Discurso durante a 134ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre a posse da Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Comentários sobre a posse da Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge.
Aparteantes
João Capiberibe, Lindbergh Farias.
Publicação
Publicação no DSF de 19/09/2017 - Página 28
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • COMENTARIO, ELOGIO, DISCURSO, POSSE, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, RAQUEL DODGE, ENFASE, NECESSIDADE, CONTINUAÇÃO, TRABALHO, INVESTIGAÇÃO, OPERAÇÃO LAVA JATO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO, JORNALISTA, ASSUNTO, SAIDA, PROCURADOR, RODRIGO JANOT.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – É verdade. Nós falamos que somos aqui meio que guardiões, ou pelo menos tentamos ser, dos nossos rios. V. Exª, amigo, vive na foz, e eu vivo lá nas cabeceiras dos rios.

    Fiz uma viagem agora, de dois dias, da Reserva Extrativista Chico Mendes até Rio Branco pelo Rio Acre. O rio está bem baixo; é o período em que ele fica mais seco. E é muito grave o que está ocorrendo nas nascentes.

    Estou criando um projeto de recomposição das nascentes, mas quero envolver muita gente: universidade, educadores, pesquisadores, governos, tudo. É um projeto de vida e de 20 anos para frente, para recompor todas as nascentes, que são milhares, do Rio Acre, que passa por oito Municípios lá. Eu acho que são atitudes como essa que todos nós podemos e devemos adotar.

    Mas eu fiquei um pouco animado porque eu vi uma fauna boa, vi muito... Depois, inclusive, vou fazer um discurso aqui sobre o que eu vi, sobre essa expedição que eu fiz, aproveitando meu feriado de 7 de setembro.

    Mas, Sr. Presidente, Senadores, Senadoras, todos que me acompanham pela Rádio e TV Senado, acho que hoje foi um dia cercado de expectativa. Eu me refiro à saída, ontem, do Dr. Rodrigo Janot. Ele deixou de ser o Procurador-Geral da República, e houve a posse da Drª Raquel Dodge, às 8h da manhã. Eu passei a noite em um voo do Acre para cá, cheguei muito cedinho e cedinho estava lá. Isso tem tido uma repercussão enorme na imprensa, nas redes sociais, na vida nacional. E é fato que nós devemos, no mínimo, na primeira sessão, no dia em que temos a posse da nova Procuradora, ter um debate também aqui na tribuna do Senado, para constarem nos Anais as nossas impressões sobre este momento que o Brasil vive.

    Eu trago aqui três questões, todas envolvidas, todas próximas, em volta desses desafios que temos. Eu trago, Sr. Presidente, um artigo escrito ontem pelo mestre do jornalismo Janio de Freitas. Nós cobramos muito da imprensa, criticamos muito, mas nós temos grandes jornalistas, mulheres e homens, neste País.

    Eu tenho procurado... Acho que a situação parece ter chegado a um ponto de tanta crise que não sei se está havendo mais liberdade, ou se, agora, deixaram de ver que eram uns contra os outros, porque havia movimento contra o PT quando estava no governo, e, agora, parece que as coisas estão... Eu consigo acompanhar um pouco mais o noticiário e queria inclusive cumprimentar os jornalistas todos.

    Tenho acompanhado o Kennedy Alencar, que tem tido coragem de criticar, de apontar caminhos com a análise política que faz na própria CBN. Tenho lido jornalistas renomados, que têm história, já, no jornalismo do Brasil, como o Veríssimo no jornal O Globo, e hoje eu trago algumas observações que o jornalista, mestre do jornalismo, Janio de Freitas traz sobre a saída de Janot, o Dr. Rodrigo Janot, e a entrada da Drª Raquel Dodge. Foi escrito ontem. Eu li com atenção.

     E ele recomenda, ele fala, com a experiência que tem, da necessidade de a Drª Raquel continuar no combate à corrupção. E ele fala: é melhor ir em frente! Ele elogia também o Dr. Rodrigo Janot, ele faz um elogio, e eu vou pedir para constar nos Anais do Senado esse artigo. Ele faz um elogio, mas ele critica. Ele reconhece os avanços do Doutor Rodrigo Janot e critica abusos e omissões que foram cometidos durante o seu período e cobra da Drª Raquel Dodge que evite os erros, os excessos, os abusos, mas que mantenha uma linha que ele entende como de avanço do Dr. Rodrigo Janot, de combate à corrupção.

    É evidente que nós estamos vivendo um período em que todos nós ficamos chocados – cidadãos, setores da imprensa e o próprio Supremo. Os famosos vazamentos criminosos vitimaram pessoas, destruíram vida de muita gente, atingiram a figura do ex-Presidente Lula. Ele foi atingido como ninguém, e sua família. Eu lembro que conversas da D. Marisa, já falecida, com os filhos foram vazadas de maneira criminosa e ninguém fez nada. E o Jânio de Freitas fala que isso é algo gravíssimo que, de alguma maneira, mancha, compromete a própria Operação Lava Jato.

    Ele coloca aqui:

O caráter político da Lava Jato até hoje ocupa adeptos seus com pretensas negativas: artigos e declarações sem fim. Nestes últimos dias, [o Dr. Rodrigo] Janot deixou-lhes uma armadilha. Está no seu pedido de arquivamento da investigação de José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá, cuja prisão chegara a pedir.

    Então, veja: nós tivemos de fato, há um ano atrás, o pedido de prisão do Presidente do Congresso. Um ano depois o mesmo Ministério Público pede o arquivamento. Mas o delator, o criminoso que levou o Ministério Público a uma atitude tão radical dessa e a um outro pedido de arquivamento, não acontece nada com ele. Então tem algo – ou é um abuso, ou o Ministério Público viveu uma trapaça. Eu acho que é isso que dá nós cairmos numa armadilha de botarmos o Brasil inteiro refém de criminosos confessos, de bandidos.

    A delação premiada é algo fundamental. Nós enfrentamos o crime organizado no Acre há 20 anos. Buscar ter a colaboração de membros das quadrilhas é fundamental, mas aquilo não pode ser uma sentença, como tem sido tratado hoje, porque o bandido, o criminoso quer se livrar do crime que ele já cometeu. E é nessa insensatez que nós seguimos.

    Eu vi uma reportagem do Fantástico mostrando a vida, a vida bem boa dos delatores: uns em Angra dos Reis, andando de iate, tomando uísque, curtindo o dinheiro do roubo; outros em coberturas no Rio de Janeiro, de 800 mil metros quadrados, curtindo, passam o dia fazendo exercício, recebendo amigos. Criminosos confessos; compraram esses patrimônios com dinheiro roubado, mas, no afã de se fazer uma ação cega de combate à corrupção, aceita-se a convivência e a conivência com criminosos. Eu acho que isso o Judiciário precisa corrigir, acho que isso o Ministério Público precisa corrigir. É isso que o Janio de Freitas traz, citando aqui o Dr. Sérgio Moro, citando aqui o Dr. Rodrigo Janot. Ele fala também: "No caso da nomeação [da tentativa de nomeação do Presidente Lula], porém, a Lava Jato quis o processo contra Lula, pela alegada intenção, e Sérgio Moro quis julgá-lo."

    Então, veja bem, na hora em que houve um vazamento ilegal, você fez uma transferência também, porque estava a Presidente da República conversando com o Presidente Lula, aquele era um processo para estar no Supremo. O Jânio de Freitas diz: "Aquilo estaria na mão da Justiça." Mas não, havia uma intenção de levar o Presidente Lula para Curitiba. E isso se materializou. O Ministro Teori morreu e ninguém fez mais nada.

    E está aí o Presidente Lula, a única liderança popular do País, passando por uma situação em que eu só encontro, na história, referência sobre o Getúlio Vargas, o Juscelino Kubitschek e o Presidente Lula. Será que não vai entrar alguém para pôr ordem nisso?

    Eu espero que a Drª Raquel Dodge cumpra esse papel. O Ministério Público é fundamental, é uma espécie de espinha dorsal. Hoje eu ouvi que é quase um poder constituído, amparado na Constituição. Ele tem um papel fundamental. Não pode ter excessos.

    Então, eu queria aqui pedir para constar nos Anais esse artigo de ontem do Jânio de Freitas. E também queria fazer algumas ressalvas sobre o discurso da Drª Raquel Dodge. Eu a conheço bem. Ela nos ajudou no Acre, há quase 30 anos, há 25 anos. É comprometida com a causa dos direitos humanos, com a causa ambiental, com a causa dos povos originários indígenas. Hoje eu falava com ela e ela citou – e isso é muito importante – a preocupação com o meio ambiente. Ela foi corajosa também, acho que fez um discurso, eu diria, muito correto, apropriado. Eu espero que, se esse discurso que ela fez for executado, for cumprido – e eu acredito que seja –, sinceramente não vai haver espaço para nenhum tipo de abuso por membro do Ministério Público, que precisa ter o respeito de todos nós e o apoio de todos nós.

    Eu queria, inclusive, fazer um comentário. Tentei falar com o jornalista Fernando Rodrigues, que é um renomado jornalista, que eu também sei que trabalha com informações, com pesquisa, que é um grande jornalista, mas saiu, inclusive, na coluna dele uma nota que eu acho que deve ter vindo por alguém que não veio com a informação correta, que faz referência ao PT, faz referência à nossa Bancada como se nós, como se os colegas do PT tivéssemos uma visão de que a Drª Raquel Dodge seria uma espécie de Brindeiro – a Raquel Brindeiro. Não há nenhuma hipótese, eu posso afirmar, Fernando Rodrigues. Estou aqui só fazendo uma ressalva, sei que você sempre corrige quando há alguma desinformação, porque você é uma pessoa que nos informa muito com suas colunas, mas não há esse clima, não há essa discussão, falo em nome da Bancada.

    Fui testemunha da posição da Bancada, participei das reuniões. Há uma confiança muito grande da Bancada na ação do Ministério Público, especialmente da Drª Raquel, de que ela possa corrigir os excessos, de que ela possa pôr fim aos vazamentos seletivos e criminosos, de que ela possa, com a sua equipe, controlar para que não haja um excesso por parte de membros do próprio Ministério Público no sentido de usurpar poderes que não lhes cabem e essencialmente que eles possam ajudar o Brasil a combater a corrupção e a levar adiante essas ações todas que envolvem a Lava Jato, mas que não se faça injustiça.

    Então, faço esse reparo. Está aqui o Líder. Sou testemunha da Bancada de que não há esse clima, nunca houve. Aliás, há o de confiança e de expectativa de que criminosos vazamentos seletivos, de que ações dirigidas para um lado ou para outro não possam acontecer.

    Eu leio, antes de passar para o Senador Lindbergh, porque gostei muito de uma parte que ela falou no seu discurso: "O Ministério Público deve promover justiça [falou a Drª Raquel, e leio aqui], defender a democracia, zelar pelo bem comum e pelo meio ambiente [ressalto, porque é uma parte importante], assegurar voz a quem não a tem e garantir que ninguém esteja acima da lei e ninguém esteja abaixo da lei".

    O que tem havido ultimamente é que parece que alguns estão acima da lei e que há outros que a lei não alcança. É evidente que há uma ação dirigida, com mão de ferro, contra o PT, contra setores da sociedade, porque as prisões estão demonstrando; por outro lado, gente, com prova, com materializadas provas, está solta, no bem-bom.

    E é muito perigoso. Todo o aparato de combate à corrupção fica refém de delatores, de criminosos, de réus confessos. É muito perigoso. Em qualquer lugar do mundo, a delação é a parte da instrução do processo, parte importante, mas o Estado tem que trabalhar com as provas, tem que reunir provas, para não ficar refém da fala mentirosa, criminosa de delatores.

    Eu ouço o Senador Lindbergh.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Jorge Viana, muito rapidamente quero dizer que esse é o sentimento nosso, como um todo, do Partido dos Trabalhadores, é de esperança com essa posse da Procuradora Raquel Dodge. A gente sabe que ela vai ser firme, dura nas investigações, mas acha que ela tem a chance de recuperar a sobriedade – sem vazamentos seletivos, sem ações espalhafatosas. Ela pode, inclusive, ajudar a resolver um pouco esse problema do descompasso institucional. A gente está vivendo uma situação que parece de anarquia institucional.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Eu uso um termo mais duro. V. Exª sabe que sou ponderado, Senador Lindbergh, nós somos aqui ponderados, procuro sempre achar a melhor solução. Mas nós estamos vivendo, sim, uma crise institucional profunda, que beira a anarquia institucional – isso é um fato concreto –, com um impeachment sem crime de responsabilidade, com mais da metade dos ocupantes do Palácio já presa, sem nenhuma legitimidade, com o Supremo num confronto direto com o Ministério Público e vice-versa.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Você sabe que nisso o ex-Ministro Joaquim Barbosa tem razão. Ele deu uma declaração à Folha de S.Paulo dizendo o seguinte: "Depois que afastaram uma Presidente eleita sem crime de responsabilidade, abriu-se terreno para que tudo pudesse acontecer no meio dessa confusão institucional." Mas eu sinceramente acho que a nova Procuradora Raquel Dodge pode ajudar a criar outro clima no País. E espero também, pela sua história, que o tema defesa da Amazônia, que hoje assume a centralidade na pauta, bem como o da defesa dos direitos humanos e das causas indígenas assumam agora, neste novo momento, com ela à frente, um protagonismo. Então, a nossa posição aqui é a de cumprimentar a Procuradora e a de ter esperanças de que ela cumpra um grande papel num momento tão difícil da vida política brasileira.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Eu, então, queria, já caminhando para o encerramento, agradecer muito o aparte do colega Senador Lindbergh.

    A Drª Raquel, para falar de corrupção, citou o Papa Francisco. Ela reproduziu um posicionamento do Papa Francisco, que acho que é importante constar nos Anais da Casa, porque é um posicionamento, eu diria, muito feliz, que traduz bem...

    Diz o Papa Francisco, como parte do discurso da Drª Raquel:

O Papa Francisco nos ensina que "a corrupção não é um ato, mas uma condição, um estado pessoal e social, no qual a pessoa se habitua a viver. O corrupto está tão fechado e satisfeito em alimentar a sua autossuficiência que não se deixa questionar por nada nem por ninguém. Construiu uma autoestima que se baseia em atitudes fraudulentas; passa a vida buscando os atalhos do oportunismo [diz o Papa Francisco como parte do discurso da Drª Raquel, que recorreu a ele para falar de corrupção], ao preço de sua própria dignidade e da dignidade dos outros...

    E aí diz a Drª Raquel:

A corrupção faz perder o pudor que protege a verdade, a bondade e a beleza" (em o nome de Deus é misericórdia [...]) [fazendo referência à origem dessa fala do Papa Francisco]. Zelar pelo bem comum é uma tarefa grandiosa do Ministério Público, que é coadjuvada pelo papel que cada cidadão pode fazer por si mesmo e pela integridade do País. É uma tarefa necessária, que exige de nós coragem.

O País passa por um momento de depuração, os órgãos do sistema de administração da Justiça têm no respeito e harmonia entre as instituições a pedra angular que equilibra a relação necessária para se fazer justiça em cada caso concreto. Temos de cuidar [e aqui eu ressalto o diz a Drª Raquel] da dignidade da pessoa humana. A Constituição não a estabelece apenas como ideal, mas exige concretude em relação a cada indivíduo, pautada pela observância da lei e dos direitos individuais.

O Ministério Público, como fiscal da Constituição e das leis, deve zelar pela dignidade de cada pessoa, pois a dignidade humana é essencial para assegurar um futuro de paz no País e entre as nações.

    Então, eu penso que as palavras, Senador Capiberibe, que ela nos trouxe são fundamentais. As instituições precisam se reencontrar com o mando da Constituição e das leis. Está evidente que temos pessoas, em nome e boas causas, como disse ainda há pouco o Senador José Medeiros, agindo à revelia da lei, é evidente, está claro.

    Eu vou encerrar – e aí eu vou ouvir o Senador Capiberibe – dizendo que o jornal Folha de S.Paulo hoje traz várias páginas com uma entrevista, como disse aqui a Senadora Ana Amélia, do Procurador Ângelo Villela, de 36 anos, que passou 76 dias preso. Foi pedida a prisão dele pelo Procurador Rodrigo Janot, por estar envolvido ou ter suspeita de seu envolvimento no caso JBS. Ele dá uma entrevista que, no mínimo, vai levá-lo para depor na CPI da JBS – no mínimo. É grave, é muito sério, pois ele fala da maneira como seus colegas e ele estavam agindo. Imaginem, numa causa tão nobre de combate à corrupção, fazendo um enfrentamento de algo que destrói a vida nacional, que destrói a dignidade humana, como acabei de falar, se o Ministério Público resolve agir fora da lei, à margem da lei, ou membros do Ministério Público. Então, com o caso do Marcelo Miller e com o caso do Dr. Ângelo Villela, fica evidente que nós temos duas peças-chave do Ministério Público sob suspeição. Eles precisam vir. Agora, eu lamento que essa CPI, que poderia... Ela vem já com uma cara de chapa-branca, ela já vem sob suspeita, porque poderia haver ali, com todo respeito, um relator com conhecimento técnico-jurídico, que pudesse, com respeito, ajudar-nos a aclarar questões fundamentais sobre a ação do Ministério Público, sobre a ação de quem quer que seja, porque esse é o nosso papel também, do Parlamento.

    Mas, independente disso, tomara que todos que compõem essa comissão possam nos ajudar a esclarecer, porque está evidente que essa entrevista dada pelo Dr. Ângelo Villela vai trazê-lo. Ele certamente vai querer vir. Ele se diz vítima, ele ficou preso 76 dias, mas é isso que dá uma instituição como o Ministério Público ficar refém da palavra de criminosos, esse é o problema. Nós não podemos...

    Os criminosos falando são indícios, o Ministério Público tem instrumentos, pode apurar, pode ir fundo, identificar as provas e, com base nisso, fazer as denúncias e até os levar, depois de julgados, à prisão. Nós estamos prendendo primeiro, com base na palavra de criminosos, para ver se houve crime depois. É muito perigoso esse caminho.

    Ouço o Senador Capiberibe e já encerro, Sr. Presidente.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Obrigado, Senador Jorge Viana. A corrupção no nosso País não é um desvio de conduta pessoal – eu acho que disso não há mais dúvida, ninguém duvida disso –, ela é sistêmica. Ora, se ela é sistêmica, é preciso uma ação política e uma ampla mobilização da sociedade para nos prevenirmos e controlarmos a corrupção. Eu acho que as investigações são importantíssimas, mas aí o leite já está derramado. Recuperar aquilo que já foi perdido é difícil. Então, nós temos que ter, nós temos que... Na verdade, eu estou propondo exatamente isto: um sistema que previne e que busca controlar a corrupção através do acompanhamento e do uso da tecnologia digital. Nós não podemos perder de vista que a tecnologia digital nos permite hoje fazer o acompanhamento dos gastos públicos, até porque nós temos uma lei que obriga os entes públicos – a Lei da Transparência – a expor as suas receitas e despesas, em tempo real, na rede mundial de computadores. Então, para complementar, para poder promover o controle social... Quando você tem uma crise da representação política, como nós estamos vivendo... Você vê que a pauta desta semana é uma pauta diversionista, ela não busca resolver o problema, ela busca fantasiar, buscar, incentivar esse clima ruim que já está na sociedade, colocando na pauta a redução da maioridade penal. São pautas que não vão resolver...

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Fragilizar o meio ambiente, os direitos dos povos indígenas.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – ... que vão complicar ainda mais. Coloca um jovem desse em uma escola do crime, como são as nossas penitenciárias, aí então nós vamos formar... Eu falo isso, porque eu fui preso político, Senador Jorge Viana. Eu fui preso político numa prisão comum. Na cela em que eu estava, isso lá nos anos 70...

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Rocha. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Lá em São José, em Belém do Pará.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Presídio de São José, nos anos 70. A cela em que eu estava era para alojar no máximo 20 detentos; nós éramos 95. Era uma rede em cima da outra; eram três andares de rede, num clima de 42º.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Misturados criminosos perigosos e presos políticos.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) – Então, isso vem de longas datas. A política de segurança pública é uma política falida. Mas, voltando à corrupção: o que eu penso? O que eu estou propondo? Eu dei entrada, na quinta-feira passada, num projeto de lei, aqui no Senado, para criar um sistema de gestão compartilhada, em que a sociedade esteja organizada em aplicativos – desses que você encontra na internet ou nas telefônicas. Esses grupos se organizariam, e o Estado os recepcionaria: seria obrigado a inscrever, cadastrar esses grupos e a trocar informação do acompanhamento de projetos específicos – na construção de obras, aquisição de equipamentos, compra de materiais. Então, esses grupos se organizariam para acompanhar esses projetos e trocar informações passo a passo até a execução final. E também para os serviços públicos: fazer o acompanhamento de um centro de saúde, por que não? Por que o cidadão não pode se organizar em torno de um centro de saúde e ajudar, inclusive, nas escolas também? A sociedade poderia se associar à direção da escola, acompanhar o gerenciamento, gerir de forma coletiva a escola, melhorar a qualidade da educação através da participação de todos. Então, esse projeto começa a tramitar aqui, no Senado. Eu o estou chamando de gestão compartilhada, na falta de outro nome, e ele começa a tramitar aqui e propõe exatamente a formação de grupos virtuais para acompanhar as despesas públicas, os gastos públicos. Eu tenho certeza de que com isso nós vamos ajudar na prevenção. Esse projeto foi feito em cima de experiências concretas que eu desenvolvi no Amapá, com base nas nossas emendas parlamentares. Nós hoje somos gerentes de projetos: cada Parlamentar tem R$15 milhões por ano para destinar a projetos nos seus Estados. E eu fiz isto: destinei para as prefeituras, para o Governo do Estado, e fiz um acordo para a gente poder gerenciar juntos, organizando os beneficiários para poder fazer um acompanhamento detalhado da execução da obra ou do serviço. Era isso. Obrigado pelo aparte.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Eu o cumprimento e lhe agradeço. Incorporo o aparte com muita satisfação.

    Queria concluir só dizendo que eu espero, sinceramente, que a Drª Raquel Dodge tenha sucesso. Nós todos temos a expectativa de que o Brasil precisa levar adiante o combate à corrupção, precisa ficar um país melhor; mas nós não vamos alcançar isso se nós não tivermos um compromisso – como a Drª Raquel fez questão de ressaltar hoje – com a Constituição, com o respeito às leis como sentença. Nós não podemos seguir este caminho: a Operação Mãos Limpas, da Itália, virou um caos no final: havia 5.600 delatores; todo mundo virou delator.

    Eu tenho muito respeito pelo Ministério Público, pelos seus membros. Mas vejam o que acontece: um dos mais importantes membros do Ministério Público, o Sr. Marcello Miller, agora não pode mais advogar – a OAB cassou ou suspendeu a licença para que ele advogue. Então, alguém vai ter que esclarecer se ele é inocente, se ele é culpado; isso tem que ser feito. A mesma coisa com o Dr. Ângelo Villela: ficou 76 dias preso. Ele foi peça-chave nessas últimas delações; nós temos que ouvi-lo.

    Mas fazemos isso não para esgarçar mais, não para piorar mais a situação; mas para buscar uma saída. E só há uma saída: o devido processo legal.

    E é por isso que eu, sinceramente, cumprimentando todos que compõem o Judiciário, o Ministério Público deste País, renovo aqui minha confiança na nova Chefe do Ministério Público Federal, Dra Raquel Dodge – de quem eu já falei; conheço, sei dos seus compromissos –, mas também entendendo que nós precisamos de o Supremo sendo mais firme, para que não haja, para que não possa haver nenhum tipo de dúvida sobre o cumprimento daquilo que a Constituição estabelece para todos nós.

    Nós aqui mesmo, nós precisamos ter coragem de assumir nossos erros, assumir as omissões. Não é possível. Vamos agora... Está acabando o prazo, dia 6 de outubro, para eventuais reformas políticas eleitorais, e um sistema falido, um sistema que faliu, que desmoralizou o Congresso, que foi fundamental para que o Brasil mergulhasse nesse mar de corrupção: nenhuma mudança importante; omissão. Violência, por outro lado: nenhuma mudança importante no Código Penal, que é de 1940.

    Então, o Congresso precisa ter uma agenda que leve em conta os interesses do País, que possa ajudar e que possa começar a mudar a imagem do Congresso, mas tomando atitude aqui – reduzindo custos de campanhas, dando mais transparência e mudando um processo político –, porque o modelo político-partidário que nós temos faliu, fracassou, a validade venceu.

    Mas veja como é que são as coisas: parece que a ficha aqui não cai. Por isso é que eu tenho muita confiança de que se comece um processo retomando a serenidade, a firmeza e a determinação de combate à corrupção pelo Judiciário e Ministério Público. E que aqui nós façamos também a nossa parte, mudando as leis, resgatando o respeito da sociedade com o Congresso, com sua agenda, com sua pauta, para que possamos oferecer para a sociedade alguma saída para esta crise, que parece que não tem fim no nosso País e que afeta duramente o nosso povo.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR JORGE VIANA.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

    Matéria referida:

     – Raquel Dodge precisa continuar com o combate à corrupção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/09/2017 - Página 28