Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação contra o pagamento indiscriminado de benefícios salariais a servidores públicos.

Autor
Sérgio de Castro (PDT - Partido Democrático Trabalhista/ES)
Nome completo: Sérgio Rogério de Castro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Manifestação contra o pagamento indiscriminado de benefícios salariais a servidores públicos.
Publicação
Publicação no DSF de 28/02/2018 - Página 48
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Indexação
  • CRITICA, ABUSO, SALARIO, PRIVILEGIO, SERVIÇO PUBLICO, ENFASE, JUDICIARIO, MINISTERIO PUBLICO, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, PERIODICO, VEJA, ASSUNTO, DADOS, CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), EXCESSO, AUXILIO-MORADIA, AUXILIO, ALIMENTAÇÃO, SAUDE, BENEFICIO, CATEGORIA, MAGISTRATURA, EXPECTATIVA, RELAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), JULGAMENTO, PROCESSO, RELATOR, LUIZ FUX, MINISTRO, LEGALIDADE, PAGAMENTO.

    O SR. SÉRGIO DE CASTRO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Cidinho Santos, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores, ouvintes, internautas, vou falar hoje sobre o tema dos altos salários no serviço público brasileiro. E não falo isso... Eu até gostaria de que nós pagássemos salários altos para todos os servidores públicos brasileiros, mas a realidade do nosso País não permite. Eu venho aqui tratar desse tema, porque uma parcela pequena de brasileiros tem recebido vantagens que o País não suporta, em prejuízo de uma grande maioria para quem recursos para saúde, educação e segurança têm faltado.

    O Brasil é um país curioso. Aqui existe a possibilidade de as leis não pegarem ou existe ainda o jeitinho, sobretudo quando se trata da manutenção de privilégios de poderosos ou de determinadas categorias especiais de brasileiros, que denomino a aristocracia da República. O pior de tudo é que a maioria da população já está acostumada, que nem mais consegue ver essas práticas como ilegais, imorais ou absurdas. Tudo ficou normal para uma quantidade considerável de brasileiros.

    E assim, dentro dessa normalidade, vamos sangrando os cofres públicos e afundando o País, até, quem sabe, chegarmos a uma situação desastrosa, como a que chegou a Grécia há pouco tempo ou como a que está vivendo a Venezuela hoje.

    Ninguém quer abrir mão de nada. Toda a sociedade paga um preço por isso, uns mais, outros menos. Mas pagam mais, com certeza, aqueles que não têm escolas para os seus filhos ou socorro para os seus problemas de saúde.

    Quero falar hoje sobre o abuso dos pagamentos de salários de servidores públicos de todos os escalões, de todas as esferas de Poder e de todos os Poderes, acima do teto determinado pela Constituição Federal, que tem como referência o salário de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Repito, quero falar sobre a aristocracia da República brasileira.

    Os penduricalhos existem nos três Poderes da República e precisam ser combatidos. Mas a sua ampla existência no Poder Judiciário e no Ministério Público, na minha opinião, é mais grave, pois afeta a credibilidade e reduz a respeitabilidade que a sociedade deve ter com eles.

    Tivemos, no fim do ano passado, acesso a informações que precisam ser discutidas pela sociedade e, principalmente, pelas autoridades, graças à providência da Presidente Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, que determinou a divulgação dos salários pagos no Judiciário.

    De acordo com levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, feito a partir dos dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça, a concessão generalizada de auxílio-moradia, auxílio­alimentação e auxílio-saúde faz com que 26 tribunais estaduais de Justiça gastem cerca de R$890 milhões por ano com esses pagamentos.

    Segundo os dados publicados, 13.185 juízes desses tribunais – mais de 80% do total – tiveram o contracheque inflado por esses benefícios ou itens similares. Três em cada quatro juízes estaduais recebem auxílio-moradia, independentemente da cidade onde trabalham, independentemente de possuírem ou não residência própria. O auxílio-alimentação atinge uma parcela maior: 78% dos magistrados o recebem.

    Graças a esses auxílios, segundo o jornal, os juízes obtêm um ganho de até 30% em relação ao salário básico, em média. Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, o salário médio é de R$28.200, mas, com os auxílios recebidos, sofre um acréscimo médio de quase R$8.400. Como esses auxílios são considerados verba indenizatória, não são levados em conta no cálculo do teto de vencimentos dos magistrados, que é de R$33.763, nem são descontados quando o limite é ultrapassado.

    É importante notar como se deu um jeitinho para que o auxílio-moradia fosse estendido à quase totalidade dos magistrados. O auxílio-moradia começou como uma ajuda de custo para moradia nas comarcas em que não houvesse residência oficial para juiz, exceto nas capitais, segundo a Lei Orgânica da Magistratura de 1979. Ainda, conforme O Estado de S. Paulo, em 1986, a restrição às capitais foi abolida. O que era exceção passou a ser praticamente regra. Mais tarde, a Resolução nº 199, de 2014, do Conselho Nacional de Justiça, à época presidido pelo Ministro Ricardo Lewandowski, formalizou a extensão do auxílio-moradia a toda a magistratura nacional. No entanto, o §11 do art. 37 da Constituição determina que o estabelecimento de parcelas indenizatórias, não computadas dentro do teto constitucional, seja feito por lei, mas, como se sabe, a resolução não tem força de lei.

    Chegou-se a tal ponto que hoje há ações na Justiça que reivindicam o "direito", entre aspas, ao auxílio-moradia também para juízes aposentados e também para os casos em que ocorreria um auxílio­moradia duplo para casais de juízes.

    Assim, segundo informações da revista Veja, em um único mês, o Poder Judiciário gastou mais de R$105 milhões em auxílios a juízes e desembargadores no Brasil inteiro. A soma inclui ajudas de custo com moradia, saúde e alimentação. Em um ano, isso representaria mais de R$1,2 bilhão.

    A Justiça estadual concentra a maior parte dessa cifra, R$76 milhões, seguida pela Justiça do Trabalho, cerca de R$18 milhões, e pela Justiça Federal, R$11 milhões. O auxílio-moradia representa 60% do total de gastos com os benefícios e é o único que é pago em todas as cortes pesquisadas pela revista. Em um único mês, foram gastos mais de R$63 milhões para esse fim.

    Trata-se de um problema de difícil solução, em que normas infraconstitucionais burlam a Constituição, criando privilégios em nítida contradição com o Texto Constitucional.

    E o Supremo Tribunal Federal, até há pouco tempo, não parecia muito preocupado em resolver a questão. Desde 2014, uma liminar do Ministro Luiz Fux ampara a possibilidade de pagamento do auxílio-moradia a cerca de 17 mil magistrados e quase 13 mil procuradores do Ministério Público Federal, segundo a revista Veja, sem que o mérito da ação seja posto em julgamento. A ONG Contas Abertas estima que essa liminar já deve ter custado R$4,5 bilhões aos cofres públicos.

    Há poucos dias, meu caro Presidente, o próprio Ministro rejeitou uma ação popular que pretendia restringir o pagamento de auxílio-moradia a juízes, promotores e conselheiros de tribunais de contas. A ação foi movida pelo Sindicato dos Servidores da Justiça de 2ª Instância do Estado de Minas Gerais, para que sejam declarados inconstitucionais os valores pagos aos que morem na comarca onde trabalham. Segundo a entidade, o pagamento do benefício na forma de indenização vem sendo utilizado, na prática, como uma forma de aumentar a remuneração dos juízes. Na decisão, foram considerados precedentes do Supremo segundo os quais não é possível questionar decisões por meio de ação popular.

    Contudo, talvez por finalmente compreender a importância da controvérsia, o Ministro Luiz Fux finalmente liberou para o julgamento do Plenário do Supremo a ação que discute o auxílio-moradia. Espera-se que esse julgamento finalmente ocorra no próximo mês de março, apesar de pedidos em contrário...

(Soa a campainha.)

    O SR. SÉRGIO DE CASTRO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - ES) – ... de algumas associações de magistrados e procuradores e promotores.

    Quero acrescentar que, ainda que se possa pensar assim, não é meu intuito fazer o Poder Judiciário de judas. Penso que problemas semelhantes devem ocorrer por toda parte. Cito o Judiciário inclusive pela atitude que deve ter de divulgar os vencimentos de seus componentes e pela abundância de dados publicados. Já justifiquei por que cito o Judiciário, mas concordo com a Presidente do Supremo, Ministra Cármen Lúcia, que instou os demais Poderes a divulgarem os vencimentos de seus servidores, como fez o Judiciário, para que se possa ter a real dimensão do problema.

    É preciso que nos debrucemos sobre esse assunto, para que o teto constitucional não seja um mero faz de conta. A melhor maneira que temos de resolver o problema é dar-lhe transparência e, afinal, legislar de forma justa e adequada sobre essa questão.

(Soa a campainha.)

    O SR. SÉRGIO DE CASTRO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - ES) – Estou terminando, Presidente.

    O que é privilégio e o que é verba indenizatória? Auxílio­moradia deve ser pago? A quem? É um privilégio que engorda salários contra a Constituição ou é uma indenização justa? Empregados da iniciativa privada recebem auxílios como esses de seus empregadores? Deve ser diferente no serviço público? São muitas as indagações sobre o tema, assim como são muitos os projetos de lei ou mesmo de emenda à Constituição que tramitam nas duas Casas do Legislativo sobre esse tema. Não me canso de repetir que os problemas do Brasil estão todos previstos. Há projetos aqui, nas duas Casas, que resolvem todos os problemas do Brasil. Precisamos é pautá-los, discuti-los, aprová-los.

    O mais notável e adiantado desses projetos talvez seja o PL nº 6.726, de 2016, que está sob os cuidados de Comissão Especial da Câmara há cerca de um ano e, recentemente, passou a ser considerado prioritário na agenda governamental. Esse projeto, que teve origem na Comissão Especial do Extrateto do Senado, regulamenta a aplicação do teto constitucional, deixando claro o que deve ser ali considerado.

    Mais uma vez, reitero que certamente não precisamos de novas proposições, de mais projetos, mas de um consenso, inclusive com os demais Poderes, para que possamos, aproveitando os projetos existentes, criar uma legislação justa e adequada para regular a matéria em consonância com a Constituição Federal.

    O que não podemos mais é persistir com práticas que ferem a Constituição e que, pior do que isso, Sr. Presidente, agridem a cidadania e provocam a revolta nos cidadãos pagadores de tributos, que irão arcar com essa conta exagerada. Essa conta retira recursos de outras áreas e restringe a atuação do Poder Público em prol da sociedade. É preciso encontrar o ponto de equilíbrio entre a justa remuneração dos servidores públicos e os interesses maiores da sociedade. E só cabe a nós homens públicos que temos essa responsabilidade tomar essa iniciativa.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/02/2018 - Página 48