Discurso durante a 182ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações a respeito da importância do Projeto de lei nº 612, de 2011, que visa à alteração do Código Civil para incluir a previsão sobre o casamento homoafetivo.

Autor
Marta Suplicy (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Considerações a respeito da importância do Projeto de lei nº 612, de 2011, que visa à alteração do Código Civil para incluir a previsão sobre o casamento homoafetivo.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2017 - Página 39
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, CODIGO CIVIL, INCLUSÃO, CASAMENTO, HOMOSSEXUAL.

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Ocupo esta tribuna para fazer um discurso que considero bastante importante na minha carreira e também para milhares de pessoas LGBT do Brasil.

    Nós temos amanhã a votação do PLS nº 612, de 2011. Vai ser o casamento entre pessoas e é uma evolução que mais de 20 países e territórios no mundo adotaram e que vai seguir aqui neste século XXI para nós todos que vão, um a um. Numa linha do tempo, já temos casamento entre pessoas nos seguintes países: nos Países Baixos desde 2001; na Bélgica, 2003; Canadá e Espanha, 2005; África do Sul, 2006; Noruega e Suécia, 2009; Argentina, Islândia e Portugal, 2010; Dinamarca, 2012.

    No Brasil, por meio do Supremo Tribunal Federal, desde 2011, veio a decisão em favor da união estável para casais homoafetivos e que, em 2013, ensejou uma resolução do Conselho Nacional de Justiça, instruindo cartórios a realizar a união estável e também casamentos. Muitos cartórios não queriam registrar. Então, por isso é que estamos fazendo a lei. Exatamente para isso, porque já existe essa resolução, mas sempre pode haver um juiz que resolva interpretar de outro jeito. Enquanto não é lei, não se tem a segurança jurídica.

    Também – voltando – em 2013, França, Nova Zelândia e Uruguai reconheceram direitos da população LGBTI. Escócia, Inglaterra, Luxemburgo e País de Gales, em 2014; Irlanda, Finlândia, Estados Unidos, em 2015; e, por fim, mais recentemente, a Colômbia, em 2016; e também, a Alemanha, Taiwan e Malta, em 2017.

    Amanhã, o que estaremos votando em plenário é um projeto de minha autoria, o PLS 612, de 2011 – quantos anos se passaram? –, na forma do substitutivo do Senador Requião, a quem agradeço e faço aqui minhas homenagens pelo aprimoramento que fez ao projeto.

    Quando apresentei o projeto, eu estava contemplando a decisão do Supremo Tribunal Federal para reconhecer a união estável, o que já foi um passo muito significativo porque permitiu a milhares de pessoas que viviam juntas e não podiam ter a proteção da lei passar a ter esse tipo de proteção de uma forma melhor.

    De lá para cá, nós evoluímos, e o Senador Requião contempla, na sua relatoria, no substitutivo, esse processo mais recente. Nós propomos alterar a redação do art. 1.723 da Lei nº 10.406/02, Código Civil, que vai passar a "reconhecer como entidade familiar, a união estável entre duas pessoas, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família". Também propomos alterar a redação do art. 1.726 da referida lei para prever que a união estável poderá converter-se em casamento, mediante requerimento formulado dos companheiros ao oficial do Registro Civil, no qual declarem que não têm impedimentos para casar e indiquem o regime de bens que passam a adotar, dispensada a celebração, produzindo efeitos a partir da data do registro do casamento. Quer dizer, é igualzinho ao das pessoas heterossexuais.

    Na prática, nós vamos consolidar o que existe, desde 2011, graças ao Supremo. E nas sábias considerações do debate que houve, o Ministro do STF Ayres Britto, no julgamento histórico de 2011, falou "nós vamos reconhecer os casais homoafetivos, vamos conceder o mesmo direito que os héteros têm. Note-se – esta frase foi a de que mais gostei – nenhum direito é tirado dos héteros. Nenhum direito!" Não se está tirando direito de ninguém.

    Essas são palavras dele: "Estamos aqui buscando reconhecer a cidadania plena a todos os cidadãos. Vamos, de uma vez por todas, cumprir previsões constitucionais: todos são iguais perante a lei. Ainda, agiremos de acordo com a lei: não é proibida a união de homoafetivos!"

    E vamos exercer nosso papel de legisladores, porque nos cabe dar o exemplo de não discriminação de todos os cidadãos em nosso País.

    É, portanto, uma questão de direitos humanos, de dignidade da pessoa humana, de contribuir com uma sociedade justa e solidária e de promover o bem de todos. Não podemos continuar calados diante do preconceito e da exclusão social que representam um regime de casamento que contempla apenas a maioria das pessoas. Agir em prol de uma sociedade mais justa é defender também as minorias. A sociedade brasileira já sabe disso e aprova, e, para não pairar dúvidas, recentes pesquisas têm revelado o apoio ao casamento.

    Com a maior alegria, o jornal Valor Econômico, no dia 17 de novembro, publicou uma pesquisa do Ideia Big Data, uma pesquisa que foi financiada por um grupo chamado Agora!, de jovens empresários, acredito, e essa pesquisa visava saber várias opiniões, sobre coisas da política e também sobre coisas de comportamento e da cultura. E, para minha surpresa e alegria, 65,5% dos brasileiros são a favor da união homoafetiva, quando duas pessoas assim o desejarem.

    Então, para mim, que estou desde 1995, quando fiz o primeiro projeto de lei, amanhã poder ter no Senado essa aprovação é um dia realmente de muita alegria, de muita realização, e para centenas de pessoas, que, hoje, já têm a possibilidade de adoção pelo próprio Supremo.

    E temos exemplos que, outro dia, também me sensibilizaram, quando uma das pessoas mais batalhadoras em relação aos direitos homossexuais, que é o Toni Reis – acompanhei toda a questão do casamento, como é que foi –, no final, conseguiu adotar três crianças, que já devem estar grandinhas agora, com 11, 12 anos a mais velha, e foram batizadas na Igreja Católica, na Catedral, em Curitiba. Não pude estar presente – teria ficado contente, porque acompanhei tudo isso, como é que foi. Mas Toni recebeu uma carta do Papa Francisco desejando muitas felicidades para aquela família que se constituía, para aquelas crianças que estavam sendo batizadas. Achei isso bastante comovente.

    Assim, não havendo nenhum óbice constitucional, legal ou razão que se configurem impeditivos para a maioria dos brasileiros, não há mais por que adiar essa matéria, não há mais por que o Senado Federal não se pronunciar.

    Faz mais de 20 anos que nós lutamos na Casa Legislativa. O projeto primeiro já está superatrasado. Para vocês terem uma ideia, há 20 anos, nós não podíamos nem falar em casamento; falava-se em parceria civil do mesmo sexo.

    Então, nós conseguimos caminhar. Tenho que dizer que a sociedade brasileira, às vezes, é um pouco preconceituosa, parece machista – também é –, mas estamos caminhando.

    Acredito que um dos instrumentos mais eficazes dessa possibilidade de tolerância, de amor ao próximo tem muito a ver, Senador Lindbergh, com as novelas. As novelas tiveram papel importantíssimo neste País, porque elas foram as primeiras.

    Eu lembro quando elas começaram a falar de homossexualidade: foi quando o projeto começou a ser discutido lá na Câmara dos Deputados, e eram homossexuais estereotipados que apareciam. Então, eles ficavam revoltados e tal, mas, aos poucos, isso continuou a ser discutido, e a sociedade, aos poucos, foi mudando de opinião: 20 anos, 30 anos, não são tantos, para hoje nós termos 65,5% da população brasileira a favor.

    Então, amanhã, espero que esta Casa dê esse passo histórico, e, aí, caminhará para a Câmara.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2017 - Página 39