Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao Governo Federal pela ineficácia das ações tomadas para sanar a crise migratória que enfrenta o estado de Roraima.

Autor
Ângela Portela (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Críticas ao Governo Federal pela ineficácia das ações tomadas para sanar a crise migratória que enfrenta o estado de Roraima.
Outros:
Publicação
Publicação no DSF de 20/02/2018 - Página 42
Assuntos
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Outros
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INEFICACIA, PLANO, CONTENÇÃO, CRISE, MIGRAÇÃO, CIDADÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, FRONTEIRA, ESTADO DE RORAIMA (RR), NECESSIDADE, SEGURANÇA PUBLICA, SAUDE, APROVEITAMENTO, PREPARAÇÃO, TRABALHADOR, IMIGRANTE.

    A SRª  ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, tenho falado com muita frequência aqui, no plenário do Senado Federal, sobre a situação grave que Roraima enfrenta, o fluxo migratório intenso em nosso Estado. Mas, tardiamente, o Governo Temer, enfim, reagiu e foi a Roraima para ver como estava a situação dos refugiados venezuelanos em nosso Estado.

    Uma delegação de ministros, em primeiro lugar, e depois a própria presença do Presidente numa reunião que envolveu toda a classe política de Roraima, com o intuito de buscar uma solução ou, pelo menos, amenizar os problemas enfrentados tanto pelos roraimenses, quanto pelos venezuelanos.

    À parte o jogo político, puderam constatar o Presidente e seus ministros os problemas que temos denunciado aqui, no plenário deste Senado Federal, inúmeras vezes, como a elevada proporção de migrantes, que já supera os 10% só na nossa capital Boa Vista.

    É evidente que o Estado não dispõe de infraestrutura suficiente para fazer frente a essa brutal e inesperada demanda.

    O Presidente anunciou, depois, um pacote de medidas com as quais pretende enfrentar essa crise. Muitas delas são providências que já defendemos aqui, no plenário do Senado, como a possibilidade de aproveitar as capacidades de trabalho dos migrantes, muitos dos quais têm escolaridade acima da média. Segundo dados da Polícia Federal, em torno de 25% dos venezuelanos em Roraima têm nível superior.

    Esse pacote anunciado, porém, deixa dúvidas. Nada há de preciso nas medidas mais importantes. Não se sabe sequer o volume de recursos envolvidos, recursos que são indispensáveis para um Estado já extenuado financeiramente pelo desafio que enfrenta com essa crise há dois anos.

    De resto, ficou a sensação de que parcela substancial da medida provisória assinada pelo Presidente se resume a ações já previstas pela legislação brasileira, em especial a Lei de Migração – que nós aprovamos aqui no ano passado e que foi promulgada em 24 de maio de 2017.

    A verdade é que faltam à Roraima os instrumentos essenciais para fazer frente a essa onda migratória, ainda mais envolvendo Municípios tão pequenos como Pacaraima. Mesmo Boa Vista, nossa capital, que tem mais de 300 mil habitantes, não tem como suportar, em curto prazo, o ingresso de mais de 50 mil pessoas, quase todas famintas e sem horizontes.

    Os problemas maiores se refletem na vida urbana: os milhares de imigrantes circulam pelas ruas; ao menos 25% deles estão em situação de rua, morando nas praças, debaixo de árvores, com crianças, com adolescentes, com recém-nascidos. É uma situação de dar dó. Os abrigos estão superlotados e os próprios venezuelanos já os evitam não apenas pela superlotação, mas também por alegarem insegurança.

    O panorama urbano se deteriorou drasticamente. Nossa capital está numa situação de penúria. Uma cidade linda, bonita, mas com um ambiente totalmente deteriorado diante desse cenário de horror, de pessoas, de seres humanos perambulando pelas ruas, pedindo emprego, pedindo comida. A mídia tem mostrado isso para todo o Brasil.

    Inevitavelmente, criou-se forte demanda dos serviços de saúde, educação e segurança, impactados com a enorme procura dos imigrantes debilitados. A rede local está há meses, há anos em situação crítica. Ações emergenciais se tornaram imprescindíveis, como a vacinação que se tem feito em áreas de larga concentração de imigrantes venezuelanos, como na Praça Simón Bolívar.

    Nesse final de semana, houve imunização contra o sarampo, doença já erradicada do Brasil, mas identificada entre os imigrantes. A média de vacinação superou 700 por dia. A ação mais incisiva na fronteira, caso da adoção de barreira sanitária, foi solicitada pela Governadora Suely Campos durante videoconferência realizada ainda em dezembro de 2016. Após esse diálogo, o Presidente prometeu tomar providências, mas a barreira nunca foi instalada.

    Veja bem, Sr. Presidente, a Governadora participou de uma videoconferência com o Presidente em 2016, solicitando o apoio para a instalação de uma barreira sanitária lá em Roraima. O resultado é que ingressam no Brasil portadores de diversas doenças contagiosas, como é o caso do sarampo, identificado nesse fim de semana.

    Então, ela pediu, mas o Presidente não instalou a barreira, como ela havia solicitado ainda em 2016.

    Na educação também existe forte demanda por parte das famílias venezuelanas, que costumam migrar com filhos pequenos. A proximidade da abertura do ano letivo agravará mais ainda essa situação.

    O impacto da imigração venezuelana aumentou em 70% a pressão sobre a rede de saúde e tende a chegar ao mesmo nível na rede de educação à medida que a presença dos imigrantes se torne mais estável. Impacto mais difícil de mensurar se dá sobre a segurança, mas é também extremamente elevado.

    A economia de Roraima é fortemente atingida pela presença dos venezuelanos, que altera de forma dramática a correlação entre oferta e demanda de empregos.

    É na segurança que se registram episódios mais dramáticos, que pressionam por soluções mais urgentes.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, a responsabilidade fundamental é do Governo Federal. O art. 21 da Constituição diz que compete à União manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais. O inciso XXII do mesmo artigo estabelece como competência privativa executar os serviços de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras. Também é de competência exclusiva da União planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas.

    Pelo art. 22, apenas a União pode legislar sobre imigração e emigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros. Impõe-se, portanto, que se tomem medidas urgentes para socorrer Roraima. É fundamental. É urgente.

    Essa necessidade tornou-se dramática no que se refere a abrigo e atendimento emergencial aos imigrantes, inclusive sob a forma de tendas e acampamentos com infraestrutura básica.

    Nós vimos aqui o Senador Telmário denunciando a grave situação diante das chuvas. Há filas imensas de imigrantes debaixo das construções dos prédios, procurando um espaçozinho pequeno, mínimo, para não se molharem nas chuvas com seus filhos, com suas crianças. Isso já ocorreu em episódios recentes, como no Acre. Trata-se de solução paliativa, embora indispensável, e não dispensa a adoção também de medidas de caráter permanente, mais tarde.

    É indispensável também que se forneça a Roraima um reforço à segurança pública. Não se pode conviver com a atual condição de incerteza tanto para os roraimenses quanto para os venezuelanos.

    É evidente a necessidade de auxílio emergencial às redes de saúde, educação e segurança, com possibilidade de se tornar permanente no trato de problemas que se mostrem estáveis. O envio de medicamentos e de equipamentos médicos é essencial, mas não se esgota na ajuda de emergência. Deve-se levar em conta a possibilidade de permanência dos migrantes por período mais longo.

    Enfim, Sr. Presidente, precisa-se desenvolver uma política de amparo no que se refere ao aproveitamento do potencial econômico dos migrantes, como planejamento e execução de planos para sua transferência a outras áreas do País e acesso a emprego e renda. Inclusive, este aproveitamento, este remanejamento – o envio de imigrantes venezuelanos com nível superior, com preparo profissional – está previsto numa das medidas solicitadas pela Governadora Suely Campos ao Governo Federal.

    Só o Governo Federal tem instrumentos para enfrentar essa situação, e é absolutamente necessário que o faça com o empenho e a firmeza que, até agora, não demonstrou.

    Sr. Presidente, eu queria também tratar de um outro assunto que é muito relevante para o nosso País: a questão da segurança pública. Como nós já falamos aqui, há necessidade em função do intenso fluxo migratório, mas também em função de tudo isso que tem ocorrido no Brasil inteiro – no Rio de Janeiro, no Ceará e no Rio Grande do Norte.

    Nós vimos que o Presidente da Câmara e o Presidente do Senado elegeram a segurança pública como prioridade máxima para o ano legislativo de 2018. De fato, é preciso concordar que o tema aflige, de maneira aguda, o dia a dia das famílias brasileiras, nas grandes, médias e pequenas cidades do nosso País. Priorizar a segurança pública é, sim, uma absoluta necessidade.

    Não podemos nos esquecer, porém, dos outros dois temas que mais preocupam os brasileiros e que andam esquecidos pelos nossos governantes. Refiro-me à saúde e à educação públicas de qualidade, cuja promoção é competência do Estado brasileiro, mas que, a cada dia, estão mais distantes dos cidadãos e das cidadãs deste País.

    Levantamento realizado pela Confederação Nacional dos Municípios, que, para tanto, baseou-se em dados do Tesouro Nacional, revela o total descaso do Governo Michel Temer para com a saúde e a educação no Brasil.

    Antes de mencionar os resultados, é preciso que nos recordemos do decantado teto de gastos públicos – vamos nos lembrar dele –, tão defendido pela equipe econômica e aprovado aqui, no Congresso, contra o meu voto e contra os votos de toda a oposição. Um dos argumentos utilizados para a aprovação da medida era que, até o ano de 2017, os gastos com saúde e educação não se submeteriam ao teto de gastos exatamente para que o teto não virasse piso. Isso quer dizer que, a partir deste ano de 2018, essas despesas passaram a ser corrigidas estritamente pela inflação, sem considerar eventuais aumentos reais da arrecadação, ou mesmo as necessidades crescentes da população brasileira.

    É aí que voltamos ao levantamento da Confederação Nacional dos Municípios. Em 2017, os gastos do Governo com saúde e educação caíram 3,1% em relação a 2016, já descontada a inflação do período. Na área de saúde, o gasto efetivo foi de R$107 bilhões, sendo que o piso era de R$109 bilhões. São R$2 bilhões a menos, que fazem muita falta a quem mais precisa, ou seja, o cidadão mais pobre, que se amontoa nos corredores dos hospitais em busca de atendimento médico.

    Em sua defesa, o Governo Temer pode dizer que empenhou R$114 bilhões, e, portanto, cumpriu a exigência constitucional. Todos sabemos, entretanto, que o que vale mesmo é o dinheiro efetivamente gasto, ou seja, o recurso que não está apenas num pedaço de papel, e que chega em forma de benefícios reais ao País, ao povo.

    A situação se torna ainda mais aguda quando consideramos as reduções reais de 18,7% na assistência farmacêutica e de 7,7% na atenção básica, áreas fundamentais da assistência à saúde do brasileiro.

    Na área de educação, além de praticamente acabar com o Fies, o Governo promoveu, em 2017, uma queda real...

(Soa a campainha.)

    A SRª  ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR) – ... dos gastos em 3,5%.

    Trata-se de uma realidade ao mesmo tempo triste e inaceitável. É uma clara demonstração da desídia com que o Governo Temer trata a educação no Brasil, que se reflete no sucateamento das nossas universidades federais e dos institutos federais de educação.

    Infelizmente, a situação tende a se agravar, e muito, com a aplicação do teto de gastos à saúde e à educação, que será implantado a partir deste ano de 2018. Trocando em miúdos, a despeito de qualquer recuperação econômica e sem considerar as necessidades crescentes da população brasileira, a correção das despesas com essas áreas fundamentais ficará restrita à inflação do ano anterior.

    Mais uma vez, como tem sido a tônica do Governo Temer e de seus aliados, o povo brasileiro é colocado em último plano.

    Nas primeiras filas, como sempre, estão os ricos, os banqueiros...

(Soa a campainha.)

    A SRª  ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR) – ... os rentistas. Isso é inaceitável, Sr. Presidente.

    Era isso o que tinha a dizer.

    Muito obrigada pelo tempo concedido.

    O SR. PRESIDENTE (Sérgio de Castro. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - ES) – Senadora Ângela Portela, quero, em nome do Estado do Espírito Santo, solidarizar-me com Roraima nessa situação difícil de acolhimento dos venezuelanos. Pessoalmente, estou junto com a posição da Senadora na responsabilização clara do Governo Federal em assumir, resolver e dar o tratamento previsto na Constituição a essa quantidade de venezuelanos que estão chegando a Roraima.

    A SRª  ÂNGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RR. Fora do microfone.) – Obrigada pela solidariedade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/02/2018 - Página 42