Discurso durante a 195ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à suposta politização da Justiça em referência ao julgamento do ex-Presidente Lula pelo TRF da 4ª Região, agendado para o dia 24 de janeiro de 2018.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Críticas à suposta politização da Justiça em referência ao julgamento do ex-Presidente Lula pelo TRF da 4ª Região, agendado para o dia 24 de janeiro de 2018.
Publicação
Publicação no DSF de 20/12/2017 - Página 52
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • CRITICA, JUDICIARIO, MOTIVO, VINCULAÇÃO, POLITICA, REFERENCIA, JULGAMENTO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, CORRUPÇÃO, ENTENDIMENTO, AUSENCIA, CRIME, ASSUNTO, IMOVEL, GUARUJA (SP), DESAPROVAÇÃO, CONDENAÇÃO, SERGIO MORO, JUIZ FEDERAL, DEFESA, CANDIDATURA, EX PRESIDENTE, CARGO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente. Também aproveito para parabenizar o Senador Wellington e a Bancada federal por essa conquista.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos ouve pela Rádio Senado, quem nos assiste pela TV Senado. Na semana passada, nós fomos surpreendidos – nós, do Partido dos Trabalhadores, mas acredito que também todos os setores progressistas da sociedade brasileira – com a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região de pautar o recurso do Presidente Lula, do seu julgamento, para o dia 24 de janeiro, primeiro dia em que a Justiça volta do recesso.

    Esse recurso foi interposto pelo Presidente Lula ao Tribunal Regional Federal em cima de uma sentença do Juiz Sergio Moro que condenou o Presidente Lula a nove anos de prisão.

    Eu já vou falar um pouco do processo, mas eu quero falar o que nos causou estranheza de o Tribunal Regional Federal ter marcado o julgamento para o dia 24. Não é errado o Tribunal marcar; é da natureza de um tribunal marcar julgamentos. O que nos deixou impactados foi exatamente o tempo rápido, recorde, que o tribunal marcou.

    Não que nós queiramos que a Justiça seja morosa. Muito pelo contrário: a gente tem reclamado muito da morosidade da Justiça. Agora, a Justiça não pode ser temerária. E eu vou dizer por que, Senador Cristovam. Esse processo do Presidente Lula tem 250 mil páginas. É um processo de 250 mil páginas. O Relator, quando recebeu o processo, levou 36 dias para fazer o relatório. O que já é algo admirável, você relatar um processo de 250 mil páginas em 36 dias. Ocorre que o revisor, o juiz revisor do processo levou, Senador Armando, seis dias para fazer a revisão. Seis dias, Senador Armando.

    Isso quer dizer que ele leu 2 mil páginas por hora, sem dormir, durante seis dias. Duas mil páginas por hora, sem dormir, durante seis dias, o que é humanamente impossível. E, se deixou de ler, me desculpa, prevaricou, pela responsabilidade que tem. Um juiz relator e um juiz revisor devem conhecer a fundo o processo sobre o qual vão dar o seu parecer.

    Esse é o mesmo tribunal cujo Presidente, Dr. Thompson Flores, deu uma declaração no jornal Zero Hora, se eu não me engano, lá de Porto Alegre, dizendo que a sentença que condenou o Presidente Lula era irretocável, para, em seguida, afirmar que não tinha lido o processo.

    Eu chamo atenção para isso porque não é possível, em um Estado democrático de direito, que a Justiça tenha esse comportamento. Por isso que nós, do PT, por isso que nós, da esquerda, por isso que setores progressistas são levados a dizer que a Justiça está politizada. Não é possível ter uma análise adequada em um processo controverso, questionado, com tantas páginas, num curto espaço de tempo.

    E acrescente-se aí que esse processo passou na frente de muitos outros que estão lá, esperando uma decisão.

    Ele é injusto com o Presidente Lula, visto que não se aprofunda na análise – os juízes não se aprofundam na análise –, e é injusto com aqueles que aguardam uma decisão da Justiça há mais tempo. É por isso que nós questionamos; é por isso que subimos a esta tribuna, falamos à imprensa e dedicamos a nossa reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, dias 14 e 15, a analisar essa situação esdrúxula, porque entendemos que ela é um atentado à democracia.

    Tem que haver regras que atinjam a todos de modo igual. Não há excepcionalidade no Direito e na Justiça. O processo tem que ser igual para todos. É só isso que nós estamos reclamando.

    E aí eu tenho que fazer uma análise da sentença que condenou o Presidente Lula, e quero dizer aos senhores que não é uma análise minha ou do PT. Nós temos um livro feito por 122 juristas brasileiros, juristas de renome nacional e internacional. A maioria não é filiada a partido político ou não milita politicamente. Juízes que disseram que a sentença do Juiz Sergio Moro não tem base jurídica, visto que não tem o fato, visto que não tem prova.

    E eu vou aqui explicar, tentar explicar, numa linguagem que não seja jurídica, o que eles querem dizer.

    O Presidente Lula foi acusado de corrupção passiva nesse processo, por ter, segundo o Juiz Sergio Moro, sido beneficiado com um apartamento no Guarujá.

    Analisemos a situação, para saber se nós temos o fato nessa situação, porque eu ouso dizer que não é nem um problema de ausência de provas; é um problema de ausência de crime.

    A corrupção passiva é um crime que só se dá por mãos duplas, vias de mãos duplas. A pessoa tem que ter dado a alguém algo que lhe interessasse e recebido desse alguém uma remuneração, um presente, um favor em troca do que ela recebeu. Então, para caracterizar a corrupção passiva que o Juiz Sergio Moro quis caracterizar no processo, o Presidente Lula teria que ter recebido o apartamento do Guarujá, ter se utilizado e se beneficiado dele e, em troca, teria que ter dado à empresa OAS um benefício objetivo e que pudesse ser medido.

    Vamos aos fatos. O Presidente Lula nunca recebeu o apartamento do Guarujá. Como todos sabem, lá atrás ele tinha comprado uma fração, para depois fazer a opção de compra do apartamento, e não fez essa opção de compra do apartamento. Tanto é verdade, que esse apartamento continua em nome da OAS e foi dado em garantia num processo junto a um fundo de financiamento da Caixa Econômica Federal. Isso está lá, e o documento está no processo.

    Então, o apartamento nunca foi do Presidente Lula, porque a cota nunca significou a propriedade do apartamento; apenas uma cota, que viraria uma opção. Segundo, o Presidente Lula nunca usufruiu do apartamento, nunca morou nele, nunca esteve passando férias nele, nem por dois dias. Então, não há utilização de um benefício por parte do Presidente Lula nem há um ganho material, visto que não é dele o apartamento.

    Segundo, está nos autos a constatação do próprio Juiz Sergio Moro, que esclarece que ele nunca falou, nos autos, que o Presidente Lula beneficiou a OAS com os recursos da Petrobras. Ele falou apenas que o Presidente Lula tinha relação, conversava com o Presidente da OAS. Imagina, Senador Armando, se nós aqui formos condenados por conversarmos, seja com empresário, seja com empreiteiro, seja com Senadores, seja com quem quer que seja. A função de um político é conversar, de um político que está no Parlamento e um político que está no Executivo, principalmente com a empresa que fazia várias obras para o governo e que precisava ter reuniões, sim, com o governo e com o Chefe do Executivo.

    Então, temos um processo que é injusto em relação ao Presidente Lula, porque não há o crime. Volto a perguntar aqui, diversas vezes perguntei desta tribuna: qual é o crime, Juiz Sérgio Moro, que o Presidente Lula cometeu? Qual é o crime? Corrupção passiva? Ok. Qual é o fato, a prova fática que mostra que teve corrupção passiva? Que o apartamento está em nome do Presidente ou que ele usufruiu do apartamento? Ele é um não dono, porque ele visitou o apartamento um dia para ver se fazia a opção de compra ou porque alguém prometeu que iria melhorar o apartamento para ele caso ele fosse proprietário do apartamento?

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Ele é um não dono.

    Além de condená-lo irregularmente por nove anos de prisão – e quem diz isso são juristas que assinaram textos de um livro, histórias de uma sentença anunciada –, agora ele vai ser julgado de maneira rápida, ágil, tão ágil que nem sequer o revisor conseguiu ler o processo. Quero saber o que ele vai falar do processo. Como alguém revisa um processo de 250 mil páginas em seis dias? É humanamente impossível.

    Então, estamos, sim, contestando isso, a bem da democracia, a bem da verdade e a bem da justiça, porque, se fazem isso com o Presidente Lula, fazem isso com qualquer um. Aliás, a Justiça brasileira deve muita explicação ao povo brasileiro, porque sistematicamente tem feito desmandos em processos, dos mais pobres até setores medianos e mais ricos da sociedade.

    Nós queremos uma Justiça que trate a todos igualmente, que se paute pelo devido processo penal, pela legalidade. É isso que nós pedimos. Por isso, nós vamos fazer manifestação em Porto Alegre, sim, porque, se querem politizar, vieram para nossa seara, vieram para o nosso terreno. Nós fazemos política e é com a arma da política que vamos fazer o embate.

    O Brasil está se mobilizando, como já fez, para acompanhar o Presidente Lula nos interrogatórios dele em Curitiba. Estaremos, sim, em Porto Alegre, estaremos com o tribunal paralelo, estaremos com aulas da democracia, com aulas do Direito, estaremos com juristas nacionais e internacionais, estaremos com lideranças políticas. E queremos saber qual é o crime do Presidente Lula, porque julgar o Presidente para tirá-lo da corrida eleitoral é um outro atentado à democracia. Já não basta o atentado do julgamento, sem prova e sem crime, de marcar um julgamento de recurso de forma açodada, ainda o objetivo é afastá-lo do pleito eleitoral.

    O Presidente Lula não é mais candidato do Partido dos Trabalhadores, nós não requeremos mais essa candidatura. Ele é candidato de parcela expressiva da população brasileira, goste a outra parcela ou não. Cabe ao PT defendê-lo, cabe ao seu Partido defender o direito de ele ser candidato, como eu defendo o direito de qualquer um ser candidato, inclusive de gente de extrema direita, porque é no debate político que temos que fazer o enfrentamento. E é por isso que nós dizemos que nós temos a terceira fase do golpe. A primeira tirou a Dilma, a segunda tirou os direitos e a terceira não quer deixar um dos maiores líderes populares da história concorrer à Presidência da República.

    A última pesquisa Vox Populi que a CUT (Central Única dos Trabalhadores) fez dizia que 56% da população acha que o Presidente Lula tem direito a ser candidato e deve deixar o povo fazer seu julgamento nas urnas.

    Nós estamos falando de um homem que está sendo perseguido por três anos consecutivos, que toda noite entra na casa das pessoas através da televisão, e principalmente através da Rede Globo, como um bandido, como um chefe de quadrilha, como o maior corrupto da história.

    Quero dizer para vocês: o Presidente Lula mora no mesmo apartamento em que morava antes de ser Presidente da República. Eu desafio aqui outro Presidente que esteja nessa situação. Pois é esse homem que entra como bandido na casa de todos pela ação da Globo que o povo olha e diz que ainda o quer Presidente da República. Há alguma coisa errada nesta valoração, há alguma coisa errada nessa análise. Não é possível que o sacrossanto e casto Judiciário com a sacrossanta e casta Globo estejam certos e quase metade da população brasileira, errada, porque é isto que está dando na pesquisa de segundo turno: o Presidente Lula tem quase 45%.

    Aliás, na própria pesquisa Datafolha e Vox Populi, ganharia no primeiro turno. Não é possível enganar tanta gente por tanto tempo, sendo bombardeado como ele foi. Alguma coisa há de errado, e, com certeza, não é com o povo. O povo está fazendo a sua análise: o que significou o governo de Lula e o que estão significando as mudanças de agora.

    Por isso, subo a esta tribuna para fazer um grito pela democracia, pelo direito, um grito para que a gente possa realmente efetivar um processo democrático neste País, de Lula ser candidato. Se querem derrotá-lo, é do jogo, mas façam isso nas urnas. Façam isso na disputa eleitora, não no tapetão. Fica feio para o Brasil. Aliás, vai ficar muito feio.

    E, por final, quero dizer: Lula ficará candidato. Ficará candidato, será registrado e nós vamos brigar até a última ação para ele continuar candidato e vamos brigar politicamente, porque Lula é candidato pelo povo brasileiro.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – E é dever de quem está na política hoje defender o processo democrático.

    Eu espero que tenhamos eleições livres e democráticas em 2018 para que todos que estão colocados aí, candidato do PDT, do PSB, do PSDB, do Democratas, do PSC, possam participar e levar à sociedade as suas propostas. O povo dirá quem irá representá-lo no Palácio do Planalto.

    Pela justiça, pela democracia e pelo direito do Lula ser candidato a Presidente da República.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/12/2017 - Página 52