Discurso durante a 136ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o aumento do conservadorismo no País e o desrespeito às garantias fundamentais.

Autor
Marta Suplicy (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL:
  • Preocupação com o aumento do conservadorismo no País e o desrespeito às garantias fundamentais.
Publicação
Publicação no DSF de 21/09/2017 - Página 52
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, REGRESSÃO, SOCIEDADE CIVIL, LOCAL, BRASIL, NECESSIDADE, OBSERVAÇÃO, RESPEITO, DIFERENÇA, ESCOLHA, SEXUALIDADE, GARANTIA CONSTITUCIONAL, DEFESA, DISCUSSÃO, ENSINO, ASSUNTO, SEXO, RELIGIÃO, DIVERSIDADE, PESSOAS, HOMOSSEXUAL.

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Caros Senadores e Senadoras, telespectadores da TV Senado, por que não avançamos culturalmente no Brasil? Por que não avançamos nos direitos humanos e ainda somos um dos países com o maior número de agressões a homossexuais? Por que nós não avançamos na diminuição da violência contra a mulher, apesar de tantas leis boas que estão aprovadas e que estão em uso? Por que, neste momento da história, regredimos a ponto de barrar discussões de questões de gênero nas escolas?

    Eu mesma fiz trabalhos nessa área, na gestão de Luiza Erundina, quando o Secretário de Educação era Paulo Freire, que me convidou para trabalhar essas questões nas escolas. Paulo Freire, desde aquela época, já possuía consciência da importância de se discutirem, na sociedade, o que é homem, o que é mulher e suas responsabilidades, inclusive para o prazer sexual. Tudo era discutido, como foi discutido nos anos 80, na TV Mulher.

    É uma coisa inacreditável a situação que nós estamos vivendo. Vivemos uma onda conservadora como nunca presenciei no Brasil, uma onda conservadora que não fala verdades, que distorce questões e que briga até com a ciência. Isso vai ficando muito difícil, porque vai degringolando. Hoje, com a internet, vemos que a participação de fake news, de informações fakes e de posições que não são fakes, mas muito exacerbadas, raivosas, odiosas, está caminhando numa dimensão que resulta em situações muito ruins.

    Vemos, agora, o caso da tal da cura gay. Isso já estava resolvido em 1990, quando a OMS tirou do rol das doenças a homossexualidade. Aí o Conselho Federal de Psicologia, já em 1999, proibiu essa tal de terapia de reversão sexual. Estamos falando, gente, de quase 27 anos de recuo em direitos adquiridos.

    Eu entrei nessa questão de defesa da homossexualidade na época da TV Mulher, quando recebia muitas cartas. Comecei a entender que o grande problema não era uma doença, mas a angústia e o desespero de a família não aceitar, de a sociedade marginalizar, de ter de viver com uma identidade que não era o que ele era de verdade, que não era a pessoa com quem ele se identificava, pois tinha de fingir que namorava, quando não queria namorar uma mulher. Era um drama. Aí eu comecei a perceber.

    Isso foi um dos motivos pelos quais entrei na política. Eu achei que só através de lei nós íamos conseguir dar-lhes uma cidadania. Foi em vão nesse sentido de conseguir aqui essa lei, mas, há 20 anos, quando propomos o primeiro casamento gay, na Câmara, nós conseguimos, pelo menos, levar para as salas de jantar uma discussão sobre essa questão. Isso foi um avanço extraordinário! Isso está no plenário até hoje, até desatualizado, mas, se não tivesse tido, nós não teríamos, finalmente, condição de fazer chegar essa questão ao Supremo Tribunal Federal já com amadurecimento de que a homossexualidade não é doença e de que os cidadãos homossexuais têm os mesmos direitos que os heterossexuais. Depois, nós tivemos também uma resolução pelo CNJ obrigando os cartórios que eram contra a obedecerem à resolução do Supremo Tribunal Federal. Isso foi um avanço muito grande, no meio do atraso generalizado que nós vivemos na questão dos direitos.

    Eu estava também pensando na questão, por exemplo, que nós vivemos semanas atrás com o Queermuseu. Ali, eu acho que não havia ninguém certo, porque o curador misturou alguns tipos de arte mais pesadas sem nenhuma advertência. Apesar de o banco dizer que foram treinados os monitores para dizerem que havia obras impróprias, talvez não tenha sido pensada a dimensão do impacto que algumas obras poderiam causar. E deveria ter havido uma advertência mais clara, na entrada da própria exposição. Depois, houve também o banco recuando, numa atitude que também foi muito criticada, com as redes sociais se sentindo muito empoderadas de poderem fazer censura e ainda dizendo que não fizeram censura. Só que o que fizeram propiciou ameaças ao banco. Foi uma questão muito mais ampla e dura do que se cogitou ou do que saiu na imprensa, levando a resultados, como, de fato, retirar uma exposição. É uma exposição que você pode ter em qualquer país do mundo, geralmente, dependendo do país, com uma advertência, como aqui não foi bem-feita, mas que não precisava ser retirada dessa forma.

    Isso me deixou muito preocupada com os caminhos em que nós estamos indo, porque, na hora que você censura uma exposição de arte – pois foi censura –, na hora que você tira do palco uma peça de teatro, como uma que foi retirada semana passada em São Paulo, porque foi criticada como desrespeito à religião, essas questões vão nos colocando de uma forma a pensar que País nós somos, quem que nós somos, onde estão as conquistas que nós tivemos por tantos anos de poder ser quem somos, de poder ter uma liberdade garantida. E é um caminho muito radicalizado, que está levando à violência, inclusive à proibição de questão de gênero nas escolas, que é a grande oportunidade que nós poderíamos ter de discutir uma relação homem-mulher e ver exatamente que a mulher não é um ser menos que o homem. As crianças, muitas vezes, chegam à escola presenciando cenas de discussão em que a mulher fica submissa, porque tem medo, ou apanha; situações desse tipo. Na escola, essa questão vai ser discutida, não com o caso individual daquela criança, mas com as posturas e a reflexão que vão mostrar como a mulher tem os direitos iguais aos dos homens não só na nossa Constituição, mas na prática. É abrir espaços e oportunidades para ver trabalhos, pois a mulher, muitas vezes, não tem a noção de que pode chegar lá, principalmente nas classes mais humildes.

    Então, tanto a questão do respeito à diversidade... Porque essa história de dizer "Não, mas vai lá desencaminhar a criança, que vai virar homossexual ou vai virar transgênero" é de uma desinformação, para mim, que dediquei grande parte da vida a estudar essas questões, que eu fico pasma por estarmos indo nessa direção. As câmaras municipais estão proibindo essas discussões como se fossem levar as crianças à perdição. Isso ocorreu há 20 anos. O resultado que houve nas escolas foi uma diminuição de gravidez – esse é que foi o resultado.

    Então, nós temos que usar as experiências que já tivemos, experiências exitosas de respeito ao outro. Ninguém ensina ninguém a ser o que não é. Agora, nós podemos, sim, ensinar a preservar e a garantir os direitos humanos, o respeito à abertura, à pluralidade, à valorização da diversidade de indivíduos, de grupos sociais e de identidades e a ser contra o preconceito de origem, de etnia, de gênero, de convicção religiosa. Falta de instrução e de conhecimento pode, sim, ceifar vidas, pode infernar famílias, pode acabar com vidas psicologicamente, plantar discriminação e causar essa violência que nós estamos vivendo. Isso é inadmissível, principalmente no Brasil, que foi um país que sempre...

(Soa a campainha.)

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) – ... teve enorme acolhida às diversidades e às diferenças e respeito a todas as religiões.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/09/2017 - Página 52