Pronunciamento de Gleisi Hoffmann em 27/02/2018
Comunicação inadiável durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Apelo ao Ministro do STF Celso de Mello para que não vote pela inconstitucionalidade dos artigos 59 e 67 do Código Florestal.
- Autor
- Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
- Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Comunicação inadiável
- Resumo por assunto
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PODER JUDICIARIO:
- Apelo ao Ministro do STF Celso de Mello para que não vote pela inconstitucionalidade dos artigos 59 e 67 do Código Florestal.
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/02/2018 - Página 29
- Assunto
- Outros > PODER JUDICIARIO
- Indexação
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- EXPECTATIVA, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, OBJETO, ARTIGO, CODIGO FLORESTAL, LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, PESQUISADOR, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), PUBLICAÇÃO, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, SOLICITAÇÃO, CELSO DE MELLO, MINISTRO, MANUTENÇÃO, CONSTITUCIONALIDADE, MOTIVO, BENEFICIO, AGRICULTOR, AGRICULTURA FAMILIAR.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Presidente.
Presidente, o assunto que me traz a esta tribuna, saudando a todos que nos acompanham pela TV e pela Rádio Senado, e pelas redes sociais, é um assunto em que V. Exª tocou agora há pouco, na mesa. É a questão que está prestes a ser julgada, decidida pelo Supremo Tribunal Federal em relação ao Código Florestal e que impacta mais de 4,5 milhões de produtores familiares.
Nós fizemos a discussão do Código Florestal. Eu era Ministra-Chefe da Casa Civil e acompanhei com muita atenção isso, para que a gente pudesse fazer a preservação e conservação ambiental, mas ao mesmo tempo manter a sustentabilidade das pequenas propriedades rurais, que são tão importamos para o País.
E amanhã está na pauta exatamente a ação que julga inconstitucionais dois artigos que defendem e que protegem os pequenos agricultores, sem isentá-los de preservar e conservar o meio ambiente. São os arts. 59 e 67. E está na mão do Ministro Celso de Mello para decidir a questão, porque já há cinco votos a favor e cinco votos contra a ação de inconstitucionalidade.
Então eu quero dirigir este pronunciamento aqui, com todo o respeito que tenho, ao Ministro Celso de Mello. E não tenho texto melhor para falar da questão a que aqui me refiro do que um artigo publicado ontem no jornal O Estado de São Paulo, do Prof. Dr. Evaristo de Miranda, que é agrônomo, doutor em Ecologia e pesquisador da Embrapa. Peço ao Prof. Evaristo licença para ler o seu artigo desta tribuna, para que fique registrada nos Anais desta Casa a nossa preocupação e por que nós estamos pedindo que o STF não declare inconstitucionais os arts. 59 e 67 do Código Florestal.
Para tanto, peço ao Sr. Presidente mais tempo para o meu pronunciamento.
Diz o Prof. Evaristo:
Se existe uma espécie ameaçada de extinção no Brasil, são os pequenos agricultores. Uma espada paira sobre a cabeça de mais de 4,5 milhões de produtores familiares: a possível declaração de inconstitucionalidade dos artigos 59 e 67 do Código Florestal pelo Supremo Tribunal Federal.
Só no meu Estado, Presidente Cidinho, são 320 mil propriedades de agricultura familiar. A maioria das propriedades, a imensa maioria das propriedades no Estado do Paraná são de agricultores familiares.
A legislação define como pequeno agricultor aquele que possua até quatro módulos fiscais. O tamanho do módulo é definido por Município e varia. O menor valor é de cinco hectares. Muitos produtores possuem apenas um módulo fiscal, e até menos. É assim nas áreas irrigadas do Nordeste – Senadora Fátima –, nos mais de 9.300 assentamentos de reforma agrária e em diversas regiões de minifúndios.
No último censo havia 4.594.785 pequenos proprietários. Esse número correspondia – pasmem! – a 89% dos estabelecimentos agropecuários do Brasil. Eles ocupavam somente 11% do território nacional e contribuíam com 50% do valor da produção agropecuária.
Quero repetir esses números, porque eles são muito fortes: os 4,5 milhões de produtores familiares correspondem a 89% dos estabelecimentos agropecuários do Brasil e ocupam somente 11% do território nacional e contribuem com 50% da produção agropecuária.
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) –
Os pequenos agricultores exploram a quase totalidade de suas terras para poderem manter suas famílias. Por não terem, individualmente, grande volume de produção, não têm poder de barganha: compram caro os insumos agrícolas e vendem barato a sua produção.
Pela legislação recente, grande parte deles ocupa áreas de preservação permanente, as chamadas APPs. Plantam café e criam gado leiteiro nas encostas da Serra da Mantiqueira e em outras áreas de relevo em todo o País, como é assim no meu Estado do Paraná; cultivam bananeiras no Vale do Ribeira (SP), parreiras e macieiras na região serrana de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul e ocupam, aos milhares, pequenas faixas de terra ao longo do rio São Francisco, no semiárido nordestino, como os ribeirinhos o fazem, em toda a Bacia Amazônica. Todo o Pantanal é APP, assim como a Ilha do Marajó e todas as ilhas fluviais.
O Código Florestal não isentou os pequenos agricultores de manter as APPs, mas o art. 67 limitou o tamanho da reserva legal à área existente com vegetação nativa nos imóveis em 22 de julho de 2008 [ou seja, congelou a situação que eles tinham na propriedade nessa data. Eles não precisavam recompor, mas também não poderiam retirar mais nada]. Se ela representava 10% da superfície, esse número seria mantido; se fosse 5%, também; idem se fosse apenas uma árvore. Eles estavam isentos de recompor a reserva legal em 20% ou até 80% da área de seus imóveis, conforme o bioma.
Caso o art. 67 seja declarado inconstitucional, milhões de famílias rurais terão sua atividade produtiva inviabilizada pela redução da área aprovada em seus imóveis, já limitadíssima [e eu estou falando aqui de apenas 11% do território nacional, responsável por 90% das propriedades agrícolas]. Os pequenos se tornarão microprodutores, categoria que só é viável na semântica. Eles não pagam suas contas com bitcoins, mas com breadcoins.
Além da perda da área para vegetação nativa, eles ainda teriam de arcar com os custos da recomposição. E pagar multas. Antes do código, medidas provisórias, que viraram lei sem nunca terem sido votadas, obrigavam os produtores a recompor a reserva legal, mesmo se a área tivesse sido desmatada no século passado. Os pequenos, vítimas desse anacronismo legislativo, foram notificados de múltiplas infrações ambientais, que eram simplesmente o resultado de um processo histórico e o retrato de sua situação social.
Apesar dessas dificuldades [e aqui acrescento, com uma política dos Governos do PT para a agricultura familiar], muitos se profissionalizaram, adotaram novas tecnologias e sistemas de produção diferenciados, como a agricultura orgânica. E contribuem na agropecuária não apenas com frutas e hortaliças, mas também com soja, café, flores, celulose e até cana-de-açúcar.
O Cadastro Ambiental Rural, fruto do Código Florestal, que se aprovou nesta Casa, atesta: 91% dos cerca de 4,5 milhões de cadastrados até janeiro têm menos de quatro módulos fiscais. Muitos não têm sequer energia elétrica, mas cumpriram o acordado: realizaram seu cadastro digital. Apontaram em mapas e imagens de satélite sua situação real para transformar eventuais irregularidades ou sanções (anteriores a 22 de julho de 2008) em serviços ambientais, como prevê o art. 59. Todos os milhões de cadastrados assim procederam.
Se o art. 59, que prevê os serviços ambientais como compensação, for declarado inconstitucional for declarado inconstitucional, não haverá Programa de Regularização Ambiental.
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) –
Pior ainda, o cadastro ambiental rural será usado imediatamente contra os produtores. As multas serão produzidas aos milhões, por computador, automaticamente, e notificadas por e-mail. Um esboço desse esquema de notificação já foi testado em 2017. A máquina de moer carne digital está pronta e azeitada, financiada por fundos estrangeiros, para devolver em sanções o que os produtores depositaram em confiança na lei.
Para o Ministro Dias Toffoli, o estabelecimento de um marco temporal não significa que o dano ambiental antes daquela data não será recomposto: "Ao contrário, define que danos causados em afronta à lei ambiental após esse marco são passíveis de multa e criminalização". Revogar esse trecho da legislação causará enorme insegurança jurídica, após ter sido praticado por quase seis anos. "O Estado diz para o cidadão: aja de tal sorte que terá um benefício. O cidadão age como a lei orientou por seis anos e, depois, o Estado vai lá e diz: não, você é um criminoso". [É isso que está prestes a acontecer se o STF julgar dessa maneira].
O Código Florestal foi aprovado por ampla maioria no Congresso. "Pela teoria do Direito Constitucional, na dúvida da constitucionalidade temos que privilegiar a legalidade da lei, neste caso, mais ainda, porque não podemos esquecer o amplo debate feito no Parlamento", defendeu [o Ministro] Toffoli.
Pois bem, é com esses artigos que eu queria defender os pequenos produtores rurais, mais de 4,5 milhões de produtores, 320 mil no meu Estado do Paraná, que têm menos de quatro módulos fiscais e que são responsáveis por colocar o alimento na mesa das pessoas. Essas propriedades não afetam o meio ambiente, posto que elas são apenas 11% do território nacional e eles não vão mexer naquilo que já estava nas suas propriedades em 2008.
Queria fazer um apelo e sei que faço em nome de muitos Senadores e Senadoras desta Casa, aos Ministro do Supremo Tribunal Federal, em particular ao Ministro Celso de Mello para que desempatem em favor dos pequenos agricultores e trabalhadores desse País que labutam de sol a sol para colocar a comida na mesa do povo brasileiro.
Muito obrigada.