Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à proposta do Governo Federal de reforma da previdência.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Críticas à proposta do Governo Federal de reforma da previdência.
Publicação
Publicação no DSF de 07/02/2018 - Página 34
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • CRITICA, ASSUNTO, REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL, ENFASE, AUMENTO, TEMPO, TRABALHO, TRABALHADOR, REGIME GERAL DE PREVIDENCIA SOCIAL.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos assiste pela TV Senado e nos ouve pela Rádio Senado e também nos acompanha pelas redes sociais, o tema que me traz à tribuna hoje é a reforma da previdência, a fatídica reforma da previdência.

    Acabo de sair da Câmara dos Deputados, com um grande ato de Senadores, Deputados da oposição, também lideranças sociais, entidades, sindicatos, muita gente reunida lá num ato contra a reforma da previdência, alertando a Câmara dos Deputados para que o Presidente não coloque em votação essa reforma, porque vai ter muita luta e um processo permanente de obstrução.

    O Governo tem feito uma propaganda e dito que esta reforma não prejudica os mais pobres, não prejudica o povo brasileiro, apenas os do andar de cima. Se fosse os do andar de cima, eu votaria nessa reforma da previdência com muito prazer. O problema é que não é isso; o problema é que atinge, sim, os do andar de baixo, atinge, sim, aqueles do Regime Geral de Previdência Social.

    Eu quero começar a falar com vocês pela idade mínima que foi alterada. Hoje, para o homem se aposentar, ele precisa de 60 anos, e, a mulher, de 55. Pois bem, essa reforma passa, para os homens se aposentarem, a 65 anos, e, para as mulheres se aposentarem, a 62 anos, sem levar em conta o tempo de mercado de trabalho, sem levar em conta o tempo de trabalho.

    E agora criou uma outra coisa, que é o gatilho demográfico: a cada período de tempo essa idade vai ser acrescida de mais um ano. Nós levamos dez anos para acrescer um ano a cada década, nos últimos 70 anos. Não é o que vai acontecer agora. Nós vamos ter um espaço mais curto de tempo. Então, daqui a dois ou três anos, em vez de o homem ter que se aposentar com 65 e a mulher com 62 vai passar a 66 e a 63, respectivamente, e assim vai.

    Por que eu digo que ela é prejudicial aos mais pobres? Porque são os mais pobres que sofrem. Por quê? Porque os mais pobres começam a trabalhar mais cedo independentemente, muitas vezes, de contribuir com a previdência. Os mais pobres trabalham em situações mais críticas para suas vidas. Dificilmente você tem uma pessoa que não tenha formação universitária, que não tenha condições melhores de formação trabalhando em condições salubres.

    Onde trabalham os mais pobres neste Brasil? Na construção civil, na limpeza pública, trabalham no serviço pesado. Essa reforma coloca a idade igual para todo mundo – não importa se é peão ou se é doutor, não importa se trabalha no ar-condicionado ou trabalha no calorão, no sol, na chuva. Vai ser a mesma idade, assim como para o agricultor. Nós sabemos a diferença que isso faz. Nós trabalhamos aqui nesta Casa – olhem que legais esses carpetes azuis –, somos bem tratados, tomamos água, café. Tudo muito legal. Nós não temos o sol na nossa cabeça, não temos a chuva na nossa cabeça. A maioria aqui começou a trabalhar com idade muito acima dos 16, 17 anos que não é o que acontece com o agricultor. Nós não podemos votar uma regra geral para uma população que não é igual em todo o País. É por isso que afirmo: atinge, sim, a maioria e a maioria pobre do povo brasileiro, e principalmente as mulheres que têm uma elevação de sete anos a mais para se aposentarem enquanto os homens têm uma elevação de cinco anos para se aposentar. Então, nós somos contra.

    Outra coisa é o tempo de contribuição. A reforma está exigindo agora para você se aposentar integralmente com o teu salário de ativa, 40 anos de contribuição. Atualmente, para se aposentar, para ter o acesso à aposentadoria integral, você precisa comprovar 35 anos de trabalho para os homens e 30 para as mulheres, não precisando ter contribuído esse tempo inteiro. Então, vejam, estamos mudando o tempo de trabalho para tempo de contribuição. De novo, eu quero alertar aqui. Quem é classe média, classe média alta – vá lá –, segura o tranco, tem condições, mas para o pobre isso aqui afeta. Vamos lembrar que a nossa população – cerca de 80% – ganha menos que R$4 mil, que o desembargador que tomou posso num Tribunal de Justiça esses dias disse que é muito pouco para ele ter como auxílio-moradia, mas é o salário de mais de 80% da população –aliás, o teto. Então, é sobre isso que estamos falando: sobre gente pobre que vai ser impactada, tendo que pagar mais à Previdência, tendo que abrir mão da sua renda.

    Outra coisa é o cálculo da aposentadoria. Antes, o cálculo da aposentadoria era feito, em geral, pelos 80% das maiores contribuições que a pessoa dava. Isso aumentava um pouco a aposentadoria. Agora, vai ser por 100% da contribuição. Então, você pega salário mais baixo, salário mais alto e isso tira, em média, 15% do salário da pessoa. Para quem ganha dois salários mínimos é muita coisa. Pode ser que para a gente, que ganha bem aqui, não seja, mas para quem ganha dois salários mínimos ou três salários mínimos é muita coisa.

    Outra barbaridade é aposentadoria e pensão. Não vai mais poder acumular. Então, eu sou aposentada, contribuí minha vida inteira e me aposentei. Meu marido era aposentado e morreu. Ele me deixou uma pensão e eu fiquei com a minha aposentadoria. Os dois contribuíram para o INSS. Agora, não se pode mais acumular e eu tenho que escolher: se ele morreu, eu tenho de escolher se eu fico com a pensão dele ou se eu fico com a minha aposentadoria. Se eu ficar com a pensão dele, eu só posso ficar com a metade e perco a minha aposentadoria. Então, eu tenho que optar apenas pela minha aposentadoria, porque, do contrário, eu teria uma redução enorme da renda.

    E nós estamos falando aqui de grande parte da população que ganha R$4 mil. É isso. Atinge o andar de cima? Não sei se atinge os mais beneficiados. Duvido que atinja os juízes e o pessoal do Ministério Público, que têm um monte de penduricalhos no salário. Atinge coisa nenhuma! E, depois, se atingir, essa gente vem na mesma hora aqui e faz lobby. Todo mundo aceita o lobby deles. Já conheço. Convivo nesta Casa. O que não vem aqui fazer lobby é o povão. Este não vem! Quem ganha até quatro, cinco salários mínimos não consegue nem passar pela porta; o segurança não deixa, há segurança aqui e não deixa. Mas, se entrou com o brochinho da Magistratura, do Ministério Público, engravatado da alta hierarquia do serviço público, entra, vai aos gabinetes, senta aqui, conversa. Não há problema! Então, essa gente vai se livrar, o pobre vai sofrer. É por isso que nós somos contra a reforma da previdência.

    Essa reforma penaliza muito as mulheres. Já falei: as mulheres vão ter que trabalhar sete anos a mais para conseguir se aposentar, pois passa de 55 para 62 anos a idade da aposentadoria. Mas o tempo de trabalho para alcançar a aposentadoria aumentará em 10 anos. Hoje são necessários 30 anos de trabalho. A mulher vai ter que contribuir por 40 anos, são mais 10 anos. O homem são 35 anos; então, serão mais 5.

    Eu quero saber o que eles têm contra as mulheres. Jesus! É uma coisa de perseguição contra as mulheres. Tiraram o recorte de gênero de todos os documentos, não querem programas de gênero nas escolas e agora estão fazendo isto, aumentam a idade para a mulher se aposentar, aumentam o tempo de contribuição.

    Qual é o problema de vocês? Que barbaridade misógina e machista é essa? Eu quero saber como os Senadores vão votar aqui, porque os Deputados eu vou ficar olhando lá e quero perguntar a eles: o que o senhor tem contra as mulheres? O que o senhor tem contra a sua mãe e a sua mulher? Porque o que eles estão fazendo com as mulheres nessa reforma da previdência é um absurdo! Por isso é que nós somos contra.

    Se a nova regra entrar em vigor, faltando um dia para a aposentadoria – no caso em que a mulher tem lá 29 anos, 11 meses e 29 dias de contribuição –, mas não dá para se aposentar naquele dia, e a reforma entrar no dia seguinte, ela vai ter que contribuir por mais 10 anos. Não há nenhuma regra de transição. Isso é uma loucura!

    A gente tem que saber que as pessoas fazem planos nas suas vidas. A gente tem que saber que as pessoas planejam. Não são só os Srs. Deputados e Senadores que planejam as suas campanhas e as suas vidas políticas, ou o Senhor Temer que planeja a sua eleição e está querendo a reeleição, ou o Sr. Meirelles que fica falando bonito. As pessoas planejam as suas vidas, e geralmente planejam em condições piores do que as nossas, com salários menores. Então, como se pode fazer isso?

    E as professoras do ensino infantil, então, que hoje se aposentam com 25 anos de contribuição, serão ainda mais prejudicadas, pois, para ter a aposentadoria integral, terão de pagar 40 anos, ou seja, vão ter que trabalhar 15 anos a mais!

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Os senhores já cuidaram de crianças pequenas? Já? Talvez de um ou dois filhos, mas muito ajudando a mulher, porque são poucos os homens – hoje, mais – que o fazem. Acho que, pela faixa etária deste Senado, poucos colaboraram. São poucos os homens que cuidam de criança: lavar o bebê, dar de comer, trocar fralda, aguentar o choro, medicar... Então, imaginem uma professora de educação infantil que tem 25, 30 crianças em sala de aula. Vocês querem que ela trabalhe por 40 anos? Onde é que vocês estão com a cabeça? Que loucura é essa, gente? O que vocês têm contra as mulheres e as professoras? E assim as professoras também de outra área. Por último, eu tenho que falar dos trabalhadores rurais, porque essa é a principal sacanagem e crueldade dessa reforma. Nós aprovamos, na Constituição de 1988 – peço só mais um minuto, Sr. Presidente –, a aposentadoria especial para os trabalhadores rurais, para os agricultores. Por quê? Porque eles não têm renda fixa. Então, nós fizemos uma modalidade que paga...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – ... 2,5% em cima do que eles vendem de produtos e fizemos a aposentadoria especial para eles, com idade menor, de 55 anos para homens e 50 para mulheres, e também com uma contribuição menor: têm que mostrar que trabalharam 15 anos, e aí começam a receber.

    Eles mudaram tudo! Agora, vai ter que ser igual ao da cidade: pagar INSS mês a mês, idade igual para homem e para mulher da cidade, vai ganhar e vai ter os seus redutores do mesmo jeito... Jesus! Essa gente coloca o alimento na nossa mesa, trabalha de sol a sol, ganha pouco!

    Eu estava falando com os agricultores do meu Estado, o Paraná. O litro de leite está 80 centavos, 90 centavos. Eu pago, no supermercado, mais de R$3, R$4. E agora querem tirar a aposentadoria dos trabalhadores rurais? Qual é a cabeça que nós temos? Qual é a cabeça, Brasil, que está governando os nossos dias?

    Eu espero que o Senado da República possa recompor essa injustiça.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/02/2018 - Página 34