessidade de prêmio. A delação surge porque não é autocrítica. Ninguém errou. Ninguém chegou ainda para a opinião pública e disse: "Eu quero confessar meus pecados". Não houve. Eu nem vou falar do que acontece em outros países, que é suicídio, que é ostracismo, depois de combater fatos como esses que foram cometidos. Eu nem falo isso, eu falo autocrítica. Eu até não gosto nunca de "fulanizar".... Eu não imagino um homem com a história de Zé Dirceu fazendo um dia delação premiada. Mas eu gostaria de ver uma autocrítica do Zé Dirceu, ou então dizer, em alto e bom som, que não cometeu qualquer erro. Por que não dizer o que fez, o que não fez, porque fez, dizendo: "Não quero prêmio. Não quero redução de pena. Eu quero apenas contribuir com o meu País fazer uma grande reflexão." A senhora falou em limbo. É hora de falar, por conta disso, em arrependimento. A gente não tem manifestação de arrependimento nem dos que fazem delação premiada. Eles fazem e terminam mantendo o seu dinheiro e continuam ricos; pagam uma parte da propina como se fosse uma comissão pelo roubo que fizeram. Está faltando confissão, arrependimento, autocrítica ao lado das delações premiadas, que são uma forma de comprar a confissão, a autocrítica, o arrependimento.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Aliás nem compra o arrependimento. Felizmente temos a delação premiada, mas é lamentável que não tenhamos autocrítica histórica sem precisar do prêmio, querendo sair do limbo e ir para o céu, graças à manifestação dos erros que cometeu. Esse é um ponto. Mas há outro, além de muitos para os quais é preciso chamar a atenção. A senhora diz que as instituições não funcionam. Eu até diria que estão funcionam. Eu até diria que estão funcionando de uma maneira doente, precária. Então, nossas instituições funcionam, mas doentes, e doentes por falta de credibilidade. Vamos falar com franqueza, já que falei em autocrítica de todos nós: o eleitorado hoje, a população talvez tenha menos – uns do que outros – desconfiança, mas tem desconfiança sobre todos nós. A senhora falou: "Não pode haver Senado sem o povo", mas hoje nós estamos tendo Senado sem Senadores. Basta olhar como está este plenário numa quinta pela manhã.

(Interrupção do som.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – Vou concluir, Senador, até porque outros, dos poucos que estão aqui, querem falar. Então, não há Senado sem povo, mas não há Senado sem Senador. Está faltando Senador hoje – Senador na plenitude dessa palavra. E, para concluir, eu creio que a senhora trouxe bem o desafio para o futuro num grande pacto, ou acordo, ou consenso. Inventemos até outro nome, mas está na hora de fazer isso. Nesse sentido, eu creio que o Presidente Temer, que ontem teve uma vitória – eu teria votado e disse aqui claramente para a continuação do processo dele... Não podemos jogar para debaixo do tapete um documento como aquele do Ministério Público. E não é só do Ministério Público; o que a gente viu na televisão da gravação. Eu creio que deveríamos ter mantido – eu digo nós, o Congresso –, mas o Presidente Temer venceu ontem. Ele agora precisa fazer um gesto no sentido de tentar, pelo menos, ganhar a população. Eu sou favorável às reformas, mas tem que ser convincente nessas reformas. Está na hora de ele fazer um gesto de generosidade – não é uma boa palavra – para aqueles que o criticam, mas não é dando cargos. Eu creio, aliás, que ele deveria fazer uma reforma ministerial e não trazer nenhum Parlamentar. Nenhum! Porque hoje nós não somos o time de mais credibilidade neste País. Ele colocou um Presidente da Petrobras técnico, que aliás Fernando Henrique usou como Ministro. Tem outros brasileiros desse tipo, capaz de trazer. Ele perguntou aos Parlamentares quanto eles queriam para votar nele. Está na hora de ele perguntar aos Parlamentares quanto é que vocês querem pagar para votarem contra as reformas, poque o Brasil precisa delas. E se perder é porque democraticamente, como ele ganhou ontem, ele perde. Mas tentou aprovar suas reformas, as nossas reformas, sem ficar comprando votos. Eu creio que é hora do Presidente Temer sair dessa visão só de apoio no Parlamento – e às vezes comprando – por apoio de simpatia, de compreensão e de entendimento da opinião pública. Está na hora de ele se perguntar todos os dias como é que que faz para ter credibilidade. Esse é o desafio dele. E não há um momento melhor para fazer uma inflexão do que depois de uma vitória que ele teve ontem – vitória que eu lamento, mas que eu reconheço. Como democrata, ganhou. Então eu reconheço essa vitória, lamentando. Está na hora de ele sair dessa postura deste ano de governar com amigos, de governar com pessoas sob suspeição, de governar com pessoas na Lava Jato...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) – ... e tentar fazer um Governo diferente. Eu, se pudesse dar um presente ao Presidente Temer, eu daria uma foto do Itamar Franco, para ele botar na frente dele e todo dia se lembrar: como é que um vice-Presidente chega ao Governo depois de um impeachment e adquire credibilidade? E ele se perguntar todo dia o que deve fazer para ser o Itamar Franco deste momento. O seu discurso permite despertarmos para isso.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Obrigada, Senador Cristovam.

    Vou incorporar com muito prazer o aparte de V. Exª ao nosso pronunciamento. Agora é também com muito prazer que ouço o Senador Telmário.

    O Sr. Telmário Mota (Bloco Moderador/PTB - RR) – Senadora Simone, muito obrigado pelo aparte. Senador Jorge, nós estamos em poucas pessoas e a Senadora Simone trouxe hoje à tribuna uma reflexão que é importante, e que a gente possa realmente aparteá-la. A Senadora Simone já ocupou cargos no Legislativo e no Executivo. Ela nasceu num berço político da mais alta qualidade – digamos assim –, do melhor respeito, pelo seu pai, e o comportamento dela, tão querida que ela é. Quando ela chegou a esta Casa, a Senadora Simone ficou um período a observar. Parecia que ela veio pelo silêncio, mas ela, como uma mulher...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Telmário Mota (Bloco Moderador/PTB - RR) – ...com esse olhar periférico da mulher, com esse olhar inteligente dela, logo, logo, foi aquela grande flor que realmente apareceu neste jardim e começou a mostrar o seu ponto de vista de forma muito firme, muito contundente, muito responsável e que, com certeza abrilhanta esta Casa. Eu realmente fico orgulhoso de estar nesta legislatura de que V. Exª faz parte.

    Mas V. Exª, no seu discurso – e como sempre a mulher tem esse olhar de pactuar, de organizar a casa, de organizar as coisas –, V. Exª traz esse convite. E V. Exª diz aqui: "Estamos sem o poeta e sem a Beatriz". Mas estamos também sem a bússola. E quando você não sabe o caminho que quer seguir, todos os caminhos te levam a lugar nenhum. Esta Casa, para pactuar, Senador Cristovam, ela precisa primeiro se encontrar com o povo. O Senado e o Congresso merecem do povo brasileiro o maior carinho e o maior respeito enquanto instituições. Aqui, essa Casa, ela é muito bem aparelhada pelos seus servidores e pela sua estrutura. Poderia, sem nenhuma dúvida, estar preparada para pactuar politicamente e prestar um serviço à população brasileira, do mais alto nível. No entanto, aqui dentro, nós – Deputados Federais e Senadores – somos resultado da escolha popular no voto. Hoje, olhando as redes sociais, os jornais, as rádios – eu me voltei para ver isso, numa forma de ampliar os ouvidos e ouvir a população –, eu vi que nós amanhecemos numa grande ressaca, uma ressaca perigosa, porque ela caminha rapidamente para uma depressão. Quando a população entra depressivamente na política ou entende a política depressivamente, aí sim, ela perde o sonho, perde a esperança, e pode ser até o sistema anarquista. Então, V. Exª, em boa hora e em bom tom, convida essa sociedade e convida o Congresso de uma forma geral – eu não entendo que é só o Senado –, para que ele se encontre com a população. Agora, se encontrar com a população é abrir os ouvidos para a população, não fazer aqui olhos de camaleão: olhar um para cima e outro para baixo. Ou nós olhamos numa só direção, ou nós não vamos chegar aos nossos objetivos. Eu tenho um carinho enorme pelo Senador Cristovam, mas quando ele fala que alguém tem que vir aqui, Senador Jorge, e dizer, abrir o seu coração, confessar o seu pecado, eu não sei se é isso que o povo quer, não. O povo quer agora é ser ouvido, o povo quer participar efetivamente disso, ou então cai nas diversas desilusões. Não adianta você agora, Michel Temer e outros... Michel Temer teve uma vitória, ganhou perdendo. Ganhou perdendo: o dinheiro que foi gasto em emendas, em liberações, em cargos, não teve uma vitória robusta. Está sem força, talvez amanhã, para atender ao mercado. O mercado vai cobrar muito, e ele cobra bastante. Eu acho que esse Congresso tem que se encontrar com o povo. Muito obrigado. 

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Obrigada, Senador Telmário. Obrigada pelas palavras carinhosas, fruto da nossa amizade, mas, se V. Exª me permitir então, eu faço uma retificação na minha fala: quando eu disse que não temos mais poetas nem Beatriz, mas o povo a nos conduzir, me permita, aproveitando, a partir de agora e desde agora para sempre, o termo que V. Exª acabou de mencionar: não temos poeta, não temos Beatriz, mas temos o povo, nossa bússola, a nos guiar.

    Com prazer, Senador Armando Monteiro.

    O Sr. Armando Monteiro (Bloco Moderador/PTB - PE) – Senadora Simone, eu queria me congratular com o pronunciamento de V. Exª e dizer que V. Exª tem revelado aqui, na sua atuação parlamentar, uma posição que nos inspira aqui nessa Casa. V. Exª alia o melhor da tradição política, e faz esse reconhecimento – eu diria, revelando o conhecimento da história brasileira, da história recente, da história republicana –, o reconhecimento ao papel desta Casa, ao papel do Senado Federal, desta instituição, da Câmara Revisora, do papel moderador que esta Casa exerceu ao longo da nossa vida pública, de um País que, durante muito tempo tinha como marca a instabilidade quase que permanente. Então, é muito importante que o Senado da República, neste momento da vida nacional, possa refletir sobre o seu papel, na perspectiva da sociedade que nós queremos construir no futuro. Eu quero concordar inteiramente com V. Exª quando diz que o verdadeiro encontro do Parlamento com a sociedade brasileira se dará através do voto popular. A partir de 2018...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Armando Monteiro (Bloco Moderador/PTB - PE) – ...quando teremos eleições gerais, eu espero que finalmente o Brasil possa promover verdadeiramente o encontro que nos conduza à construção dessa sociedade do futuro. Eu lamento sinceramente o que ocorreu ontem. Acho que ontem nós assistimos a uma espécie de apoteose do fisiologismo. Ontem, o que se revelou verdadeiramente é que o atual grupo que está no poder revela um absoluto domínio do código de um sistema apodrecido, na melhor expressão – e eu quero homenageá-lo – do jornalista Ricardo Noblat. Ou seja, o sistema revelou absoluto domínio do código que opera um sistema político apodrecido. No entanto, nós sabemos que o papel desse Governo é fazer essa transição; mal ou bem, operá-la. Agora, qual é o nosso papel, o papel do Senado Federal? É nos voltarmos agora para uma agenda substantiva que dê resposta à imensa inquietação da sociedade brasileira, agravada pela crise econômica, pelas tensões sociais dela decorrentes. Veja V. Exª essa questão da segurança pública, que revela essa patologia social. É uma sociedade que, paradoxalmente, acumulou no plano material, mas que não foi capaz de produzir uma sociedade minimamente equilibrada, que assegure padrões de convivência, seja no plano político, seja no plano social. Então, para não me estender, congratulo-me com V. Exª, que é uma voz lúcida. V. Exª tem a sensibilidade que haverá sempre de nos produzir o melhor ambiente nesta Casa para que a gente possa verdadeiramente desempenhar o papel que nos cumpre nesse momento tão importante da vida do nosso País.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Obrigada, Senador Armando. Agradeço mais uma vez a oportunidade pelo tempo, Presidente, mas que possam ficar aqui registradas duas coisas, Senador Armando: primeiro, que quando V. Exª mencionou o episódio de ontem, eu fiz questão de deixar claro na minha fala que o que me trouxe a esta tribuna não foi um fato isolado do ontem, mas o que vem acontecendo em um passado recente da história brasileira. Talvez ali tenha se encerrado um lamentável episódio, um capítulo da política brasileira.

    V. Exª foi muito feliz – só não quis adiantar porque estava em um aparte – e deu talvez o recado melhor do que eu. Eu disse que precisávamos encontrar uma saída; V. Exª quase quis dizer qual era. Talvez, o grande papel neste momento imediato, nos próximos 30 dias, seja abrir o caminho para que o povo possa, efetivamente, ter a legitimidade do seu voto na urna e poder, efetivamente, escolher as opções por nós oferecidas. Falo aqui da nossa grande responsabilidade, urgente e premente, de fazer a mãe de todas as reformas, que é a reforma política. Encerro aqui fazendo uma referência à fala do Senador Cristovam. O Senador Cristovam disse que, quando eu afirmei que poderia haver povo sem Senado, mas não Senado sem povo, o que o preocupava é que o mais grave é não ver no Senado os Senadores.

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) – Eu posso garantir que a história registrará que o Senado Federal teve um Senador da dignidade, da grandeza, do conhecimento e da capacidade de V. Exª – da capacidade e genialidade do Senador Cristovam –, fazendo referência a todos os grandes amigos e amigas Senadores, que eu vislumbro como colegas nesta Casa.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/08/2017 - Página 34