Pela Liderança durante a 161ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Registro da participação de S. Exª em evento da associação dos ex-alunos da Escola Superior de Guerra.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Registro da participação de S. Exª em evento da associação dos ex-alunos da Escola Superior de Guerra.
Aparteantes
Telmário Mota.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/2017 - Página 23
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, EVENTO, ENTIDADE, EX-ALUNO, ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG), LOCAL, VITORIA, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), DEFESA, NECESSIDADE, NACIONALISMO, PLANEJAMENTO, PAIS, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, COREIA DO SUL, CHINA, CRITICA, EMIGRAÇÃO, CIENTISTA, INTELECTUAL.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, em geral, nós ficamos tão concentrados aqui no dia a dia dos problemas que atravessamos que temos pouca chance de pensar algo mais longe, mais estratégico.

    Eu tive a sorte, no sábado, de participar de um evento, como palestrante, da associação dos ex-alunos da Escola Superior de Guerra na belíssima cidade de Vitória, onde o Senador Ricardo Ferraço me deu a honra de aparecer também.

    E é uma oportunidade rara, porque, de repente, nós estamos diante de cem pessoas, na maior parte de certa idade até, ali interessadas em debater o futuro da Nação, fora do dia a dia, dos problemas que nós enfrentamos.

    E aí o que se viu é que nós, Senador Pedro, temos dois problemas hoje que precisamos enfrentar.

    O problema da coesão nacional. É um País dividido em corporações, em grupos, em siglas, que eu nem chamo de partidos, sem uma unidade, sem um pensamento comum, sem uma torcida, como nós temos na Copa do Mundo, a cada quatro anos. Não há hoje torcida pelo Brasil. Nós torcemos pela Seleção Brasileira de Futebol ou de basquete ou do que for. O Brasil, como entidade, com alma, não está tendo torcidas. Falta coesão. E nós discutimos como retomar coesão.

    E falta rumo de longo prazo. Quem está discutindo os próximos vinte anos? Daqui a quatro anos, nós vamos estar comemorando o segundo centenário da Independência. Quem está discutindo como será o terceiro centenário? Se não na sua integridade de cem anos – que, no mundo de hoje, é impossível imaginar diante da velocidade como as coisas se transformam –, mas, pelo menos, nos primeiros vinte, trinta anos do terceiro centenário. Não se está discutindo.

    E ali, no meio daqueles senhores, ex-alunos da Escola Superior de Guerra, foi possível debater um pouco a coesão e o rumo para o Brasil.

    No que se refere à coesão, muitos de nós chegaram à conclusão de que falta um item para atrair o brasileiro a sentir-se coeso com o Brasil: exemplos dos que estão em cima. Eles me disseram: "Como pode um jovem sentir-se "coesionado" pelo Brasil, quando as direções nacionais, os líderes do País, além de perdidos, estão presos?" Perdidos por falta de ideias que nos unifiquem e presos pela corrupção. Como ter um sentimento de coesão nacional na cabeça dos nossos jovens, quando eles veem que aqui muitas vezes votamos com interesse corporativo e não com interesse nacional?

    O exemplo das direções seria o primeiro passo para trazer uma coesão ao Brasil.

    O segundo é quebrar as mordomias que nós, líderes, dirigentes, temos, distanciados do povo por uma série de vícios que nós temos em relação a privilégios. Eu nem falo só do foro privilegiado, que já é algo que incomoda e quebra a chance de coesão. Eu falo privilégios mesmo no dia a dia, quando nós temos condições salariais, vantagens, atendimentos superiores à população.

    O primeiro passo da coesão seria, sem dúvida, o exemplo. Como ter coesão também com uma estrutura política que nos faz, a cada candidato, gastar uma quantidade imensa de recursos para se eleger? É preciso retomar a coesão nacional. É preciso ter os instrumentos para dar ao Brasil uma coesão.

    A segunda discussão é o rumo. Para onde vamos? Aonde queremos chegar?

    Como vai ser a Nação brasileira nos tempos da alta tecnologia para a qual não estamos preparados duplamente? Não estamos preparados para usá-la nem estamos preparados para produzi-la, porque dois fatos estão ocorrendo hoje: nós estamos afogando os cérebros brasileiros ao negar-lhes a educação de base e nós estamos sofrendo uma fuga de cérebros que buscam outros centros onde desenvolver suas pesquisas e seu conhecimento.

    Ontem, na Comissão de Ciência e Tecnologia, tivemos uma audiência sobre a fuga de cérebros. É assustador, Senador Dário, o que está acontecendo no Brasil. Nós afogamos os cérebros que não terminam o ensino médio de qualidade nem conseguem uma boa universidade. São afogados! E, no caso daqueles raros que nós conseguimos que passem por todo o processo de aprendizado, que viram cientistas, nós sofremos a fuga deles em direção a outros países. Pior é que, até pouco tempo atrás, eles iam em busca de melhores condições de trabalho. Agora, eles vão em busca de melhores condições de vida. Eles vão fugindo da violência nas cidades onde moram; eles vão em busca de dar melhor atendimento a seus filhos, o que não conseguem aqui.

    Ou seja, em um mundo que caminha para ser a sociedade do conhecimento, a economia do conhecimento, nós queremos um rumo, mas não estamos construindo a base do rumo, que é a educação de base e a educação superior para dar condições aos nossos cientistas de trabalharem.

    Já tivemos isso antigamente, quando foi criada a Embrapa, que é um exemplo do que o cérebro brasileiro é capaz de fazer. Fazia-se concurso, e o profissional que entrasse recebia uma bolsa para fazer o doutorado e já voltava empregado, com seu laboratório. Hoje – e o Ciência sem Fronteiras foi um exemplo –, nós mandamos até muitas pessoas para fora, mas voltam sem adquirir o conhecimento necessário, sem um emprego que lhes assegure pôr em prática o que aprenderam, sem os equipamentos necessários. Na verdade, nós temos afogamento, nós temos fuga e nós jogamos fora o que conseguimos construir. Que futuro vamos ter?

    Além do problema do conhecimento, da ciência, da tecnologia, que ramos vamos ter com uma estrutura que amarra o funcionamento da economia brasileira em burocracias, em regras que não estão condizentes com o futuro do mundo? Até que se tentou aqui um primeiro passo com a reforma trabalhista, que entrará em vigor em 11 de novembro. Vamos ver os efeitos dela. Eu sou otimista do ponto de vista da geração de emprego, mas ainda é um passo muito pequeno. O capital internacional, que está sobrando no exterior, não consegue vir para cá por amarras que nós fizemos. Nós somos um País cujo Hino diz: "Deitado [...] em berço esplêndido..."; está errado. Na verdade, é um País amarrado em laços esplêndidos.

    Nós criamos mecanismos de proteção a empresas ineficientes e achamos que isso é progresso. Não é progresso proteger a ineficiência. Ainda temos pensamentos progressistas que consideram que a revolução virá por dentro da economia, como se acreditava no passado, numa época em que não havia globalização, numa época em que o consumismo não estava espalhado, numa época em que não se inventava, a cada dia, um produto novo.

    Hoje, a justiça não virá por dentro da economia, a justiça virá usando o que uma economia eficiente produzir. Não é o que pensam hoje as pessoas que querem um progresso para o Brasil progressista, com justiça; um progresso que vá além da produção, que leve em conta o bem-estar da população.

    Nós não estamos trabalhando na busca de um rumo para o País dar eficiência à nossa economia e, num outro ponto, usar a eficiência da economia para que o País adquira um grau de justiça que nós não temos. E aí entra o que hoje é consenso, apesar de não ser praticado, que é ideia de que a justiça virá usando os recursos de uma economia eficiente para montar um sistema educacional em que o filho do mais pobre estude em uma escola tão boa quanto a do filho do mais rico.

    Não é só por justiça, Senador Telmário; é para não desperdiçar cérebros. Quando dizemos que a escola tem que ser boa igualmente para ricos e pobres, brancos e negros, alguns acham que isso é por justiça; mas não é só por justiça, é por eficiência, porque cada cérebro que nós não aproveitamos dando a educação necessária é um cérebro desperdiçado. E, na economia do conhecimento, o cérebro é a grande riqueza.

    Veja bem, Senador Telmário, se descobríssemos que o ouro de nossas reservas, que o petróleo de nossos postos estava indo embora, haveria uma revolta nacional; mas nós sabemos que os cérebros estão indo embora, e não há revolta nacional. Os cérebros dos nossos cientistas são uma riqueza maior do que o ouro, maior do que o petróleo; e não há revolta contra isso. E mais: não há revolta pelos cérebros que nós desperdiçamos ao não darmos educação.

    Nós estamos assistindo ao afogamento dos cérebros e à fuga dos cérebros calados. Isso foi o que eu vi no sábado, em Vitória, no debate com os ex-alunos da Escola Superior de Guerra, preocupados com o futuro do País, preocupados com o rumo. E esse rumo virá, sobretudo, da capacidade brasileira de usar os seus cérebros para funcionarem como uma grande energia da transformação brasileira, do aumento da produtividade. E, mais uma vez, insisto: isso, só com uma economia eficiente.

    A diferença entre o Brasil e a Coreia do Sul não é apenas que a Coreia investiu muito em educação; é também porque a Coreia fez uma economia eficiente. A economia não tentou deturpar a economia para servir com justiça aos que precisavam, com justiça, correto do ponto de vista ético, moral, mas que não funcionou do ponto de vista técnico. Do ponto de vista técnico, é preciso que a economia seja eficiente. Do ponto de vista da justiça, é preciso usar o resultado da economia para servir ao povo e ao futuro da Nação.

    É uma pena que sejam raros os momentos que temos e usamos para debater a coesão nacional e o rumo do Brasil.

    Eu tive o privilégio de fazer isso sábado de manhã, mas não é com a constância que eu gostaria, como, por exemplo, nesta Casa; não é!

    Mas não há outra saída – e eu concluo, Senador Telmário, e lhe passo a palavra. A saída é aqui, porque a saída tem que ser na democracia.

    A China encontrou coesão e rumo, mas com um estilo de governo que não é o que nós queremos aqui, com o estilo de um partido único, mas com o estilo que deveríamos ter aqui de respeito ao mérito e de busca da eficiência. Buscam eficiência e buscam usar bem a eficiência. Buscam criar coesão e buscam usar a coesão para definir o rumo para o País.

    Eu quero aqui lembrar esse encontro no sábado e dizer da minha satisfação de estar com os ex-alunos da Escola Superior de Guerra, que é um espaço onde se debate o futuro.

    Com muito prazer, passo a palavra ao Senador Telmário, que pediu um aparte.

    O Sr. Telmário Mota (Bloco Moderador/PTB - RR) – Obrigado, Senador Cristovam. V. Exª está falando do patrimônio cultural brasileiro. Realmente, se há um patrimônio físico, como ouro, nióbio, petróleo etc., sendo retirado do Brasil, naturalmente muitas vozes contrárias se levantam e se manifestam. Esse patrimônio cultural e científico brasileiro, realmente, começa a sair, e não há esse barulho, não há essa preocupação, e o prejuízo é imensurável, já muito bem colocado por V. Exª. Ontem, inclusive, eu usei essa tribuna e mostrei minha preocupação de o Ministério da Educação cortar o Pibid, que é a bolsa do aluno-professor, fundamental, fundamental para a motivação. O aluno já começa a ser um professor para as categorias de ensino menores. No sentido de incentivá-lo, o Pibid é da maior importância; abrange no Brasil um patamar muito alto, uma quantidade muito grande de pessoas e está tendo, possivelmente, um corte. Ontem, nós fizemos um apelo ao Presidente da República e ao Ministro da Justiça para que, realmente, não aconteça isso. E quero só parabenizar V. Exª mais uma vez por trazer esse assunto tão relevante, mas também tão desprezado, até pela mídia, pela grande mídia. Eu acho que ela poderia ajudar e chamar atenção para isso. Talvez isso não venda jornais, não venda aos telespectadores, não venda ao apreciador, aos ouvintes dos meios de comunicação. Quero parabenizá-lo. V. Exª tem uma fala que achei interessante: V. Exª diz que a educação para o brasileiro tem que ser com uma bola, redonda! Isso é palavra do Senador que hoje ocupa, com muita honra, a tribuna: de V. Exª. Então, V. Exª diz que educação tem que ser redonda para que todos tenham oportunidade de jogá-la. Parabéns!

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Isso. Muito obrigado, Senador.

    Eu lembro essa fala da redondez da escola, porque, no futebol, todos nós tivemos a mesma chance de Neymar. Agora, não tivemos o talento nem a persistência, mas a bola era redonda para nós também. Na educação, não. Na educação, quem chega lá em cima não é apenas porque teve talento – porque teve também –, mas porque teve uma escola redonda. Os outros, com a escola quadrada, não conseguem chegar, salvo um ou outro que salta por ali e consegue.

    Nós precisamos fazer com que as escolas sejam redondas para todos, mas não só, volto a insistir, por uma questão de justiça, mas por uma questão de inteligência nacional, porque uma escola ruim não apenas sacrifica o aluno que ali está; sacrifica o país inteiro, que perde o potencial do cérebro dessa criança. Lamentavelmente, não estamos conseguindo perceber o afogamento dos cérebros. Até estamos despertando para a fuga dos cérebros, porque as coisas parecem que só acontecem na educação a partir da universidade. O Enem é bastante antigo. Ninguém dava importância ao Enem quando era um exame do ensino médio. Bastou o Enem ser instrumento de escolha de quem entra na universidade, como se fosse um vestibular, e todo mundo descobriu a importância do Enem.

    No Brasil, é como se a educação começasse a partir do vestibular e não antes. E por isso o Governo está cometendo esse crime de cortar as bolsas para esses jovens que se preparam para ser professores desde o ensino médio. Professor não começa a ser professor a partir de entrar na universidade, ele começa lá no ensino médio e é ali que começa a desenvolver a sua vocação, o seu compromisso e o seu conhecimento.

    Sr. Presidente, eu queria apenas saudar esses ex-alunos da Escola Superior de Guerra e dizer da satisfação que eu tive ao poder debater o Brasil na sua falta de coesão hoje e na sua falta de rumo para o futuro. Pena que esse não seja um debate que se tenha todos os dias.

    Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/2017 - Página 23