Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a campanha mundial “16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Comentários sobre a campanha mundial “16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”.
Publicação
Publicação no DSF de 30/11/2017 - Página 100
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • COMENTARIO, CAMPANHA, AMBITO INTERNACIONAL, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, REFERENCIA, DIA, LUTA, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS), IGUALDADE RACIAL, IMPORTANCIA, LEGISLATIVO, CRIAÇÃO, MEDIDAS LEGAIS, PROTEÇÃO, NECESSIDADE, INAUGURAÇÃO, CASA DA MULHER BRASILEIRA, ADOÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, OPOSIÇÃO, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL.

  SENADO FEDERAL SF -

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COORDENAÇÃO DE REDAÇÃO E MONTAGEM - COREM

29/11/2017


    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PCdoB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, desde o dia 20/11, pelo Brasil afora, inúmeras atividades marcam o calendário de luta das mulheres brasileiras em torno da Campanha dos 16 dias de ativismo pelo fim da Violência contra as Mulheres.

    A gente deve sempre se referir a estes 16 Dias como sendo "16+5" Dias de Ativismo, pois o Brasil incorpora o Dia Nacional da Consciência Negra - 20 de novembro - à campanha que mundialmente começa no dia 25/11, data do Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher (25 de novembro) e vai até o dia 10 de dezembro.

    Entre uma data e outra, acontece o Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência Contra a Mulher, comemorado no dia 5 de dezembro, data da chamada Campanha do Laço Branco, porque a gente sabe que não o fardo da luta contra a violência de gênero não pode pesar apenas sobre suas vítimas - sob pena de revitimizá-las e penalizá-las!

    O bonito, Srs. Parlamentares e Srªs Parlamentares, é que o período destes 16 (+5) dias engloba uma série de datas que não são "específicas das mulheres", como o já mencionado Dia Nacional da Consciência Negra, o Dia Mundial de Combate à Aids (1º de dezembro) e o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (no dia 3 de dezembro).

    Estas datas têm, muita importância para as mulheres, não só para aquelas que são soropositivas ou que têm alguma deficiência - que não podem ver um filme, ouvir uma música ou entrar num cinema sem acessibilidade -, mas para todas aquelas que sabem que a sociedade machista distribui desigualmente - e não remunera - o chamado trabalho do cuidado.

    Isso é uma questão terrivelmente política, porque é sobre os ombros femininos, sobre as mulheres das famílias, que se deixa o ônus de cuidar de quem adoece, de quem envelhece, de quem está desempregado.

    Os homens, não: vão para a vida - e deixam às tias, avós, mães e irmãs um trabalho de atenção que o Estado cada vez menos garante e cada vez menos prioriza, desde o golpe que sofremos.

    Ontem mesmo, dedicamos uma Pauta Feminina ao tema Violências Sensíveis: pela Valorização das Parteiras Tradicionais - mediada com brilhantismo pela deputada Janete Capiberibe (PSB-AP), e pudemos ouvir parteiras tradicionais dos Estados do Amapá, Pernambuco e Goiás.

    Algumas delas, são mulheres de 80 anos de idade, como D. Flor, do Quilombo do Moinho, ou D. Adiles, de Santo Antônio do Descoberto (GO), que nunca tiveram qualquer reconhecimento pelas centenas de vidas (329, no caso de D. Flor) que ajudaram a trazer ao mundo.

    Como costumo dizer, as mulheres são punidas por dar a vida, por amparar a vida, por alimentar a vida, por cuidar da vida - só que isso não é um problema divino, mas um problema social, que pede solução política e nos cabe a todos e todas discutir.

    Para incentivar essa discussão saudável e necessária, a Procuradoria Especial da Mulher do Senado tem estado presente não só em atividades desenvolvidas aqui no Congresso, mas também em outros estados, como no Ceará, onde Roberta Viegas, coordenadora do Observatório da Violência contra a Mulher, nos representa em encontro na cidade de Fortaleza.

    No dia 20 de novembro, eu mesma tive a imensa honra de estar na cidade de São Luís, capital do nosso querido estado do Maranhão, no lançamento da Campanha dos 16 dias, para falar sobre O Papel do Parlamento no Combate à Violência.

    Efetivamente, a violência racial é uma das muitas faces da violência que atinge as mulheres brasileiras, com o agravante de se perpetuar no chamado racismo institucional, aquela que se instala e se perpetua nas rotinas do atendimento das instituições.

    O racismo institucional é um tipo específico, uma modalidade de violência institucional, termo que mais abrangente, que tem a ver com a violência cometida na prestação de serviços públicos.

    A violência institucional, infelizmente, também pode ocorre nos equipamentos de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

    A Procuradoria Especial da Mulher do Senado tem a experiência de receber e encaminhar as queixas de mulheres em relação às quais a rede de assistência à mulher em situação de violência, infelizmente, falha.

    A mulher que nos procura, queixando-se de mau atendimento, reclama de:

    - Não ser atendida.

    - Não ser atendida ou acolhida com empatia e calor humano.

    - Não ser atendida por uma profissional também mulher.

    - Não ser ouvida sem desconfiança sobre seu depoimento.

    - Não ser informada sobre seus direitos.

    - Não receber todos os atendimentos que são anunciados.

    - Não ser devidamente encaminhada para os outros atendimentos.

    - Não ser devidamente protegida.

    - Não receber os benefícios no prazo certo.

    - Não ser efetivamente inserida no mercado de trabalho, a despeito de tudo que se anuncia sobre os serviços de promoção da autonomia econômica.

    Todos esses fatos nos fizeram adotar como mote dos 16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra a Mulher o seguinte slogan: "Mau Atendimento também é Violência".

    Esta decisão foi tomada em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência, a Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra Mulher, o Comitê pela Promoção da Igualdade de Gênero e Raça, a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos Humanos das Mulheres, a Comissão dos Direitos da Mulher e a Secretaria da Mulher.

    Como procurei destacar em São Luís, diante de lideranças políticas e comunitárias que lotaram o auditório da Assembleia Legislativa, é preciso haver corresponsabilidade entre os poderes em favor da eficiência da rede de atendimento à mulher.

    Infelizmente, projetos importantíssimos para as mulheres, como o da Casa da Mulher Brasileira, criada por iniciativa da presidenta Dilma Rousseff, não foram priorizados por esse governo,

    Até o momento, além das duas casas que Dilma inaugurou no seu curtíssimo 2o mandato, em Campo Grande e em Brasília, apenas uma outra entrou em funcionamento, na cidade de Curitiba.

    Em São Luís, recebi inúmeros apelos de mulheres francamente frustradas porque o governo federal adia a inauguração da Casa da Mulher Brasileira.

    Realmente, senhores e senhoras parlamentares, que outro termo se não frustração?

    A Casa está pronta - com todo material de infraestrutura instalado -, e só está em funcionamento por conta de o Secretário de Governo, Antônio Imbassahy, não liberar a inauguração!

    Essa situação, segundo nos informaram, arrasta-se há meses já!

    Em quase todos os outros estados, a Casa da Mulher Brasileira não saiu do papel. Na minha Manaus está em estágio de topografia, realizada graças a uma emenda parlamentar de nossa Casa.

    Em Roraima, a Casa da Mulher de Boa Vista está pronta, porém sem material de infraestrutura, como móveis e computadores. Na mesma situação, pendente de infraestrutura, encontra-se a Casa da Mulher Brasileira de Fortaleza.

    Já na cidade de São Paulo, o governo federal realizou apenas 85% da obra e ainda precisa de fazer um convênio com o executivo municipal para a concluir o restante.

    Como procuradora Especial da Mulher, não posso aceitar essa negligência.

    O que estamos negligenciando é o investimento no combate à violência assustadora contra as mulheres.

    De acordo com a 1ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública - um estudo realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública - sete pessoas morreram assassinadas no Brasil a cada hora, em 2016.

    Na divulgação destes dados Renato Sérgio Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, fez uma comparação elucidativa:

    "É como se tivéssemos uma bomba atômica por ano no Brasil".

    O relatório aponta que foram assassinadas 4. 657 mulheres em 2016, o que representa 12 mulheres assassinadas a cada dia.

    Deste montante de homicídios de mulheres, apenas 533 destes casos - 3,5% do total - foram enquadrados como feminicídios. Ou seja, houve de 1 a 2 feminicídios por ano em 2016, de acordo com os dados fornecidos pela polícia.

    Não é pouco, mas vejam, essa realidade terrível fica ainda pior se a gente considera os dados do Conselho Nacional de Justiça, cujo Panorama da Política Judiciária de Enfrentamento à Violência Doméstica Contra a Mulher.

    De acordo com os dados do CNJ, que se baseiam em números dos tribunais, em 2016 ingressaram 2.904 casos novos de feminicídios nas Justiças Estaduais.

    Este número é quase cinco vezes maior que os do Fórum.

    Assim, tivemos pelo menos - pois o CNJ não computou dados do Amapá, de Alagoas e do Rio Grande do Norte - de 7 a 8 feminicídios por dia, no Brasil, em 2016.

    Ainda de acordo com os dados divulgados pelo Fórum, em 2016, 49.497 pessoas foram estupradas no Brasil; o que dá uma média de 135 estupros por dia, sendo que só 10% dos estupros são efetivamente notificados no Brasil, de acordo com os estudiosos.

    Outra coisa importante: os especialistas em segurança pública alertaram que a baixa presença das mulheres na corporação policial, estimada em 10%, é um dos fatores que influenciam no atendimento à mulher em situação de violência.

    Vejam só, senhoras senadoras e senhores senadores, 10% é também o marco inicial de representação que demandamos com a aprovação da PEC 134, que ficou de fora da reforma política.

    O nosso Congresso abdicou de votar uma medida que soaria, certamente, como uma das mais importantes e necessárias para a democratização da representação política no Brasil.

    Srªs Senadoras e Senadores, não podemos aceitar como normal esta situação absurda de termos 1.291 câmaras de Vereadores sem nenhuma vereadora (sendo que apenas em 23 de nossos mais de 5.000 municípios, o número de vereadoras supera o de vereadores); e de termos cinco estados (AL, ES, MT, PB e SE) sem nenhuma deputada federal, inclusive um deles - Sergipe -jamais tendo eleita uma mulher para a Câmara dos Deputados.

    Uma das maiores formas de violência que podem ser cometidas contra a cidadania é justamente a de natureza institucional - e nossa obrigação, no Parlamento, é não ser conivente com isso.

    Tanto na polícia, quanto no parlamento, precisamos de mais mulheres, para o bem do atendimento de todas e de todos, para o bem da prestação do bom serviço público, tema da nossa campanha "O Mau Atendimento Também é Violência".

    Lutamos, e vamos lutar sempre, para garantir que a presença das mulheres nos espaços do Estado e da sociedade seja um fator arejador, modificador e renovador da nossa vida em sociedade.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/11/2017 - Página 100