Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a desnacionalização do setor energético nacional, quando a petrobras recorreu ao sistema de parcerias para disputar blocos de exploração do pré-sal.

Autor
Ângela Portela (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINAS E ENERGIA:
  • Preocupação com a desnacionalização do setor energético nacional, quando a petrobras recorreu ao sistema de parcerias para disputar blocos de exploração do pré-sal.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2017 - Página 112
Assunto
Outros > MINAS E ENERGIA
Indexação
  • CRITICA, ASSUNTO, PRIVATIZAÇÃO, DESNACIONALIZAÇÃO, PETROBRAS DISTRIBUIDORA S/A, MOTIVO, AUSENCIA, REGRA TECNICA, UTILIZAÇÃO, MAQUINA, BRASILEIRA (PI), CRIAÇÃO, NECESSIDADE, IMPORTAÇÃO, VENDA, EMPRESA, DISTRIBUIÇÃO, COMBUSTIVEL, PREÇO MINIMO, MERCADO, RESULTADO, PREJUIZO, PAIS, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

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COORDENAÇÃO DE REDAÇÃO E MONTAGEM - COREM

31/10/2017


DISCURSO ENCAMINHADO À PUBLICAÇÃO, NA FORMA DO DISPOSTO NO ART. 203 DO REGIMENTO INTERNO.

    A SRª ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, em mais um passo no rumo de seu encolhimento e da desnacionalização do setor energético nacional, a Petrobras recorreu ao sistema de parcerias para disputar blocos de exploração do pré-sal brasileiro nos leilões que aconteceram na última sexta-feira, 27 de outubro.

    Na 14ª Rodada, a Petrobras se uniu à gigante americana ExxonMobil para arrematar seis blocos da Bacia de Campos, que estão na chamada "franja do pré-sal". O nome da parceira só foi anunciado no momento de apresentação da oferta bilionária. Juntas, elas pagariam R$ 3,4 bilhões pelas áreas arrematadas.

    Isso significa que, quatro anos depois do primeiro leilão, uma oferta do pré-sal volta a ser feita ao mercado. Serão duas rodadas de ofertas de campos de exploração, as primeiras de uma série de nove programadas até 2019. Sexta-feira, praticamente todas as grandes petroleiras do mundo, multinacionais sem qualquer compromisso com o desenvolvimento brasileiro, participaram da disputa pelos oito blocos em um hotel de luxo no Rio de Janeiro.

    Não foi um bom resultado para o governo. Antes de mais nada, a operação constituía uma das principais apostas da equipe econômica para cumprir a meta fiscal de déficit de R$ 159 bilhões. Mas, em vez disso, os leilões de petróleo da camada pré-sal resultaram em dificuldade adicional para o governo. A frustração de cerca de R$ 1,8 bilhão fará o governo revisar para baixo a estimativa de receitas extraordinárias que entrarão nos cofres federais até o fim do ano.

    Originalmente, o governo pretendia arrecadar R$ 11,75 bilhões em 2017 com os leilões do pré-sal. No entanto, as três rodadas terminaram com arrecadação de R$ 9,95 bilhões. Isso ocorreu porque, nos leilões de sexta-feira, o governo não conseguiu vender dois dos oito blocos ofertados, reduzindo de R$ 7,75 bilhões, valor inicialmente previsto, para R$ 6,15 bilhões, a quantia arrecadada pela União.

    A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, informou que o governo contava com R$ 27,6 bilhões de receitas de concessões no caixa do governo em novembro e dezembro para fechar as contas. Do total, R$ 12,3 bilhões virão do leilão das hidrelétricas da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), que entrarão no próximo mês, e R$ 3,55 bilhões, da concessão de aeroportos, cujo pagamento será feito em dezembro. Traduzindo: são medidas que, para cobrir um déficit momentâneo, dilapidam o patrimônio construído pela população brasileira.

    O restante dos recursos de concessões viria justamente dos leilões do pré-sal, que também ingressariam nos cofres federais em dezembro. No entanto, as receitas finais com concessões em 2017 serão bem inferiores, inclusive por conta de não terem sido vendidas duas áreas no último leilão de petróleo e gás.

    A frustração de receitas se traduzirá em novas medidas de arrocho. Haverá mais cortes nas áreas de educação, de saúde, de segurança pública e de ciência e tecnologia, já fortemente atingidas pelo arrocho orçamentário.

    Haverá também novas medidas restritivas para os servidores públicos. Já se dá como certo que o governo federal suspenderá os reajustes negociados para o ano que vem, assim como elevará a contribuição previdenciária dos funcionários de 11% do rendimento para 14%, o que significa uma inaceitável e inconstitucional redução de salários.

    Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, o problema dos leilões do petróleo tem outros, e graves, contornos. Parte-se da surpreendente produtividade do pré-sal, maior do que se imaginava quando a reserva de 149 mil km2 foi descoberta, em 2007.

    Os campos offshore da Petrobras demoraram 45 anos para bater a marca de um milhão de barris por dia. Os do pré-sal, menos de dez anos. É o desempenho do pré-sal que explica o expressivo interesse estrangeiro pelos leilões, que acontecem em um momento em que todas as grandes empresas se esforçam para cortar custos e evitam se comprometer com investimentos de longo prazo.

    Especialistas são críticos às mudanças que culminaram nesse novo ciclo de exploração do pré-sal. O relaxamento da regra que previa o uso de um percentual mínimo de conteúdo nacional pelas petroleiras - de fevereiro deste ano -, em sua avaliação, vai gerar um volume grande de importações de maquinário e geração de emprego em outros países.

    Os oito blocos nas listas das duas rodadas dos leilões deverão gerar mais de R$ 100 bilhões em investimentos na próxima década. A menor participação da Petrobras na exploração dos blocos ofertados, desperdiça um recurso estratégico. Ela deveria continuar a explorar o pré-sal na medida das suas possibilidades. As reservas são do Brasil, não para o mundo.

    Entre as 14 empresas estrangeiras habilitadas para concorrer, a única que ainda não está presente no Brasil é a Petronas, da Malásia. Na lista há ainda a americana ExxonMobil, a espanhola Repsol Sinopec, a Norueguesa Statoil, a britânica Shell, a francesa Total e as chinesas CNOOC e CNODC. Essas quatro últimas estão no consórcio com a Petrobras que venceu em 2013 e que explora o campo de Libra.

    Tudo isso se insere em um quadro maior de privatização e de desnacionalização. Há menos de duas semanas, no dia 15, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu revogar a cautelar que impedia a venda de ativos da Petrobras. A partir da decisão do TCU, a privatização da BR Distribuidora vai recomeçar do zero.

    A política de venda de ativos da Petrobras é uma espécie de "privatização branca", no essencial pior que a velha privatização praticada no governo FHC. Naquela época, havia ao menos um processo, com etapas definidas em lei aprovada no Congresso Nacional, que determinava procedimentos e permitia algum debate na sociedade. As empresas eram arrematadas em leilão na bolsa de valores, em frente às câmaras de televisão.

    Atualmente, a estratégia de privatização da Petrobras obedece a duas táticas complementares: a privatização de empresas subsidiárias (a apelidada política de "desinvestimento") e a venda de blocos de exploração e extração de petróleo (os chamados "ativos"), a que acabamos de assistir.

    No momento o caso mais saliente de "desinvestimento" é a venda da BR Distribuidora. Por seu turno, em outra esfera concomitante de privatização, põe-se à venda a participação da empresa em águas rasas nos Estados de Sergipe e Ceará. E mais o bloco exploratório BM-S-8 (Carcará), localizado no pré-sal da bacia de Santos, 100% do campo de Baúna (pós-sal da bacia de Santos) e 50% do campo Tartaruga Verde (no pós-sal da bacia de Campos).

    Ora vejam, pretendem vender a BR Distribuidora (comprador ainda não divulgado), em uma conjuntura de recessão, quando o valor de mercado das empresas cai.

    Até mesmo para aqueles que, eventualmente, defendem privatizações, este é o pior dos momentos para vender o patrimônio do povo brasileiro. De fato, acaso privatizadas, as empresas do setor petroquímico, de fertilizantes e de biocombustíveis, o escopo da Petrobras reduzir-se-á à produção de petróleo, enquanto a tendência internacional é transformar as petrolíferas em empresas de energia.

    Pretende-se vender uma das joias da coroa da Petrobras - a BR Distribuidora, que leva a bandeira da empresa a todos os recantos do Brasil com 7,5 mil postos de combustíveis. No capitalismo de hoje, a marca é fundamental. Nenhuma das outras grandes petroleiras pretendem vender a toque de caixa os seus postos de distribuição. Claro que não, pois elas sabem que isso certamente afetaria a difusão da marca.

    A BR Distribuidora é uma empresa lucrativa e de inegáveis potencialidades. A arrecadação se manteve positiva até 2015. Naquele ano, em função da recessão, pela primeira vez desde 1999, a empresa apresentou resultado negativo. Vale dizer: um resultado totalmente conjuntural.

    O apelidado "desinvestimento da Petrobras", associado agora à formatação desses leilões afigura, de forma inequívoca, privatização de empresas públicas, na qual, ao fim e cabo, o Estado perderá o controle acionário de empresas públicas. Ao vendê-las, a direção da Petrobras desrespeita inclusive a Lei 9.491/1997, que dispõe sobre o Programa Nacional de Desestatização, e o Decreto 2.594/1998, que trata dos procedimentos de avaliação.

    A lei exige procedimentos públicos para a venda de qualquer empresa nacional, como, por exemplo, a recomendação da venda em reunião do Conselho Nacional de Desestatização; o depósito de ações da empresa no Fundo Nacional de Desestatização; divulgação dos processos de desestatização pelo gestor do FND; publicação de edital, com justificativa da privatização; indicação do valor econômico da empresa; auditoria externa; oferta de parte das ações aos emprega dos da empresa; enfim, licitação.

    Já a venda dos blocos também não tem amparo legal, por desrespeitar a Lei 8666/1993, que institui normas para licitações, contratos e a transferência de domínio de bens a terceiros em processo de alienação.

    Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, assistimos, portanto, à dilapidação do patrimônio nacional, em uma corrida desesperada a recursos para cobrirem os sucessivos rombos resultantes de uma política econômica ineficaz. Uma vez mais, quem paga a conta são os trabalhadores. São os brasileiros que, com seu esforço, construíram esse patrimônio.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2017 - Página 112