Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação do Projeto de Lei do Senado nº 612, de 2011, de autoria de S. Exª, que prevê o casamento entre pessoas do mesmo sexo

Autor
Marta Suplicy (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Defesa da aprovação do Projeto de Lei do Senado nº 612, de 2011, de autoria de S. Exª, que prevê o casamento entre pessoas do mesmo sexo
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2018 - Página 35
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REFERENCIA, POSSIBILIDADE, CASAMENTO, PESSOAS, HOMOSSEXUAL, APOIO, CIRURGIA, ALTERAÇÃO, SEXO, ELOGIO, ATUAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Prezados colegas Senadores e Senadoras, quem está nos assistindo pela TV ou ouvindo no rádio, nós estamos comemorando, neste mês, o Dia da Mulher, também o mês todo da mulher, e a Bancada feminina do Congresso Nacional listou, entre suas prioridades, a aprovação do meu Projeto 612, que é de 2011, que prevê o casamento entre pessoas. O Relator é o Senador Requião.

    Vocês podem até ficar assustados. É um projeto de 2011 que parece que ainda é uma grande novidade ou um grande escândalo, segundo alguns, que se empenham em tentar impedir o casamento entre pessoas.

    O texto altera o Código Civil, reconhecendo como entidade familiar a união entre duas pessoas e não, como é hoje, entre homem e mulher. Bem, o projeto muda no Código Civil as palavras "entre homem e mulher" para "entre duas pessoas". Não traz nenhuma novidade, porque, exatamente em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito civil dos casais homossexuais.

    O que nós estamos fazendo é colocar em lei o que hoje já pode ser feito em qualquer cartório. Agora, realmente, fico extremamente espantada, Senador João Alberto, porque algo que... É uma lei desde... Não é uma lei, é uma possibilidade. Desde 2011, centenas e milhares de casais homossexuais já usufruem desse direito civil de cidadania, e hoje há tanta dificuldade em aprovar isso aqui, no Senado.

    Por quê? Converso com os Senadores. A maioria não vê nenhum problema, a maioria não tem preconceito, a maioria acha que já está aí, que é assim. Não sinto nada no sentido de que as pessoas possam chegar perto de dizer que essas pessoas não têm o direito, mas, chega na hora de votar, têm receio de votar.

    Eu fico pensando que o eleitor dessas pessoas está muito mais à frente do que esse medo que alguns Senadores têm, mas muito mais à frente. Um eleitor dessas pessoas, dos Senadores e Senadoras, colegas meus, está lá vivendo naquela cidade, naquela vila; ele tem um parente homossexual, tem um vizinho, com quem convive bem. A maioria já tem esse entendimento, já tem esse respeito. Por que impedir aquela pessoa de ter esse direito? Por quê? Eu me pergunto e acho difícil a resposta. Isso vai contra a humanidade, vai contra a bondade, vai contra a generosidade, vai contra o respeito ao outro e é como se fosse afetar a si próprio.

    Há uma frase muito bonita do Ministro Ayres Britto, que vou ver se encontro aqui, de quando foi aprovado, mas não estou lembrada. Mas ele disse que, quando se dá esse direito aos homossexuais, não se tira nenhum direito dos heterossexuais. Então, por que perturba tanto as pessoas ver algumas pessoas que têm um comportamento sexual, uma orientação sexual diferente da própria terem um direito igual a todo mundo? Afinal, são cidadãos e pagam impostos, como qualquer pessoa.

    Realmente, é para mim muito difícil entender, principalmente com a formação que tenho, como psicóloga, psicanalista – trabalhei anos na área da sexologia. Por que achar que, aprovando uma lei que já dá esse direito – mas que não é lei ainda, porque é do Supremo –, você vai incentivar a homossexualidade?

     Primeiro, porque a pessoa é homossexual. Ninguém se transforma em homossexual. Não existe isso. A pessoa é homossexual. Ela se descobre por volta da adolescência, quando ela tem a consciência de que ela é diferente dos coleguinhas ou das coleguinhas. Isso, depois, passa por um período – eu diria – de atrapalhação dentro da cabecinha do adolescente. E depois ele percebe que é diferente mesmo. Aí, se tiver um apoio familiar, ele consegue ter uma vida bastante melhor em meio ao preconceito generalizado, pois ainda é bastante forte, ou vai ter uma vida infernal e não vai poder se assumir, ou, então, vai se assumir com muito ônus e com a família contra.

    Ou seja, o que nós queremos é que essas pessoas passem a ter respeito. É só isso. Não é nada muito complicado. Não é algo que vai incentivar as pessoas. Ou vocês imaginam que alguém vai, um dia, dizer: "Eu vou ser homossexual, porque aí eu posso me casar com outro homossexual"? Isso é insano. Ninguém vai fazer isso. A pessoa, quando é homossexual, o preço que já está pagando por ser homossexual, pela discriminação, para a família entender, é tão grande ainda nos dias de hoje. A pessoa é. Isso que me parece tão difícil que se entenda. Ou, então, os colegas não estão nem aí e preferem não entrar em algo que eles acham que é complicado, mas que, na cabeça deles, é mais complicado do que na realidade na qual eles provavelmente vivem e com a qual convivem.

    Agora, temos também de pensar que nós temos uma responsabilidade aqui, no Congresso.

    Nós temos que cumprir nosso papel de legisladores e, como legisladores, nós temos que trabalhar em vista de pacificar as relações na sociedade na forma da lei. Nesse sentido, é muito importante aprovar a questão do casamento entre pessoas. É a segurança jurídica para essas pessoas e a relação que elas vão ter com a sociedade. Muitas vezes, dizem: "Mas não vai fazer diferença". Faz sim. Faz sim. Se está na lei, a família tem muito mais facilidade de aceitar. Não digo que não vai ter dificuldade. Fica mais fácil para a família acolher. Está na lei. É direito. A gente já viu que fez uma diferença grande quando o Judiciário aprovou. Agora a oposição sistemática em aprovar este projeto é uma forma de discriminação e de violência dos direitos dos homossexuais. Há quem diga: "Mas eles já estão casando. Para que precisa? O Judiciário já deixou". É indigno fazer essa colocação porque não é tão simples e nenhum heterossexual tem que passar por esse processo, pelo qual qualquer homossexual tem que passar para poder ter o direito de que nós todos, heterossexuais, podemos usufruir.

    Quero aproveitar essa oportunidade, para, mais uma vez, bater palmas para o STF, Supremo Tribunal Federal, e para o Tribunal Superior Eleitoral, diante da nossa insistente omissão no Legislativo. Eu tenho desde 2011 um projeto que reconhece o direito de transgêneros alterar o nome e o sexo no registro civil sem passar por cirurgia de redesignação. É o PLS nº 658. A Suprema Corte acabou de reconhecer esse direito, igualzinho ao projeto, que nós temos desde 2011. A relatoria brilhante do Senador Jader Barbalho, melhorou meu original, uma relatoria muito boa, que está na Comissão de Justiça. Vamos ver se conseguimos passar. Quantos anos depois e quanta resistência! É a mesma coisa. O TSE já entende e determina que os trans poderão concorrer nas próximas eleições usando seus nomes. Vão ser contabilizados nas cotas de gênero. Nessas decisões, venceram os argumentos baseados em princípios da autodeterminação e da dignidade da pessoa humana, os mesmos que eu tenho pleiteado aos Srs. Senadores e Senadoras que ouçam e que reconheçam.

(Soa a campainha.)

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) – Cabe destacar que, no julgamento do STF, a maioria dos Ministros decidiu também que não será preciso autorização judicial para que o transexual requisite a alteração no documento, que poderá ser feita em cartório.

    Estamos diante de decisões justíssimas, fruto de batalhas de anos, no Parlamento, nos movimentos, nas ruas. O Brasil já mudou faz muito tempo! O direito chega com grande atraso, mas nem por isso deve ser menos festejado.

    Quero pedir que o Projeto nº 658 de 2011, que está na CCJ, com parecer favorável do Senador Jader, momento relevante nessa luta civilizatória que temos travado, também avance. O Senado não pode mais se apequenar do jeito que tem se apequenado em relação às questões de cidadania plena. Não há razão para acontecer isso.

(Soa a campainha.)

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) – Filme com protagonista trans ganha Oscar! Novelas brasileiras sensibilizam multidões. Todos sabemos aqui que a população brasileira já evoluiu.

    Não tem volta. As pessoas já aceitam. Não tem volta. É uma coisa que vai fazer bem a milhares de pessoas que não têm essa cidadania e também às famílias dessas pessoas.

    Nós estamos deixando para trás a oportunidade de fazer valer que este é um País que quer romper com o preconceito e, mais do que isso, com a violência contra as pessoas.

    Neste momento, a palavra está com o Senado.

    Eu concluo trazendo à nossa reflexão as palavras da Ministra Cármen Lúcia ao encerrar o julgamento sobre a demanda dos trans no STF.

    Palavras dela: "Não se respeita a honra de alguém se não se respeita a imagem que [essa pessoa] tem. Somos iguais, sim, na nossa dignidade, mas temos o direito de ser diferentes em nossa pluralidade e nossa forma de ser".

(Soa a campainha.)

    A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) – Reflitamos sobre isso.

    Muito obrigada, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2018 - Página 35